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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


O SENHOR DO DESEJO / Paula Quinn
O SENHOR DO DESEJO / Paula Quinn

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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Ele é a fantasia de qualquer mulher…
Misteriosamente belo e sensual Lorde Brand Risande conhecido como "O Apaixonado" é a tentação encarnada em homem. Mas sua perícia no campo de batalha e entre os lençóis esconde um amargo segredo: a traição que silenciou seu coração. Agora, enquanto este temido guerreiro toma posse das terras que ganhou por seus serviços na guerra, terá que enfrentar o mais formidável de todos os seus inimigos.

… E o destino de uma mulher.
Lady Brynnafar Dumont está disposta a fazer qualquer coisa para proteger sua gente, inclusive seduzir o selvagem cavaleiro normando que derrotou seu pai. Preparada para enfrentar uma besta sem coração, nunca imaginou que ia se encontrar com um homem descarado e perversamente atraente, que não quer nada com ela. A atitude desse homem faz avivar seu orgulho e fortalecer sua decisão. Mas ela é inocente… e agora deverá usar todas suas artimanhas de mulher para vencer Lorde Brand na única batalha que vale a pena lutar… conseguir seu amor.

No ano 1065 D.C., Lady Brynnafar Dumont se verá na encruzilhada mais importante de toda sua vida. Seu pai acaba de ser derrotado por um normando e, agora, todas as propriedades da família pertencem a seu inimigo. Pelo bem de sua gente, Brynna estará disposta a tudo, inclusive contrair um matrimônio que não deseja.
Disposta a assumir seu destino, e acreditando que seu futuro marido é um autêntico ogro, Brynna fica
completamente assombrada quando se dá conta que Lorde Brand é o homem com o qual esteve fantasiando há um ano, quando o encontrou nadando em um lago e ficou fascinada por ele. Agora, esse matrimônio não lhe parece tão indesejável.
Só existe um pequeno problema: é que Lorde Brand jurou não voltar a se apaixonar, já que a única vez que entregou seu coração a uma mulher, esta o deixou completamente destroçado ao traí-lo com um de seus melhores amigos.
Brynna conseguirá conquistar o amor de Brand?
Ele deixará que ganhe uma batalha que jurou não nunca mais perder?

 

 

Prólogo

Porthleven, Inglaterra

Verão de 1064 D.C.

A carruagem se deteve com brutalidade num dos atalhos do caminho de terra. Lady Brynna Dumont colocou a cabeça entre as cortinas da pequena janela para averiguar o que acontecia. Sua delicada mão correu a cortina de veludo; podia-se ver sua pele pálida contra o brilho vermelho do luxuoso tecido.
— Por que nos detemos?
— Há uma árvore caída mais adiante, minha senhora. Devemos movê-la para poder continuar. Tomará tempo, temo.
Aborrecida pela demora, mas querendo aproveitar o magnífico dia, Brynna abriu impulsivamente a porta da carruagem, disposta a explorar os arredores. Capas de linho azul caíram sobre sua refinada sapatilha antes de pisar no chão do bosque. Seus olhos, tão verdes como as folhas que murmuravam na suave brisa, percorreram as árvores que a rodeavam, ostentando os brotos do verão. Respirava o aroma fresco do ar matutino quando o cavalo negro de Sir Nathan passou ao seu lado.
— Volte a entrar na carruagem — ordenou, puxando os arreios para ficar frente a ela — Pode ser perigoso ficar aqui fora.
Brynna entreabriu os olhos e os cravou no rosto sempre zangado do guarda mais confiável de seu tio Robert. Sir Nathan era alto e ameaçador, o brilho no olhar revelava seu desejo de colocá-la sobre seus joelhos e açoitá-la até que obedecesse. Ela bufou de só pensar nisso. Nunca.
— Estarei bem, Sir Nathan — ofereceu-lhe um sorriso irreverente —, Se ocupe da árvore caída. Estou ansiosa por retornar para casa com meu pai.
Enquanto se afastava, sentiu como seu olhar queimava suas costas, mas o ignorou e levantou o rosto para a copa das árvores. Fechou os olhos e respirou fundo. "Formoso" pensou, enquanto uma brisa suave lhe beijava as bochechas e jogava uma mecha sedosa de cabelo acobreado contra sua face. Afastou o cabelo com a mão, e dirigiu um rápido olhar a Nathan. Estava ocupado ladrando ordens aos seus homens. Os passos de Brynna eram imperceptíveis e ninguém notou quando escapuliu entre as árvores.
Brynna passeou pelo bosque, tratando de esquivar e afastar as trepadeiras que aderiam ao seu vestido. De algum lugar as suas costas, podia escutar Sir Nathan ainda gritando ordens sobre a maneira apropriada de levantar uma árvore caída. Feliz por estar fora de sua vista começou a cantarolar. O
mal-humorado cavalheiro tinha estado a serviço de seu tio Robert desde que Deus criou o mundo. Sir Nathan era extremamente respeitado, sobretudo por seu pai, mas isso nunca tinha impedido que Brynna discutisse com ele em qualquer oportunidade que se apresentasse. É obvio, não era ela que começava as brigas. Nathan era um soldado velho e endurecido pelas batalhas, que não aprovava que as damas andassem a cavalo, usassem botas ou falassem, a menos que lhes dirigisse a palavra. Ela ainda não sabia bem se ter passado o verão discutindo com o comandante de seu tio tinha sido mau ou bom. A filha de Lorde Richard Dumont, poderoso guerreiro do Inglaterra, gostava de boas brigas, como seu pai.
Nada disso importava agora. Por fim estava retornando para casa com seu pai e mal podia esperar para vê-lo. Bom, corrigiu-se, podia esperar um momento mais, só para desfrutar desse esplêndido dia.
A robusta voz de Nathan perseguiu Brynna por entre as árvores até um estreito vale onde se mesclou com o canto das aves no alto. O esplendor da pradaria atapetada de jasmins amarelos e o azul do céu a envolveram. Brynna sorriu e levantou a saia para correr pela exuberante paisagem. Caiu de joelhos sob a sombra de um velho salgueiro e se recostou na grama, desfrutando das suaves pétalas amarelas e azuis que lhe acariciavam as bochechas.
Um estranho som chamou sua atenção. A princípio pensou que estava sonhando, sentou-se e olhou ao seu redor. Estava sozinha no vale. Uma risada sedutora percorreu o ar e, como um canto de sereia, levou-a para um espesso arbusto de groselhas. Era maravilhosamente provocante. Sem dúvida, era a voz de um homem, porque os tons eram profundos e vibrantes. Mas diferente do som rude das vozes dos homens da guarnição de seu tio Robert, esta voz não era áspera aos ouvidos.
Brynna se ajoelhou entre os densos arbustos com o fôlego entrecortado e separou os ramos.
Definitivamente era um homem. Flutuava de costas há alguns metros de distância em uma lagoa banhada pela luz do sol e afastava as folhas que flutuavam, com as mãos. A visão de seu corpo nu acendeu as bochechas da jovem e seus lábios se separaram. Uma luz acobreada se refletia nos músculos tensos de um peito e uns braços musculosos. Jogou a cabeça para trás, sorveu água e lançou-a para cima, como o jorro de uma fonte.
Brynna suspirou, enquanto observava a cena. As árvores, com flores rosadas e brancas, rodeavam a pequena lagoa e lançavam suas frágeis sementes com a mínima brisa. Como uma nevada estival, centenas de minúsculas pétalas espalhavam-se pelo ar e caíam sobre a água, cobrindo toda a superfície. E ali, no meio do paraíso, achava-se o homem mais imponente que Brynna tinha visto em sua vida. Embora nadasse sozinho na lagoa, agia como se houvesse outros desfrutando o dia com ele. Mergulhou nas profundezas cristalinas, entrando em um mundo que só ele conhecia. Mergulhou mais e mais fundo, para seu mundo particular.
Os minutos se estenderam, enquanto Brynna observava a superfície banhada pelo sol, procurando sinais dele. Ficou de pé, alarmada, e abandonou seu esconderijo entre a folhagem. Queria mergulhar na água, mas hesitou, já que não sabia nadar. De repente, ele emergiu, ruidosamente, sacudindo os cabelos negros. Saiu bruscamente da água, A moça pôde ver seu firme abdômen... E mais embaixo. Com um repentino giro de seu corpo voltou a desaparecer, só para tornar a emergir.
Brynna sentiu que estava observando a um homem peixe. Talvez debaixo da água serpenteasse uma grande cauda com escamas, poderosa e incandescente. Parecia muito feliz em sua brincadeira aquática do que qualquer outro humano sobre a terra. A alegria enchia seu rosto; seu sorriso enlevado acendia o rosto, os músculos e o sangue de Brynna. Nunca tinha visto um homem tão erótico. A água era uma amante que beijava cada parte de seu corpo ao mesmo tempo. Ele fechou os olhos, e se abandonou ao puro deleite que o consumia. Quando voltou a abri-los, levantou o rosto para o sol.
O coração da jovem parou ao ver que a cor desses olhos absorvia os azuis intensos do céu enquanto refletiam a verde profundidade da lagoa. Queria ficar ali para sempre e observá-lo imerso em sua fantasia. Começou a sentir comichões em lugares cuja existência acabava de descobrir.
O som do trote de um cavalo aproximando-se do lado oposto da lagoa a sobressaltou, e despertou de sua encantadora fantasia. Voltou à cabeça rapidamente em direção ao intruso.
Uma mulher, montada num cavalo branco apareceu entre as árvores como se fosse um sonho irrompendo na vigília. O pálido cabelo loiro caía em todo seu esplendor sobre as costas e chegava até a cintura, como uma cascata de seda. Seu rosto era de uma beleza indescritível, tão delicado como os brotos tenros da grama que crescia ao redor da lagoa.
Quando a viu, o homem sorriu.
— Colette, chegou tarde! — gritou.
— Surpreende-me que tenha notado. — A bela dama lhe dirigiu um sorriso atrevido, desceu do cavalo e o amarrou a uma árvore próxima.
Brynna suspirou quando a mulher despiu, com suavidade, seus ombros tirando o vestido de algodão, que caiu ao chão como se um anjo tivesse descartado suas asas. O nadador a olhava, deslizando para ela tão lentamente que nenhuma onda rompeu a tranqüilidade da água ao seu redor.
Ai, Meu Deus, o que devo fazer ? Perguntou- se Brynna. Podia notar na voz do homem que o casal não se dedicaria só a nadar. Como escaparia sem ser descoberta? Veria-se obrigada a observar? Estranhamente, a idéia a intrigava e perturbava, ao mesmo tempo. Queria sonhar que tinha descoberto este homem, que pertencia somente a ela. Podia nadar com ele, viajar por seu mundo debaixo da superfície e compartilhar o êxtase que acendia sua paixão.
— Está fria?
— Eu te darei calor — prometeu o homem. Sua voz era como a tênue brisa em um dia sufocante; suave, macia, acalmando o ansioso coração de Brynna.
A moça saltou por cima da roupa com uma graça que fez com que Brynna se sentisse como uma menina, e, nua, dirigiu seus passos para a beira do lago.
Ele nadou para ela. E, para surpresa de Brynna, saiu da água a fazendo se sentir encantada e mortificada. A água caía em ondas, desde suas resplandecentes costas, sobre as firmes e redondas nádegas descendo pelas coxas musculosas até suas pernas. Não era um homem peixe, afinal, pensou Brynna, mordendo o lábio inferior. Tomando as mãos de sua amante, ele retrocedeu na água aproximando-a com suavidade. Ela protestou e conteve o fôlego quando a água fria lhe lambeu os pés, mas ele riu e a conduziu mais para dentro da lagoa. Quando a água chegou à sua cintura, ele se deixou cair para trás, sem soltar à mulher, que com seu abraço úmido mal se mantinha a flutuando sobre seu corpo.
Brynna queria dar a volta, correr, mas não podia. Tinha caído em um feitiço, maravilhada pelo som de sua risada e o apetite com que seus dedos acariciavam o corpo molhado recostado em seu peito.
Ele desapareceu na água, libertando a sua amante. Ela o seguiu, e Brynna esperou, contando mentalmente os segundos. Havia se passado muito tempo. Já deveriam ter saído. Esperou ansiosa por ver seu rosto de novo.
Passou um minuto, depois outro, pondo a prova os nervos de Brynna até que não pôde suportar a tensão. Por fim a superfície da água agitou-se e o casal emergiu, como um gêiser. O homem segurava a cintura da amante, empurrando-a para cima primeiro. A boca da mulher estava aberta, agitada, recuperando o fôlego que a devolvia à vida. Prisioneira da força masculina desses braços sorriu e deslizou pelo corpo de seu amante.
Brynna podia ver a paixão no rosto dele. Podia vê-la, era tão intensa que vibrava e projetava o fluxo da água ao seu redor. Seus lábios desenharam um sorriso amplo e luxurioso enquanto bebia a água que escorria do rosto da mulher.
— Amo você.
As palavras podiam ser lidas com clareza em seus lábios, em seus olhos. Brynna deixou escapar um fraco gemido, desejando que fossem para ela.
Ele beijou sua amante no pescoço e riscou um caminho de fogo para seus seios. Brynna conteve o fôlego. Desapareceu de novo sob a água e a misteriosa dama lançou a cabeça para trás, como tinha feito o homem apenas uns minutos antes, quando ainda estava sozinho na água.
Mordendo o lábio, Brynna tentou imaginar-se o que estava fazendo à bela mulher, sob a água, que a fazia suspirar e gemer, e depois gritar.
Ele emergiu novamente, desta vez atrás de sua loira dama. Pôs seus braços ao redor dos seios dela e sussurrou algo em seu ouvido, com um sorriso radiante, quando o sol iluminou o rosto da mulher. Levantou-a sobre seu corpo e voltou a baixar.
Por sorte, Brynna pôde sufocar o gemido antes que lhe escapasse dos lábios. Entretanto, o fogo que ele tinha acendido nela não podia ser apagado. Sabia que nunca poderia esquecê-lo.


Capítulo 1

Fins de outono – ano de 1065

Nervosa, Brynna caminhava com pressa de um lado para outro de seu quarto. Quando já não pôde esperar mais, se dirigiu a sua donzela com os lábios apertados e cheios de raiva.
— O que pode estar levando tanto tempo?
Alysia observou a sua senhora da beira da cama. Fez um gesto com a cabeça, temerosa de pronunciar uma palavra. Lady Brynna era uma mulher amável, embora às vezes mostrasse um temperamento mais ardente que o fogo. Hoje era um desses dias. Entretanto, nunca a tinha visto tão furiosa. Por certo, muita coisa tinha mudado desde que o pai de sua senhora, Lorde Richard Dumont, retornou do campo de batalha, vencido. Alysia sabia que a única preocupação da jovem tinha sido que seu pai voltasse com vida, mas o bastardo normando o tinha derrotado. Foi uma surpresa para todos os habitantes de Avarloch, já que ninguém tinha vencido antes a Lorde Richard.
As vidas de todos estavam a ponto de mudar, com a chegada de Lorde Brand Risande. O vencedor devia reclamar o castelo e o título de Lorde Richard. Mas havia algo pior que um lorde normando governando Avarloch: corria o rumor de que o novo senhor tinha sido corrompido pela traição. Até o Norte, até Aberdeen, tinha chegado à história sobre o cavalheiro escuro cujo coração se tornou frio e cruel. A pobre Alysia tinha passado muitas noites com outras donzelas e com os servos e vassalos do castelo temendo por sua sorte, quando Lorde Richard e Lady Brynna fossem expulsos como trastes imprestáveis. Mas Brynna não se preocupava. Só ficava mais furiosa com o correr dos dias, e jurava não deixar nunca seu lar, sem importar que classe de besta o ocupasse.
Quando um witan, um dos membros do Conselho dos nobres anglo-saxões, chegou naquela manhã para reunir-se com Lorde Richard, proibiram Brynna de assistir ao encontro. Alysia a acompanhou em silêncio durante quase todo o dia, enquanto a dama lançava insultos e acusações que faziam com que a morena donzela tremesse.
— É uma traição, Alysia — disse Brynna furiosa — Nosso rei, que é ele mesmo um saxão, conspirou contra meu pai.
— Mas por quê? — perguntou Alysia.
— Porque meu pai expressou, na igreja, seu descontentamento com o modo no que o rei Eduardo governa a Inglaterra. Eduardo é débil e permitiu que o destino do país ficasse nas mãos de seu cunhado, Harold de Wessex — Brynna levava solto seu cabelo castanho avermelhado, exceto por duas mechas trancadas nas têmporas e presos na nuca e quando ela andava pelo quarto, ondulava em brilhantes e espessas labaredas ao redor da cintura de seu vestido. Eduardo é um covarde que ofereceria sua terra a um normando, antes de aceitar os questionamentos de meu pai.
Alysia permaneceu calada, não se atrevia a recordar a sua dama que suas palavras eram consideradas traição. Mas ninguém em Avarloch a delataria por isso. Sua senhora era muito querida, como Lorde Richard.
— Agora meu pai perdeu seu lar e meu destino está, neste preciso momento, em mãos de um Conselho de homens que mal conheço. Bom, — Brynna deu outra volta —, Se o porco normando acredita que virá aqui tomar posse de meu lar, terá um despertar pouco agradável. Vou arrancar seus olhos, juro!
Alysia engoliu em seco. Foi um som quase imperceptível, mas Brynna o escutou e a olhou fixamente, podiam-se ver as chamas dentro de seus olhos esmeralda.
— O que? Não deveria matar esse bastardo? — perguntou.
Alysia negou com a cabeça.
— Eu... Eu não disse nada, minha senhora.
— Pensa que deveria abandonar meu lar sem lutar?
Alysia não tinha alternativa, agora tinha que dizer algo.
—Talvez ele não... Não seja T... Tão mau — gaguejou, apertando os lençóis da cama de Brynna entre os dedos — Escutei dizer que é de aparência agradável e alto e forte, e...
— Não me importa se for tão alto como Golias! — gritou Brynna. Então, vendo a Alysia tremer, baixou a voz e se ajoelhou ante ela— Perdoe-me, Alysia. Não foi minha intenção gritar. É só que... Que... — não terminou a frase. Seus lábios tremeram um instante antes de esticar- se em uma linha firme.
A porta se abriu e um dos guardas de seu pai apareceu dentro do quarto.
— Pode descer agora, minha senhora. O Conselho a espera.
Brynna lançou um olhar furioso para o guarda, embora ele não tivesse nada a ver com a traição a seu pai, e ficou de pé.
— Obrigado, Sir Martin. — Sua voz tornou-se repentinamente suave, sua expressão, uma máscara de tranqüilidade, que desejou sentir de verdade.
— Que será de você, minha senhora? — perguntou a jovem donzela, retorcendo as mãos sobre a saia.
Brynna olhou Alysia com um formoso sorriso e o tomou suas mãos.
— Não tema. Farei o que tiver que fazer para permanecer aqui. Não te abandonarei.
Entrou no grande salão com toda a graça e a elegância de uma rainha... Para delícia de Lorde Richard Dumont. Sorriu a seu pai, quando seus olhos se encontraram por cima da mesa, lotada de nobres. Deus amava-o tanto! Era o mais belo do salão, levando-se em conta que os homens sentados ao seu redor na larga mesa pareciam presuntos gordos, prontos para assar. Brynna esquadrinhou cada rosto, seu belo sorriso alargando-se mais com cada um que observava.
Formado na época do rei Alfredo, o witan era um grupo de nobres que governavam junto com o rei. Outorgavam terras, administravam justiça e decidiam assuntos tais como a guerra e a paz, tudo com o consentimento de seu rei, é obvio.
Lorde Richard ficou de pé quando sua filha se aproximou dele. Tomou sua mão e a levou aos seus lábios para lhe dar um beijo terno.
— Meu raio de sol — sussurrou, e lhe ofereceu a cadeira ao seu lado.
Antes de sentar-se, Brynna viu seu tio Robert sentado ao lado de Sir Nathan. O mal-humorado cavalheiro a saudou com a cabeça, enquanto ela o avaliava, em silêncio.
— Minha querida — começou a dizer seu tio e se moveu, incômodo, na cadeira — Sabe por que estamos aqui.
— Para decidir meu destino — disse Brynna. Manteve sua expressão neutra, embora quisesse dizer a todos que apodrecessem no inferno. Ninguém ia forçá-la a abandonar seu lar.
— Desejaria que assim fosse, minha menina — disse ele brandamente —. Você ficaria comigo até que seu pai arrumasse um matrimônio apropriado para ti — Sir Nathan grunhiu e Brynna se sentiu tentada a lhe sorrir, antes de voltar a prestar atenção em seu tio—Temo que seu destino já estava decidido, quando o normando venceu seu pai.
Brynna ergueu uma sobrancelha, perfeitamente arqueada.
— O que quer dizer, tio?
— Brynna — seu pai respondeu por ele. Era muito difícil olhá-la nos olhos, mas ele queria dizer-lhe pessoalmente. Tudo era sua culpa, por perder diante do normando... Um remorso com o qual teria que viver o resto de sua vida— O Conselho se nega a ceder esta terra aos normandos.
— Mas, o que podemos fazer? — voltou-se e procurou entre os rostos que a observavam, fixamente— O rei permitirá que meu pai lute de novo contra este normando?
— Não, filha — disse Richard, sacudindo a cabeça — O Conselho ordena que o guerreiro se case contigo. Oferecer-lhe uma esposa saxã é a única maneira de assegurar que a terra permaneça, parcialmente, sob o governo saxão.
— Esposa? — Brynna quase se engasgou com a palavra. Sentiu que o sangue abandonava seu rosto e lutou para controlar seus sentidos, quando o salão começou a girar — Mas eu...
— Tem dezenove anos, Brynna — recordou seu tio gentilmente – passou há muito da idade em que uma dama deve aceitar um marido.
Não estava preparada para converter-se em esposa. Não queria casar-se com o homem que tinha vencido seu pai em batalha. Já odiava o normando. Como poderia honrá-lo e obedecê-lo, quando queria enviá-lo ao inferno? Queria protestar, mas quando abriu a boca, só pôde emitir um suave gemido. Percebeu que esse era o único modo de permanecer em Avarloch.
— O rei toma o partido dos normandos em muitas questões, devido ao seu parentesco com o duque William — explicou Robert, embora fosse claro que a tarefa começava a impacientá-lo. Sua sobrinha deveria estar bordando uma tapeçaria, não se reunindo com homens e discutindo política —Lorde Brand Risande não deseja se casar, mas o rei conseguiu a ajuda de duque William para tratar do assunto. Risande foi treinado sob a tutela do duque, e nosso rei nos assegura que obedecerá a ordem de casar-se contigo.
— Nosso rei?! — o temperamento de Brynna finalmente veio a tona. Entrecerrou os olhos e olhou primeiro para seu tio, e depois para cada um dos outros nobres — Refere-se ao mesmo rei que assinou um decreto oferecendo a propriedade de Avarloch a qualquer nobre que enfrentasse meu pai e ganhasse? Um rei que não se reuniu em conselho com vocês, como requer a lei antes de tomar essa decisão? E por que, depois de conspirar para expulsar meu pai de sua terra, Eduardo quereria nos ajudar?
— Porque — respondeu uma voz rude, e Brynna dirigiu seu olhar para Sir Nathan — Traremos a batalha a Avarloch se o normando te rechaçar.
— Não! — Brynna quase saltou de sua cadeira. A mão de seu pai sobre seu ombro a deteve. Voltou-se para ele.
— Pai, você não pode estar de acordo com isto.
— Não acredito que chegue a esse ponto, Brynna — assegurou — Eduardo pode ser muitas coisas detestáveis, mas não é tolo. Se o Conselho se voltar contra Lorde Risande, os normandos certamente tomarão a ofensiva, em especial agora que envolvemos ao duque William. Poderia começar uma guerra — Lorde Richard sorriu e deu um tapinha na mão de Brynna, quando ela sacudiu a cabeça — Não vê, preciosa? Se houver guerra, Eduardo se verá obrigado a tomar partido dos saxões e, se o fizer, perderá todas as alianças com o duque William. Tem que nos ajudar. Pode não querer um Dumont em Avarloch, mas agora não tem alternativa. Quanto ao duque William, já enviou uma missiva anunciando que chegará durante esta semana. Enviou uma solicitação ao rei para que eu permanecesse aqui, até sua chegada. Não sei por que deseja que eu fique, mas estou seguro de que não quer começar uma guerra por um castelo inglês. Então, percebe? Não haverá luta aqui. O duque convencerá este homem a tomá-la por esposa. Não terá que abandonar seu lar, e Avarloch permanecerá, em parte, como posse saxã.
O coração de Brynna batia em seu peito ante a idéia de uma batalha em Avarloch. A possibilidade de que seus vassalos perdessem a vida, fazia brotar lágrimas em seus olhos. As imagens de seu lar destruído, nas mãos dos guerreiros, reafirmaram sua decisão de fazer o que fosse necessário para assegurar-se de que aquilo nunca acontecesse. Que opções tinha? Nenhuma. Seu destino, na verdade, tinha sido decidido quando seu pai perdeu diante de Lorde Brand Risande. Tinha que casar-se com o normando. Voltou-se para os numerosos nobres que a observavam. Seus ombros delicados se ergueram, com determinação.
— Não deixarei que Avarloch seja destruído. Farei tudo o que me ordenarem. Mas nunca esquecerei a traição do rei Eduardo contra meu pai. Ele não merece sua lealdade, e nunca terá a minha.
Um redemoinho de murmúrios se elevou no grande salão. Vencer o rei em seus próprios jogos secretos era uma coisa, a traição era outra. Sir Nathan sacudiu a cabeça, com o cenho franzido.
— Arrisca-se muito, pronunciando palavras de traição, jovem. Se fosse minha filha, faria com que te açoitassem.
Nesse momento, o sol se ocultou. Os raios de luz que se infiltravam pelos arcos das janelas no grande salão se esfumaçaram. A escuridão cobriu Avarloch, enquanto Lorde Richard ficou lentamente de pé.
— Sir Nathan, nos conhecemos há muitos anos. E talvez você acredite que isso lhe dá permissão para falar com minha filha dessa maneira. Está equivocado — Os olhos de Richard eram como adagas afiadas. — Tenho muita consideração por seus serviços, porque você é um bom amigo de meu irmão. Mas nunca pense sequer em erguer sua mão contra minha filha, ou o desmembrarei e espalharei seu corpo por estes campos — O olhar desafiante de Richard percorreu o resto dos convidados — Minha filha diz o que pensa, tal como eu ensinei. Você sabe que Risande foi enviado por ordens do próprio rei para me matar. O normando me perdoou a vida, embora não saiba por que. É um guerreiro feroz, lutou como nunca tinha visto um homem lutar, seu poder só é comparável aos rumores que correm sobre William da Normandia. Os esforços de Eduardo para libertar a Inglaterra de mim deixaram um homem mais perigoso em meu lugar. O rei logo perceberá. Quando enviar alguém para lutar contra o guerreiro normando, necessitará de um homem cujo braço seja mais rápido que o vento e cujo coração pulse ao som de um tambor de guerra. E mesmo assim, duvido que possa vencê-lo. Eu não pude, e agora minha filha deve pagar por minha derrota. Mas juro: se a contínua traição do rei Eduardo chegar a machucá-la, de algum modo, retornarei do inferno, se for necessário, e o matarei. — Esperou um momento e, como ninguém falou. Lorde Richard tomou a mão de sua filha e a conduziu para a saída do grande salão.
Brynna voltou para seu quarto e se jogou sobre a cama. Alysia havia saído. O fogo da lareira estava quase apagado, restavam somente algumas brasas brilhantes e fazia frio em seu quarto. O inverno chegaria logo; o normando traria seu odioso frio consigo. A jovem tremeu diante da idéia. Estava disposta a fazer qualquer coisa para salvar Avarloch e sua gente de uma batalha, mas como poderia dar sua vida e seu corpo a um homem que não amava?
Como sempre, seus pensamentos voltaram-se para um dia, dois verões antes, quando estava em Porthleven; para um homem com olhos da cor do céu; um homem cujo coração cantava com os prazeres da vida. Nunca esqueceria a paixão de seu sorriso e o modo como acendeu seu corpo. Suspirou profundamente contra o travesseiro. Se fosse ele, sua magnífica fantasia, que viesse casar-se com ela..

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Capitulo 2

Brynna parou sobre o parapeito que dava aos vastos campos e ao bosque distante que pertenciam a seu pai.
Não, agora não.
Ele estava à caminho. Brynna podia senti-lo, percebê-lo no vento que fazia dançar as copas das árvores ao longe. O cavalheiro normando viria tomar posse de seu lar e não havia nada que ela pudesse fazer. Em realidade, nada que ninguém pudesse fazer. Nem sequer seu pai. Tão selvagem era o normando, que Lorde Richard Dumont se rendeu diante dele? A idéia a aturdia. Seu pai nunca tinha perdido uma batalha.
Lorde Richard era um guerreiro conhecido por todos os saxões desde que era comandante do rei Eduardo. Tinha lutado contra Godwin, pai de Harold de Wessex, que planejou uma fracassada rebelião contra o rei, logo depois que Eduardo elevasse um bispo normando a arcebispo de Canterbury. Os Godwin foram desterrados, mas retornaram um ano depois e ganharam a aceitação do povo. O rei Eduardo lhes devolveu o favor e, por ter brigado contra os Godwin, enviou Richard para viver entre os turcos, durante um ano. A intenção era castigá-lo, mas o pai de Brynna iniciou uma relação amistosa com os turcos, quando lutou com eles contra seus inimigos bizantinos. Retornou com tesouros de sedas e uma nova donzela chamada Alysia para servir sua esposa. Brynna tinha dez anos, nesta época.
Lorde Richard era um grande guerreiro e viveria para lutar outras batalhas, disso Brynna estava certa. O sangue saxão corria profundamente pelas veias... Como ela. Mas sua luta por Avarloch tinha terminado. Tinha perdido e agora tinha que partir.
Brynna olhou suas terras.
— Eu, em troca, nunca partirei — declarou desafiante, fixando o olhar no longínquo bosque, como se o normando pudesse escutá-la — Nunca me renderei diante de ti. — abraçou-se e levantou o queixo, enfrentando o frio que lhe respondeu. Sua túnica de lã se agitava contra o vento.
Não sabia nada dele, exceto os rumores que tinha escutado de suas donzelas. Seu amigo de infância, o duque William da Normandia o chamava "Brand, o Apaixonado" por seu ardor pela vida. Dizia-se que nunca tinha perdido uma batalha, porque seu apetite de vitória era mais poderoso que o de qualquer oponente que enfrentou.
Brynna se perguntava quem trairia um homem assim. Conforme Lily e Alysia, a prometida de Lorde Brand tinha sido surpreendida nos braços de um de seus guardas. As donzelas de Brynna se preocupavam com os rumores: diziam que seu novo senhor normando havia se tornado frio e amargo. Brynna teria sentido pena dele, se não o odiasse tanto.
Ele traz o frio.
O roçar de uma mão em seu ombro rompeu o fio de seus pensamentos e Brynna voltou-se para sorrir ao seu pai.
Lorde Richard deu um passo para frente e olhou à distância, rodeando sua filha com um braço.
— Não posso te proteger disto, Brynnafar.
— Sei — ela respondeu tranqüila e apoiou a bochecha contra seu largo ombro. Mesmo com quarenta e dois anos seu pai era um homem imponente, um guerreiro, selvagem ao seu modo. Mas, pensou Brynna com dor, não suficientemente selvagem.
— Ele é horrível, pai? Tem o cabelo emaranhado e comprido e presas afiadas?
Lord Richard riu brandamente e apertou o abraço ao redor dela.
— Não, filha, não tem presas. É belo para um normando. — Fez uma pausa, recordando o homem que enfrentou na batalha. — É estranho – a palavra rolou da língua de seu pai; estava carregada de curiosidade e de algo que Brynna ainda não compreendia.
— O que aconteceu, pai? — levantou a cabeça, esperando que lhe informasse que seu prometido tinha uma cauda bifurcada.
— O normando... É um patife estranho. Logo depois de ser capturado, levaram-me a uma pequena clareira no bosque com o resto de meus homens. Ele se aproximou, havia outro homem com ele. Disseram-me que era seu irmão, um cavalheiro poderoso que derrotou muitos de meus homens com sua espada. Falaram por um momento e Lorde Brand riu. Por um momento, minha mente não pôde compreender que esse era o mesmo homem que tinha me vencido.
— Por que não? — perguntou Brynna, cativada pelo som hipnótico da voz de seu pai.
— Parecia... — Lord Richard sacudiu a cabeça, custava-lhe encontrar as palavras precisas para descrever o guerreiro — Inocente, quase como um menino, como se não soubesse o que era o ódio, ou a raiva. Não havia nada frio ou calculado em seu sorriso. E então essa inocência sumiu, quando seus olhos se encontraram com os meus e soube que era ele o homem contra o qual tinha lutado no campo de batalha. Pareceu-me estranho que alguém pudesse agir dessa maneira e lutar com tão pouca piedade. — Seu pai inclinou a cabeça para o lado e a olhou. — Tem um rosto enganoso, Brynnafar. Deixa que a precaução te guie com este homem.
— Farei, pai — prometeu, erguendo-se para olhar de novo sobre o parapeito.
Lorde Richard estudou sua filha, com olhos cheios de remorsos.
— Se pudesse de algum modo, evitar que este matrimônio acontecesse... — sua voz se perdeu, enquanto fixava seu olhar nas portas de madeira que levavam ao castelo. — O rei Eduardo já está aqui, para assegurar-se que o normando case contigo e o duque William chegará esta noite.
Brynna ergueu os ombros, fazendo com que seu pai desejasse abraçá-la, uma vez mais. Ela era sua filha, orgulhosa e forte diante de qualquer perigo, mas sua intenção de parecer valente ante as adversidades cortou seu coração.
— Farei o que for necessário para permanecer em meu lar, pai. Nunca me tirará de Avarloch. Mamãe ainda vive aqui, no jardim das ervas, nas cavalariças. Ainda posso sentir sua presença costurando e fiando. Cresci com o povo daqui. Recorda quando tinha sete anos e a cozinheira me deixou ajudá-la a preparar o jantar? Usei algumas das ervas de mamãe para o guisado e quase envenenei todo o castelo.
— Sim, seu guisado de cicuta. Como esquecer? — O pai riu.
— E o velho Gavin, o ferreiro, que me ensinou a fazer minha primeira ferradura?
Seu pai assentiu:
— Tentou colocá-la em meu corcel e o animal deu uma patada. Não a tocou, mas caiu de costas e bateu com a cabeça em uma pá.
— O pobre Gavin chorou uma semana. — Brynna sorriu, recordando sua vida em Avarloch.
Outra brisa gelada agitou suas longas mechas vermelhas e ela ergueu um dedo para tirar o cabelo dos olhos.
— Sobreviverei a este homem, do mesmo modo que sobrevivi aos duros invernos deste lugar.
— Venha para dentro, Brynna. — Seu pai tomou sua mão para consolá-la. Mas ela sacudiu a cabeça.
— Não, quero vê-lo quando chegar — assegurou, marcando cada palavra — Quero que sinta minha presença aqui. Enviarei todo o meu ódio com o vento. — Fixou os olhos nas copas distantes das árvores. Seu pai sabia que era inútil discutir com ela. Era obstinada, e se queria que o normando sentisse seu ódio, certamente o sentiria.
Sir Luis observou o pai de Brynna desaparecer pelo corredor, antes de sair ao parapeito. O jovem cavalheiro inglês tinha chegado com o rei Eduardo alguns dias antes. Quando viu a bela Brynna Dumont, soube que lamentaria para sempre não ter se unido à batalha com Lorde Richard e não ter ganhado a mão dessa criatura fogosa, e seu castelo.
Moveu-se, em silêncio, estudando-a desde antes de anunciar sua presença. O cabelo ondulado caía pesado sobre suas costas. Suas pernas eram longas e bem-feitas, envoltas em meias negras de lã e botas. Não tinha se vestido especialmente para receber seu prometido, ao contrário: esforçou-se por ocultar sua beleza. Luis sorriu, com lascívia, atrás dela. A vestimenta que Brynna tinha escolhido fracassava, miseravelmente, nessa intenção.
Brynna deu a volta, embora Luis não tivesse feito nem um ruído. E ao vê-lo, revirou os olhos, deixando que seu desprezo pelo cavalheiro inglês aparecesse livremente. Não gostava desse homem que parecia estar sempre movendo-se de maneira furtiva nas sombras, observando-a com seus pequenos olhos escuros. Era alto e magro e apertava suas meias, com a intenção de que sua virilidade parecesse indecentemente grande.
— Vá embora. — ordenou com aborrecimento.
Luis deu outro passo à frente.
— Acaso está tão desejosa de ver seu guerreiro normando que o espera de pé, gelando no frio?
Brynna não respondeu, porque embora ele fizesse um esforço para parecer preocupado por seu bem-estar, ela escutou o leve tom sarcástico de sua voz que tinha chegado a conhecer bem nos últimos dias.
— Ele não a quer, sabe? — Luis parou junto a ela. Apoiou as costas contra o corrimão do parapeito, e absorveu toda a beleza de Brynna com seus pequenos olhos negros.
— Isso não me importa — respondeu ela bruscamente, sem olhá-lo.
O cavalheiro arqueou uma sobrancelha.
— Seriamente? — perguntou risonho, curvando a comissura do lábio superior escondido sob um fino bigode — Não a ofende obrigarem este homem a desposá-la? Lorde Brand deixou bem claro que não deseja ser seu marido. De fato, o rei teve que convocar o duque da Normandia para vir aqui, em um esforço para evitar uma batalha — Luis estudou os suaves e brancos contornos do rosto de Brynna enquanto falava e sorriu levemente diante do quase imperceptível franzir de suas delicadas sobrancelhas — Preferia lutar contra os saxões que casar-se com você, minha senhora, e pretende me dizer que isso não a ofende?
— Essa foi minha resposta. — A expressão de Brynna não tinha mudado, nem tampouco o tom gelado de sua voz. Por que teria que se importar se o selvagem queria casar-se com ela ou não? Mas, embora tentasse negar, se perguntava por que o lorde normando preteria lutar ao invés de ser seu marido. Odiava tanto aos saxões? Acaso sua negativa tinha a ver com a infidelidade de sua prometida?
— Suas mãos demonstram desgosto, minha senhora. — Luis ronronou, aproximando seu rosto dela—. Dá-lhe asco a idéia de compartilhar o leito com o normando?
Incapaz de seguir suportando o som de sua voz, Brynna deu meia volta para colocar-se frente a ele.
— Não, é você quem me dá asco, Sir Luis.
Os olhos do cavalheiro inglês arderam por um momento, antes de encolher os ombros.
— Não diria isso se sentisse minha virilidade penetrando-a profundamente - tentou beijá-la, mas Brynna jogou a cabeça para trás e lutou com fúria até livrar-se de seus braços. Ergueu a mão e esbofeteou seu rosto, com toda sua força.
— Informarei a meu pai e ao rei imediatamente sobre seu comportamento e me assegurarei de que seja castigado — cuspiu.
Ignorando o ardor que tinha produzido a bofetada, Luis fez um gesto para que ela fizesse o que quisesse.
— Direi que me implorou para que a tirasse daqui, ou que usou seus encantos para me enfeitiçar e me convencer de que me deitasse com você. Não haverá matrimônio, se o rei pensar que estivemos juntos. Você perderia sua preciosa terra — Luis sorriu, mas seus olhos ardiam — Nunca mais volte a me golpear, porque se o fizer, tomarei o que quero e a deixarei aqui, para ser encontrada pelos outros. — começou a caminhar de volta ao castelo, mas se deteve e deu a volta para olhá-la uma vez mais — Talvez o faça de qualquer maneira.
Brynna o observou afastar-se. Um calafrio percorreu suas costas. Voltou o olhar para o bosque, quando percebeu que o odiado cavalheiro tinha partido. Deus. Rezou, em silêncio, para que o selvagem normando não fosse como Sir
Luis.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Capitulo 3

Brynna entreabriu os olhos ao ver uma figura emergindo do bosque. Como uma aparição surgida das chamas, ele chegou rodeado por uma névoa carmesim. Cavalgava sobre um enorme corcel de guerra também tingido de carmesim. Besta e homem pareciam um só, invencível, impregnando o ar com um poder viril. Outros homens montados o seguiam. Saíam das árvores como os trovões atrás de uma tormenta, estandartes de cor azul e dourada revoavam no frio. Mas Brynna não podia afastar o olhar do cavalheiro solitário. Cavalgava com tanto orgulho. Sem temor. As costas erguidas como uma flecha, o olhar levemente elevado como se pudesse vê-la parada ali, só, no parapeito, com seu cabelo de bronze formando redemoinhos sobre o rosto. À medida que se aproximava cada vez maior, Brynna notou que o carmesim que o cobria não era a névoa, mas uma larga capa. Caía sobre a malha metálica da armadura que envolvia seus largos ombros e as grossas dobras de lã se agitavam sobre as ancas do corcel. Um halo de confiança o rodeava, a julgar pelo modo como levava seu elmo sob o braço, enquanto guiava o cavalo com uma só mão.
Os homens do rei Eduardo já estavam cavalgando ao encontro das tropas que avançavam, com o rei em pessoa à frente. Brynna observou enquanto o normando dava a ordem de deter-se e esperava que as tropas do rei o alcançassem.
De repente, como se tivesse sentido os verdes e desafiantes olhos de Brynna lhe queimando a carne, o guerreiro ergueu o rosto e pousou seu olhar sobre ela.
Brynna cambaleou, dando um passo para trás.
Era ele! O homem do lago! O homem que ela tinha fantasiado em seus sonhos. Não, não podia ser. A cabeça de Brynna dava voltas. Esta era a besta que lutou contra seu pai e o venceu? Que seria seu marido? Levou uma mão trêmula à boca para afogar um grito. Tinha sonhado com ele tantas noites, desejando vê-lo. Não, certamente não era o mesmo homem. Esse rosto era severo. Aqueles olhos azuis, radiantes ao sol, agora eram tão frios como as pedras sob seus pés. O enorme poder de seu olhar a fez querer dar outro passo para trás. Lutou para controlar-se, enquanto seus sentidos eram alcançados pela beleza de seu rosto de linhas cinzeladas, seu nariz reto, esculpido em granito, e seus lábios grossos e apertados enquanto a estudavam. Era todo poder, puro e implacável sob seus cabelos negros. Mas algo tinha mudado. Já não era a criatura exuberante que a tinha cativado com sua alegria. Não havia rastros de felicidade em seu olhar de gelo. O vazio o preenchia, tão vasto e tão escuro como o mar sob um céu de veludo.
Brynna se envolveu em uma capa de coragem e o olhou direto nos olhos.
Ele a observou fixamente um momento antes de desviar o olhar.
“ Prefere lutar contra os saxões que casar-se com você”. As palavras soavam como um eco nos ouvidos de Brynna. O coração batia forte dentro de seu peito. O que tinha acontecido com a loira beleza do lago? A mulher que ele, evidentemente, amava? Era ela quem o tinha traído?
Forçando-se a recordar que esse era o selvagem normando que devia tomar posse de seu lar, expulsar seu pai e também a ela, Brynna desprezou as fantasias. Voltou-se e seu cabelo comprido açoitou o ar quando deu a volta para abandonar o parapeito. Avarloch significava mais para ela que qualquer sonho, e não deixaria que este homem a rechaçasse e permitisse que seu lar fosse destruído.
Brand levantou de novo o olhar, vislumbrando, por um instante, a espessa cabeleira castanha avermelhada ondulando sobre o corrimão. O cavalo do rei Eduardo tinha alcançado Brand e seus homens, e Eduardo seguiu seu olhar.
— A filha de Richard, Lady Brynna Dumont.
— É formosa — disse um homem à direita de Brand. Estava montado sobre um cavalo de guerra tão grande que, ao seu lado, o corcel do rei parecia um pônei.
— Um pouco pálida — respondeu Brand sucintamente.
— É possível que tenha congelado — disse Eduardo— Esteve ali em cima todo o dia, esperando sua chegada.
Brand girou seu estóico olhar para o rei.
—Talvez para me transpassar o coração com uma flecha.
Eduardo apertou os dedos, carregados de anéis, sobre seus arreios e olhou Brand, ressentidamente.
— Permita-me lhe assegurar, Lorde Brand, que Lady Brynna é inofensiva. Não guarda ressentimento por você, mas tem que acostumar-se a sua posição, como uma verdadeira dama de sua estirpe — O rei não queria uma confrontação com este homem. O duque William tinha sido muito claro em suas missivas: Lorde Brand Risande devia ser tratado com respeito. Eduardo amaldiçoou sua má sorte pela centésima vez, por permitir que um nobre normando lutasse contra Richard. Este patife estava muito perto de William. Com certeza, agora todos seus cuidadosos planos se estilhaçariam.
— Que posição seria essa?
O rei observou o homem montado no enorme cavalo de guerra junto a Brand.
— Quem se dirige a mim? — perguntou, com um altivo gesto de seu queixo.
—Sou Sir Dante Risande — dirigiu um breve olhar prateado a Brand — O irmão deste velhaco.
Eram dois! Pensou o rei Eduardo. Sua sorte não podia ser pior. Apertou a boca quando Dante teve a audácia de arquear as sobrancelhas, enquanto esperava uma resposta.
— Ela será a esposa de seu irmão.
— Como já disse, não preciso de uma esposa.
Eduardo se voltou para Brand.
— E como eu já disse, os nobres saxões considerarão uma ofensa se simplesmente jogar Lady Brynna à beira do caminho...
— E não consideram uma ofensa que você tenha conspirado para matar seu pai? — perguntou Brand, enquanto elevava uma sobrancelha, curiosa sobre o ombro do rei.
A moça dirigia-se para eles, com passos largos e decididos, enquanto sua capa de lã flutuava a suas costas. O rosto, decidido; os olhos, fixos em Brand como duas gemas em chamas.
— Parece a ponto de me assassinar — disse Brand, com um leve sorriso curvando a comissura de sua boca. Largas ondas de cobre dançavam ao redor do rosto daquela jovem e caíam em cascata sobre seu peito. Suas bochechas avermelhadas pelo vento conferiam um brilho atraente ao fulgor verde de seus olhos. O olhar de Brand se deslocou lentamente para as pernas bem formadas e as fortes coxas que caminhavam para ele, e mais acima, à fina cintura, acentuada por um grosso cinto que prendia uma túnica cor de oliva.
— Estranha vestimenta para uma dama — comentou ele.
Aguardando ansiosamente a confrontação que sabia estar a ponto de começar, Brand relaxou e respondeu ao desafiante olhar da mulher, com um olhar divertido.
O rei voltou-se no momento em que Brynna os alcançou. Estava a ponto de anunciá-la, quando ela o interrompeu.
— Sou Lady Brynnafar Dumont — olhou para o escuro lorde, e depois ao estandarte azul que ondulava atrás dele. O leão dourado logo substituiria o emblema de seu pai nos salões de Avarloch. Levantou o queixo, desafiando a cada um dos normandos ali presentes — Dou as boas vindas a você e a sua comitiva ao castelo de Avarloch, meu lar. — Brynna esperou. Não houve resposta, só uma expressão levemente divertida. Teria gostado de apagar aquele ar de troça com uma bofetada, se conseguisse alcançar seu rosto.
Brand a observou durante um longo momento, sem dizer uma palavra, até que Brynna começou a sentir-se incomodada, sob seu olhar examinador. Dante sacudiu a cabeça, sentindo lástima pela mulher. Reconheceu a expressão de seu irmão. Curioso e paciente, Brand estava a ponto de acabar com ela, da mesma maneira que o fazia no campo de batalha. Era um olhar calculado, como um tigre que avalia sua presa antes de atacar, só que os olhos de Brand faziam com que sua vítima acreditasse que era a caça em lugar de um predador.
Brand saltou de seu corcel, com a mesma facilidade que uma pena caindo de uma asa. Sua capa se abriu ao redor de suas pernas quando aterrissou graciosamente há apenas alguns centímetros de Brynna. Diabos, era formosa, teve que admitir. Ser duro com ela seria difícil, mas não tinha alternativa.
Tomá-la como esposa desgraçaria a ambos. Inclinou-se de maneira educada, e a percorreu com um olhar gélido, antes de tomar sua delicada mão e levar aos lábios.
— Sou Lorde Brand Risande de Dover, senhor do castelo Graycliff.
Sua voz era uma carícia rouca. Ela não estava segura se o calor em suas bochechas era resultado do deslizar da boca sobre seus dedos ou a sutil e sensual inflexão normando-francesa de sua pronúncia. Com um simples gesto de seus lábios, fez com que ela esquecesse sua raiva, fez com que recordasse a alegria que tinha visto em seu rosto, certa vez. Encontrou-se desejando aproximar-se e tocá-lo, para convencer-se de que era real. Sob uma cortina de cílios negros, seus olhos azul-esverdeados a cativavam, enquanto lhe beijava a mão.
— Meus homens estão ao seu dispor, mademoiselle...
Apanhada na armadilha da ternura e do sorriso sedutor que lhe oferecia, Brynna pestanejou e mordeu o lábio inferior. Não podia permitir-se esquecer por que ele estava ali.
— Meu senhor, eu...
— Para ajudá-la a empacotar suas coisas. — A determinação de suas palavras e o tom desapaixonado com que as pronunciou caiu sobre ela como uma pedra. Soltou sua mão com uma ternura controlada e deu a volta para procurar as rédeas de seu cavalo, ignorando o assombro que via nos olhos dela. Brand, por sua vez, dirigiu um olhar furioso ao rei Eduardo, depois olhou sobre seu ombro à filha de Dumont, desafiando-a — Se necessitar de uma escolta para onde quiser, será um prazer oferecer meus melhores homens.
Como se estivesse contendo o fôlego enquanto seu irmão falava, Dante soltou um forte suspiro, seguido de algumas expressões confusas em francês, enquanto Brand guiava seu cavalo para o castelo. Ninguém voltou a pronunciar uma palavra, até o rei ficou boquiaberto.
Brynna deu a volta para vê-lo afastar-se. Queria ir atrás dele, rogar que mudasse de idéia, para evitar uma batalha por Avarloch. Mas assaltada por uma obstinada onda de orgulho, apertou os dentes. Como pôde ser tão tola de cair sob seu feitiço? Era tão fraca de espírito que somente um olhar deste homem podia sacudi-la até os ossos? Piscou, para evitar tornar a chorar e começar a blasfemar, e olhou para o outro bruto, cujo sombrio olhar cinzento pousava sobre ela. Deu a volta e cravou os olhos em Sir Luis, sentado em seu cavalo, junto ao rei. Seu amplo sorriso malicioso só atiçou a fúria de Brynna, que mordeu a língua para controlar seu temperamento. Deixou-os e se encaminhou ao jardim.
Enquanto sentia a fúria daquela jovem ainda sacudindo o ar, Dante ergueu o olhar e capturou o sorriso zombador de Sir Luis. Dante tinha visto o mesmo apetite nos olhos de Sir Alexander, quando o traidor olhava para Colette, a rameira que tinha traído seu irmão. Mas já que esta mulher partiria na manhã seguinte, não importava. De todas as maneiras, os olhos de Dante eram como aço fundido quando Luis finalmente o olhou. O irmão mais novo de Brand cravou as esporas em seu cavalo e o seguiu ao seu novo lar.
Brynna caminhou até que lhe doeram as pernas, quando chegou ao jardim, caiu de joelhos sobre a grama fria.
Que tipo de homem era Brand Risande que podia expulsá-la de seu lar, sem o menor remorso? Como podia ser tão terno, como se estivesse acariciando a bochecha de um bebê recém-nascido, e depois golpear com o cálculo letal de uma serpente?
— Ai, mãe... — sussurrou, e fechou os olhos para ver o rosto de Lady Tanith — Ele é o homem do lago com o qual sonhei, e o selvagem com o coração de pedra que odiei durante as últimas duas semanas. Como posso lutar contra ele? Se me obrigar a partir, haverá derramamento de sangue aqui. O que devo fazer?
Brynna abriu os olhos ao escutar a um pássaro, cantando no alto. Olhou ao redor do jardim e secou as lágrimas. Viu sua mãe plantando suas preciosas sementes, escolhendo amorosamente violetas aromáticas e romeiro para condimentar o jantar de seu marido. Viu-se quando era menina, rindo da maneira como sua mãe acariciava a mandíbula de seu marido, quando ele vinha ao jardim para levá-las para casa. Recordou sua doce risada, e soube o que tinha que fazer. Devia guardar a raiva que sentia pelo normando, como sua mãe tinha guardado seu ressentimento, quando se casou com Lorde Richard.
Mas poderia perdoar Brand por invadir seu lar? Ele tinha derrotado seu pai, mas não o tinha matado. Pela fúria de Deus, tinha que haver algo bom nele. Brynna se perguntou o que teria acontecido durante o ano que passou. Como podiam ser tão arrebatadores seus olhos e ao mesmo tempo tão frios, tão despojados de emoção? Não podia ser o mesmo homem que tinha produzido uma tempestade em seu íntimo, quando o viu no lago. Como podia chegar a ele? Sabia o que tinha que fazer. Não podia abandonar Avarloch.

 

 

 

 

 

Capítulo 4

Brand entrou no castelo de Avarloch com a mesma arrogância, poder e autoridade de alguém que tivesse vivido ali toda sua vida. Os vassalos saltaram quando o viam, as donzelas escapuliram pelos corredores pouco iluminados, como roedores fugindo da sombra de um falcão que sobrevoava o lugar. As botas de Brand golpeavam o piso, produzindo um eco que percorria os largos corredores. Avarloch estava bem cuidado. Cada terrina de bronze, cada candelabro dourado brilhava como ouro fino. Havia flores recém-cortadas, dispostas meticulosamente em todos os lugares.
Ela.
Brand estudou as paredes, ricamente adornadas com tapeçarias que ilustravam batalhas entre homens que ele não reconhecia, vestidos com armaduras rudimentares.
— Os celtas lutaram com valentia por sua terra.
Brand olhou sobre seu ombro. Lorde Richard estava parado a alguns metros de distância, observando-o.
— Pensei que já tinha partido — respondeu Brand, secamente, e deu a volta para continuar apreciando as tapeçarias.
— Também eu. Mas o duque William solicitou que ficasse até sua chegada.
Brand ofereceu um sorriso frio às tapeçarias.
— Então William está à caminho? Sem dúvida, vem encontrar com Eduardo para pôr em prática seu plano de me casar com sua filha.
— Conheceu-a?
Suspirando, Brand se voltou para olhar o homem que tinha conquistado na batalha. Não eram inimigos. Enfrentar um guerreiro no campo de batalha era muito diferente de encontrar com o rival em sua própria casa. Brand apertou os dentes, ante seu sentimento de simpatia por Lorde Richard.
— Ela é formosa, Lorde Richard, mas não tenho nenhum desejo de me casar. -Brand observou o cavalheiro mais velho, com curiosidade. Ali, em seu próprio ambiente, vestido com uma túnica singela e um casaco, com seu cabelo escuro e sua barba bem raspada, o famoso Lorde Richard parecia menos selvagem. Era simplesmente um pai preocupado pelo bem-estar de sua filha. — Não desejo uma esposa — repetiu Brand, em voz baixa.
Lorde Richard Dumont sentiu-se surpreso pela natureza gentil deste guerreiro. Nunca, em todos seus anos de batalha, encontrou alguém tão hábil, desumano, poderoso, e, entretanto, ali estava, respeitoso em sua intenção de não ofender o mesmo homem cujo sangue tinha sido enviado para derramar, somente umas semanas antes.
O olhar de Richard deslizou do ombro de Brand para a elaborada tapeçaria que cobria a parede oeste por completo.
— O povo de minha esposa — assinalou, sorrindo, como se pudesse vê-la
— Quando vim pela primeira vez, Tanith me odiava, embora eu não tivesse a ver, diretamente, com o massacre dos celtas. Eu era um saxão e isso era suficiente.
— Foi forçado a casar-se com uma celta? — perguntou Brand com incredulidade.
O pai de Brynna riu, brandamente.
— Forçado? Não, eu a amei desde o primeiro momento em que a vi, era uma chama imponente, que ardia dentro de minha alma. Era apaixonada até em sua fúria, e quando, por fim, ganhei seu amor, acreditei que sua paixão me consumiria.
Brand escutou, em silêncio, compreendendo o que significava amar outra pessoa tão completamente. Mas também conhecia a tortura do amor traído. Moveu-se incômodo, passando a mão pelos negros cabelos. Não queria recordar o amor, nem queria escutar falar dele. Se Lorde Richard estava tentando convencê-lo de que sua filha poderia, algum dia, perdoar o fato de ser um soldado normando e chegar a amá-lo, então estava desperdiçando suas palavras. Brand precisava dizer, antes que prosseguisse.
— Sir Richard, não desejo que sua filha sofra. Tem minha palavra de que pode ficar aqui, até que encontre um marido, mas esse marido não serei eu.
Richard fez uma leve reverência.
— Respeito seu desejo de permanecer solteiro, Lorde Brand. Não voltarei a lhe pedir que se case com minha filha. Sabe, a esta altura, que haverá luta aqui. Isso romperá o coração da minha filha. Brynnafar ama Avarloch intensamente.
Com o cenho franzido, Brand encontrou o olhar firme de Richard. Diabos, não lhe importavam as batalhas, mas como podia forçar uma jovem a abandonar o único lar que tinha conhecido?
— Este assunto será discutido mais tarde com o rei — Brand disse bruscamente e em dois largos passos, chegou à estreita escada. Deteve-se, de repente, e apoiou uma bota no primeiro degrau. Mortificado pela memória do rosto de Richard enquanto falava de sua esposa, levado por uma espécie de curiosidade mórbida, talvez para aliviar a dor de seu próprio coração, deu a volta para olhar o cavalheiro mais velho, uma vez mais.
— Diga-me, Sir Richard, o amor de sua esposa ainda o consome?
Somente Dante, ao entrar no castelo, percebeu o tom lúgubre que rodeava a pergunta de Brand, só ele reconhecia a dor escondida no escuro olhar de seu irmão.
— Assim é — Richard assentiu — Até da tumba.
— A tumba? — os olhos de Brand se arregalaram, a surpresa e uma tortura mais profunda se viam, claramente, em seu rosto.
—Tanith morreu enquanto viajava para o sul, há três verões — disse, enquanto seu olhar se dirigia para as enormes tapeçarias penduradas nas paredes — Mas seu fogo ainda arde dentro de mim. E arde em Brynna também — lentamente voltou seu olhar a Brand — Minha filha leva no sangue o orgulho de seu pai e a paixão de sua mãe. Só um homem com um grande controle e uma vontade de ferro poderia resistir a ela. Por este homem sinto compaixão, porque nunca se verá inundado pelo calor de um beijo quando ela sorrir. Nem sentirá a promessa da primavera liberada logo depois de um longo e duro inverno quando ela pousar o olhar em seu rosto.
O silêncio tomou conta dos três homens, como o véu de uma densa neblina. Tão abruptamente como um raio atravessando as nuvens, Brand abandonou o salão deixando o eco vazio das palavras de Lorde Richard. A raiva e o remorso o invadiram, enquanto subia as escadas. Sentia pena pelo anterior lorde do castelo de Avarloch, que tinha perdido tal amor, mas não queria saber nada dessas ilusões. Porque não importava quão doces fossem, eram só isso, ilusões.
Seus pensamentos voltaram-se para Colette e o dia em que a encontrou no arvoredo, não muito longe do castelo de Graycliff. A cabeleira derramada sobre suas costas, um manto que cobria sua nudez. Ela esperava, com os braços modestamente cruzados sobre seus seios, o homem que se aproximava por atrás. Por que não podia ter sido outro homem, em lugar de seu amigo Alexander, que se inclinou para lamber o doce ombro de Colette. Talvez se tivesse sido um estranho fazendo amor com ela, o frio que tocou o seu coração não teria gelado sua alma.
— Malditos sejam os dois — grunhiu Brand, enquanto subia os degraus. Tudo o que conhecia sobre a confiança e a lealdade foi arrebatado nesse dia, deixando um vazio. Talvez nunca voltasse a confiar em ninguém.
Subiu os últimos três degraus de uma vez, avançou dando grandes passos. As tochas dançavam, enquanto passava pelas fileiras de portas de ambos os lados do corredor. Também havia flores no segundo piso, e o sangue de Brand fervia em suas veias, quando as olhava. Colette tinha decorado o castelo de Graycliff com flores frescas, impregnando o ar com aroma de rosas e gardênias.
Por que o tinha traído? Tinha se perguntado milhares de vezes, mas nunca achava uma resposta. Não lhe tinha dado tudo? E mesmo assim, teria dado mais. Tudo... Tudo o que quisesse. Mas ela queria Alexander. Deu voltas em círculos, como se estivesse preso em um lugar muito pequeno para abrigar sua incontrolável fúria e tortura.
— Qual destas endemoninhadas portas tenho que abrir?! — gritou às portas que o rodeavam.
— Senhor?
A jovem estava parada na escada, com as costas contra a parede e as mãos trêmulas sobre o coração. Esse cavalheiro escuro era terrível em sua ira, furioso e tão impenetrável como as muralhas que rodeavam o castelo. Ele apertou as mãos, quando se voltou para enfrentá-la, sua capa flutuando ao redor de suas botas de couro.
— Desculpe-me por não tê-lo levado diretamente aos seus aposentos. Eu...
— Está bem — Brand levantou a mão para acalmá-la —, não estou zangado contigo. — Tratou de sorrir, tentando aliviar o temor que se desenhava nos enormes olhos negros da moça — Como se chama?
— Alysia. Eu... eu sou uma das donzelas de Lady Brynna. — Com precaução, Alysia estudou seu sorriso. Apenas uns instantes atrás, parecia a ponto de derrubar as paredes com seus punhos. Aonde teriam ido todas essas emoções? Tinha visto sua fúria mesclada com pena tão profunda e tão rudemente contida, que a tinha atemorizado. Agora usava uma máscara, uma máscara que a estremecia de prazer. Quando ele inclinou a cabeça e olhou-a, com curiosidade, ela ruborizou ao ser surpreendida, enquanto o examinava.
— Você é o novo senhor de Avarloch, não é assim? — perguntou com sutileza, sem mover-se de seu lugar contra a parede.
— Oui, senhora.
Alysia sorriu diante do título que ele, tão graciosamente, lhe conferia. Sorriu timidamente em princípio, depois mais e mais, à medida que os lábios dele refletiam os dela, em um amplo sorriso. Tão radiante era seu sorriso que a donzela quase tropeçou ao subir outro degrau.
— Deseja o aposento do amo, meu senhor?
Brand estava a ponto de declinar o oferecimento, quando seu irmão chegou correndo pelas escadas e o chamou.
Dante deteve o passo, assim que viu a bela jovem de cabelos negros. O que ia dizer a seu irmão escapou, ao ver os enormes olhos assombrados da donzela. Era um homem grande e teve que inclinar o corpo contra o de Alysia para passar ao seu lado, no estreito corredor. De sua posição, Brand não podia ver o rosto de seu irmão, mas a expressão aturdida e assombrada de Alysia lhe disse que se Dante não se estivesse apertando, com tanta firmeza contra seu corpo, ela teria caído, derretida, pelas escadas.
Ele tinha razão. Os músculos de Alysia afrouxaram. Esse estranho cavalheiro tinha que ser o homem com o físico mais forte que já tinha visto, e o mais belo. Tinha o cabelo de um tom tão negro como o de seu irmão, mas mais largo e sem cachos. Seus olhos eram de um hipnótico matiz cinzento, impregnados de luzes verdes. Os músculos eram firmes e quentes em seu contato com ela. Afastou-se, dando um passo para o lado. Em algum lugar de sua mente, Alysia escutou Brand apresentar ao homem como seu irmão.
— Encantado — seu lento sorriso malicioso e as ternas covinhas que produziu, fizeram com que o pulso de Alysia se elevasse em um ritmo desigual.
— Queria me dizer algo, Dante? —perguntou Brand, começando a impacientar-se, enquanto o olhar cativado de seu irmão permanecia na juba negra que caía sobre os ombros de Alysia.
— Desculpe?
— Quase faz cair Lady Alysia em sua pressa por me dizer algo. Do que se trata?
Dante deu a volta para olhar seu irmão; por uns momentos despertou de seu transe.
— O duque William está aqui. Acaba de passar a muralha exterior do castelo.
Dante não estava seguro se a resposta de Brand era a correta. Seus olhos se voltaram, novamente, para Alysia como se tivessem vida própria.
Brand passou ao lado deles e esteve a ponto de dizer a Dante que o seguisse, mas notou que seu irmão e a donzela sorriam, mutuamente.
— Talvez tenha vindo por nossas cabeças — disse Brand, antes de descer as escadas. Sorriu ao ver Dante assentir com alegria.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Capítulo 5

O duque William da Normandia estava agitado. Passeava pelo salão com um ar dominador, seus olhos não se detinham, catalogando o que via. Para os criados do castelo de Avarloch, ele era uma visão certamente terrível. O ar ao seu redor estava carregado, e revelava seu poder e supremacia sobre todas as pessoas do castelo, inclusive sobre o rei, que estava sentado em silêncio, perto da enorme lareira e o observava, enquanto seu pé golpeava, nervosamente, o piso.
Vestido com uma pesada armadura sobre uma espessa túnica e calças de lã, os músculos do duque estavam tensos. Sua larga juba de cabelos castanhos caía, desordenada, sobre os ombros maciços e emolduravam suas espessas sobrancelhas e barbada mandíbula. Não ostentava anéis nos dedos, embora fosse tão rico como um rei. Sua riqueza se notava no fino couro de suas botas e na grosa pele que forrava sua capa, cuidadosamente colocada sobre o respaldo da cadeira.
— William — Brand o chamou da escada. Com a graça casual de alguém que tinha todo o dia para chegar aonde queria, desceu outro degrau.
Os escuros olhos cinzentos que se voltaram para avaliar Brand eram imutáveis, severos e desumanos. Então, se enrugaram nos cantos, quando o duque da Normandia sorriu ao seu amigo mais querido.
— O que faz aqui? — perguntou Brand com suspeita, voltando-se para olhar o duque, com um gesto agudo.
— É assim que me recebe em seu novo lar, Brand?
O sorriso de William se ampliou e levantou seu forte braço ao encontrar-se com Brand, ao pé da escada.
— Nem sequer um "teve uma boa viagem, meu senhor?" — dois braços, fortes como troncos, rodearam o jovem cavalheiro quando William bateu nas costas de seu ex-escudeiro, como uma saudação — Eu sabia, nunca devia ter permitido que vivesse na Inglaterra durante tanto tempo. Suas maneiras são atrozes.
Brand sorriu. Era bom ver seu amigo, embora suas suspeitas sobre o propósito da visita do duque fossem corretas.
— Teve uma boa viagem, meu senhor? — concedeu graciosamente.
— Agh, foi terrível! O mar estava enfurecido e perdi um cavalo no caminho — grunhiu William, e sua expressão se iluminou — Mas valeu a pena ver este esplêndido país de novo — dirigiu seus olhos afiados como navalhas para Eduardo — Algum dia, quando for coroado rei da Inglaterra, tudo isto será meu. Você não pode viver para sempre, primo — adicionou com um sorriso.
— Não tenho nenhum desejo de viver para sempre, William — respondeu Eduardo, secamente — Mas no que se refere a ser coroado logo depois de minha partida, esse é um assunto que terá que discutir com Harold de Wessex.
— É minha intenção fazer isso. – os olhos do duque normando brilharam com o apetite de um guerreiro selvagem, entusiasmado pela batalha. Promessas mortais e implícitas impregnaram o ar e Eduardo se contorceu em seu assento; conhecia muito bem seu primo.
Voltou sua atenção para Brand.
— Então, por que não matou Richard?
A pergunta era direta e Brand não estava preparado para ela, mas não se alterou sob o exame controlado de William.
— Sua morte não era parte do decreto.
— As testemunhas do decreto não concordariam com você, Lorde Brand —disse Eduardo de maneira benigna — Como sempre, você não fez o que foi ordenado, e tomou a decisão de deixar com vida Richard, por sua conta.
— Isso é correto — o sorriso que adornou os lábios de Brand era tão encantador e tão perfeito em sua sinceridade, que o rei Eduardo quase sorriu, também. Brand deixou que sua suave expressão se desvanecesse antes de atacar —. Lorde Richard Dumont se levanta desafiante contra um rei que não pode governar seu próprio país e deixa que alguém o faça. Eu o respeito. Ele não é fraco como você. Por que, então, deveria matá-lo?
Os olhos de Eduardo se cravaram em Brand com desprezo.
— Agora foi muito longe. Eu...
— Ele tem razão, Eduardo, e você sabe — interrompeu William sem incomodar-se em ocultar seu sorriso — Harold governa a Inglaterra. Fala por você como se sua mão fosse um acessório permanente em seu traseiro. Pessoalmente, eu gosto de lutar contra os saxões. Só estou aqui porque sei os incorrigíveis tolos que são vocês, os saxões, e não quero que o que aconteceu com Richard aconteça também com Brand.
Antes que Eduardo pudesse recuperar-se, William pousou seu severo olhar outra vez em Brand.
— Respeite ou não Richard, acha que foi sábio poupar sua vida?
—Eu estava no campo de batalha. Era minha decisão.
O tom áspero de Brand fez William perceber que, apesar do sorriso que ainda mantinha nos lábios, seu amigo não toleraria ser questionado. Nem sequer pelo duque normando.
William riu, o som percorreu os corredores como uma canção robusta. Brand era o único homem que ele conhecia que não fugia com o rabo entre as pernas, ao ser confrontado. E William não queria que fosse de outra maneira.
— Muito bem — disse com um rápido gesto de sua mão robusta —, Na verdade, me alegro que Richard siga com vida. Lutou muitas batalhas com coragem e grande destreza, e por isso pedi que ficasse aqui.
— Seu pedido me pôs em uma posição extremamente incômoda — disse Brand, inflexível.
— Decidi correr esse risco — William lançou um sorriso sigiloso e se sentou em uma cadeira de encosto alto, junto ao rei — Mas não discutiremos isso agora — olhou ao redor do grande salão — Acaso não há cerveja neste lugar?
Brand se voltou para um dos criados, e o homem saiu correndo do salão.
Com um sorriso de satisfação, o duque William assentiu com a cabeça:
— Oui. O verdadeiro amo desta casa não precisa pronunciar nenhuma palavra.
Brand tomou assento frente a William e afundou no espesso acolchoado de brocado.
— Que bom ver você, William. Os amigos confiáveis não são fáceis de achar — olhou o duque longa e pensativamente — Sei por que está aqui.
— Fui convocado — disse William secamente e olhou Brand e ao rei— Retire a seus criados, Brand, devemos falar em particular. — antes que este pudesse levantar uma mão, os poucos criados que restavam, sumiram em todas as direções.
— Sua Majestade? — o duque William empregou o título de Eduardo, com moderado respeito— Desejo falar com meu amigo a sós — sorriu.
— S'IL vous plait.
Os olhos de Eduardo arregalaram-se, ao revelar sua surpresa por ser dispensado como se fosse um criado, e não o rei da Inglaterra. Mas sem uma palavra, ele também abandonou o salão.
Quando ficaram a sós, William se inclinou para frente na cadeira. Seu sorriso estava carregado de veneno.
— Tenho muita admiração por você, Brand, mas se ousar me desafiar assim. Quando for rei, cortarei sua cabeça. — O duque tinha sentido falta de seu sorriso genuíno e lhe deu prazer vê-lo de novo — Como está, mon ami? — perguntou-lhe William, com mais seriedade.
— Estou bem — Brand esticou suas longas pernas para frente e cruzou os braços sobre o peito.
Frente a ele, olhos cinzentos se entrecerraram, como espadas finamente polidas.
— O cavalheirismo requer honestidade, Brand. Não recorda bem.
Voltando o rosto para o fogo da lareira, Brand estudou as chamas pensativamente. Depois de um bom momento, piscou e o fogo refletiu seu olhar turquesa. Não tinha falado de Colette desde que a tinha banido, mas William conhecia seu coração. Quando Brand abriu a boca, as palavras saíram quentes de sua língua.
— Ela era toda minha vida, William — disse brandamente — íamos casar na primavera. Espera que esqueça tão rápido o que me fez?
— Je sais. Sei — o poderoso duque suspirou —, mas essa parte de sua vida terminou Brand. É tempo de curar-se.
O criado retornou com uma bandeja carregada de frutas e queijos, e duas taças de cerveja. Deu-lhes os copos e colocou a bandeja em uma pequena mesa de madeira, localizada frente a eles, depois fez uma reverência e abandonou o salão, antes que Brand pudesse agradecer.
Quando o criado dobrou o corredor, quase chocou-se com Brynna. Ela franziu o cenho e levou um dedo aos lábios, para que ele não revelasse sua presença; fez um gesto para que se retirasse. Já tinha escutado quase toda a conversa e não tinha intenções de sair. Apoiou a bochecha na parede fria e voltou a prestar atenção.
— Para curar-me quer dizer que devo me casar com Lady Brynna Dumont? —perguntou Brand, pousando um olhar em seu amigo e confirmando suas suspeitas.
— Neste momento é o que deve fazer — respondeu com gentileza.
— Não posso.
— E por que não? Colette se foi.
— Sei! — gritou — Acha que quero que volte, depois do que fez?
— Quer? —William levantou uma sobrancelha escura.
— Non — Brand sacudiu a cabeça — Oui. Non.
— Parece um normando muito decidido... — resmungou e mordiscou uma maçã.
— Não quero que volte.
William ignorou o negro olhar de Brand porque compreendia a profundidade da dor de seu amigo, mas ele estava ali para evitar que os saxões ficassem contra Brand. E isso era exatamente o que aconteceria se rechaçasse a dama. De todos os modos, falou de maneira gentil, deixando que sua preocupação por seu cavalheiro preferido fosse percebida.
— Se não querer que Colette retorne então o que te impede de casar com a mulher saxã?
— Simplesmente não quero me casar com ela.
— Por quê? — insistiu.
As chamas chisparam e refletiram longas sombras sobre as paredes, quando Brand ficou de pé. Caminhou de um lado para outro do grande salão passando os dedos por seus cachos negros.
— Nunca poderia amá-la.
— O amor não tem nada a ver com isto. Até ela sabe — William respondeu simplesmente e lançou o resto da maçã às chamas.
— Eu não... — Brand se deteve e fechou os olhos. O silêncio se aprofundou; a única coisa que se escutava era o chiado do fogo, devorando os restos da fruta.
— Não quer que voltem a te ferir — William terminou a frase por ele. Brand abriu os olhos para esquadrinhar o olhar de seu amigo, à luz tênue da lareira.
— Não voltarão a me ferir — corrigiu mordaz.
Os velhos pisos de madeira rangeram do outro lado da parede e a cabeça de William se ergueu, de repente, como a de um lobo. Farejou o ar um momento, depois levantou um dedo para silenciar Brand.
— O Conselho dos witan informou ao rei que queimarão o castelo de Avarloch se rechaçar à moça — William piscou os olhos, quando Brand o olhou perplexo.
Os dois homens escutaram o forte suspiro atrás da parede. Brand se encaminhou para o som, para ver quem estava escutando, mas William, que já suspeitava de quem se tratava, levantou-se da cadeira e o deteve.
— Querem uma resposta, Brand. Terão que queimar Avarloch?
— Não! — Brynna abandonou seu esconderijo do outro lado da parede e em sua pressa, caiu diretamente nos braços surpresos de Brand. — Não, por favor! — rogou, seus olhos inundados de lágrimas brilhavam como esmeraldas na água do mar — Não exigirei nada, juro, meu senhor. Faça-me sua esposa e prometo lhe dar herdeiros e não me queixar jamais. Submeterei-me a sua vontade, farei o que disser. Não permita que queimem Avarloch, suplico. É meu lar!
Brand queria zangar-se com Brynna por escutar sua conversa particular. Mas não podia, não com o rosto dela tão perto do dele, seu lábio inferior suave e trêmulo, sua espessa cabeleira acobreada derramando-se entre seus dedos, as bochechas aveludadas empapadas de lágrimas. Pelo amor de Deus, tinha um rosto formoso, uma boca sensual, era uma flecha do Cupido tentando-o, com pensamentos pouco castos sobre o que gostaria de lhe fazer. O olhar de Brand percorreu o rosto triste. Os olhos de Brynna brilhavam com temor, procurando sua piedade. Mas havia também fortaleza nessas gemas verdes, fortaleza e vida que acenderam uma minúscula faísca e enfraqueceram o sangue de Brand. Seu aroma também era maravilhoso, a suavidade de sua pele... Diabos, quase tinha esquecido como podia ser suave uma mulher.
— Senhora, eu...
— Como ousa nos espionar, como uma rameira qualquer! — a voz de William golpeou o ar como um trovão, penetrando nos ouvidos de Brynna como nenhuma outra voz tinha feito antes. Ele ficou muito satisfeito ao comprovar que tinha obtido o efeito desejado. A dama desapareceu no peito de Brand, agarrada a ele.
—Quem é você? — rugiu William — Exijo saber de quem é a cabeça que cortarei com as primeiras luzes do dia!
Brynna não podia olhá-lo, não o tinha visto até agora por ter tropeçado com Brand, mas estava certa de que se tratava de um monstro. Manteve o rosto apertado no peito forte de Brand, tremendo em seus braços.
— Responda-me!
Não podia. Para falar a verdade, se ele não a estivesse segurando tão fortemente, teria caído no chão.
— Já é suficiente, William! Está morta de medo — a brusca ordem ecoou no salão. Brynna percebeu a força na voz de Brand, sentiu o poder de seus braços enquanto apertavam seu corpo e se perguntou se Brand era idiota, falando nesse tom a este... Este bárbaro.
— E deve estar — bufou o tosco normando, muito satisfeito de si mesmo agora que tinha Brand protegendo-a — Se ela estivesse na Normandia neste momento, seria açoitada até cair quase morta, por cometer semelhante traição.
— Não está na Normandia — o fôlego quente de Brand soprou os cachos junto ao ouvido de Brynna.
— Non, mas isso resolveria todos seus problemas, não é verdade? —William perguntou, com uma faísca em seus olhos cinzentos e um sorriso brilhante e vitorioso nos lábios — Mate.a e informaremos ao Conselho dos witan que preferiu tirar a própria vida, antes de casar-se com um porco normando.
— Já basta William — advertiu Brand —, Já brincou com ela o suficiente.
— Brincou? Brynna escutou a palavra, mas pensou que estava sonhando. Ninguém podia ser tão cruel. Agarrou a capa de Brand com os dedos.
— Senhora? — a voz de Brand era como seda ao afastá-la lentamente de seu peito e olhar seu rosto —. Está bem. Não lhe fará mal — Brynna levantou o olhar para ele. Uma terna preocupação enchia o olhar azul de Brand. Preocupação mesclada com... Diversão.
— É verdade que os saxões queimarão Avarloch se não me desposar? —Brynna perguntou com delicadeza, apesar que a compreensão e a fúria a invadiam.
Perdido em seus formosos olhos verdes Brand, literalmente, teve que arrancar seu olhar dela para lançar um olhar severo a William. Brynna captou o gesto que trocaram, e seu sangue começou a ferver. O duque riu. Ela se voltou para ele com lentidão, sem importar-se quão temível pudesse ser. Seus olhos eram como dois vulcões em erupção. Com lábios firmes e dentes apertados, afastou-se de Brand e fechou os punhos, para golpear à robusta besta a sua direita.
— Podre monte de baba do demônio! — uivou, aproximando-se de William.
Atrás dela, os olhos de Brand arregalaram-se e rapidamente conteve a vontade de rir.
O duque da Normandia era muito maior que ela, mas Brynna levantou a face para ele, sem temor.
— Como se atreve a brincar de maneira tão frívola sobre meu lar? Se eu fosse homem, mataria você aqui mesmo, gigante covarde! Mas a morte seria muito boa para você. Minha espada o faria sofrer, até que implorasse misericórdia, então cortaria essa garganta miserável de uma orelha a outra e meu sorriso seria a última coisa recordaria sua alma maligna em sua descida ao inferno!
William voltou seu olhar surpreso para Brand, cujo rosto refletia a mesma expressão divertida e de admiração.
— Por Deus, tem que se casar com ela, Brand! — exclamou William.
Como se, de repente, lembrasse de Brand, Brynna voltou-se para enfrentá-lo com tanto desprezo e veneno quanto o que acabava de verter sobre William.
— E você! Certamente, meu lar não significa nada para você. Quando me rechaçar e os nobres enviarem seus soldados para atacar, espero que você seja o primeiro a morrer. — Voltou-se novamente, e Brand sentiu o fresco aroma de jasmins de seu cabelo, quando as espessas mechas golpearam seu rosto. As narinas se moveram, imperceptivelmente, absorvendo seu aroma quando ela saiu indignada do salão.
Quando ficaram a sós, Brand lançou um ardiloso olhar de regozijo a William.
— É um bastardo.
William assentiu e voltou a sentar-se.
— Oui. Isso dizem. Embora, na verdade, acredito que meu pai amava minha mãe camponesa. — Olhando fixamente na direção que Brynna tomou, a voz de William se suavizou e tornou-se um rouco ronrono —. Se minha mãe tivesse uma faísca do fogo que possui a filha de Richard, não o culpo. — Olhando na mesma direção, Brand concordou com ele, mas não disse nada. — Que temperamento! — continuou William. Voltou-se para Brand — Este lugar significa mais para ela que sua própria vida.
Brand assentiu lentamente, sabendo que William tinha razão.
— Como posso obrigá-la a abandoná-lo?
— Não pode! Deve se casar com ela. Ordeno-lhe isso. Ainda responde ante mim, embora eu te permita esquecê-lo, às vezes. – gabou-se William quando pareceu que Brand podia protestar pela ordem ou rir dela — Além disso, não deixarei que morra nas mãos dos saxões. Prefiro que viva, e tenho o pressentimento de que essa mulher pode recordar-lhe o que significa viver.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Capítulo 6

Brynna subiu correndo as escadas até seu quarto. As chamas das velas dançaram, conforme passava. Bárbaros! Pensava furiosa. Todos eles! Tratá-la com tanta desconsideração... Não era suficiente que o Conselho ameaçasse começar uma batalha ali? Sugerir que o witan seria capaz de queimar Avarloch era imperdoável. Para Lorde Brand não importava Avarloch. Era só outra conquista o prêmio por vencer seu pai. Odiava-o, odiava a todos, em especial ao peludo amigo do cavalheiro. Que tipo de homem brincaria sobre cortar a cabeça de uma mulher? Ante essa idéia, Brynna levou os dedos à garganta e engoliu em seco. E, entretanto...
A lembrança da voz grave de Brand a inundou, antes de terminar seu pensamento. Lorde Brand Risande a tinha defendido, não é? Havia se sentido protegida em seus poderosos braços. Não! Tinha que recordar que era ele quem a obrigaria a partir com as primeiras luzes do dia. Não lhe importava se ela vivia ou morria. Protegê-la? Brynna riu, amargamente. Ele seria o primeiro a lançá-la aos lobos.
Fechou a porta de sua antecâmara, com um golpe. Desenganchou o broche de esmeraldas, lançou a capa ao outro lado do quarto e se jogou na cama. Odiava-o. Sacudiu a cabeça ante a lembrança da risada de Lady Tanith no jardim. É obvio, sua mãe tinha encontrado bondade em Lorde Richard e tinha chegado a amá-lo. O pai de Brynna era um homem amável, honrado. Justamente o contrário do desgraçado sem coração que se achava lá embaixo. Deveria odiá-lo. Mas ainda a perseguia a lembrança do sorriso apaixonado de Brand no lago.
Pelo amor de Deus, ele é real. O aroma masculino que impregnou sua roupa o testemunhava. Contra sua vontade, recordou o frio peito encouraçado contra seu rosto, duro e impenetrável como seu coração. E agora sabia por que. ‘’Ela era toda minha vida’’.
Tortura-o, como os ecos fantasmagóricos em um velho campo de batalha. O ar do castelo tinha se tornado denso quando o guerreiro normando falou de seu amor. Lorde Brand tinha adorado à mulher do lago. Brynna o tinha visto, tinha tentado esquecer, mas era real. Escondeu o rosto no travesseiro, tentando apagar as imagens dos dois no lago, acariciados pelo beijo do verão. Ele estava vivo nesse dia, mas lhe arrancaram o coração do peito, e lhe deixaram só a lembrança do que tinha sido.
Entretanto, não havia nada de frio em seus olhos, quando a olhava. Alagava-os uma cálida preocupação e uma terna compaixão. Poderia penetrar em sua armadura, e acender o coração deste guerreiro? Sabia que devia fazê-lo, se quisesse ficar em Avarloch... Ou se quisesse voltar a sentir seu abraço outra vez.

Brand encontrou Dante quando saía de um aposento localizado no segundo piso, não muito longe da antecâmara onde Brynna estava recostada, pensando nele. Como uma pequena sombra escura, Alysia se pendurava no braço de Dante e lhe sorria, com um olhar de veneração, que iluminava o rosto.
— Brand! — Dante balbuciou, como se seu irmão fosse a última pessoa que esperasse ver no castelo de Avarloch.
Brand sorriu diante das bochechas avermelhadas da donzela, quando deu a volta.
— Somente estava mostrando ao Senhor Dante seus aposentos — explicou Alysia, evitando o olhar de Brand.
— Já encontrou um aposento para mim, Alysia? — perguntou Brand com gentileza.
Alysia empalideceu.
— Não, meu senhor, eu... eu... — olhou Dante, com desesperança, mas o belo cavalheiro somente sorriu e levou um dedo ao cabelo negro dela.
—Temo que a distraí de seus deveres, irmão — a defendeu Dante, embora sabia que não havia necessidade de fazê-lo. Brand raramente se zangava com os servos e vassalos de Graycliff, e exceto por Alexander, Dante nunca soube que seu irmão castigasse ou ferisse alguém a seu serviço. É obvio que Alysia não sabia. Mas nesse momento, os olhos ardentes de Dante e seu sedutor sorriso a fizeram esquecer que Brand estava parado junto a ela, até que, por fim, Dante ergueu o olhar.
— Não importa, estou certo de que há um aposento perfeitamente aceitável para mim...
— Ah — disse a donzela com um suspiro —,O levarei a seu quarto, imediatamente. — Passou por entre os dois homens e escapou pelo comprido corredor, enquanto Brand e Dante trocavam um rápido sorriso a suas costas.
Alysia se deteve no final do corredor e abriu uma pesada porta de madeira.
— Esta era a habitação do pai de Lorde Richard. É a única no castelo, além da de Lorde Richard e Lady Brynna, que tem sala de banho.
— Perfeito — disse Brand, passando ao seu lado para entrar no quarto—, um banho era meu outro pedido.
— Necessita que o atenda meu senhor? — perguntou Alysia timidamente, conhecendo seus deveres com o novo amo. Embora banhar a Lorde Brand não fosse, de maneira nenhuma desagradável, o único homem que ela queria atender nesse momento era Dante.
— Non — respondeu Brand, rapidamente, enquanto avaliava o enorme quarto, com a grande cama de dossel e a maciça lareira de pedra. Contra a parede oeste, havia um armário de nogueira suficientemente grande para acomodar toda sua roupa. Ao seu lado, havia uma mesa de cavalete, adornada com um vaso cheio de rosas silvestres e uma fina bacia de ouro para lavar as mãos. Um elegante biombo, que chegava à altura do ombro de Brand, ocultava a banheira que tinha mencionado Alysia. O quarto tinha boa ventilação e pareceu satisfatório. Com um gesto afirmativo, sugeriu sua aceitação e se voltou de novo para Alysia — Faça com que subam minhas coisas e envie alguém para que acenda o fogo... E tire estas flores.
Alysia fez uma reverência com a cabeça inclinada e deu a volta para sair, mas Brand deu dois largos passos e tomou sua mão.
— Não tem que inclinar-se diante de mim, cada vez que abro a boca. — Seu sorriso aliviou a ansiedade da donzela. Todo o temor que ela e os outros haviam sentido agora dissipava-se. Lorde Brand Risande era maravilhoso.
— Necessita algo mais, meu senhor? — perguntou ela, ansiosa para ir contar a novidade aos outros.
Brand libertou sua mão e continuou investigando o quarto.
— Oui, avise aos cozinheiros que quero que sirvam a ultima refeição do dia uma hora depois do pôr do sol. Eu gostaria de uma taça de cerveja morna todas as manhãs — fez uma pausa, examinando as rosas que floresciam como promessas de amor. Passou o dedo sobre uma delicada pétala desejando aspirar seu doce e conhecido aroma —, e avise lady Brynna que eu gostaria de vê-la em minha mesa.
Os olhos da donzela se iluminaram e Brand supôs que os rumores sobre o destino da senhora de Avarloch tinham sido uma grande preocupação para o povo do lugar. Ou isso, ou a donzela tinha aprendido com sua ama a escutar atrás das paredes.
Sem querer sorriu ao recordar a língua explosiva de Brynna. Seu pai tinha razão, era uma mulher apaixonada, cheia de fogo e de vida e... Rapidamente, apagou a lembrança de sua mente. Casaria-se com ela se era esse seu dever. Levaria-a para sua cama. Mas nunca lhe daria seu coração.
Dirigiu-se para a beira da cama, dando largos passos e provou o colchão com os dedos.
— Uma coisa mais — levantou seu olhar para a exótica e morena donzela—, diga ao duque William que solicitei sua companhia em minha cama esta noite — se sentou na cama suave e tirou as botas. Levantou de novo o olhar ao registrar a surpresa no silêncio dela. O sorriso em seus lábios assegurou a Alysia que havia uma razão para suas palavras.
— Embora seja casado, o duque gosta muito das mulheres e do vinho; isso... Quando não está lutando. Solicitará sua companhia esta noite, se eu não solicitar primeiro, e rechaçar o duque da Normandia não é recomendável — explicou Brand, levantando-se da cama. — Durma onde quiser, esta noite, menina, mas se não quiser que seja com o duque William, então deve lhe dizer que estará comigo.
Alysia olhou fixamente os olhos de seu novo amo, sem poder acreditar no que estava escutando. Acaso importavam tanto os sentimentos de uma simples donzela, para protegê-la do guerreiro normando?
Fez uma reverência, não sabendo do que outra maneira expressar sua gratidão e Brand suspirou, depois sorriu para Dante, por cima do ombro de Alysia. Dante tomou o braço da jovem donzela e a escoltou para fora do aposento. No momento em que fechou a porta atrás deles, Alysia puxou a manga da camisa de Dante.
— Então aceitará Brynna como sua esposa?
— Ainda não sei o que decidiu, mas não posso imaginar que renegue uma esposa como ela.
— Não — Alysia concordou, quase sem fôlego — É maravilhoso, tão amável e gentil — Quanto se equivocaram todos ao se preocuparem.
— Alysia — sussurrou Dante, ao ver uma luz de esperança em seus olhos. Era bom que seu irmão fosse apreciado, mas ele não queria que ninguém em Avarloch confundisse a bondade dele com debilidade, como tinha feito Alexander —, Meu irmão é um homem justo. Exige respeito e o oferece em troca. Mas diga aos outros que o novo senhor é um guerreiro, acima de tudo.
Ela assentiu e observou a porta atrás da qual o novo amo do castelo se preparava para seu banho. Recordou o poder de sua voz suave como o mel e a feroz chama em seus olhos, quando o viu pela primeira vez, no corredor.
— Direi meu senhor.
Dante tomou seu queixo entre as mãos e levantou seu rosto para ele.
— Você verá esta noite, na hora do jantar.
— Jantar? Não, eu não janto com...
Dante assentiu, interrompendo suas palavras.
— A partir de agora, todos jantamos juntos.
Uma vez mais, os olhos de Alysia brilharam. Ofereceu-lhe seu sorriso mais radiante, depois correu, segurando saia sobre os tornozelos e desceu as escadas para contar aos outros. Dez minutos mais tarde, cinco baús de madeira de vários tamanhos foram enviados ao quarto de Brand, assim como a água para seu banho, tão quente que os vapores formavam redemoinhos sobre a banheira, enquanto vertiam a água.
Dante se jogou sobre a cama de Brand, quando voltou para falar com seu irmão.
— Então, o que faz o duque aqui? — perguntou, enquanto Brand se despia e lançava suas roupas sobre a mesa, agora desprovida de flores.
— Eduardo mandou chamá-lo para me convencer a me casar com Lady Brynna.
— E conseguiu?
— Oui. Ordenou-me isso — Brand ignorou o sorriso aflito de seu irmão, dirigiu-se para o outro lado do biombo e entrou na banheira. Deslizou dentro da água fumegante que ameaçava alagar o piso.
— Minha cama não é tão confortável como esta — Dante franziu o cenho momentos mais tarde, amassando um travesseiro antes de pousar sua cabeça.
— É estranho — disse Brand, enquanto começava a ensaboar o peito—, estava certo de que a donzela tinha lhe dado a cama mais confortável do castelo. Já que, além de tudo, ela vai passar tanto tempo ali — adicionou, com um sorriso malicioso.
Dante abriu a boca para proteger a honra dela, mas pensou no negro e suave cabelo de Alysia derramado sobre seus ombros cor de oliva e concluiu que Brand, provavelmente, tinha razão, pelo menos se Dante conseguisse o que queria. Cruzou os braços atrás da cabeça e suspirou.
Brand riu, em silêncio, ao escutar o som ofegante e deslizou mais profundamente na água, inundando a cabeça. Emergiu um momento depois, com tanta força que salpicou água por toda parte.
— Diga-me o que pensa de sua futura esposa — perguntou Dante.
— Acredito que tem uma língua feroz. — Brand verteu um pouco do cremoso sabão aromatizado com especiarias na concha de sua mão e ensaboou os cachos negros e o rosto.
Um lento e preguiçoso sorriso desenhou-se no rosto de Dante:
— Uma língua pode ser uma grande vantagem para um homem.
Ante a resposta de seu irmão, Brand deixou de ensaboar-se, por um momento, para formar uma certa imagem. Voltou a afundar e enxaguou a espuma da cabeça, tentando apagar o fogo que, repentinamente, esquentou seu sangue.
A porta do quarto se abriu, com um forte golpe. William estava de pé na entrada. O duque olhou para Dante, que assinalou o biombo. William se encaminhou para a barreira e a tombou com a mão, de um golpe. Olhou fixamente Brand, que se encharcava na banheira.
— Dou dez homens pela bela morena! — implorou o selvagem normando.
— Non — respondeu simplesmente, saindo da água fumegante. A água caiu como um rio sobre seu corpo musculoso e formou um atoleiro a seus pés. Tomou a toalha que Dante lançou da beira da cama e secou o torso molhado. Uma expressão de aborrecimento enrugou a face do duque, fazendo-o parecer um lobo.
— Faz uma hora não queria nenhuma mulher, agora quer duas?
— Eu não queria uma esposa, William — recordou Brand, procurando algo dentro de um dos muitos baús que havia trazido do castelo de Graycliff
— Nunca disse que não queria desfrutar de uma mulher na cama. — Escolheu umas meias negras e grossas e uma camisa azul escura de mangas largas, com um bordado dourado. Lançou a camisa sobre a cama e ajustou as meias.
— Bastardo egoísta — grunhiu William, aceitando facilmente sua derrota. Voltou a atenção a Dante, que agora estava sentado na cama, sorrindo ante a divertida disputa.
— Dante! —William foi parra seu lado, com os braços estendidos para lhe dar um forte abraço, e o irmão de Brand se preparou para a investida — Merde, está muito maior do que quando partiu da Normandia! Nunca devia ter deixado que viesse para a Inglaterra viver com este patife — William apontou em direção a Brand com o queixo, que sorriu e lançou a toalha.
— Quem mais pode me ensinar como agradar a duas mulheres ao mesmo tempo? — brincou Dante.
William lançou-lhe um olhar de lince e o golpeou no ombro.
— Por isso, ouvi falar, não houve escassez de mulheres em sua cama, Dante. Oui, sua reputação com o belo sexo chegou até a Normandia - entrecerrou os olhos — Quantos anos tem agora, vinte?
— Vinte e quatro.
— Ah, está no auge, filho. Volte para a Normandia comigo e te darei seu próprio harém. Este seu irmão tem vinte e oito anos e tem medo de casar-se.
— E você já está tão velho que não escuta as risadas das rameiras de seu harém a suas costas — replicou Brand.
— Olhe para ele — disse William, com um tom de lástima na voz, ignorando o insulto de Brand e sacudindo a cabeça em sua direção — Chama isso de músculos? As patas das galinhas do curral têm mais músculos que você.
— São suficientemente fortes para te esmagar sob meus pés, velho — Brand zombou, alegremente e se deu conta do quanto tinha sentido saudades de brigar com seu amigo mais querido.
Dando um passo gigantesco, William se aproximou outra vez e colocou um braço ao redor do pescoço de Brand, imobilizando-o como se fosse uma cadeia de ferro, quando ele tentou escapar. De repente, William ficou sério e tomou o rosto do jovem entre suas mãos imensas.
— Preocupo-me contigo. É como um filho para mim. Ao menos seu irmão mantém o coração longe de suas calças.
— Estou bem — assegurou em voz baixa.
William o estudou durante um momento, depois deu um leve tapa em sua bochecha.
— Muito bem, então, se case com a moça e me dê muitos meninos, e se alguma vez precisar, estarei ao seu lado.
Brand se inclinou, em uma reverência, com genuíno respeito e afeto.
— Obrigado, William — sorriu —, agora vá embora daqui e deixe que me vista. E leve Dante contigo.
— Muito bem, mas te advirto: a próxima moça bela que ver esta noite será minha — disse, enquanto pousava um braço maciço sobre o ombro de Dante ao sair.
Quando ficou a sós, Brand cruzou o quarto e pegou o cinturão de sua espada. Ouviu um golpe na porta, enquanto prendia a pesada banda de couro na cintura.
— Entre — disse, mal levantando a vista.
Brynna empurrou a porta, mas em vez de passar, esperou na entrada. Seus olhos percorreram as sutis mudanças que Brand havia feito no quarto, então pousaram nele. Maldito seja, não tinha direito de ser tão brutalmente belo e tão vivo em um quarto que havia sido de seu falecido avô durante tanto tempo. E como se esses endemoninhados cachos negros e brilhantes que caíam sobre seus olhos fossem pouco, a visão de seu peito nu fez com que ela esquecesse por que tinha vindo. Sentiu a boca seca. Ele ainda estava molhado. Gotas cristalinas que deslizavam pelos lisos e polidos músculos dos braços e do pescoço guiaram seu olhar até mais embaixo, para seu esculpido abdômen.
— Lady Brynna — ele cruzou o quarto e se sentou na cama. Procurou suas botas e a olhou, outra vez, ao notar finalmente que ela ainda não tinha pronunciado uma só palavra — É um prazer vê-la de novo — sentenciou, decidido a tratá-la com mais gentileza que antes. Depois do modo como William tinha gritado, ela merecia um tom mais amável.
—É verdade?
— Que me alegra vê-la? — levantou uma sobrancelha, enquanto calçava as botas. Ela assentiu, observando-o tão fixamente que ele pensou que talvez estivesse calculando o melhor ângulo por onde aproximar-se para lhe cravar uma adaga Seu olhar recaiu sobre as mãos de Brynna. Não segurava nenhuma arma, mas tinha os punhos apertados. Isso o divertiu, ao recordar à gata selvagem que tinha atacado o duque da Normandia logo depois de descobrir que ele a havia enganado.
— Por que não me alegraria? — perguntou mansamente.
Ela encolheu seus delicados ombros.
— Porque tenho o cabelo vermelho, talvez.
Brand a olhou, antes de ficar de pé e recolher sua camisa da cama.
—Tem um cabelo formoso, senhora. Mas o que tem isso a ver?
Brynna o observou, enquanto se vestia. Fez um esforço para manter firme a voz, mas as fortes linhas desse corpo lhe confundiam os pensamentos.
— Não abandonarei Avarloch — disse bruscamente. Ele passou a mão pelos cachos molhados para tirá-los do rosto. Brynna molhou os lábios secos — Você... Você não pode me tirar tudo e me expulsar do lugar no qual passei toda minha vida.
— Posso, ao menos, adverti-la do que acontece ao nosso redor? Está se reunindo uma multidão.
Brynna deu meia volta e ruborizou, ao ver os criados escondidos atrás dela. Afugentou-os, entrou no quarto e fechou a porta, com força.
— Pronto — disse aborrecida — Contente agora?
Brand se apoiou contra o suporte da lareira e a estudou. Demônios, mas era encantadora. Nunca tinha esperado que seu prêmio fosse uma pequena bruxa infernal tão fogosa, com olhos que prometiam doces entretenimentos. Estava desfrutando tanto a atitude desafiante que acendia seu temperamento que decidiu não lhe dizer ainda se podia ficar. Esquadrinhou, com audácia, seu corpo da mesma maneira que ela o tinha estudado. Sorriu quando voltou a ruborizar-se, mas seus olhos revelaram algo muito mais selvagem que o humor.
— Não tem nenhum parente com o qual possa ir viver? Uma irmã ou um irmão? Tia...?
— É óbvio que não abandonarei Avarloch, tolo. Não escuta bem?
Lorde Brand se aproximou.
— É muito atrevida para uma mulher que não tem alternativas.
O quarto se tornou menor, à medida que ele se aproximava. Brynna sentiu o impulso de levar uma mão à garganta; ele tinha o aspecto de um lobo, escuro e sedento de sangue.
— Tenho uma opção, Lorde Brand — o coração pulsava com força no peito quando ele chegou ao seu lado. Estava tão perto agora que podia sentir a calidez de seu fôlego sobre a bochecha. Fixou o olhar em seu queixo, para não ver esses belos olhos enganosos. Mas logo percebeu seu engano ao notar a sensual covinha no queixo, que acentuava seus lábios endiabradamente pecaminosos.
— Que opção é essa? — sua voz era arrogante.
Brynna se preparou para o assalto e jogou a cabeça para trás, para encontrar seu olhar. A cabeça dava voltas e quase tinha perdido o fôlego. Ao vê-lo no lago, havia se sentido muito cativada, observando seu prazer para que a impactassem seus traços por completo. Seu aroma limpo e masculino não a tinha rodeado como a rodeava agora. Quando o estava espiando, não tinha idéia de sua enorme e dominante estatura e do efeito que teria em seus sentidos estar tão perto. Mordeu o lábio inferior, decidida a não perder-se nesse sonho. Este homem era real, e a obrigaria a abandonar seu lar.
— Lutarei com você por Avarloch — disse fazendo um esforço para levantar o queixo, em um gesto de desafio diante do poder que ele exercia sobre ela.
Por um momento, Brand pareceu muito surpreso para falar. Logo, riu na sua cara.
— Patife! — alfinetou Brynna — Acredita que porque ser uma mulher não posso lutar contra você? Sir Nathan pensava o mesmo, até que quebrei a vassoura da tia Gertrude em sua cabeça e, rapidamente, mudou de idéia, asseguro! Você não é diferente, não é mais que um vulgar...
Rodeou-lhe a cintura com o braço e a levantou facilmente do piso.
— O que acredita que está... — os olhos de Brynna se arregalaram, mas uma vez mais suas palavras foram interrompidas, desta vez por um longo, forte e exigente beijo que deteve sua respiração.
— Como se atreve! — Brynna falou com tanta ênfase, quando se separou dele, que Brand não teve outra alternativa que sorrir ante sua beligerância — Vilão! — o sorriso dele atiçou sua fúria ainda mais e levantou a mão para golpeá-lo.
Brand segurou sua mão, com o sangue aceso por seu maravilhoso temperamento. Antes que pudesse perguntar-se como tinha chegado a esse ponto, empurrou-a contra a porta. Ergueu sua mão sobre a cabeça, logo tomou a outra e as uniu. Não disse uma palavra, e isso era pior que se tivesse falado. Simplesmente a olhou com uma excitação que iluminava seus olhos. Seu fôlego não estava tão entrecortado como o de Brynna, mas sua boca se curvava, em um meio sorriso, tão luxurioso e desafiante que a assustou. Apertou-se contra ela, seu corpo firme e quente, e os lábios que lhe roçaram a garganta eram tão suaves e excitantes como as asas de uma fada. Quando a jovem gemeu contra seu corpo, Brand afundou a boca na dela e a beijou quase brutalmente, lhe permitindo saborear a paixão que ainda rugia, além de seu férreo controle.
Afastou-se o suficiente para continuar compartilhando seu fôlego. Sua respiração era agora tão dificultosa e pesada como a dela. Brynna passou a língua pelos lábios inchados e ele afundou seu olhar neles. Inclinou-se e lhe roçou a boca, saboreando-a de novo e deixando sua marca indelével. Brynna o olhou fixamente nos olhos, aturdida por sua cor e intensidade. Teria caído se não estivesse tão apertada contra ele.
— Você é desprezível — sussurrou.
— Então certamente... — sua voz fogosa de barítono a envolveu como uma névoa cálida... —não vai querer ficar em Avarloch com um homem assim.
— Posso fingir que você não existe — prometeu Brynna, e desviou o olhar quando ele levantou uma sobrancelha.
— Por alguma razão, duvido muito — assinalou ele.
Brynna bufou diante de sua arrogância e o empurrou para libertar-se. Ele deu um passo atrás e observou aqueles olhos de fogo que o olhavam.
— Não abandonarei Avarloch, disso pode estar certo. E se ignorá-lo não funcionar... — desenhou-se nos lábios um sorriso malvado, para imitar o que ele estava oferecendo — Poderia simplesmente matá-lo em sua cama.
Brand respondeu com um sorriso malicioso e sensual:
— Isso soa muito tentador.
Brynna ruborizou até a raiz dos cabelos, ao perceber o que queria dizer, e abriu a porta com força, saindo correndo do quarto. Brand sentiu que esses aros de fogo cor de esmeralda irradiavam fúria, só comparável a dele, excitantes, coroados pela magnificência de seu cabelo que dançava contra a luz, como labaredas de ouro. Aspirou longamente o aroma de jasmim que ficou em sua túnica. A filha de Lorde Richard era delicada em seus braços, apaixonada contra sua boca, e Brand se encontrou saboreando a idéia de seu corpo, suave e, entretanto, resistente. A fortaleza de seu espírito o excitava, acendia em seu interior uma faísca de algo que já tinha esquecido que existia. Desejava-a, mas ela seria suficientemente forte para estar com ele? Sabia que se a tomasse, seria diferente do que tinha sido com Colette. Não seria gentil, devoraria-a até que fosse completamente dele, até que soubesse que ninguém mais poderia enchê-la como ele.
Quanto mais pensava nisso, mais lhe atraía a idéia de casar-se com Brynna Dumont. Era certamente formosa. Seria tão ruim fazê-la sua esposa? Não a amava e nunca a amaria, mas não era razão para se negar seu corpo, o excitante prazer que sentiu ao beijá-la, ou a ânsia que sentiu ao segurá-la em seus braços, algo que acreditou que nunca voltaria a sentir.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Capítulo 7

Brand saiu de seu quarto e fechou a porta, devagar. Quando levantou o olhar, viu lorde Richard encaminhando-se para a escada. Não sabia por que William queria que o guerreiro saxão permanecesse ali, mas era sua intenção averiguá-lo. Era terrivelmente difícil ter que expulsar um homem de sua casa, quando o homem ainda estava nela. Até pior, Lorde Richard não era só um guerreiro, mas um pai que seria arrancado dos braços de sua filha. Apertando a mandíbula, Brand se preparou para a tarefa de falar com o experiente comandante.
— Lorde Richard — o chamou, antes que o cavalheiro mais velho chegasse à escada. Brand apressou um pouco o passo para alcançá-lo.
— Lorde Brand. — Os dois homens se olharam, em silêncio, durante um momento, antes que o jovem falasse.
Brand era um pouco mais alto e mais largo de ombros que o pai de Brynna, mas Lorde Richard não parecia menos imponente de pé, na beira da escada, com uma mão descansando comodamente sobre o punho de sua espada.
— Sua filha ficará aqui, como minha esposa.
Richard piscou, e assentiu levemente:
— Brynna se alegrará que lhe permita ficar em Avarloch.
Alegrar-se, pensou Brand. Alegrará-se. Não era a reação que esperava quando tomasse uma mulher por esposa, mas por que teria que ser de outra maneira? Ela não o amava. Apenas se conheciam. De fato, pensou rudemente, ela nem sequer se alegraria. Estava disposta a ser sua esposa para permanecer em Avarloch e evitar um derramamento de sangue. Concluiu que essa era uma razão tão boa como qualquer outra.
— Acreditei que você não queria uma esposa — disse Richard perguntando-se, como o tinha feito tantas vezes durante as últimas semanas, se não seria melhor levar sua filha para onde Deus achasse por bem conduzi-lo. Só levou um instante para decidir-se. Era um soldado. A batalha o seguia, como o vento. Que tipo de vida podia oferecer a sua filha, se nem sequer podia lhe dar um lar onde descansar as pernas?
— Não quero uma esposa — respondeu Brand simplesmente — Mas o homem a quem jurei obedecer quer que tenha uma. Sua filha também me deixou bem claro quanto significa Avarloch para ela. Não seria mais que um selvagem desalmado, se a obrigasse a abandoná-lo. E não sou um selvagem.
Richard entrecerrou os olhos. Logo depois de enfrentar Lorde Brand Risande em batalha, o pai de Brynna não estaria de acordo com essa afirmação. Acaso este normando trataria a sua filha com amabilidade? Procurou a resposta nos olhos de Brand. Ou o escuro cavalheiro estava lhe fazendo saber que Brynna não significava nada para ele, além de um meio para evitar outra batalha?
— Brynnafar é fácil de amar, Lorde Brand — afirmou Richard com gentileza, tentando conter o temor e a raiva que cresciam em seu interior — E sei que você chegará a perceber isso.
Os olhos de Brand eram como um oceano infinito, quando Richard olhou dentro deles. As emoções chocavam-se como ondas contra o coração de Brand. O que havia ali? Richard pensou, em silêncio. Por que a vastidão do olhar do conde o enchia de inquietação, a tal ponto que sentia que estava penetrando em um abismo, onde não existia nada mais que um vazio?
— Nunca a amarei — a certeza da resposta de Brand deixou gelado ao pai de Brynna — Não a maltratarei, nem a expulsarei de sua casa, mas jamais a amarei.
— Como você disser — a voz de Richard foi apenas um sussurro. Desviou o olhar do infinito vazio que observava. Muitos pais entregavam suas filhas por muito menos que amor, mas Richard tinha querido que sua única filha tivesse o mesmo ele e sua Tanith tinham compartilhado. Que destino tinha sido designado para sua filha, quando ele se rendeu ante este homem? Sem outra palavra, se afastou de Brand e desceu sozinho as escadas.
Observando-o, enquanto se afastava Brand pensou em ir atrás dele. Deveria lhe dizer algo mais. Queria assegurar ao digno cavalheiro que sua filha estaria segura ali, mas não era suficiente e Brand sabia. Apertou a mandíbula, refreando as promessas que sabia que não podia cumprir, e finalmente seguiu o caminho de Richard para o grande salão.
Brynna se apoiou contra a parede e fechou os olhos, para deter os fortes batimentos de seu coração. Tinha vindo no corredor, momentos depois que Brand chamou seu pai, e com apenas um leve rastro de culpa, tinha escutado a conversa. Agora lamentava. A promessa de Brand a tinha golpeado como um sopro de ar congelado, até fazê-la tremer, presa aos ecos da desesperança. Pensou que depois de beijá-la, tinha ganhado sua paixão. Não precisava ganhar. Ele se casaria com ela. Devia sentir-se feliz de ficar em Avarloch, enlevada por converter-se em sua esposa. Mas o estavam forçando a casar-se com ela.
Nunca a amarei.
Sua promessa a atravessou como uma espada, mas como sempre o orgulho de Brynna e seu fogoso temperamento saíram vitoriosos sobre seu coração. Endireitou os ombros e se afastou da parede, que parecia sustentá-la.
Farei com que sinta algo, Lord Brand Risande. Estava furiosa. Deve haver algo que ainda possa sentir.
Com uma renovada determinação, que acendeu a chama em seus olhos, Brynna voltou depressa para seu quarto e tirou a túnica, as meias e deixou que o cabelo caísse, brilhante, sobre as costas nuas. Correu para o alto armário junto à cama e sorriu, enquanto se vestia com uma fina camisa de algodão. Faria-o sentir algo, mesmo que fosse a última coisa que fizesse. Recordou sua fantasia e o homem que a tinha beijado com tanta paixão em seu quarto. Podia ser um guerreiro frio e desumano, mas não faltava-lhe ardor sexual. Disso Brynna estava segura. Sim, sabia exatamente o que esse "algo" seria.
O vestido que escolheu era de uma seda turquesa tão fina que parecia ter sido tecida por fadas. A seda era tão exótica que seu pai quase tinha perdido a vida para protegê-la, em seu retorno a Avarloch das terras turcas. Lady Tanith tinha confeccionado o vestido com suas próprias mãos, bordando delicadamente os fios dourados ao redor do decote profundo e dos punhos. Fluía entre os dedos de Brynna com tanta suavidade como o suspiro de um menino. Deslizou o vestido sobre sua cabeça. Sussurros que prometiam a vitória nublaram seus pensamentos, quando a seda aderiu aos seios e nádegas como uma capa fina e incitante, fazendo-a sentir-se deliciosamente feminina. Ao mover-se, o tecido pareceu respirar, pulsar e convocar a ser tocada. Escovou o cabelo até que reluziu com sua cor de cobre incandescente e o envolveu em um véu prateado, que brilhava sobre suas costas.
Brynna queria que Brand a desejasse, mas não tinha idéia do poder que possuía ou do efeito de sua crua beleza sobre os homens. Sua firme vontade e sua teimosa natureza desalentavam a maioria de seus pretendentes a cortejá-la uma segunda vez. Em raras ocasiões se vestia para agradar. Devido a seu pai e seus homens saírem com freqüência para lutar, nunca haviam muitos hóspedes em Avarloch. Mas agora, os corredores estavam cheios de homens, tanto normandos como ingleses. Brynna sentiu que ruborizavam suas bochechas quando um soldado normando, liberado de seus deveres para jantar no grande salão, quase se chocou contra uma parede quando a viu. Dois dos cavalheiros do rei Eduardo se detiveram, imobilizados em seu lugar, quando ela os agraciou com um sorriso e os saudou.
Revisou sua aparência duas vezes, antes de chegar à escada, para assegurar-se de não estar exibindo nada indecente. Satisfeita por ter tudo em seu lugar, encolheu os ombros e se encaminhou com suas belas sandálias para o lugar onde seu prometido a esperava.
O grande salão estava cheio de gente. Brynna nunca tinha visto tantos normandos juntos em um só lugar. Falavam em voz alta e faziam muito barulho, quase todos pareciam estar bêbados, embora o jantar mal tivesse começado. Franziu o cenho, enquanto seus olhos percorriam o salão procurando o sério senhor dos normandos. Encontrou Lorde Brand sentado na alta mesa, seu olhar frio e calculista abrangia a totalidade do salão, absorvendo tudo e todos ao seu redor. Com parecia longe o herói de suas fantasias, cuja risada forte e exuberante fazia com que até as flores de dançassem. Sua fantasia já não existia e em seu lugar ficava a estátua de um senhor da guerra, esculpido em gelo. E, entretanto, sua beleza silenciava seu coração.
Da mesa onde estava sentado junto a Dante, Brand baixou a jarra de vinho de sua boca e cravou o olhar na magnífica deusa que acabava de entrar no salão. Ao deslocar-se, a seda aderia a seu corpo, roçava suas suaves curvas. Brand sentiu que sua respiração interrompia-se, entre seus dentes apertados. Com olhos selvagens, observou o firme movimento de seus seios, o deslocamento sensual desses casulos túrgidos, que se chocavam contra duas delicadas capas de gaze, o modo como seus quadris dançavam ao caminhar, incitantes... Prometendo. O fogo ardeu, e acendeu um cru desejo nele enquanto o delicioso tecido a acariciava. Seda que se rasgaria facilmente, ante seu contato.
Um dos cavalheiros do rei Eduardo parou em frente a Brynna e obstruiu a visão de Brand. Amaldiçoando, em voz baixa, tentou recordar o nome do patife.
—... Como ele — Dante se inclinou para frente em sua cadeira, estudando o cavalheiro que estava falando com Brynna.
— O que? — perguntou Brand a seu irmão, enquanto emergia do acalorado feitiço no qual tinha caído.
— O velhaco que está falando com Lady Brynna — repetiu Dante — não gosto dele.
— Por que não? — Brand se esforçou para ver, através das dezenas de criados e escudeiros que obstruíam sua visão. Pôde entrever a manga de Brynna e logo seu ombro, atrás do sombrio cavalheiro inglês. Pareceu que ela estava tentando livrar-se dele, mas não conseguia.
— Esta tarde, quando chegou, ele a olhava de um modo que já vi antes.
Brand não disse nada, mas olhou para Dante, com os olhos entrecerrados, olhos letais.
— Onde?
— Em Alexander — Dante se arrependeu de suas palavras, quando Brand se levantou lentamente da cadeira, apontando com seus olhos como geleiras ao homem que estava agarrando o braço de Brynna.
— Já volto — anunciou Brand, com um grunhido.
Abriu caminho entre as pessoas, como um lobo espreitando sua presa, lenta, cuidadosamente, com um único propósito. Com uma intensidade que tornou seus olhos de uma cor azul intensa, observou cada movimento do inglês. Passou junto a cavalheiros e damas, aos quais não via nem escutava. Por fim, se deteve a centímetros de Brynna. Podia escutar o agudo veneno em sua voz, o áspero tom de suas palavras ao advertir o cavalheiro que lhe permitisse passar. E notou a surpresa e o alívio em seus olhos, quando o viu por cima do ombro do inglês.
Sir Luis também notou sua surpresa e deu a volta, justo quando Brand o rodeava, para colocar-se junto à Brynna.
— Ah, Lorde Brand — o cavalheiro do rei Eduardo o saudou, alegremente, enganado pelo sorriso sereno do guerreiro —A dama e eu falávamos justamente de você.
Brynna quase cai de costas quando Brand voltou seu sorriso radiante para ela. Não era sua surpreendente beleza que fazia com que seu coração falhasse, mas a implacável ira em seus olhos que nenhum sorriso, não importava o quanto fosse luminoso, podia ocultar. Estava tão perto dele que sentiu a ameaça de seu imponente, poderoso corpo, e tremeu.
— Senhora — a voz de Brand soou como um ácido doce, enquanto a pegava pelo braço— Como se chama este patife?
No tempo que durou um suspiro, Brynna olhou fixamente nos olhos de Brand. O medo a atravessou, e de repente compreendeu como este homem tinha conseguido derrotar seu pai.
— Ele é Sir Luis de...
— Sou um dos cavalheiros do rei Eduardo — interrompeu Luis. Uma mescla de surpresa e raiva substituiu o sorriso que tinha devotado a Brand, momentos antes — Não sou nenhum patife, senhor, e me ofende que me chame assim.
Os lábios de Brand desenharam um sorriso malicioso, com uma sede tão selvagem que sua prometida temeu que fosse saltar sobre a garganta de Sir Luis a qualquer momento.
— É melhor que o chame "patife" que "cadáver"; não lhe parece? —perguntou Brand, com tranqüilidade, esperando a resposta com uma paciência horrorosa, enquanto Sir Luis se retorcia intranqüilo e secava as pequenas gotas de transpiração da fronte.
— Está me ameaçando, senhor? — perguntou Luis. A confiança com a qual geralmente falava se transformou em um débil sussurro.
— Non — resmungou como se sentisse pena do homem que estava frente a ele — Se tocar Lady Brynna de novo, matarei você. Isso é um fato.
Os olhos escuros de Luis procuraram Brynna, a incredulidade vagando por seu rosto.
— Não olhe para ela. — repreendeu. Sua raiva estava agora totalmente exposta.
O rosto de Brynna empalideceu. Suas mãos tremeram pela violência reprimida que ele já não se incomodava em ocultar. Tinha medo de olhá-lo, sabia que seu sorriso havia se apagado, e não queria ver o que o tinha substituído. Sir Luis, por sua vez, achava impossível olhar para outro lado. A terrível promessa de violência nos olhos de Brand o tinha imobilizado; Luis tinha medo até de abrir a boca em sua defesa.
— Saiba disto — advertiu, com um grunhido, enquanto se aproximava de Luis. — Ninguém poderá salvá-lo se voltar a aproximar-se dela, nem sequer seu rei poderá me deter. Juro — sua expressão era tão rígida como um muro, e convidava o cavalheiro inglês a desafiá-lo. Como o desafio não chegou, Brand apertou a mão de Brynna e a levou, sem uma palavra.
Inundada por um temor paralisante, o olhar de Brynna pousou sobre os fortes dedos que cobriam os seus. Estava consciente da suave pressão que Brand aplicava e o agudo tremor que lhe percorria o corpo, quando lhe acariciava a pele com o polegar, como se estivesse examinando sua textura. Suprimiu uma repentina urgência de suspirar e se perguntou como seu contato podia ser tão parecido a uma carícia, momentos depois de ter estado disposto a matar, com a mesma mão. Um calafrio subiu por sua espinha.
Ainda temerosa de ver a fúria em seu olhar cristalino, mas desejando olhar para ele, Brynna deslizou os olhos lenta, cautelosamente, para seu rosto. Ele olhava a mesa onde Dante estava sentado esperando-o. Restava somente um rastro do fogo que tinha escurecido seus olhos. Ela o estudou. Entreteve-se nos cachos mais escuros que um céu sem estrelas, ao mesmo tempo tão luminosos como a luz da lua sobre o mar. Suas sobrancelhas e pestanas tortuosamente longas eram igualmente escuras e deixavam na penumbra seus olhos. Se olhar mais de perto, talvez encontre a luz que, uma vez, os acendeu com exuberante êxtase.
Esquecendo do temor, ficou absorta nas fortes linhas de seu nariz normando, os ângulos agudos de sua mandíbula, onde apareciam umas tênues sombras escuras, não importava quão cuidadosamente se barbeasse. O contorno de seus lábios carnudos era excitante. Suspirou ao olhá-lo e ao recordar o modo como a tinha beijado. Era um belo, fascinante e temível guerreiro. Um guerreiro que podia mudar sua aparência com um simples sorriso e converter-se em um anjo.
Olhos tranqüilos e profundos a observavam, quando Brynna ergueu seu olhar de seus lábios. Ela quase sorriu, perdida nessa beleza selvagem e, entretanto, comovedora. Conteve-se rapidamente e desviou o olhar, mas não antes que um vermelho ardor lhe percorresse as bochechas. Quanto tempo a tinha estado observando, enquanto ela o devorava com o olhar? Era zombaria o que viu em seus olhos ou ternura? Brynna tentou afastar a mão, mas ele enroscou seu braço mais firmemente ao redor do dela.
— Está ainda mais formosa esta noite — disse Brand, de repente, voltando a fixar seu olhar à frente.
"Mais formosa?”, pensou Brynna, permitindo-se olhá-lo de novo, mas só por um instante.
— Obrigado, meu senhor — sorriu feliz por ter escolhido esse vestido — Não voltará a me forçar a beijá-lo outra vez, não é? — adicionou com uma faísca de fogo Dumont brilhando nos olhos.
Brand bufou e inclinou sua cabeça para olhá-la.
— Forçá-la? Mademoiselle se me lembro bem, você estava tão ansiosa de receber meu beijo, como eu de oferecê-lo.
— Você se lembra mau, meu senhor — replicou ela, com insolência.
Quando chegaram à mesa, Dante ficou de pé e rapidamente lhe ofereceu a mão de Brynna, que ele beijou com ternura, enquanto levantava uma sobrancelha invejosa em direção a seu irmão.
— Informei ao rei que me casarei com você — disse Brand, afastando uma cadeira para que Brynna sentasse junto a ele — Assim, se sentará a meu lado, de agora em diante.
Brynna congelou, ante a arrogância de sua voz. Tola! Quase tinha esquecido do patife no qual se converteu sua fantasia. Afastou o olhar de Dante para olhar fixamente seu prometido, com chamas nos olhos.
— Honra-me com sua magnanimidade, meu senhor — Brynna fervia, mas lhe ofereceu uma leve reverência — Entretanto, como não me informou de sua amável decisão, já fiz acertos para me sentar com meu pai — o atravessou com seu olhar desafiante, e ela entendeu quão rápido podia gelar o ardor de seus olhos. Não importava. O medo desaparecia, quando a raiva corria por suas veias, como nesse momento. Como pôde ter desperdiçado tantas noites sonhando com essa besta?
— O que você deseja não importa para mim, senhora — disse Brand sem perder a calma — minha esposa se sentará comigo em minha mesa.
— Até que seja sua esposa — Brynna replicou com a mesma tranqüilidade — Me sentarei onde me agradar — Se endireitou, desafiante, pronta para enfrentá-lo.
Mas a batalha terminou antes de começar. Brand sorriu e se afastou, para deixá-la passar em direção ao seu pai. Reconhecendo que o sorriso era sua arma mais eficaz, Brynna hesitou, por um instante, antes de deixá-lo. Ele seria capaz de lhe chutar o traseiro, quando se voltasse? De estripá-la com outra de suas declarações desumanas, enquanto se afastava? Ah, mas era mais galante do que parecia. Fazendo um gesto com o braço, ofereceu-lhe um espaço amplo para que passasse.
— É livre para ir com seu pai — disse, com um desprezo gelado adornando sua cavalheiresca oferta — Pode partir também com ele... Se assim o desejar.
Tomada de fúria, Brynna passou velozmente ao seu lado. Se o destino de Avarloch não estivesse em jogo, subiria correndo para seu quarto, empacotaria seus pertences e partiria com seu pai. Até viver com seu tio e o mal-humorado de Sir Nathan seria melhor que passar outro minuto com Lorde Risande. Queria rir de si mesma, mas um soluço lhe atravessou a garganta. Não podia partir. Não importava quão desconsiderado fosse o ogro que tomou seu lar. Brynna amava Avarloch e todos seus habitantes. Queria amar o homem do lago, mas ele se foi. Tal como seu pai iria. Não podia perder também seu lar.
Ao ficar sozinho, Brand afastou a cadeira com tanto ímpeto, que quase lhe escapou das mãos.
— Vejo o que queria dizer quando se referia a sua língua — Dante escondeu, com cautela, o humor de sua voz enquanto seu irmão se sentava junto a ele —, ela será uma esposa interessante.
— Se não a açoitar primeiro — ameaçou Brand e bebeu lentamente um gole de vinho. Seus olhos seguiram Brynna por cima da beira da taça.
— Está brincando contigo — William deslizou na cadeira em que Brynna devia estar sentada.
— Sei — grunhiu Brand e seu olhar sobre Brynna endureceu, enquanto ela se inclinava para beijar seu pai.
— Ela é... magnifique! —o duque suspirou, deixando cair o queixo em sua mão — E a julgar pelo vestido que escolheu usar esta noite, acredito que será uma esposa bem disposta.
— Os jogos podem ser perigosos — disse Brand com raiva, sem afastar os olhos dela — Neste momento, não me importa se está disposta ou não.
Escutou-se uma forte gargalhada do homem sentado ao seu lado, e logo uma vigorosa palmada nas costas.
— Muito bem — brincou William— Já te colocou ofegante.
O duque ficou de pé, ainda rindo, mas Brand não o viu partir. Uma ardente fúria o inundava, a cada minuto que passava. Não devia ter permitido que se fosse. Seu lugar era ao lado dele e agora ele parecia um idiota sentado junto a uma cadeira vazia. Deixaria que tivesse sua vitória esta noite, mas seria a última.
Brynna podia sentir a fúria do guerreiro de onde estava sentada, e se sentia muito feliz consigo mesma. Mas quando inclinou a cabeça sobre seu ombro para olhá-lo, notou que sua raiva tinha mudado. Havia um brilho masculino e calculista em seus olhos, que a intranqüilizou. Uma energia presa lhe contraía os músculos, debaixo do linho azul de sua camisa. Parecia um caçador preparado para devorá-la viva. Endireitou os ombros, mas afastou a vista da força de seu olhar.
Por fim, serviu-se a comida, e a moça se surpreendeu ao ver os servos compartilhando a mesa com os cavalheiros e os nobres.
Essa era a atitude de um homem frio?
— O que está fazendo, pai? — perguntou Brynna, inclinando-se para Lorde Richard.
— Lorde Risande fez o anúncio, antes de sua chegada — seu pai respondeu, enquanto tirava o miolo de seu pão —Todos jantarão juntos de agora em diante. — Lorde Richard olhou por uns instantes a mesa de Risande, mas o novo senhor de Avarloch não estava em sua cadeira. Richard encolheu os ombros. — Disse a você que era um homem estranho.
Brynna pensou que era uma idéia maravilhosa. A maioria dessas pessoas eram seus amigos, homens e mulheres cuja companhia tinha desfrutado durante muitos anos. Gerald, o jardineiro, estava sentado em frente a ela e a jovem lhe ofereceu um cálido sorriso. Dennis e Peter, os rapazes dos estábulos, estavam junto a Blythe e Lily, suas donzelas. Estavam todos juntos, alguns pareciam incômodos em suas cadeiras, enquanto outros riam com os cavalheiros, enquanto comiam. Seus olhos percorreram o salão, sorrindo diante dos muitos rostos conhecidos. Quando se deparou com o sorriso zombador de Sir Luis, afastou o olhar, arrependendo-se por um momento de ter saído do lado de Brand.
Mas não podia evitar que seus olhos voltassem para a mesa. Surpreendeu-se ao descobrir a cadeira de Brand vazia. Olhou ao redor do salão e o encontrou inclinado sobre a cadeira de sua donzela Rebecca. Tinha uma mão plantada na mesa frente a ela, enquanto a outra descansava nas costas da moça... Sobre seu cabelo mais pálido que as asas de um anjo, pensou Brynna, com amargura. Brand inclinava-se sobre a formosa donzela e Brynna se amaldiçoou por não ter afastado o olhar, quando Rebecca riu timidamente por algo que ele disse. Dirigiu-se para onde estava Alysia. Agachou-se para lhe dizer algo no ouvido e tanto o novo senhor de Avarloch como a amiga mais querida de Brynna se voltaram para olhar Dante, que caminhava para eles com um meio faisão em uma mão e uma taça na outra. Brand sorriu, com o que parecia ser uma espécie de brincadeira secreta que compartilhava com Alysia. Voltou-se para olhar o duque da Normandia e riu com vontade.
Todo o ambiente mudou para Brynna nesse momento. A risada de Brand emanava uma calidez que a acariciava, esse som que a tinha atraído tempos atrás. O frio se dissipou no castelo de Avarloch. Por um momento, sua fantasia tinha retornado. Mas agora estava calado, tímido, e intrigantemente sensual. As duras linhas de seu rosto fluíam em um sorriso divertido, que o tornava quase terno e indefeso. Seus luminosos olhos azuis o transformavam. Uma inocência pura, masculina, surgia de seu olhar, de seu sorriso sem artifício. Brynna se sentiu hipnotizada por seu esplendor, assim como todas as outras mulheres no grande salão, sem excluir Alysia, cuja escura pele oliva se tornou avermelhada, quando sorriu de novo.
Brynna retorceu as mãos, inquieta. Seria assim sua vida? Amaldiçoada com um marido que prodigalizava seu excitante sorriso às donzelas do castelo, enquanto sua esposa estava sentada a apenas uns metros de distância? Sem querer, golpeou as palmas contra a mesa, afastou a cadeira e ficou de pé. Brand levantou a vista para olhá-la e a jovem lhe cravou os olhos. Deu boa noite a seu pai rapidamente, antes de correr para a porta. Acaso era uma espécie de besta de carga, que não merecia sequer um sorriso, um olhar terno? Para surpresa de todos, o bárbaro era capaz de sentir emoções humanas, mas não por ela.
De repente, uma mão agarrou sua cintura e deteve sua caminhada furiosa para as escadas.
— Aonde vai? — a voz de Brand soou áspera aos seus ouvidos, enquanto a fazia voltar-se.
— A... meu... quarto — ela mordeu cada palavra, com amargo desprezo.
Seus dedos apertaram sua cintura, seus olhos abrasavam a carne como carvões acesos.
— Já me abandonou uma vez e me deixou sentado sozinho, logo depois de informar ao rei sobre nosso matrimônio. Não abandonará também o salão.
— Você informou ao rei. Informar-me não lhe passou pela cabeça?
— Por que deveria fazê-lo? — Brand arqueou uma sobrancelha em um gesto de arrogância. — É seu dever.
— Sim — seus olhares lutavam com igual força —, É — sorriu severamente —Que pena que nunca poderei amá-lo.
Por um instante, Brand quis sorrir ante sua audácia. Ela tinha estado escutando outra vez atrás das paredes, enquanto conversava com seu pai, momentos antes e agora queria ganhar a batalha. Achou graça em seu olhar desafiante e decidiu brincar um pouco mais.
Orgulho. Fogo. Beleza.
Permaneceu em silêncio durante um longo tempo, estudando-a com uma curiosidade predadora que Brynna agora reconhecia e contra a qual combatia.
— É melhor não haver amor entre nós, Brynna — disse, por fim — Ambos seremos muito mais felizes.
Suas bochechas arderam. Por que lhe doía tanto sua maldita promessa de não amá-la?
— Tire as mãos de cima de mim, Lorde Risande — ela alfinetou, reunindo o que ficava de seu orgulho — Minha donzela o aguarda, vá com ela.
Afastou o olhar, ansiando não sentir mais a força de sua mão. Desejou ser tão fria e insensível quanto ele. Mas desde o momento em que o tinha visto pela primeira vez, a sede de vida iluminando seus olhos azuis, enchendo de música sua profunda risada, a moça soube que podia apaixonar-se por ele. Tinha sonhado com esse homem durante mais de um ano, tinha desejado com todo seu coração ser ela que recebesse seus abraços na água, naquele dia. Nunca esperou voltar a vê-lo, já tinha se resignado. Teria sido melhor assim. Não havia modo de chegar a ele. Sim, seu beijo tinha sido apaixonado, mas não significava nada para ele, além de um modo de demonstrar que tinha o controle. Passaria o resto de sua vida com um homem ao qual não importava se ela vivia ou morria. E, de repente, pela primeira vez desde que tinha morrido sua mãe, Brynna sentiu uma profunda tristeza. Tinha caído sob seu feitiço nesse dia, enquanto o via nadar. Mas as fantasias eram para as crianças, e o sonho tinha terminado.
Brand entrecerrou os olhos e a olhou, inclinando a cabeça como se tentasse ler seus pensamentos. O suave tremor de seu lábio inferior lhe disse que a batalha tinha terminado, por hora. A derrota de Brynna era real. E ao notar isso, as defesas de Brand caíram. Não era culpa desta bela moça que o estivessem forçando a casar-se com ela. Não era ela quem o tinha enganado. A jovem estava presa no meio da traição do Eduardo, como seu pai, como ele mesmo. Era inocente, mas estava disposta a lutar com ele por seu lar. Recordou sua promessa, quando William a enganou para que pensasse que Avarloch seria destruído, se ele não se casasse com ela. Estava disposta a converter-se em sua esposa e lhe dar filhos. Seu sacrifício o emocionava, sem mencionar esses lábios que ansiava beijar, ao menos uma vez mais.
— Senhora?
— O que? — ela piscou lentamente, olhando em direção às pessoas dentro do grande salão, em vez de olhar para ele.
Tomou o queixo com os dedos e inclinou a cabeça para examinar seu rosto.
— Peço que fique em Avarloch e seja minha esposa. O que diz? — a ternura de sua voz atraiu os olhos de Brynna para ele e abriu a boca, surpresa e aturdida.
O brilhante olhar que encontrou e cativou o dela era cheio de emoção. Humana, maravilhosa emoção. Brand parecia estar iluminado com uma nova luz, não só pelo apetite que ela tinha visto em seus olhos quando a beijou, mas também com uma emoção radiante. Seus olhos eram mares de paixão, incitantes e serenos. Pena, alegria, angústia, compaixão, fúria, e um desejo luxurioso tão poderoso que emanava de cada um de seus poros. Mas havia algo mais, uma mera sombra do que dava vida a todas essas emoções, que estava ali, esperando na escuridão, esperando ser libertado.
— Sim — a palavra rolou da língua de Brynna, sem fôlego — Serei sua esposa.
Ela tinha vislumbrado além da escuridão algo que ele tentava destruir. O que tinha mudado dentro dele, nesse momento fugaz? Acabava de ver seu coração, quando lhe pediu que fosse sua esposa. Sorriu, porque havia um pouco de luz ainda dentro dele.
Brand passou os dedos, brandamente, pelo braço até chegar a sua mão, e enroscou seus dedos, muito maiores, com os dela. O corpo de Brynna deu um salto diante de seu terno contato, como se fosse feito de relâmpagos. Tinha sonhado durante tanto tempo em apenas poder tocá-lo, ser amada tão apaixonadamente por um homem cheio de vida.
Lentamente, ele inclinou a cabeça, separando seus carnudos lábios. Meu Deus estava a ponto de beijá-la novamente, e desta vez ela estava preparada. Incapaz de resistir, Brynna o observou, até que pôde sentir a calidez de seu fôlego no rosto. Ele deslizou a língua sobre seus lábios antes de capturar seu suspiro na boca. As costas de Brynna se derreteram. Ele a apertou contra si e as pernas dela tornaram-se fracas, à medida que o beijo se tornava mais apaixonado. No espaço de cada nova respiração, sua língua procurava com mais ânsia, bebia mais profundamente, enquanto seus braços rodeavam sua cintura, aproximando-a até que se sentiu completa e totalmente consumida por ele. Podia senti-lo respirar, cheirar o aroma de terra, saborear o vinho que adoçava seu fôlego. Estava sendo transportada, afogada em inacabáveis ondas, até que esqueceu de si mesma, e só sabia dele.
Quando por fim se afastou, ela se sentiu mais só do que jamais havia se sentido. Ele a reclamava com seus beijos, apaixonados, significativos, e ela soube que nunca voltaria a sentir-se completa de novo, até que lhe pertencesse.
Ele riu brandamente diante do sorriso sonhador em seu rosto. O som era como sua voz, baixo, sedoso e muito masculino.
— O que? — perguntou, quando ela se mordeu o lábio inferior.
— Está sorrindo — Brynna ruborizou — É a primeira vez que sorri, sem outro motivo oculto atrás de seus olhos.
— Não acredito que meus olhos tenham ocultado meu desejo de beijá-la antes — murmurou Brand. Levantou a mão até seu cabelo e tocou as mechas acobreadas, sem poder evitar — Mas, devo admitir que se soubesse que veria essa felicidade em seu rosto, teria pedido que se casasse comigo antes.
Este é o verdadeiro, pensou Brynna, recordando o que tinha visto em seu rosto na lacuna, o que fez com que quisesse conhecê-lo. Era de fogo, incontrolável, irreprimível. A paixão, um apetite que a devorava insaciavelmente, ofegante, necessitando-a para sobreviver. O que tinha acontecido? A tristeza tomou o rosto de Brynna e esticou a mão para tocar seu sorriso.
— O que ela fez para te destruir desta maneira?
Sua mão se deteve, antes de chegar aos lábios. O sorriso de Brand se desvaneceu, a luz que tinha ardido nele durante poucos momentos agora não existia, só sombras.
— Fez com que eu a amasse — sussurrou.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Capítulo 8


Brand escoltou Brynna de volta a sua mesa, e ela concordou em sentar-se ali durante o resto da noite. Lorde Risande anunciou a todos seu compromisso e houve um coro de brindes por parte de seus cavalheiros, assim como dos homens de William e Eduardo. Mas Brynna estava segura de que o povo de Avarloch era a que aclamava com mais entusiasmo.
Tomou seu lugar ao seu lado, e embora não visse nada nele que se parecesse com afeto, durante o resto dessa noite, o humor de seu prometido definitivamente estava melhor. Festejou quando Dante desafiou Sir Henry LeForre, um elevado cavalheiro da guarda de William: a provocação consistia em descobrir quem podia beber mais cerveja e lançar uma adaga a seis metros de distância, em um banco que William tinha colocado. Um momento mais tarde, um despreocupado Brand levantava sua taça em honra ao vitorioso. Percorreu o salão, conversando tranqüilamente com quase todos os presentes, em sua primeira noite como senhor de Avarloch. Enquanto falava com seus novos vassalos, seus olhos encontraram os de Brynna em mais de uma ocasião, para compartilhar um olhar silencioso e um rápido e sensual sorriso, que fazia com que o coração dela se parasse, cada vez que o via.
— Parece que será bem aceito por meu povo, Lorde Brand — disse Brynna quando ele finalmente retornou à mesa. Sentou-se ao seu lado, enquanto o olhar agudo da moça pousava sobre os intermináveis rostos que enchiam o grande salão de Avarloch — Em especial pelas donzelas. Alysia, mais especificamente — adicionou, notando como a moça sorria, timidamente quando o novo senhor a olhava.
— Os olhos de Alysia só seguem meu irmão — sentenciou Brand divertido, enquanto olhava de soslaio a uma ciumenta Brynna.
Mas a jovem ainda suspeitava, levantou uma sobrancelha dúbia e averiguou:
— É por isso que sorri para você dessa maneira?
Brand se regozijava.
— Os ciúmes são difíceis de ver em seus formosos olhos verdes, senhora.
— Asseguro-lhe que não estou com ciúmes! — respondeu Brynna indignada — Não há razão para que esteja.
— Non, não tem por que estar — deu a volta em sua cadeira para enfrentá-la, a ferocidade de seu olhar suavizado só por sua voz de cetim — Assegurarei-me de que nunca haja razão para que encontre prazer na cama de outro — seus olhos a observavam, como ondas em um mar tempestuoso e Brynna não estava certa se devia lhe sorrir ou temer este homem que seria seu marido. Sua voz era profunda, tranqüila e carregada de um apetite ávido. Olhava seus seios, depois para a cintura de Brynna, e ela não pôde evitar sentir um diminuto fogo que se propagava em seu interior. O calor era conhecido, sempre o sentia quando recordava. Certamente, este homem pode ser gentil quando deseja, pensou Brynna. Mas ele era gentil também com os servos. Era gentil com aqueles que não queriam nada dele, além de um lugar onde viver e alimento para encher o estômago. Enquanto o povo não pedisse seu coração em troca, Lorde Brand Risande seria o perfeito senhor de Avarloch.
Poderia compartilhar seu leito, sabendo que nunca a amaria? A idéia a excitava e aterrorizava. A atraente promessa de Brand de agradá-la no leito não era suficiente para assegurar que não daria o mesmo prazer a qualquer mulher que se oferecesse. Surpreendeu-se pela profundidade de sua raiva ao pensar nisso. Nunca toleraria que tivesse uma amante. Seu pai nunca teve uma, mas certamente, Lorde Richard tinha amado sua esposa. Deus santo, e se estivesse apaixonada pelo descarado? Brynna sacudiu a cabeça levemente e se reprovou por ter idéias tão infantis sobre o amor. Mas mesmo assim, a lembrança dos braços de Brand invadia seus pensamentos, e amá-lo nunca seria suficiente. Queria ser amada por ele, do mesmo modo.
Brand ficou de pé; William estava fazendo gestos para que se aproximasse de uma mesa larga, repleta de guardas normandos, bêbados. Brand assentiu resistente, voltou a sentar-se e suspirou, olhando sua prometida.
— Precisam de mim - disse com seriedade.
Brynna não pôde evitar sorrir. Queria lhe dizer que assim sentia-se... Por ele.
— É obvio meu senhor — respondeu em troca.
Por um momento, pensou que tinha mudado de idéia e ficaria. Aproximou-se o suficiente para não tocá-la, mas sim para perturbá-la, foi tão imperceptível que se não estivesse observando-o com tanta intensidade, não teria notado.
— Desculpe-me então, bela dama — sussurrou, e quando ficou de pé para afastar-se, Brynna compreendeu por que se aproximou. Ia deixá-la ali, lutando para controlar o tremor que tomava conta de seu corpo, quando seu fôlego a tocava e seu aroma lhe enchia os pulmões. Queria que ela ansiasse tê-lo sempre perto, sentir o calor que fluía de seu corpo.
Estudou seu caminhar, enquanto se dirigia para William e seus homens, tão selvagens quanto o mesmo duque, e concluiu que tudo o que dizia respeito a Lorde Brand Risande era sensualmente masculino, até a pena, que tratava de esconder com tanta veemência.
Não tinha sentido lamentar-se por isso agora, sentenciou, e voltou-se para olhar os rostos que enchiam o salão de Avarloch. Cavalheiros, vassalos e servos tinham abandonado suas cadeiras e estavam conversando. As risadas faziam eco no grande salão. Brynna estava intrigada pelo que o novo senhor de Avarloch fazia. Os servos, em geral, lutavam por seus senhores nas batalhas, mas só por necessidade, para permanecer sob o amparo do lorde, em tempos difíceis. Enquanto olhava ao seu redor, Brynna notou que os homens de Avarloch seguiriam Brand por lealdade e afeto. A cada instante, um rosto diferente olhava em direção ao novo senhor, com um sorriso amplo, quando este lhes devolvia o olhar. Fazia com que se sentissem iguais, respeitava a cada homem, fosse cavalheiro ou servo, e seu respeito seria retribuído.
Ao ver seu pai parado junto a um de seus cavalheiros, no canto mais distante do salão, Brynna se levantou para ir ao seu encontro. Até ali, no meio do rei e sua companhia, até entre os selvagens cavalheiros da Normandia, Lorde Richard Dumont se sobressaía. Avarloch ainda era dele, embora só por umas poucas noites mais.
— Brynnafar — seu pai ofereceu um cálido sorriso, enquanto esticava a mão para receber a dela. Voltou-se para o cavalheiro que se achava ao seu lado, estudando Brynna com um sorriso amplo e calculista — Pode se retirar, Eldred — disse, com um olhar de falcão.
Quando o cavalheiro se foi, o pai de Brynna a repreendeu, em um tom severo.
— Esse vestido pode chegar a ser perigoso, filha.
Brynna tocou o braço de seu pai, aliviando as pequenas linhas ao redor de seus olhos.
— Não tema, pai. Contigo aqui para me proteger, nenhum homem se atreveria a me fazer mal - uma terna emoção cruzou o rosto atraente de seu pai, e Brynna recordou que estava a ponto de perder o único homem que sempre a amaria. De repente, o medo agarrou-a pelo pescoço com dedos quentes, ameaçando estrangulá-la, até que não restasse nada mais que um rio de lágrimas. — Sentirei saudades — disse, cheia de dor.
Seu pai a abraçou e acariciou seu cabelo.
— Eu também vou sentir saudades, minha pequena e querida Brynnafar - disse. Separou-se dela para olhá-la — Mas devemos ser fortes. Um novo destino nos chama, filha, e devemos aceitá-lo, não lutar contra ele.
— Mas para onde irá?
Voltou à cabeça em direção à mesa de William, olhando por uns instantes à pequena congregação de homens sentados.
— Brynna — Lorde Richard deu um passo para trás e segurou-a pelos ombros. Necessitava de sua completa atenção e compreensão —, O duque William me ofereceu um lugar entre seus homens. Está discutindo agora mesmo os detalhes com Lorde Brand.
A confusão escureceu os olhos esmeralda de Brynna, enquanto estudava o rosto de seu pai.
— Irá para a Normandia? — perguntou, em voz baixa, levando uma mão ao peito, quando ele assentiu. Seus olhos se encheram de lágrimas — Acreditei que ficaria na Inglaterra, pai.
Já tinha sido muito difícil ser a filha de um guerreiro, sempre esperando e rezando para que retornasse para ela e sua mãe depois da batalha. Sempre havia retornado. Agora iria para a Normandia e talvez nunca mais voltasse a vê-lo.
— Que mais tirarão os normandos?!
— Brynnafar — os olhos de seu pai brilhavam contra o leve fogo da lareira. Sua voz era baixa, profunda e alquebrada pela tristeza - Cruéis normandos mataram sua mãe. Mas não deve odiar a todos.
— Mas pai, eu não...
— Sua mãe me ensinou a perdoar. Meu povo assolou aos celtas, destruiu aldeias inteiras, tomou o que não lhe pertencia e fez o que quis. Os transformamos em nossos servos. Sua mãe me odiava no princípio pelo que era, mas entendeu, depois de um tempo, que eu não tinha tido nada a ver com o que tinha acontecido com seu povo. Foi capaz de me amar. Não podemos ser frios com todos, pelo que uns poucos fizeram — as lágrimas caíram pelas bochechas da moça e seu pai as secou, com os dedos — Lorde Risande é um homem honrado, Brynna. Isso é mais importante que o país de onde vem ou o sangue que corre por suas veias.
A risada irrompeu na mesa de William e a jovem levantou a cabeça para olhar o homem com o qual se casaria.
— Mamãe teria gostado, imagino — disse, observando o cavalheiro — Todos aqui parecem apreciá-lo.
Seu pai concordou.
— É mortífero no campo de batalha, mas falam muito bem dele no castelo de Graycliff em Dover — e adicionou, com ternura: — Aprenderá a amá-lo como sua mãe aprendeu a me amar.
Brynna queria perguntar a seu pai o que aconteceria se seu amor nunca fosse retribuído. Como podia contar que tinha espionado um homem que nadava nu, que a tinha cativado pelo amor que compartilhava com outra mulher? Embora seu pai não se escandalizasse com facilidade, como podia admitir diante dele que queria ser amada por Lorde Brand, o Apaixonado?
— Sei qual é meu dever. Sempre soube — disse ela. Não precisava contar a seu pai o que a perturbava. O Apaixonado já não existia. Suspirou, e se esforçou para sorrir— Por todos os céus, será um normando!
Seu pai riu docemente.
— Lutar do lado de William não mudará quem sou. E, além disso, Eduardo não está bem e tenho o pressentimento de que Harold competirá pelo trono quando o rei morrer. Já sabe o que penso de Harold.
— Sim. Só quero que seja feliz.
— Serei — assegurou seu pai — William é um grande guerreiro. Meu único pesar é que não poderei ver minha filha.
— E eu, o meu pai — Brynna observou Brand e William juntos e fez gestos a Lorde Richard para que os olhasse — Talvez não fiquemos tanto tempo separados como tememos. Eles são grandes amigos. Imagino que o duque da Normandia visitará Avarloch, com freqüência. Algo que não era bom... Até agora.
— Então esperemos que Lorde Brand esteja de acordo.
— O que importa se estiver de acordo ou não? — a resignação que sentia Brynna mudou para uma repentina indignação - Não tirou de nós o suficiente? Por que tem que ser consultado sobre seu futuro?
— Não seria se decidisse partir para qualquer outro lugar que não fosse a Normandia — explicou seu pai— É o código de honra, Brynnafar. Alguns homens veriam como uma ofensa que seu senhor empregasse alguém que eles venceram no campo de batalha.
Brynna o escutava, enquanto olhava de esguelha aos dois homens que agora se aproximavam. O mais desalinhado dos dois tinha apoiado seu braço musculoso sobre o ombro de seu amigo.
Os olhos de Brand nunca abandonaram Brynna, e quanto mais a observava, mais fascinado sentia-se por sua beleza. Seu cabelo preso pela rede caía sobre suas costas como espessas ondas vermelhas, pinceladas de castanho. Os suaves cachos cor de cobre terminavam onde começavam as sensuais curvas de suas nádegas. Fios de prata e ouro emolduravam seu rosto e faziam mais delicado seu nariz reto, mais dócil seu queixo desafiante, e seus olhos mais verdes que o auge da primavera. Quando William finalmente bateu nas costas de Lorde Richard ao chegar a seu lado, Brand lançou a sua prometida um sorriso que revelou seus silenciosos pensamentos e fez com que ela ruborizasse.
— Bem, Lorde William, para onde viajarei quando abandonar Avarloch? —perguntou Richard, com audácia.
— Para a Normandia, é obvio! — o sorriso de William era tão amplo como seus ombros e Brynna quase sorriu ao olhá-lo. Recordou a cruel brincadeira que tinha feito antes e deu a volta, para beijar a seu pai.
— É o que quer. Alegro-me por você, pai.
— É obvio — disse William, zombador, piscando um olho a Lorde Richard— Teremos que lhe tirar dois dedos... Sendo que você é um saxão e tudo mais.
Apertando os dentes, Brynna lançou um olhar de fogo ao divertido duque. Sua voz atravessou o ar, com força.
— Você desperdiça seu patético humor tentando me intimidar, Sua Senhoria. Suas cruéis brincadeiras sobre meu lar e o bem-estar de meu pai provam que você não é mais que um tolo. Sim, e um tolo irritante, além do mais.
Lorde Richard parou, congelado, com a boca completamente aberta. Brand baixou a cabeça para ocultar uma gargalhada que emergia e a calada surpresa que expressava em seu rosto. E William, o selvagem duque dos normandos, assombrado e admirado pela fogosa mulher a sua frente, respondeu-lhe:
— É você uma mulher extraordinária — sua voz soava profunda, nostálgica.
Os ombros de Brand se sacudiram e Brynna percebeu que estava rindo. Quase deu um chute na parede. Estava muito zangada para falar, voltou-se, saindo depressa do grande salão, pela segunda vez naquela noite.
Brand não a seguiu e deu uma cotovelada em William, enquanto tentava conter a risada que estava certo de que ofenderia o pai de Brynna.
— Bastardo — sussurrou a William, então ficou sério, rapidamente, quando olhou Lorde Richard — O duque carece, por completo, de moral. Está seguro de que quer ir com ele?
Lorde Richard estava ainda muito aturdido pela perigosa explosão de sua filha para responder, mas William bateu em suas costas, para assegurar que não estava zangado.
— Temo que me diverti em excesso as custas de sua filha, mas ela é, na verdade, notável. Também era assim sua mãe?
— Sim, era — Richard aspirou um profundo e purificador fôlego e o exaltou lentamente, observando o caminho que sua filha tinha tomado para abandonar o grande salão —, era.
— Então, você é um homem abençoado por Deus — disse William em voz baixa, recordando as lendas que sabia agora serem verdadeiras, sobre o enlouquecido nobre saxão que tinha aniquilado os homens responsáveis por assassinar sua esposa, três anos antes.
— Você me disse que sua esposa tinha sido assassinada, Sir Richard —disse Brand, emocionado diante da pena nos olhos de Richard — Soube alguma vez quem foi que a arrebatou do seu lado?
— Sim — disse olhando William. Tinham concordado em não dizer a Brand como tinha morrido Lady Tanith Dumont, temendo que usasse o ódio de Brynna pelos normandos como desculpa para não casar com ela. Já não importava.
William colocou sua enorme mão sobre o ombro de Richard, mas seu olhar cinzento estava fixo em Brand.
— Nós o fizemos — respondeu em voz baixa, e se retirou.


A ponto de chegar a seu quarto, Brynna se deteve. Sir Luis atravessou em seu caminho, com um sorriso sombrio como a meia-noite.
— Parece que seu vestido alcançou seu objetivo, minha senhora. Seu normando não lutará. — enquanto falava, seus olhos percorriam os seios de Brynna com uma avidez que lhe fez querer esbofeteá-lo.
— Saia da frente, senhor — advertiu, com os dentes apertados.
Sir Luis obedeceu, abrindo caminho. Mas quando ela passou ao seu lado, voltou a dizer:
— Lástima que sua donzela conhecerá lorde Brand, o Apaixonado, antes de você.
Brynna se deteve e voltou-se, rapidamente, para enfrentá-lo.
— O que quer dizer?
— Alysia — um sorriso de desprezo surgiu em seus lábios. O fedor de cerveja amarga parecia penetrar por todos seus poros. Luis secou uma gota de saliva dos lábios com a mão, acentuando o desprezo que a jovem sentia por ele —, Dizem que o duque da Normandia que não pode visitar seu leito esta noite, porque o novo senhor solicitou Alysia em sua cama.
— Mentira! — reagiu Brynna, mas recordou o modo como Brand se inclinou sobre a cadeira de Alysia, com um sorriso muito terno — Não — disse bruscamente, descartando a imagem — Alysia está interessada em Sir Dante.
— Nesse caso, seu irmão deverá cuidar suas costas — Luis lançou uma gargalhada — Sir Alexander LaRouche, um querido amigo de seu senhor Risande, sentiu o frio aço de uma espada em seu peito, quando tomou o que Risande queria. Para seu prometido ninguém importa. Mata amigos e inimigos da mesma forma.
— Não — Brynna retorceu as mãos no vestido. Nada disto era verdade. Por que estava escutando esse canalha? — Você é um mentiroso! — deu um passo a frente—. Advirto-lhe, Sir Luis, se voltar a aproximar-se, informarei ao rei.
Luis encolheu os ombros.
— Faça o que quiser. Mas, enquanto você enche os ouvidos do rei, seu prometido estará enchendo sua donzela com sua semente.
— Não tem importância. Não me preocupo com o que faz — replicou Brynna, com ardor. Estava agitada, cravou as unhas nas palmas das mãos, mas não deixaria que o patife visse sua dor — Prefiro dar meu corpo a Brand, embora tenha tomado a cem de minhas donzelas, que dar a você!
Brynna ofereceu um tenso sorriso ao cavalheiro e escapou para seu quarto. Alysia! Sua querida amiga! Ai, como pôde ter acreditado em Brand? Brynna tinha visto os ternos sorrisos que ele dava a sua sensual donzela, seus sussurros secretos, e tudo debaixo do nariz de Dante. Ririam dela também? Ririam esta noite quando ele levasse Alysia ao seu quarto? Como pôde ser tão fraca para cair de novo sob o feitiço do patife? Sacudiu a cabeça, freneticamente, desprezando a imagem de seu sorriso sensual. Tinha matado seu amigo? Não, sua mente rechaçou a idéia. Luis era um mentiroso. Tinha que ser. Significaria que o homem que ela recordava era, na verdade, só um sonho, que o homem que desposaria era um bárbaro frio, calculista, insensível, que matava seus próprios amigos. Mas seu pai tinha advertido que o normando era perigoso. Havia dito que o sorriso angelical de Brand era enganoso. E ela tinha visto com seus próprios olhos. Como pôde ser tão tola? Com certeza, também não tinha amado à mulher do lago. Deve tê-la enfeitiçado também.
Mas eu o vi. Vi seu amor por ela.
Tinha que existir uma explicação para tudo isto. Brynna não duvidava do que tinha visto naquele dia. Não podia permitir. Não haveria nenhuma esperança em seu matrimônio se o fizesse. Saltou da cama e correu para a porta. Tinha que falar com ele, perguntar sobre Alysia e o "amigo”, que supostamente tinha matado. Tinha que olhar em seus olhos e descobrir algo, além de um frio mortal. Abandonou seu quarto e caminhou apressada, pelo corredor em direção as escadas, levantando o vestido sobre os tornozelos. Os corredores de Avarloch estavam vazios, mas risadas ainda se escutavam no grande salão. Diminuiu sua marcha, recordando de William da Normandia. Tinha que cuidar com sua língua, na frente do selvagem que parecia obter um intenso prazer, quando ela se zangava.
Brynna pressentiu um movimento em suas costas. Deteve-se e voltou a cabeça para olhar sobre seu ombro. As numerosas tochas acesas e o fogo na grande lareira central lançavam sombras, que dançavam sobre as paredes dos largos corredores. O piso de madeira rangeu. Sentiu sobre o corpo olhos de abutre, que a observavam como um animal agonizante. De repente um tremor lhe percorreu as costas. Deu um passo e se preparou para correr. Viu uma sombra mover-se e mãos saltaram para cobrir sua boca e a cintura, como demônios surgidos da vasta escuridão do inferno. Não podia respirar a mão lhe apertava a boca e parte do nariz. Arranhou o rosto, que se achava atrás dela, mas parecia que a dor não existia para a força que a tinha apanhado. Foi metade arrastada, metade carregada, pelo longo corredor, para um pequeno jardim, fora do castelo. Seu atacante a empurrou contra a parede de pedra, e deu a volta para que seu rosto se tornasse visível, sob as tochas que ondulavam sobre suas cabeças.
— Disse esta manhã que seria minha — Luis apertou a palma da mão contra sua boca, para sufocar seus gritos. Seu rosto estava muito perto. Um fôlego quente e azedo por causa do vinho e da cerveja revolveu seu estômago —. Estou farto de sua rebeldia — grunhiu, apertando as bochechas dela com os dedos — Desfila pelo castelo, vestida como uma prostituta e espera que os homens mantenham seu desejo sob controle, dentro das calças? — riu, enquanto usava a outra mão para tocar seus seios. — Todos os cavalheiros em Avarloch a desejam, querida Brynna. Todos os cavalheiros, exceto Lorde Brand — rasgou seu vestido e a camisa debaixo dele, expondo seus brancos seios.
Brynna lutou ferozmente, mas sem êxito. Voltou a cabeça e por um momento, conseguiu afastar a mão que cobria sua boca.
— É homem morto. Meu pai...
A mão de Luis voltou a apertá-la, mas desta vez ao redor do pescoço, até quase fazer com que desmaiasse.

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Brand saiu do grande salão, sobressaltado ao saber que os normandos tinham matado à mãe de Brynna e zangado porque tinham lhe ocultado essa informação. Brynna tinha muitas razões para odiá-lo, pensou, subindo a escada. Tinha dado a ela a opção de aceitar um marido que já não sabia amar ou ser expulsa de sua própria casa. Merde, como podia sequer olhar para ele, sem que seu coração derramasse ódio? Tinha todo o direito de odiá-lo.
Caminhou em silêncio, passando pelo corredor, perto do quarto de Brynna. Quando chegou à porta, passou a mão pelo cabelo. Queria lhe dizer que sabia o que tinha acontecido com sua mãe e pedir perdão pelo que seu povo tinha feito.
Ninguém respondeu, quando ele bateu. Tentou outra vez, olhou de um lado a outro do corredor. Certamente, tinha retornado ao grande salão e ele não a tinha visto.
Ia se casar com uma mulher a quem não amava e que nunca poderia amá-lo. Estava sendo usado como um peão para libertar a Inglaterra de Lorde Richard, mas o preço era, na verdade, muito alto, pensou Brand, enquanto descia as escadas. Tinha que ter piedade dela e lhe dizer adeus. Mas aonde iria agora que seu pai partiria para a Normandia com o duque? A imagem de Lorde Richard lutando ao lado dos normandos, ainda o surpreendia. O homem não tinha nada contra o povo que gerou os assassinos de sua esposa. Como tinha conseguido curar seu coração depois dessa tragédia? Ao chegar ao primeiro piso, observou o longo e silencioso corredor. Um calafrio o percorreu, mas se desfez da sensação e entrou no recinto. Seus olhos percorreram o imenso salão, não havia rastros de Brynna. Com crescente desânimo, percorreu os corredores uma vez mais. Silêncio. Onde estava ela? Queria chamá-la em voz alta, mas os sussurros de seus sonhos invadiram seus pensamentos. Sabia que não responderia, do mesmo modo que Colette nunca o tinha feito, quando percorria os intermináveis corredores de Graycliff, em seus sonhos. Apertou os lábios para não gritar.
O piso rangeu sob suas botas. As portas o chamavam de ambos os lados do comprido corredor, mas não abriu nenhuma. Olhou diretamente para frente, enquanto se encaminhava para as portas do jardim, sabendo, de algum modo, que encontraria Brynna quando chegasse ao final do corredor.
Brand empurrou a fria madeira com a palma da mão. Uma explosão de ar fresco assaltou seus sentidos, quando abriu a porta e ingressou no jardim.
Escutou um grito abafado e voltou à cabeça, em direção ao som. Brynna estava apertada contra a parede, lutando cegamente com uma sombra, que arrancava seu vestido e afundava sua escura cabeça em seus seios. Uma fúria tão negra que ameaçava sua alma deu a Brand velocidade, agilidade e poder. Só demorou um instante chegar até eles. Estendeu a mão com a rapidez de uma flecha e a fechou ao redor da cabeça de Sir Luis. Com um rápido e eficaz puxão, Brand afastou o cavalheiro e esmagou sua cabeça contra a parede, em cima do ombro de Brynna.
O sangue que emanava da têmpora, do nariz e da boca de Luis salpicou o rosto da moça, mas só quando viu seu salvador, sentiu que um grito se formava em sua garganta. O corpo do cavalheiro inglês desabou depois do golpe, mas Brand não permitia a Luis que afundasse no chão. Agarrando-o pela gola da camisa, deu a volta e com um punho que voou como um martelo, enviou os dentes de Luis ao piso.
Luis caiu aos pés do guerreiro, e enquanto a jovem observava, com absoluto terror, o normando desembainhou a espada que levava na cintura. O som do metal saindo da bainha de couro pareceu prolongar-se eternamente na mente de Brynna. A espada já estava livre, brilhando com os raios da lua e a luz das tochas no jardim. Brand ergueu o braço, preparando-se para dar o golpe final.
Mãos enormes e poderosas imobilizaram seus braços no ar.
— O que está fazendo? O que aconteceu aqui? — era William. Seus olhos selvagens passaram de Brand a Brynna, que agora estava agachada em um canto, contra a parede—. Não faça, Brand — advertiu o duque, ainda lutando para evitar que a espada caísse sobre a cabeça de Luis.
Quase irreconhecível em sua ira, Brand tinha os olhos muito abertos, e ardiam com uma fúria tão terrível quando olharam ao homem que o estava detendo, que William quase o libertou.
— Ele estava tentando violá-la.
— Deixe-me levá-lo diante do rei. É seu homem, Brand — suplicou William rapidamente, em voz baixa.
— Solte-me, William — foi um grunhido de advertência. O som distante de um trovão.
— Non! Evita uma batalha casando com ela. Agora, começará uma guerra por matar um dos cavalheiros do rei? A dama não sofreu nenhum dano. Olhe para ela —os olhos de William não abandonaram os de Brand, quando falou com Brynna —. Ele a forçou, senhora?
Por um momento Brynna não pôde responder, devido ao medo que lhe apertava a garganta.
— Forçou-a? — inquiriu o duque, com severidade.
— Não.
— Ah, vê? — insistiu William.
Brand ergueu seu gélido olhar para seu amigo.
— Advirto a você pela última vez, solte-me.
— Muito bem. Podemos nos bater em duelo pela manhã, mas não permitirei que o prendam, por matar este montão de imundície. Baixe a espada, agora!
Brynna afundou no piso, protegendo os ouvidos do terrível trovão da voz de William, que produziu um eco no jardim. Começou a chorar.
Os olhos de Brand se dirigiram para ela, e depois, para o ensangüentado e temeroso rosto de Luis. Brand queria matá-lo. Não importava a prisão, nem a guerra, nem nada. Podia cheirar o sangue de Luis no ar, queria acabar com ele. De repente, e com uma força que enviou William cambaleando para trás, Brand libertou seu braço com um puxão e deslizou o fio da espada, tranqüilamente, pela garganta de Luis, num piscar de olhos. Quando terminou, voltou seu olhar para o duque, antes de lançar a espada no chão.
— Nenhum homem voltará a tomar o que é meu, ou sequer tentar, em minha casa.
O duque da Normandia assentiu, lentamente, olhando uma vez mais à mulher, antes de abandonar, em silêncio, o jardim.
Um pranto afogado prendeu a atenção de Brand. Caiu de joelhos frente a ela, que tinha a cabeça baixa. A rede de prata tinha sido rasgada, na luta com Luis e o cabelo de bronze caía sobre seus ombros nus, até a saia.
— Está ferida? — perguntou, gentilmente, estendendo sua mão para alisar as mechas de fogo e afastá-las de seu rosto — Brynna?
Ao erguer seu rosto, viu seus olhos verdes, que brilhavam com temor e lágrimas. Olhou o formoso e sombrio rosto de Brand, onde há apenas alguns instantes, a paixão que governava seu coração se transformou em uma fúria, completamente aterradora. E embora ainda restassem alguns indícios disso, uma terna preocupação tomava seus olhos.
— Que tipo de demônios o possuem? — perguntou Brynna, fracamente.
Brand se afastou, como se ela estivesse segurando uma tocha acesa sobre sua pele.
— O que?
Deslizando as costas contra a parede, Brynna ficou de pé. Colocou o tecido rasgado do vestido sobre seu seio exposto.
— É tão frio. Não teme nada. Nem ao duque William, nem ao rei. Nem sequer à guerra...
— Ele estava a ponto de te forçar! — gritou Brand, ficando de pé.
— Sim! E então o matou diante de meus olhos!
— E isso a perturba, depois do que ele fez?
— Não sou um bárbaro como você, meu senhor — anunciou Brynna tranqüila e seca.
Um olhar de gelo puro, de um tom azul cristal, percorreu a carne aveludada, que aparecia sob seus dedos.
—Talvez esteja desiludida, porque cheguei antes que acontecesse alguma coisa.
A mão de Brynna açoitou o ar. Seus dedos arderam quando se encontraram com o rosto de Brand. Ele girou seu rosto uns centímetros, com a força do golpe, seus olhos voltaram-se para ela, frios, mas já não gélidos. Olhou-a fixamente por um momento. Sem dizer uma palavra, deu a volta e abandonou o jardim.

 

 

 

 

 

 

 

 

Capítulo 9

O amanhecer se infiltrava no quarto de Brand, os raios de luz iluminavam sua cabeça. Abriu os olhos, apagando as imagens de Colette de sua mente. Por um momento, permaneceu imóvel, recostado de barriga para baixo. Nada se movia quando a realidade caiu sobre ele. Piscou e olhou através da coluna de luz junto a sua cama. Por que me traiu? Queria gritar. Queria que Colette
dissesse como tinha podido enganar-se tanto com ela. Como tinha permitido cegar-se pelo amor, a ponto de não ver seus próprios pés caminhando para a toca do lobo? Sempre tinha acreditado em seus instintos. Como guerreiro, não podia errar. O engano mais simples podia custar a vida a ele ou a seus homens. Havia confiado a Alexander a sua.
Sentou-se, esgotado, e balançou as pernas sobre a beira da cama. Novamente, tinha sonhado que caía de um precipício. Passou os dedos pelos cachos e amaldiçoou, entre dentes. Havia se sentido tão seguro de seus passos, e, entretanto, tinha caído. Como podia voltar a confiar em seus instintos?
Foi para a cadeira, onde pendurava suas meias e suas calças de linho leve, amaldiçoou outra vez e as colocou. Bateram na porta. Alysia com sua cerveja, pensou Brand grato.
— Entre.
A porta se abriu com um golpe e o sorriso zombador e alegre de William iluminou o quarto, fazendo com que Brand caísse para trás.
— Bom dia! — William olhou a cama e o restante do quarto. Seu sorriso sumiu.
— Onde está a moça?
— Que moça? — disse Brand, sonolento. Não estava com humor para seu alegre amigo esta manhã.
— Alysia.
— Com Dante, provavelmente — disse Brand, franzindo o cenho. Ajustou as meias de lã sobre as coxas fortes e musculosas e prendeu a calça no quadril. Sentado na cama, calçou as botas e levantou a vista para olhar as escuras sobrancelhas de William —. Não devia ter deixado que ficasse com Dante. Este maldito quarto está congelado e está demorando com minha cerveja.
— Com Dante? — repetiu William, os olhos arregalados e cheios de desdém — Deu a moça para Dante, depois que eu a solicitei?
Brand ficou de pé e procurou uma túnica em seu armário. Suspirou.
— Não tinha intenções de trazê-la para meu quarto. Só disse isso porque gosta de Dante e eu não queria que você deitasse com ela.
William fechou a porta atrás de si e desabou em uma cadeira, com um ruído seco e pesado e uma expressão ferida desenhada em seu rosto.
— Só tinha que me dizer que Dante a queria. Não tinha que me enganar.
Brand fechou a porta do armário com força, ao não encontrar uma túnica apropriada.
— Ninguém pode "só" te dizer algo. É um bastardo obstinado, que não sabe o que é a palavra "não".
— Isso não o deteve, ontem à noite.
Brand abriu, bruscamente, a tampa de um baú gasto que trouxera de Graycliff e ainda não tinha sido desempacotado e olhou brevemente William, por cima do ombro.
— Não devia ter se envolvido. Este é meu castelo e esse sujo imprestável estava forçando minha prometida.
— E teria sido o castelo do rei, e a prometida de outro na próxima semana, se não tivesse falado com Eduardo em sua defesa, Brand. Goste ou não, há uma lei que impede de matar um guarda do rei. Sir Luis era um dos cavalheiros pessoais de Eduardo.
— Um fato do qual eu não me orgulharia, se fosse o rei Eduardo — disse Brand, secamente, enquanto examinava uma túnica de veludo escarlate.
Um leve sorriso complacente se desenhou nos cantos da boca de William.
— Isso é o que eu gosto em você, Brand. Não se importa se o Rei ameaçar te jogar nas masmorras. Coisa que não fará agora, que tivemos nossa pequena conversa. Mesmo assim, espera você em seus aposentos, para que informe sobre o que aconteceu ontem à noite.
—Tem minha gratidão — sorriu Brand, zombador, olhando de esguelha para William, antes de passar túnica pela cabeça.
— Sabe — William passou a perna sobre o braço da cadeira, sua bota gasta nas batalhas balançando no ar — Quando for rei, não vou tolerar nenhuma desobediência, nem sequer a sua.
Os cachos coroaram a abertura da túnica antes que o rosto de Brand emergisse, com seu sorriso sarcástico.
— Não dite normas tolas, e não terá que fazê-lo.
William suspirou e sacudiu a cabeça, sabendo que, tolas ou não, Brand só obedeceria as leis que escolhesse obedecer, sem importar de quem viessem.
— É inútil discutir contigo — concedeu o duque, ignorando a inocente expressão de vitória de seu guerreiro.
Bateram na porta.
— Entre - disse William, despreocupadamente, por cima do ombro.
Dante entrou no quarto, levando uma taça de cerâmica. Estava a ponto de explicar a Brand por que trazia a bebida, em lugar de Alysia, quando viu William e seus lábios se converteram em uma linha fina.
— Graças a todos os Santos! — gritou o duque, levantando—se de sua cadeira. Tomou rapidamente a taça da mão de Dante e a alcançou a Brand —, sua cerveja, por fim, chegou. Mas espere, o que é isto? — William estudou o rosto de Dante —, você não é Alysia. Onde está a formosa donzela esta manhã, patife?
Sem saber o que responder, Dante olhou seu irmão, por cima do ombro de William, mas Brand só sorriu. Dante encolheu os largos ombros e encontrou o olhar de William.
— Alysia está... Indisposta.
— Ah, indisposta! — exclamou William, preocupado, caindo uma vez mais sobre a cadeira — É perfeitamente compreensível então por que você está cumprindo os deveres da moça. Ao menos, é mais honrado que seu mentiroso irmão. — Olhou para Brand com severidade, enquanto resmungava. Então, voltou sua atenção a Dante.
— Também explica por que não estava ao meu lado ontem à noite, quando seu irmão matou Sir Luis.
— Matou? — a expressão de Dante passou de divertida a incrédula.
— Estava tentando se passar com Brynna.
— Sabia! Disse a você que eu não gostava do bastardo.
— Não o imite, Dante —William sacudiu a cabeça — Onde aprenderam a ser tão desonestos e sedentos de sangue?
— Contigo — responderam em uníssono.
Os traços severos de William relaxaram, em um sorriso amplo e satisfeito.
— Então eduquei bem aos dois.
— Agora diga-me — William se inclinou em sua cadeira e ofereceu a Dante uma careta ardilosa — o que quis dizer com "indisposta"?
Dante ergueu seus olhos para seu irmão, procurando ajuda, quando William o pressionou para que respondesse. Brand levantou as sobrancelhas e o humor curvou a comissura de sua boca, enquanto ele também esperava a resposta de Dante.

Brand saiu do quarto com William e Dante ao seu lado. Escudeiros e donzelas ocupados em suas tarefas matutinas se inclinavam, conforme os três homens passavam, mas ele quase não os notou. Tinha sentido o leve aroma de jasmim no ar e uma imagem de cabelos acobreados tomou conta de sua mente. Ela tinha passado por ali fazia apenas uns segundos. Menos mal, pensou, já que a senhora certamente desmaiaria na presença de uma besta tão desalmada como ele.
Brynna levantou a cabeça quando os três homens ingressaram no aposento. O coração pulsava com força no peito como sempre acontecia quando via Brand. A rica túnica escarlate que usava o tornava especialmente sedutor esta manhã. A cor rubi profundo do veludo trazia calor a seu olhar. Os cachos caíam desordenados sobre seu rosto e o faziam parecer encantador e divertido. Brynna lembrou-se que tinha que respirar, enquanto avaliava o andar de seu prometido. Era alto, mortalmente rápido, costas largas e forte. Possuía a graça de um lobo que contrastava com a musculosa densidade do tosco duque William, que parecia um urso.
Mas nenhum tecido luxuoso pôde suavizar os severos ângulos de seus traços, quando o olhar de Brand passou de Lorde Richard ao rei, que estava sentado em uma cadeira forrada de veludo dourado. Seu olhar abatido pousou ali por um momento, antes que seus olhos se deslocassem, como um incêndio florestal, de Eduardo a Brynna.
O rei Eduardo ficou de pé. Estudou o cavalheiro normando, franzindo o cenho diante da leve reverência que fez um gesto que parecia mais de ironia do que de respeito. Eduardo se arrependeu de ter escutado William e não ter apressado a morte do cavalheiro normando, na noite anterior.
— Por favor, sente-se, Lorde Brand — disse o rei, com os lábios tensos.
William grunhiu e lançou a Eduardo um olhar mortífero, quando passou ao seu lado e sentou-se junto a Lorde Richard. Brand escolheu a cadeira mais próxima de Brynna.
— Senhora — saudou-a, tranqüilo, antes de sentar-se, seus olhos ardiam e suas narinas se agitavam, levemente. Ela estaria ali para acusá-lo diante do rei? Arrependeria-se de sua decisão de ficar em Avarloch se fosse assim.
Brynna podia sentir a força de Brand ao seu lado, como se um escudo de aço o cobrisse. Assentiu cortesmente, retorcendo-se inquieta em sua cadeira. Cruzou as pernas e levou a grossa trança acobreada às costas. Incapaz de ignorar sua imponente presença correu os olhos verdes, que apareciam sob seus espessos cílios, para o suave linho negro que cobria as grossas coxas dele. A perna dobrada estendia-se além da sua, que parecia frágil e diminuta em comparação. Ele é um homem, disse uma voz dentro de sua cabeça. Puro poder, firmeza de guerreiro. Seu corpo, uma arma capaz de matar qualquer coisa que ameace o que lhe pertence. Mas Brynna não podia evitar a lembrança de sua carícia quando agarrou-se a ele, logo depois de ter sido descoberta pelo duque normando no primeiro dia em Avarloch. O amparo de seu prometido também podia tomar a forma de um abraço forte, mas terno.
— Lorde Brand — a voz do rei trouxe Brynna ao presente —, o que tem a dizer em sua defesa, diante de suas ações na noite passada?
O sorriso preguiçoso de Brand era mais perigoso que um grunhido.
— Estava possuído por demônios, Meu Rei.
Junto dele, Brynna fechou os olhos, afogando um suspiro. A ira de Brand ferroou seu coração.
— Quero a verdade, não uma explicação surgida do temor — advertiu Eduardo, despedindo com um gesto rápido da mão um criado que tinha entrado no aposento, com uma bandeja de cerveja. O criado olhou para Brand, e o senhor do castelo de Avarloch sacudiu a cabeça, em um gesto gentil, indicando que se retirasse.
— Quero saber o que aconteceu com a dama, Lorde Brand — inquiriu o rei.
Brand sentou-se, despreocupadamente, com os cotovelos sobre os braços da cadeira, e as mãos cruzadas. Piscou lentamente, como um gato que observa um camundongo, sabendo que tem todo o tempo do mundo para matá-lo.
— Não falo por temor — uma sombria neblina cobriu o azul esverdeado de seu olhar, mas sua voz era calma — Depois de comer em meu castelo, o homem atacou minha prometida. Teve sorte de que lhe cortasse a garganta com tanta rapidez.
O rei Eduardo simplesmente olhou para Brand, e voltou o olhar para William.
— Este homem é um monstro. Um monstro com o qual você terá que lutar algum dia.
— Assim seja — respondeu William, secamente.
— E eu também sou um monstro — se interpôs Lorde Richard —, pois se tivesse apanhado seu cavalheiro tentando forçar minha filha, o teria aniquilado, com minhas próprias mãos.
— Como eu, meu novo amigo — William sorriu jovialmente para Richard.
— São três loucos desalmados — disse Eduardo, com desprezo.
—E é por isso que nós lutamos nas batalhas, enquanto você simplesmente observa e dá ordens de uma posição bem protegida — adicionou Brand impaciente. — Este castelo me pertence, como você mesmo decretou por sua própria mão. Protegerei a todos que vivem nele com minha vida e sem temer às conseqüências.
— E ele não tem por que prestar conta de seus atos, Eduardo — adicionou por sua vez William, seriamente.
Eduardo ignorou William, vendo que a presença do duque ali era inútil. Amaldiçoou-se por pensar que este primo normando estaria do seu lado contra Lorde Brand Risande. O rei se voltou para a Brynna, esperando que a dama lhe desse um relatório civilizado do que tinha acontecido.
— Achava-se em perigo em presença de Sir Luis, senhora?
Brand ficou rígido, esperando sua resposta. Brynna sabia que esta podia ser sua oportunidade de recuperar Avarloch. Mas quanto tempo passaria até que o rei se livrasse de seu pai, desta vez sem piedade? Os olhos severos do rei não expressavam nada além de ódio por Brand, e se ela dissesse o que ele queria escutar, seu prometido seria encarcerado. Recordou como havia ofendido Brand quando o chamou de "bárbaro", logo depois de ter evitado que fosse violada. Não compreendia as atitudes dos homens, mas compreendia o que era a honra, e embora a fúria de Brand a assustasse, sabia que nunca mais o questionaria, quando a estivesse protegendo.
— Sim, meu Rei, temi por minha vida — Brynna começou, com calma, seu relato —Sir Luis rasgou meu vestido e estava estrangulando-me, quando Lorde Risande nos encontrou. Sir Luis disse que me violaria, e que todos os cavalheiros a seu serviço queriam fazê-lo... Exceto meu prometido.
A sala foi invadida por um silêncio tão grande que podia escutar o crepitar das chamas sobre a cera das velas. Brynna voltou a cabeça para olhar Brand. Não tinha sido sua intenção dizer, mas agora que estava dito se alegrava. Já não tinha sentido ocultar. Todos sabiam que Lorde Risande teria preferido uma batalha do que casar-se com ela. Provavelmente todos também sabiam que havia se deitado com sua donzela Alysia na noite anterior. Os olhos de Brynna recaíram sobre suas mãos, que se agarravam às dobras da saia de seu vestido de cor açafrão.
— Embora ele não deseje, serei a esposa de Lorde Risande, Meu Senhor — afirmou ela, tentando ignorar o gelo que emanava de seu prometido ao olhá-la — Ele só estava protegendo o que lhe pertence — permitiu-se olhar Brand nos olhos — Como faria qualquer guerreiro.
Sua fantasia sorriu, mas estava longe de sentir prazer com sua resposta. Mais ainda, parecia a ponto de lhe cortar o pescoço. Não, pensou Brynna rapidamente, captando algo mais na leve curva de seus lábios. Não estava zangado com sua resposta, porque pensava que ela estava brincando de modo inocente com ele, e ele estava preparando para aceitar o desafio.
— Sua Majestade — continuou Brynna com mais cuidado agora, esperando convencer Brand de sua sinceridade —, estou grata ao meu prometido por me salvar de seu cavalheiro, e me ofendem estas acusações. Talvez, em vez de repreendê-lo, Sua Majestade deveria questionar a honra de seus homens.
Os olhos do rei se suavizaram com resignação, sabia que acabava de perder esta batalha. Como podia castigar o desafiante cavalheiro sem parecer que não se importava a segurança de sua própria gente?
— Muito bem — suspirou—, uma vez que você será sua esposa, e porque Sir William solicitou isso — lançou ao duque um olhar significativo — não seguirei interrogando Lorde Risande.
Brynna assentiu com um leve sorriso. Precisava saber se ainda havia dor no olhar azul de Brand. Não foi necessário.
Ele ficou de pé abruptamente, empurrando para trás a cadeira em que estava sentado.
— Terminamos sua Senhoria? Tenho outros assuntos para atender.
O rei Eduardo fez um gesto de despedida com a mão e antes que Brynna pudesse erguer os olhos, Brand se foi. Olhou para William. O duque se dirigia para ela com passos largos e elásticos e um sorriso amplo desenhado no rosto. Atrás dele, Eduardo e Richard se levantaram, para abandonar o aposento.
— Lady Brynna — William se inclinou sobre sua cadeira e tomou sua mão—, você, na verdade, é uma digna esposa para Brand. — Plantou-lhe um áspero beijo na mão delicada, deu-lhe um sorriso branco e abandonou a sala.
Brynna suspirou profundamente. Havia dito o correto para proteger Brand, e William estava encantado. Mas, ao mesmo tempo, tinha que admitir que estava em um jogo muito perigoso com seu prometido, e tinha fracassado.
Dante se levantou da cadeira, mas em lugar de seguir Brand tomou a cadeira de seu irmão, junto a sua futura cunhada. Sua boca carnuda desenhava um sorriso fácil que suavizava seu olhar cristalino.
— Meu irmão pode ser odioso e altivo, às vezes.
Brynna assentiu.
— E não esqueça mal-humorado e insensível — exalou um sonoro suspiro que fez Dante rir.
— Oui, ele pode ser assim — disse, agora sério— Mas ele é muito mais que isso. Temo que se esqueceu, ou talvez tenha medo de ser quem era antes.
Brynna recordou o homem do lago.
— Pode me dizer o que aconteceu, Dante? —perguntou gentilmente, pousando sua mão sobre a dele.
Dante olhou seus longos e elegantes dedos e ergueu a vista para olhá-la.
— Ele a amava, madame. Mas seu amor foi traído — começou.


— Lorde Brand! — o pai de Brynna alcançou o escuro cavalheiro no corredor —, por favor, permita-me expressar minha gratidão por resgatar a minha filha desse bastardo, e por proteger sua honra. Ela segue intacta.
Brand apertou a mandíbula. Sua prometida era virgem. E por que deveria surpreender-se? Nem todas as mulheres na Inglaterra abriam as pernas tão facilmente como fazia Colette.
— Ele morreu muito rápido — respondeu, com voz gelada.
Richard assentiu.
— Devo admitir que me preocupava que você não fosse tratar minha filha com amabilidade.
— Nunca lhe faria mal — argüiu Brand, sua irritação diante do insulto era evidente no tom de sua voz.
—Mas nunca a quererá tampouco.
Brand franziu o cenho, seus olhos se tornaram sombrios.
— Sei o que disse senhor, não há necessidade de recordar minhas próprias palavras. Brynna será minha esposa, e como sua filha mesma declarou, protegerei o que é meu, como faria qualquer guerreiro. Nisso tem minha palavra. Isso é tudo o que deve lhe preocupar.
— Sim, disse isso, por certo. — Richard o olhou com os olhos entrecerrados. Recordou o frio brilho no olhar deste homem quando Brynna sugeriu que a única razão pela qual ele a tinha protegido era porque lhe pertencia —, e você pareceu zangar-se, por quê?
Inquieto, Brand ofereceu a Richard um sorriso irônico.
— Não me interessa o que ela pensa de mim. O que quer que você acreditou ver, enganou-se.
— De verdade? —perguntou Richard, duvidoso.
— De verdade — respondeu Brand quase grunhindo.
— Muito bem. Equivoquei-me, então — sorriu e procedeu cautelosamente—. Mas não me equivoco quando digo que minha filha necessita de amor além de amparo.
Brand grunhiu, baixou a vista um segundo e logo voltou a levantá-la.
— Então talvez ela não pertença a Avarloch, apesar de tudo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Capítulo 10

O agudo vigor do ar invernal tocou o rosto de Brynna quando saiu ao parapeito. Ajustou a capa, defendendo-se do frio que arrancava o feno dos fardos empilhados contra a parede. As palavras de Dante ressoavam em seus ouvidos como o uivo do vento. "Seu amor foi traído...”
— Lady Colette de Marson... — Dante tinha dado um nome à beleza de cabelos de seda, e o pronunciou quase sem fôlego. Enquanto Dante lhe contava sobre a apaixonada de Brand, seus olhos se obscureceram até adquirir um tom cinzento-O cabelo lhe caía sobre as costas como uma cascata dourada. Sua voz era mais doce que qualquer néctar. Todos a amavam. Mas Alexander a desejava. Todos sabiam. Devíamos ter dito a Brand. Talvez nada tivesse acontecido. Mas Alex era um soldado leal e um amigo de confiança. Nunca pensamos...
Brynna entrecerrou os olhos e olhou para o bosque distante, coroado por uma miríade de cores do outono tardio. Um vento ergueu a capa ao redor das pernas, arrebatou mechas acobreadas de sua trança e as fez dançar sobre seu rosto. Brand trouxe o frio consigo, pensou novamente. Um frio que substituía a paixão que uma vez tinha dado vida. Um frio que protegia seu coração da angústia e da traição das pessoas que tinha amado pessoas nas que tinha acreditado.
— Ele grita seu nome durante a noite — tinha confessado Dante —, posso escutá-lo de meu quarto. Entretanto, não menciona seu nome quando acorda. Nunca pronuncia seu nome — a pena penetrava a voz de Dante e Brynna pensou que talvez tivesse esquecido que ela estava sentada ao seu lado enquanto falava - Talvez não devesse tê-la expulsado — Dante tinha sussurrado seus pensamentos em voz alta.
— Por que me diz isto? —perguntou, mas não queria escutar mais.
Dante encolheu os ombros, como se o peso da dor de seu irmão fosse muito para carregar sozinho.
— Talvez você possa fazer com que a esqueça. Quero que você o compreenda: ele vive com as promessas que tem feito, mas que nunca poderá cumprir.
Brynna tremeu e ajustou a capa. Assim, havia algo de verdade nos rumores. Brand tinha encontrado Colette e seu amante juntos. Caminhou aos estábulos para ver sua égua prenhe, as imagens de Brand e Colette voltaram a vida na mente de Brynna. Tratou de afastar suas lembranças, menos a do sorriso de Brand. Pertencia a Colette de Marson. Quantas vezes essa mulher tinha visto seu sorriso? Quantas vezes ele tinha lhe oferecido seu coração?
— Bom dia, Peter — saudou o jovem do estábulo ao abrir as pesadas portas das cavalariças.
Peter deixou de varrer o feno e levantou a cabeça. Um brilhante sorriso cruzou o rosto, enquanto uma rajada de vento soprava para o interior do estábulo, esparramando o feno a seus pés.
— Bom dia para você, minha senhora. — Peter deixou a vassoura e a ajudou a fechar as portas. — Falta pouco para chegar o inverno. Por sorte, o potro nascerá logo, se não, sua tenra carne congelaria.
Seus olhos de cor esmeralda se ajustaram a tênue luz das velas e aos magros raios de luz que penetravam pelas velhas paredes de madeira. O olhar de Brynna recaiu na enorme égua castanha que estava no estábulo com o ventre inchado, o dobro de seu tamanho.
— Como vai? — perguntou, caminhando para a égua.
— Bom, não vai parir hoje. Ainda está de pé. — Peter seguiu varrendo.
A moça passou a mão pela mancha branca e aveludada, em forma de diamante que a égua tinha entre os olhos.
— Invejo você — sussurrou ao animal—, dar vida a outro ser é algo maravilhoso.
As portas rangeram em suas dobradiças e a brilhante luz matutina invadiu o estábulo, quando Brand entrou, com uma explosão de ar frio.
— Meu senhor. — O sorriso do Peter se desvaneceu ao ver o homem frente a ele.
Brand deu uns poucos passos em direção a Brynna. Seu olhar era tão decidido como o de uma águia que acabava de vislumbrar sua presa.
— Deixe-nos — havia uma crua exigência em sua voz, que fez com que Peter deixasse cair a vassoura imediatamente e saísse depressa do estábulo, fechando a porta atrás de si.
— O que está fazendo aqui? — perguntou Brand. Sua presença a entorpecia. Por amor de Deus, ele era tão cru quanto o inverno mais cruel, e tão formoso como um negro lobo solitário sobre um campo recém nevado. Quase não conseguiu respirar quando ele se aproximou.
— Ele grita seu nome durante a noite... — ouviu Brynna por sobre o tranqüilo tom de sua voz—. Minha égua... Está prenhe. Eu v-vim v-vê-la — gaguejou à medida que Brand se aproximava olhando os lábios e o pescoço, enquanto ela falava.
Por sorte seu poderoso olhar a abandonou antes que se derretesse por completo. Ele levantou a mão para acariciar a suave pelagem da égua.
— Ssh... tudo está bem — a acalmou, quando a égua soprou e afastou a cabeça diante do contato do estranho. Sua voz era tranqüila, sua respiração tão suave como um sussurro. Elogiou a beleza da égua, suas finas linhas e a redondez de seu ventre. Esperou, pacientemente, enquanto o animal soprava e chutava para trás, mas não passou muito tempo até que a égua aproximasse sua cabeça, acalmada por sua voz gentil, ansiosa do contato de uma mão tão terna.
Brynna o observou emocionada pelo modo quase comovedor como falava com a égua, como se compreendesse o temor do animal. Mas como podia? Sabia que este homem não temia nada.
—Você acalma muito bem o medo, meu senhor.
Brand voltou o olhar para ela, enquanto acariciava a cabeça da égua.
— Mas não o teu — assinalou ele com doçura.
Brynna riu. O som era forte e forçado.
— Não tenho medo, meu senhor.
Ele levantou uma sobrancelha preguiçosa, estudando-a.
— Sou um guerreiro possuído por demônios, não esqueça.
Até na tênue luz do estábulo, Brynna podia sentir a força de seu olhar. Sua mandíbula era agressiva, sua boca sensual quando lhe ofereceu um sorriso franco, masculino. Ela baixou a vista.
— Eu... eu não quis dizer...
— Quis dizer o que disse — aproximou-se mais dela, muito perto, na realidade. Observou-a com olhos que sondavam sua alma. — Sou um bastardo sem coração e desumano, que vê o que quer e toma. Não é assim, Brynna? — Seu fôlego roçou o rosto. Sua voz se tornou mais profunda, já sem nenhum toque de ternura.
— Não, meu senhor, eu... — as palavras da jovem ficaram presas em sua garganta, a meio caminho entre um suspiro e uma exclamação, enquanto ele roçava o suave contorno de seu rosto com a ponta do dedo.
—E acha que não te desejo. — Estava tão perto que podia sentir o aroma de seu cabelo, mas se moveu mais perto ainda, até que seu peito firme roçou os seios ofegantes. Apoiou os lábios brandamente contra a têmpora de Brynna —. Mas eu te desejo.
Fechando os olhos, ela deixou que seu quente fôlego a tomasse. Ele tinha acendido um fogo abrasador em algum lugar debaixo de sua cintura, um fogo que subia direto até seu coração. Os lábios de Brand enviaram uma chama ardente que desceu pelo canto de seu rosto para o pescoço, onde ele beijou sua leve pulsação.
— Acha que não posso ser gentil. — Sua boca voltou a subir encontrando a dela, em um beijo ávido que lhe tirou o fôlego. Deslizou a mão ao redor de sua cintura, para aproximá-la da firmeza de sua virilidade. Aproximava-a mais e mais... até que ela pensou que se fundiria a ele. Assolou sua boca com cruel perícia. Sua língua passou sobre a dela, brandamente, confirmando que podia ser gentil. Quando passou as palmas quentes das mãos sobre o batimento do coração em sua garganta, Brynna gemeu. Ele se afastou tão lentamente que ela quase caiu em seus braços poderosos. A respiração de Brand tornou-se pesada e entrecortada.
— É tão formosa — sussurrou. Levantou uma mão e suspirou, ante a suavidade de seu cabelo enquanto o alisava sobre sua fronte. Tinha esquecido como era bom segurar uma mulher em seus braços, e o corpo de Brynna se entregou as suas carícias, sem resistência, enquanto deixava que ardentes flechas de fogo percorressem suas veias. Queria cobrir sua pele com o duro, ávido calor de seu corpo.
O desejo de Brand a devorou, seu contato era tão terno sobre sua pele que tinha vontade de chorar. Queria ser amada por este homem sensual. Incapaz de olhar esses formosos olhos e não ver a emoção que ansiava, Brynna baixou o olhar, lhe deixando ver o veludo escuro de suas pestanas. Ele sussurrou seu nome, inclinando a cabeça para beijar a comissura de seus lábios.
— Entregue-se a mim agora.
Que Deus tivesse piedade dela, mas o desejava. Tinha-o desejado desde o primeiro momento em que o viu. Uma paixão crua se agarrou nela, surpreendendo-a. Nunca tinha estado com um homem, mas a lembrança do êxtase de Brand enquanto nadava, tinha deixado aceso partes de seu corpo que enviavam rastros ardentes a suas bochechas. Como poderia sobreviver a suas carícias, a sua paixão? Sua força a consumia, tornava-a completamente fraca em seus braços, entretanto, estava certa de que a tomaria meigamente, acalmando a dor de sua paixão com sua voz de mel. Ela o desejava ansiosa por sentir sua força cobrindo-a... Mas queria mais. Queria que a olhasse como tinha olhado a seu anjo. Queria fazê-lo sorrir como Lady Colette tinha feito. Queria ser tudo para ele, e queria ver-se em seus olhos, senti-lo quando a acariciava.
E então, com toda a força que Brynna pôde reunir, e toda a dor que podia suportar, resistiu, e se separou dele.
— Não.
— Brynna... — Ele a aproximou novamente.
— Não! — ela deu um passo para trás—, não serei o que Alysia foi para ti ontem à noite.
Brand se deteve, a surpresa e um certo aborrecimento encheram seus olhos.
— Não me deitei com Alysia! Eu só disse a William...
Mas a voz de Brynna cobriu a sua.
— Serei mais que uma donzela para ti, Lorde Brand — ela insistiu... Exigiu.
Os olhos de Brand endureceram. Seu sorriso era como uma espada desembainhada, pronta para atacar, sua voz baixou para um ronronar provocante.
— Oui, você será mais, senhora — prometeu com um tom afiado no tom de voz— Será minha esposa, e então já não pedirei. Somente tomarei. — Deslizou a ponta do dedo sobre a boca de Brynna, secando a umidade que tinha ficado ali quando molhou os lábios, nervosamente. Ela o observou sem poder fazer nada enquanto ele levava o dedo a sua própria boca. Seus olhos azuis nublaram-se, com sensualidade, ao saboreá-la, seus lábios esculpidos tão perigosamente excitantes. — Tomarei o que quero como o selvagem possuído pelos demônios que sou.

 

Um ar gelado penetrou nos pulmões de Brand quando saiu do estábulo. Aspirou profundamente, deixando que o frio cortante atravessasse seu coração. Brynna já tinha uma opinião formada sobre ele. Era um bastardo desalmado que se deitaria com suas donzelas numa noite e com ela na seguinte. Apertou os dentes. Oui, tinha razão. Nunca o amor voltaria a cegá-lo. Desta vez, manteria os olhos bem abertos e não cairia nunca mais desse precipício. Sabia que tinha que tomar cuidado com esta mulher. Podia perder-se em seu temperamento incitante e na ternura que via em seus olhos. Diferente do calculado controle que se escondia atrás dos tímidos sorrisos de Colette, o sorriso de Brynna era tão franco quanto seu encanto. Não era difícil cair vítima do calor de seu olhar e da inocente paixão de seus beijos. Tinha que resguardar-se, preparar-se para este matrimônio como se preparava para a batalha, vestindo uma armadura resistente às flechas do Cupido. Lady Brynna Dumont era um rival perigoso.
Ao sair das cavalariças, Peter viu Brand aproximar-se, e instantaneamente, sentiu urgência de retornar ao interior. Mas era muito tarde para correr. O lobo o tinha avistado. Olhos agudos observavam, fixamente, como se fosse um tenro pedaço de carne.
— Você! — gritou Brand, apontando Peter com o dedo— Como se chama?
O moço do estábulo deu um pulo e parou.
— P-Peter, meu senhor.
— Peter, cuide da égua. Se houver alguma mudança em sua condição, quero que relate imediatamente — Brand não diminuiu a marcha enquanto falava e continuou caminhando para o castelo, como se estivesse em uma missão.
“Isso é tudo?” pensou Peter, ainda tremendo. Não o comeria vivo?
— Sim, meu senhor! — gritou o moço. A escura capa que flutuava ao redor do corpo do Brand parecia um par de asas de falcão, prontas para baixar sobre o castelo de Avarloch e devorar todos seus habitantes.

A imagem de um pássaro não foi a primeira coisa que veio à mente de William quando Brand entrou, apressado, pelas portas da frente, segundos mais tarde. Mas teria concordado com Peter de que o novo senhor de Avarloch parecia a ponto de cravar os dentes em alguém. O duque normando descansava comodamente em frente da enorme lareira, no grande salão, com uma perna envolta em couro apoiada sobre o braço da cadeira, uma taça de cerveja na mão e uma donzela de cabelos escuros em seu colo.
Brand caminhou rapidamente para ele com olhos severos e a mandíbula tensa.
— Quando vai partir? — perguntou, desprendendo o broche de prata do pescoço.
William murmurou algo no ouvido da moça, a dispensou com um sorriso terno e uma piscada libidinosa.
— Por quê? Está muito ansioso para me ver pelas costas? — O duque observou o suave vaivém dos quadris da donzela, enquanto abandonava o salão.
— Non. — Brand lançou sua capa sobre o encosto da cadeira e começou a caminhar de um lado para outro. — De fato, quero que protele sua partida por uns dias, sem dizer nada ao rei.
Agora William voltou-se para prestar toda sua atenção em Brand. Um ar severo dominava seu semblante.
— Por quê?
— Está convidado para minhas bodas.
William riu.
— Suas bodas! Primeiro não queria casar com a moça e agora está apressado como um homem que tem fogo nas calças. — Brand permaneceu em silêncio, enquanto seu amigo ria, até que a compreensão tomou conta do rosto do duque. Seu sorriso se desvaneceu.
— Ah, suas calças estão apertadas. —William suspirou, pesadamente — e por que não a toma agora? Para assegurar-se de que seja digna de seu leito matrimonial.
Brand pensou no modo como os dedos de Brynna se agarraram a sua capa e o modo como seus olhos se fecharam, com lânguido desejo, quando ele a beijou.
— É digna — disse.
Jogou-se em uma cadeira e fez gestos a um criado.
— Algo quente para beber — disse, e observou enquanto o homem desaparecia para cumprir com seu dever —. Acredita que me deitei com sua donzela Alysia — disse secamente, sem olhar para William.
— Ah! Está com ciúmes e nega suas atenções.
Brand lançou um olhar de aço para o fogo e as chamas dançaram crepitantes sobre a superfície de seus olhos.
— Não é seu afeto que quero.
O duque encolheu seus maciços ombros.
— Acha que só porque se casará com ela, estará mais disposta?
— Disposta ou não, terei o que quero — a voz de Brand soou tão vazia como uma promessa quebrada.
Os olhos escuros, de aço, estudaram-no atentamente.
— E o que é que quer Brand..., além de sua carne sob a tua, é obvio?
Silêncio.
— Não espero nada deste matrimônio.
William riu brandamente, e bebeu sua cerveja de um gole.
— Às vezes, as coisas que menos esperamos nos surpreendem de forma extremamente agradável.
Suspirando com impaciência, Brand relaxou em sua cadeira e cruzou os braços sobre o peito.
— Economize suas profecias, William, e diga o que está pensando.
O duque arrotou sonoramente e lançou a Brand um alegre sorriso.
— É um bastardo interessante, sabia isso? Todos passam correndo daqui para lá, ansiosos para beijar meu traseiro, mas você não... e ela não. Lady Brynna Dumont fará sua vida muito excitante, mon ami. Feliz, espero. Desgraçada, estou seguro. — William levantou sua taça vazia em direção a um escudeiro que passava e só teve que esperar o tempo de um piscar de olhos para que o escudeiro corresse para ele e enchesse sua taça.
— Vê o que quero dizer? — William mostrou um sorriso e bebeu seu gole —, você ainda está esperando sua bebida.
Brand não pôde fazer mais do que rir, e quando o fez, foi como se o sol iluminasse o grande salão e brilhasse especialmente sobre ele. Os anos se esfumaçaram com a luz. Olhos grandes e luminosos como os de um menino dançavam com despreocupado abandono e jubiloso entusiasmo. Observando-o, William percebeu, com o coração pesaroso, quanto tinha sentido saudades desfrutar da vida com seu amigo mais querido, Lorde Brand, o Apaixonado.
— Ela te devolverá à vida — disse William, em voz baixa enquanto era envolvido por uma onda de dor por tudo que seu amigo tinha perdido. Rápido, aspirou um forte fôlego que repôs seu espírito naturalmente alegre —. Sua Lady Brynna é um anjo fogoso. Se tivesse vinte anos a menos, brigaria contigo por ela.
— Perderia.
Mais risadas. O som era rico e cheio de jovialidade; os que passavam pelo salão sorriam ao escutá-los.
— Ficará então? — perguntou Brand.
— É obvio — uma vez mais, a calidez fluiu do tosco duque, quando sorriu a Brand. — Esperava que me pedisse isso. Eu gosto deste lugar e não me entusiasma a longa viagem para casa com este tempo.
— Mas tem sangue viking, certamente umas poucas ondas tempestuosas não lhe assustam — brincou Brand.
— Não me assustam — respondeu, com um gesto brusco—, revolvem meu estômago.
— Então fique até a primavera.
— Non. Mas ficarei um tempo — de repente, seu rosto escureceu: — devo preparar meus homens para a batalha.
Brand notou que sua bebida ainda não tinha chegado e olhou ao seu redor, procurando um criado.
— De quem é a terra que sonha governar agora? — perguntou impassível, sabendo que não passava um dia no qual um duque normando não estivesse brigando ou pensando nisso.
— A de Eduardo.
Brand deu a volta para olhá-lo, surpreso.
— Inglaterra?
William sorriu, examinando uma unha. Brand sentiu-se consternado, como tantas outras vezes, diante da ferocidade dos olhos do guerreiro. William parecia um leão excitado pela matança, contra a suave luz da lareira.
— Brincou muitas vezes sobre isso, mas nunca pensei que fosse sério.
— Por que não? — ergueu os olhos —. Eduardo me prometeu o trono. Harold de Wessex me desafiará, estou certo. Já está tomando decisões pela Inglaterra e Eduardo não faz nada, porque teme o pequeno bastardo. Mas terei a cabeça de Harold. E depois, terei toda a Inglaterra.
— Alegra-me não ser o rei — suspirou Brand, recostando-se na cadeira —. Com tantos homens planejando meu funeral antes de estar morto.
— Eduardo não é um homem jovem e não está bem, se por acaso não notou.
— Não notei — murmurou Brand secamente, e William lançou um olhar ardiloso, antes de continuar.
— Devo planejar meu futuro.
— Acho que ainda restam alguns meses antes que o homem estique as pernas — sugeriu com frieza.
— Se ficar, isso significa que Lorde Richard ficará também.
Brand assentiu.
— Sei. Acredito que deveria estar aqui para as bodas de sua filha. Quando não está me seguindo de perto, tratando de assegurar-se de que não maltrato Brynna, é um homem bastante agradável. — Seus olhos se entrecerraram sobre as ardentes chamas da lareira. — Pergunto-me quanto tempo levará Eduardo para enviar alguém para lutar comigo, como fez com Lorde Richard.
— Está preocupado?
O sorriso que Brand deu fez rir de novo o duque. William ficou de pé e bateu nas costas do amigo, com força.
— Isso significa que o rei não está convidado para suas bodas?
Brand jogou a cabeça para trás e riu e William ficou feliz. Porque embora seu cavalheiro preferido fosse tão desumano como ele no campo de batalha, sua risada podia encantar até seu mais odiado inimigo.
O duque deixou Brand momentos mais tarde e procurou pelos corredores a sua bem disposta donzela. Explodiu em uma sonora gargalhada ao escutar o forte e quase suplicante alarido proveniente do grande salão.
— Muito bem, pelo amor de Deus! Onde está minha maldita bebida?!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Capítulo 11


Brynna arrancou uma rama de hortelã do chão e provou. O broto fresco se derreteu em sua boca. Teria que recolher tantas ervas quanto fosse possível antes que o clima gelado destruísse a maior parte de seu jardim. O romeiro e o tomilho podiam pendurar na adega para a secagem, e quase toda a salsinha podia ser salva, se trabalhasse rápido. Seus malmequeres já estavam murchando. Ao ver as pétalas murchas, franziu o cenho.
Levantou-se ao amanhecer para poder começar cedo e ter um pouco de tempo a sós, antes que o castelo se enchesse de gente. Não recordava quando Avarloch tinha estado tão lotado. Quase não podia caminhar pelos salões, sem chocar-se com um soldado ou com o escudeiro de um soldado. Inclusive suas donzelas tinham deixado os bordados para atrair a atenção de algum guarda normando ou inglês.
Brynna ansiava por um pouco de paz e tranqüilidade para poder ordenar seus pensamentos, que estavam concentrados quase todo o tempo em seu futuro esposo. Não havia tornado a vê-lo desde que a tinha beijado no estábulo no dia anterior, e isso a aliviava. O modo como ela reagia cada vez que o via, desgostava-a terrivelmente. Não parecia uma gata no cio, choramingando com seus ávidos beijos? Surpreendia-se pensando nele todo momento. Até tinha insultado o rei na noite anterior quando quis sustentar uma conversa com ela durante o jantar! Era suficientemente inteligente para dar-se conta de que a voz monótona do rei Eduardo a teria submerso em um estado de letargia, até se não estivesse procurando o rosto de Brand entre os presentes no grande salão. Ao não encontrá-lo, ficou de mau humor e se retirou para seu quarto. Possivelmente, seu prometido estava na cama com outra de suas donzelas, pensou Brynna, e arrancou com força um ramo de hortelã do chão frio. O que precisava era uma bofetada que a devolvesse a razão.
Escutou um som atrás dela e deu a volta, percebendo que não havia nenhuma esperança de que sua razão retornasse. Brand estava parado ali, simplesmente olhando-a fixamente, enquanto sua determinação murchava como o repolho aos pés dele.
— Como me encontrou? — conseguiu dizer quando ele se aproximou. Não queria estar a sós com ele. Não podia confiar que não se jogaria em seus braços se lhe pedisse outro beijo.
— Seu pai me disse que podia estar aqui.
Levantou a vista para olhá-lo quando chegou ao seu lado. Queria perguntar-lhe por que tinha estado procurando-a, se tivesse tido coragem para ouvir sua resposta, ou se o vento parasse de brincar com seus cachos espessos, fazendo-os dançar ao redor de suas têmporas.
— Este era o jardim de minha mãe — disse e baixou os olhos para defender-se de seu tranqüilo olhar — Devo salvar o que puder, antes que a geada... — as palavras engasgaram, quando ele repentinamente se agachou ao seu lado.
— Lamento a morte de sua mãe. — O tom de sua voz era de aço aveludado.
Brynna levantou a vista e logo se amaldiçoou por fazê-lo. Sua proximidade perturbava seu pensamento e fazia com que seu sangue fervesse.
— Eu... — Maldito seja. Não podia recordar o que estava para dizer. Olhou-o, zangada por convertê-la em uma tola. Ele respondeu oferecendo um sorriso que acelerou seu pulso. Como conseguiria fazer algo agora que ele tinha interferido em seus pensamentos, como um raio de sol penetrando a escuridão?
— O que quer? — disse bruscamente.
— Você.
— Já tem meu senhor — disse Brynna, tentando ignorar o verdadeiro sentido que se infiltrava através de suas palavras: a excitante promessa de que a possuiria por completo — Obteve quando venceu meu pai.
— Nem sequer sabia que existia quando lutei com seu pai — argüiu Brand.
Mas ela sabia que ele existia. Detenha-se, Brynna, repreendeu-se recordando a crua, radiante emoção que tinha provocado o apelido "o Apaixonado": Esse homem se foi. Encolheu os ombros e colocou um molho de folhas em uma cesta, que tinha pendurada no braço.
— O que tiver que ser, será. Teremos que aprender a nos odiar com um pouco mais de discrição, entretanto. Não deixarei que meu povo saiba como somos desgraçados — ela o olhou, indignada, quando ele jogou a cabeça para trás e riu —. Não consigo ver a graça no assunto, Lorde Brand.
— Só pensava como deve ter sido vigorosa a vida de seu pai enquanto a criava. Com razão, é tão bom guerreiro. Teve anos de prática lutando com uma leoa.
Brynna jogou a cabeça para trás e tirou uma mecha dos olhos, deixando um rastro de terra na bochecha.
— Eu nunca reneguei meu pai! Certamente contou que coloquei fogo no cabelo da duquesa dos York. Asseguro-te, eu estava segurando a vela tão perto de seu rosto porque pensei que havia uma aranha caminhando pelo nariz. Como ia saber que era um lunar?
Brand a olhou, por um momento e desatou a rir, outra vez. Brynna queria zangar-se com ele, mas se surpreendeu sorrindo também. Sua risada era contagiante, sensual, e completamente sedutora. Surpreendeu-se olhando para ele, mesmo depois que deixou de rir e sorriu com algo mais que humor.
Limpou a terra da bochecha com os dedos.
— É irresistível. — Seu olhar capturou o dela um momento antes que uma sombra atravessasse em seus olhos. Sentou-se na grama, esmagando alguns ramos de hortelã e abraçou suas longas pernas contra seu peito. Um silêncio tomou conta do jardim, enquanto ele contemplava algo que esculpia linhas desumanas em seus traços.
— Nossas bodas acontecerão dentro de três dias.
— Tão cedo? — Brynna não quis que pensasse que a idéia de ser sua esposa fosse repugnante. Certo, era um matrimônio forçado para ambos, e na verdade, ela temia prometer entregar sua vida ante os olhos do Todo-poderoso. Não tinha idéia do que seria sua vida e tinha pensado que teria ainda algumas semanas para pensar.
O sombrio olhar de Brand deslizou para o seu.
— Eduardo partirá amanhã. William também irá logo. Pensei que te agradaria que seu pai estivesse aqui no dia de suas bodas.
— Desculpe-me. Agradeço sua consideração. Só pensei que teria mais tempo para me preparar. — Ele assentiu e pousou os olhos nas copas distantes das árvores. De repente, pareceu tão infeliz quanto Brynna tinha notado minutos antes. Dante disse que Brand era um homem difícil de entender, mas seus olhos eram como janelas abertas para expor seu interior. Ainda amava Colette de Marson. Desejava que fosse ela e não Brynna a mulher com quem se casaria. Era verdadeiramente uma tragédia, pensou ela enquanto lágrimas indesejadas inundavam seus olhos. Seu marido não só nunca a amaria como também amava outra pessoa. Não havia razão para chorar por isso. Simplesmente não se permitiria jamais apaixonar-se por ele. Dessa maneira, não importaria a quem pertencia seu coração.
Com esse pensamento fortalecendo o ânimo, Brynna decidiu fazer as pazes com ele no jardim de sua mãe. Ao menos, poderiam ser amigos, não? Afastou-se e cruzou o jardim até onde ainda floresciam suas apreciadas rosas selvagens. Estendeu a mão para tomar uma rosa vermelha, mas mudou de idéia, já que o vermelho representava o amor. Observou as outras e finalmente sorriu, decidindo-se pela branca, que significava pureza. Ela não era a mulher que ele amava, mas ao menos nunca o trairia.
Voltou para seu lado, agachou-se em frente a Brand e deu sua oferenda. Observou como sua inflexível expressão se dissolvia em um olhar silencioso, maravilhado. E, quando colocou os fortes dedos ao redor do caule frágil de tal forma que não se machucasse com os espinhos, o rosto de Brand se transformou numa expressão de gratidão tão comovedora, que Brynna soube que tentar não se apaixonar por ele seria impossível.

De sua janela Brynna observou o rei Eduardo e suas tropas perderem-se na distância. À medida que se afastavam do castelo de Avarloch, mais se alegrava de que tivessem partido. Pena que o duque da Normandia não partiu também pensou enquanto o vento soprava sua nuca. Lorde William a assustava, embora nunca deixaria que ele visse seu temor. Mas ao menos sua estadia significava que seu pai ficaria Estava grata e surpresa, que Brand tivesse convidado seu pai para ficar para as bodas. Parecia não lhe afetar a presença do velho cavalheiro em Avarloch, Lorde Brand Risande sabia qual era seu lugar ali. A posição de seu pai não o ameaçava.
Brynna se afastou da janela com um longo suspiro e observou seu vestido de noiva estirado sobre a cama. Suas pobres donzelas tinham trabalhado dia e noite para prepará-lo a tempo. Tocou a branca e brilhante seda e mordeu o lábio inferior. Brand tinha apressado a cerimônia para que seu pai pudesse estar presente? Ou queria desposá-la depressa para poder levá-la para seu leito? Não permitiria que voltasse a rechaçá-lo. Acaso alguma vez lhe importaria seu desejo de que seus apaixonados sussurros fossem reais? Sua união não significava nada para ele. Ela não significava nada para ele. Brynna recordou o modo como ele tinha falado com a égua, dizendo que era bela, momentos antes de dizer a Brynna que era formosa. Seria igual se ela fosse um cavalo; não importava. Não era Colette. Puxou o vestido e caiu na cama com um grande suspiro. Por que lhe importava? Dias antes se contentava em casar para manter a paz, não por amor. Mesmo depois de saber que seu futuro esposo era o homem com o que tinha sonhado, resignou-se a casar-se com ele sabendo que nunca a amaria. O que tinha mudado?
Lorde Brand o Apaixonado era um homem prisioneiro de seu próprio coração e Brynna ansiava libertá-lo. Mas como? Como podia romper o escudo e alcançar a escuridão? E se conseguisse, atreveria-se a amá-la? Deveria tentar? Tinha muitas perguntas, mas sempre apareciam mais. Como seria ser amada por ele, apreciada, protegida e cuidada além da imaginação? Levantou o vestido de noiva e o levou ao peito. Não o rechaçaria, nem lutaria com ele quando a tomasse. Aceitaria-o como seu marido e tentaria lhe ensinar a amá-la.
Não abandonou seu quarto durante o resto do dia, e quando chegou a noite pediu a sua donzela Lily que levasse o jantar a seus aposentos. Brynna se surpreendeu de ver Alysia em seu lugar.
— Onde está Lily? — perguntou da cama. O tom agudo de sua voz não foi registrado pela morena donzela.
— Sir William ordenou que jantasse com ele. É já é a quarta noite consecutiva — adicionou Alysia arqueando a sobrancelha.
— Pobre moça — murmurou Brynna com amargura, tocando a grossa manta que cobria sua cama.
Alysia riu como uma menina, deixando a bandeja em uma mesa próxima.
— Temíamos que Lily fosse encontrada na cama do duque totalmente ensangüentada... Ou sem fôlego, mas a moça nunca esteve mais vigorosa e saudável, desde que era um bebê!
Brynna esquadrinhou a jovem donzela, tentava detectar se sua donzela também parecia "vigorosa e saudável" depois de passar as noites com Brand.
Sem perceber o olhar examinador de sua ama, Alysia olhou para a janela aberta e se abrigou, com os braços.
— Está se formando uma tormenta na véspera de suas bodas.
Os olhos de Brynna se entrecerraram.
— Acha que é um presságio, Alysia?
— Não, minha senhora, só um infortúnio em uma ocasião tão maravilhosa.
— Ocasião maravilhosa? — perguntou Brynna com suspeita.
— Ai, sim! — Alysia se deu a volta para olhá-la, a felicidade iluminava seus traços exóticos —. Lorde Risande será um bom marido. É tão atraente, tão amável. — Alysia ficou séria, quase triste enquanto olhava Brynna. — Sei que não o quer, minha senhora, mas acredito que ele a fará feliz. É um cavalheiro tão galante, um verdadeiro senhor, um...
— Talvez você deva se casar com ele e não eu — a interrompeu Brynna mordaz.
— E o faria se fosse a senhora de Avarloch, e se eu não gostasse tanto de Sir Dante — anunciou Alysia com todo o entusiasmo de uma moça dez anos mais jovem.
— Sir Dante? — Brynna piscou surpresa.
A donzela lhe dirigiu um amendoado olhar cor de carvão e assentiu.
— Viu alguma vez um homem tão maravilhoso? — perguntou-lhe enquanto vertia cerveja morna em uma taça e a oferecia a Brynna.
Sua ama a olhava fixamente, incapaz de abrir a boca; franziu as sobrancelhas e sacudiu a cabeça, tentando clarear a confusão que a invadia.
— E Dante não se ofende que seu irmão tenha levado você para a sua cama?
— Que cama? — A cabeça de Alysia se ergueu de maneira tão brusca que quase deixou cair a taça. Brynna tomou a bebida antes que a cerveja derramasse sobre sua saia, e fixou o olhar em sua donzela.
— A cama de Lorde Brand, é obvio.
— Minha senhora! — Alysia suspirou levando as mãos ao peito, como se a surpresa fosse muito para ela. — Nunca estive na cama de Lorde Risande!
— Mas disse ao duque...
— Não! Lorde Risande me advertiu que dissesse ao duque que ele tinha me solicitado, para me salvar dos braços do duque. Juro, não dormi com seu prometido.
Brynna empalideceu.
— Acredito, Alysia. Está bem — a consolou, vendo as lágrimas cristalinas suspensas sobre as longas e negras pestanas da moça — Tentou me dizer isso nas cavalariças — disse mais para si que para Alysia, recordando a raiva de Brand quando o acusou de dormir com sua donzela.
— E você não acreditou? — Alysia se sentou na cama junto à Brynna e, ainda tremendo, tomou sua mão.
— Nem sequer dei a oportunidade de se explicar.
— Ai, minha senhora — suspirou a donzela —, se seus olhos não seguem a ninguém mais, além da senhora.
Brynna levantou o olhar, abandonando seu triste pensamento.
— O que quer dizer?
— Você tem que ter notado — insistiu Alysia.
— Notar o que?
Alysia emitiu um som que pareceu um resmungo, mas seu sorriso tornou-se radiante.
— Observa-a todo o tempo com olhos ardentes. Sir Conrad quase lhe cortou o braço, quando você passava por perto, anteontem. Seu Brand a viu, sabe, e quase parou o treinamento, só para olhá-la passar. Por certo, nota a maneira como olha para a senhora. — Brynna franziu o cenho.
— Isso não significa nada. Não sou mais que uma posse que ele deve vigiar.
— Ai, tolices! — agora a donzela bufou sonoramente, impacientando-se com a obstinação de sua ama — Quando um homem não pode tirar os olhos de cima, significa que é mais que uma posse para ele.
Sim, significa que me deseja isso é tudo.
— Onde está agora? — perguntou, tentando provar a seu acelerado coração que não se importava com seu prometido.
— Jantando com o duque e todos os outros.
— Perguntou por mim?
— Não, mas...
— Ah, viu?
— Minha senhora — Alysia disse brandamente, vendo a desilusão cuidadosamente dissimulada nos olhos verdes de Brynna—, está com todos seus homens e com o duque William. Os homens têm orgulho. Não revelaria que está ansioso para ter sua companhia, ririam na cara dele, quando anunciassem que você prefere comer sozinha.
Brynna só suspirou com os ombros cansados.
— Lorde Brand não se importa com o que os outros pensam dele, homens ou duques ou mesmo reis.
Alysia estudou Brynna com atenção, um leve sorriso se formou em seus lábios à medida que foi compreendendo.
— Você o quer.
Brynna esteve a ponto de protestar, mas de repente sentiu-se muito cansada de negar o que havia em seu coração. Assentiu, olhando fixamente a taça.
— Acredito que sim, mas ele nunca vai retribuir.
— Isso não é verdade...
— É —a voz de Brynna cobriu a de Alysia —, mas não importa Avarloch sempre deve estar em primeiro lugar. — levantou-se da cama e foi até a janela para observar a noite que caía sobre Avarloch —. Vá procurar seu cavalheiro, Alysia, e quando o encontrar, conte de seu amor. Olhe nos olhos dele e deixe que seu coração fale por ti.
— Ai, minha senhora — Alysia se aproximou dela, mas Brynna se voltou, sorrindo.
— Vá. Ficarei bem. Tenho muito que fazer, devo me preparar para amanhã.
— Deixe que a atenda — rogou sua donzela.
— Não, estou bem. Seriamente — assegurou Brynna em uma voz mais relaxada.
Alysia suspirou, não desejava partir, mas quando sua ama deu volta para olhar pela janela, a donzela tocou seu braço e saiu do quarto, em silêncio.
Brynna olhou a escuridão do parapeito e mais à frente, o bosque distante, desejando que Alysia tivesse razão a respeito de Brand. Provavelmente nem sequer se dá conta de que não estou ali.
Com um suspiro resignado, levantou o vestido de noiva e o colocou, com cuidado, sobre uma cadeira de encosto alto perto da cama. Colocou a camisola de gaze e se meteu na cama, sem tocar no jantar. Não pensaria mais em tudo isso. Não pensaria em nada.
Momento mais tarde alguém bateu na porta. Como pensou que era uma de suas damas, Brynna não se incomodou em colocar uma bata quando se levantou para abrir.
Ao vê-lo no marco da porta, Brynna conteve o fôlego: a expressão de Brand era tão sombria como seus cachos escuros. Vestia túnica e calças negras, mas a escuridão que o cobria não podia diluir o glorioso turquesa de seus olhos. Aparecia grande e poderoso contra a porta e o aroma do bosque o envolvia. A jovem pensou que parecia mais selvagem do que nunca, quando seus olhos a percorreram ardentes. Percebeu que a camisa de gaze que a cobria era fina demais, não ocultando nada de seu corpo. Sentiu calor em todos os lugares, ele a penetrava com seus olhos, como se fossem chamas lambendo seu corpo brandamente, apertando, queimando sua carne sob uma ardente carícia. Sabia que devia cobrir-se, mas gostava do modo como os olhos dele a faziam sentir.
— Está doente? — perguntou, com um tom brusco na voz.
— Não, meu senhor — Olhou seus olhos e piscou.
Intensificou seu olhar:
— De agora em diante, Brynna, você janta comigo. Se negar, virei te buscar em pessoa.
— Por quê? — olhou—o fixamente.
— Por quê? — repetiu ele, confuso pela pergunta. Quando ela assentiu com a cabeça e repetiu a pergunta, ele piscou — Porque seu lugar é ao meu lado — observou-a baixar os olhos e suspirar, como se suas palavras tivessem ferido a moça de algum modo —, E — acrescentou — porque torna mais suportável a companhia desses idiotas enganadores de William. Oui — assentiu como se ele mesmo acabasse de perceber isso. Passou os dedos pelo cabelo porque o que tinha descoberto o tinha incomodado —. Torna a noite mais agradável.
Brynna quase derreteu ali mesmo. Levantou a vista e lhe ofereceu um sorriso que o fez gemer. E fez o que tinha desejado fazer durante todo o ano. O resto de seus pensamentos se perderam quando lhe envolveu a cintura com seus braços e devolveu seu beijo inocente com um mais ardente. Reclamou sua boca com uma completa posse e domínio, firme e, entretanto, estranhamente tenro. Sua língua penetrou na profundidade de sua boca, devorando-a. Seu corpo se tornou mais firme e tenso. Antes que Brynna percebesse, libertou-a com a mesma força. Ficou parado, apertando a mandíbula, tão selvagem que Brynna pensou que arrancaria sua camisa e a tomaria ali mesmo, sem nem chegar à cama.
— Sentará comigo todas as noites enquanto jantamos e não voltará a me perguntar por que. Entendeu Brynna?
— Sim — respondeu ela sem fôlego, perfeitamente disposta a fazer o que lhe ordenasse. Ele assentiu, antes de partir.
Brynna fechou a porta e se apoiou contra ela, um sorriso cruzou seu rosto, antes de saltar à cama.

Amaldiçoando furiosamente entre dentes, Brand fechou com força a porta de seu quarto e tirou as botas, com um pontapé. Chamas corriam por suas veias. Disse a si mesmo que era a raiva que fazia com que seu coração pulsasse com tanta fúria, a raiva de ser abandonado e ter que sentar-se sozinho de novo junto a uma cadeira vazia, reservada para a dama do castelo. Mas sabia pela ânsia e o feroz pulsar abaixo de sua cintura que uma crua paixão era a verdadeira culpada. As imagens do corpo de Brynna turvavam seus pensamentos. A rigidez de seus seios, o modo como seus mamilos se apertavam sob a camisola transparente. Por Deus! Queria tocá-la. Queria enroscar os dedos em sua espessa cabeleira, incliná-la para que encontrasse o ardor de seu desejo. Queria morder seus sensuais lábios carnudos, afundar os dentes em seu pescoço e descer até encontrar os bicos de seus exuberantes seios. Brand amaldiçoou entre dentes, propondo-se a apagar a lembrança dela de seus pensamentos. Mas seu rosto permanecia ali, gravado em sua mente. Seu sorriso era tão sincero mesmo quando o estava desafiando, seu espírito tão intenso que o sentia mesmo quando não estava perto.
— Maldita seja, mulher, o que está me fazendo? — Brand estava ofuscado e tirou bruscamente a túnica. Nem sequer Colette o tinha deixado aceso dessa maneira. Caminhou de um lado para outro de seu quarto tentando controlar a necessidade de tomá-la. Não conseguindo, abriu a porta com um puxão e saiu tempestuosamente de seu quarto. Queria Brynna em sua cama, desejava-a mais que qualquer outra mulher que tinha conhecido. E ela o desejava, estava certo disso. Se não, nunca o teria tentado tão cruelmente. Oui, seus gloriosos olhos esmeralda o seduziam, seu sorriso o provocava, e seu corpo reagia ao dele, quisesse ou não.
Quando chegou à porta, golpeou-a com o punho. O sangue corria por suas veias, inchando seu sexo, fazendo com que seu coração se acelerasse. A porta se abriu. Brynna estava do outro lado, surpresa de vê-lo de novo. Seus lábios estavam separados como se fosse a dizer algo, mas Brand cortou a breve distancia entre eles, fechou a porta com um pontapé e a carregou em seus braços. Sua boca se apertou contra a dela e colocou suas grandes mãos sob suas nádegas, para levantá-la do chão.
Instintivamente Brynna se agarrou, com as coxas, em sua cintura para sustentar-se. Não teve tempo de assustar-se pelo brilho lascivo em seus olhos, nem tempo para perguntar o que o havia trazido de volta para ela. Sentiu-se embriagada, despreocupada, enquanto a língua ávida de Brand afundava em sua boca, enquanto sustentava com uma mão suas nádegas e com o outro braço a apertava fortemente contra seu corpo musculoso. Passou os braços ao redor de seu pescoço e emitiu um gemido tenso e suave, que fez com que o corpo de Brand explodisse, com um desejo incontrolável.
Ele empurrou seu corpo contra a porta, sem soltá-la, sem deixar de beijá-la. Queria tomá-la dessa maneira, seus músculos, seus nervos gritavam que a possuísse ali mesmo, forte, rápida, e brutalmente. Separou as coxas da jovem e apertou sua potente ereção contra o doce lugar entre suas pernas. Puxou a camisola, tentando tirá-la por seus quadris, mas o tecido estava enroscado entre seus corpos ansiosos. Os dedos impacientes subiram até o decote, mas em vez de rasgar a fina gaze, colocou as palmas das mãos sobre seus seios e se deleitou ante o contato. Quando seu mamilo endureceu sob seu polegar, Brand inclinou a cabeça e o apertou nos lábios, molhando o tecido.
Alguém bateu na porta e — não pela primeira vez —, Brand amaldiçoou William e se amaldiçoou por permitir que Richard Dumont permanecesse em Avarloch, quando escutou o pai de Brynna chamá-la do outro lado da pesada porta.
Brynna conteve o fôlego e entrou em pânico. Brand ficou tão encantado ao perceber que se sentia mortificada por ter sido descoberta dessa maneira, mesmo sabendo que se transformaria em sua esposa na manhã seguinte, que quase rompeu em gargalhadas.
— Um momento, por favor, pai! — disse sem fôlego e lançou a Brand um olhar assassino, ao ver sua expressão divertida — Solte-me — sussurrou frenética.
Ele sentiu que seus lábios se curvavam em um sorriso diabólico; com um movimento lento e implacável que quase a faz gemer alto como se fizesse isso para que seu pai a escutasse, Brand apertou-se contra ela uma última vez antes de separar seus corpos. Seus pés tocaram o chão, e ele ficou muito satisfeito diante do modo sonhar com que ela o olhava.
A voz de Lorde Richard atrás da porta fez Brynna pular. Quis afastar Brand com um empurrão, colocando as mãos em seu peito. Ele mal se moveu.
— Descarado — disse em um tenso sussurro. Então, mais alegremente:
— Já vou, pai — alisou o cabelo para trás e a camisola amassada, com as mãos ainda trêmulas, antes de abrir a porta.
Richard olhou sua filha, que parecia bastante aturdida e um tanto confusa, antes que seus olhos escuros pousassem sobre o homem que estava de pé atrás dela, em seu quarto, como se tivesse todo o direito de estar ali.
— Lorde Brand? — disse Richard, não muito seguro de como reagir.
— Lorde Richard, já estava saindo — Brand deu um sorriso tranqüilo e voltou seu olhar para Brynna. Levou o polegar à boca dela e deslizou sobre seu lábio inferior. — Espero ansiosamente amanhã. — Quando ela ruborizou, ele riu brandamente, com um afeto sincero que fez com que o coração da moça pulsasse em seus ouvidos.
— Vim dar boa noite — disse Richard, distraindo a atenção de sua filha do homem que se afastava pelo corredor. Não perguntou o que fazia Brand no quarto de sua filha uma noite antes de suas bodas. Pensou que era melhor não saber —. Boa noite, filha. — Richard a beijou no rosto e lançou um olhar para a porta do quarto de Brand uma última vez. Sentia-se aliviado ao ver que o lorde normando sentia algum afeto em seu coração por Brynna. Richard ansiava por esta segurança, especialmente quando sua filha não respondeu, mas suspirou com alegria e fechou a porta de seu quarto.

 

 

 

 

 

 

 

 

Capítulo 12

Com dedos ansiosos, Lily e Alysia fecharam os numerosos botões do vestido de noiva de Brynna.
Desenhado em um estilo saxão antigo, o traje estava confeccionado com uma capa de fina seda branca que acariciava a pele e se ajustava abaixo da cintura com um cordão prateado, de seda trançada. O tecido tinha sido confeccionado para agradar um marido, ao cair brandamente sobre o contorno dos seios insinuando os rosados mamilos. Uma capa, forrada de cetim e bordada na parte externa com motivos celtas cobria à noiva dos olhares alheios, e fluía em espessas e brilhantes dobras até o chão.
— Você é a visão de uma virgem pela qual um dragão daria a vida — Alysia deu um passo para trás para examinar sua ama logo depois de amarrar o cordão prateado ao redor da cintura.
Brynna juntou suas delicadas sobrancelhas, então começou a rir.
— E você, Alysia, é uma romântica incurável que sonha com tempos passados.
— Pode ser, mas estou certa de que fará seu marido ficar louco de desejo, quando a vir esta noite — respondeu à donzela, enquanto Lily escovava o cabelo de Brynna até obter um brilho de cobre e colocava um aro de diminutas margaridas brancas trançadas em um cordão de fina prata sobre a fronte.
Alguém bateu na porta e Alysia indicou a Lily que abrisse, enquanto ela procurava a capa de cetim. Tinha começado a amarrar os laços da capa, quando Lorde Richard entrou no quarto.
O lorde saxão parou na porta simplesmente observando sua filha, enquanto Alysia se afastava dela.
— Está tão parecida com sua mãe — pronunciou cada palavra com um nó na garganta.
— Obrigado, pai — Brynna sorriu e o olhou. — Espero que agrade Brand.
— Brynnafar — se aproximou dela e tomou as mãos —, se não agradar, então não há nenhuma esperança e a levarei para a Normandia comigo.
— Pai, eu não poderia...
Ele sorriu, levantando a mão para calá-la. Seus olhos se suavizaram com a emoção.
— Estou brincando, filha. É uma beleza muito especial e seu prometido sabe exatamente como eu soube, quando me casei com sua mãe. Ficará encantado, embora prefira não pensar nisso — adicionou com um gesto de desagrado. Ajustou a capa de sua filha para fechá-la completamente e sorriu com ternura — Recordo minha noite de bodas com sua mãe... — Sua voz se perdeu e os olhos de Brynna se encheram de lágrimas, observando a calidez e o amor que suavizavam o belo rosto de seu pai.
— Será feliz com este homem, Brynnafar — assegurou, secando as lágrimas dos olhos com seus dedos— Depois de passar um tempo com ele, percebi que cheguei a gostar dele — Richard se aproximou dela e lhe sussurrou ao ouvido para que suas donzelas não o escutassem —, apesar de que, se não fosse hoje seu casamento, ontem à noite o teria passado pelo fio da minha espada — piscou um olho para sua filha antes que ela pudesse responder. Lorde Richard a atraiu ao círculo de seus fortes braços e beijou sua bochecha brandamente —. Agora venha, antes que William mate de um susto nosso capelão e o matrimônio não possa ser celebrado.
Brynna riu e passou o braço pelo de seu pai, deixando que a guiasse para fora do quarto.

As velas dançavam sobre os polidos bancos de mogno. O incenso impregnava o ar da capela de Avarloch. Os homens de Brand estavam alinhados ao longo da parede enquanto os homens de Lorde Richard estavam parados, como estátuas de prata, na parede oeste. Os homens de William estavam sentados entre os convidados.
O colete metálico de Brand brilhava contra às milhares de pequenas chamas hesitantes, enquanto seus olhos azuis observavam, imperturbáveis, as grandes escadas esculpidas que levavam ao castelo. Estava a ponto de começar uma nova vida com uma mulher que o considerava um bastardo frio e cruel. Mas, na verdade, nunca tinha dado razões para que pensasse de outra maneira. Como conseguiria fazê-la feliz algum dia? Perguntou-se solenemente. E como tinha Brynnafar Dumont conseguido fazer com que se importasse com sua felicidade?
Pensou nos muitos momentos que tinham passado juntos desde que chegou a Avarloch. Por Deus, era uma mulher apaixonada. E que essas paixões ardessem até mais quando estava furiosa só a tornava mais atraente. Mas também tinha saboreado seus ardentes beijos. Oui, ela não tinha feito nada para negar que o desejava tanto como ele a ela. Essa simples certeza tinha bastado para mantê-lo acordado muitas horas depois de havê-la deixado a noite anterior. Sorriu à luz cálida das velas, surpreso pelo efeito que essa mulher provocava nele. Merde, que idiota era, mas lhe tinha dado uma rosa e o tinha protegido de seus espinhos. Como pôde tê-lo afetado tanto um ato tão simples? Não teve mais tempo para pensar. Quando se ouviu o suave som da harpa na igreja, aspirou profundamente.
— Não está pensando em fugir, não é? — sussurrou William perto de seu ouvido.
O sorriso de Brand se tornou mais amplo.
— Non, embora não tenho dúvida de que você saltaria para tomar meu lugar, se apenas me movesse.
— Com toda certeza — concordou o duque normando com uma forte palmada nas costas de Brand.
De pé atrás deles, o capelão limpou a garganta. Soou mais como um grunhido e quando William se voltou para olhar para ele, o homem de Deus o olhou indignado.
— Está esperando que a qualquer momento estripe alguém — disse William com um tenso sorriso de soslaio —. Minha reputação me precede.
— Não é de admirar —disse Brand —. Recorda as bodas de Lady Winifred? Tornou-a viúva antes que pudesse dar o sim.
O duque entrecerrou os olhos, recordando as fatídicas bodas.
— Ah, oui, agora recordo! — sua expressão se nublou um momento, Então, voltou a iluminar-se. _ Bom, não temos que nos preocupar de que aconteça algo assim hoje — bateu novamente nas costas e olhou o capelão sobre o ombro, com um sorriso ameaçador.
Fez-se silêncio na capela quando a noiva apareceu na entrada acompanhada por seu pai.
William escutou o homem ao seu lado inalar profundamente, como se estivesse preparado para uma execução, mas quando observou Brand, viu seu olhar maravilhado. O duque da Normandia sorriu levemente e se afastou uns passos de seu mais querido amigo.
As chamas refletiam sombras que dançavam sobre as paredes escuras e tingiam Brynna com uma luz estranhamente dourada. Ao observar sua fogosa deusa, Brand não podia ver nada mais que seus olhos. Lorde Richard lhe ofereceu a mão de sua filha, com um sorriso de genuína calidez, mas Brand quase não o viu. Como se Brynna fosse muito formosa para contemplar sem suspirar, seu prometido afastou o olhar. Repetiram os juramentos com promessas de obediência, honra e amor. O coração de Brand sofria ao pronunciá-los. Queria respeitá-los. Desejava com todo seu coração poder fazê-lo.
Escutando Brand prometer que a amaria, Brynna percebeu a esperança misturada em suas palavras. Levantou o queixo, endireitando os ombros. Era a filha de um guerreiro. Não importava quanto tempo levasse, o coração deste homem seria dela. Conquistaria o frio vazio que tinha sitiado seu homem fantasia. E o traria de volta. Tinha que fazê-lo, o bem-estar de seu próprio coração dependia disso.
Quando chegou o momento de beijá-la, Brand deslizou as mãos ao redor de sua delicada cintura sob a capa e sobre o fino tecido. O prazer que sentiu desenhou um sorriso nos lábios e o fez inclinar seu corpo para o dela com avidez. Brynna separou os lábios desejando seu beijo, que chegou tão lentamente, tão meigamente, que a fez tremer. Quando seus braços a rodearam por completo, a capa de Brand a envolveu, como as asas de um enorme pássaro negro e se escutaram votos dos cavalheiros e vassalos que os rodeavam. Mas o mais forte veio de William.
Brand finalmente se afastou. Um sorriso tão inesperado como uma chuva de verão tomou conta de seu rosto e Brynna lhe tocou a bochecha, temendo uma vez mais que não fosse real e que se desvanecesse se fechasse os olhos.
— Seu povo me aprova — a voz dele em seu ouvido lhe enviou uma comichão pelas costas.
Os olhos de Brynna percorreram os numerosos rostos sorridentes de seus cavalheiros.
—Também o seu, meu senhor.
— Então não devemos decepcioná-los — Seus lábios estavam quase sobre os dela e seu fôlego era tão quente como a paixão em seus olhos.

Com uma mão na cintura de sua esposa, Brand a guiou para o grande salão, onde a festa estava a ponto de começar. Havia largas mesas alinhadas que ocupavam todo o contorno do recinto, adornadas com ramos de rosas frescas. Grossos pratos de prata e taças localizados na frente de cada cadeira. A cerveja e o hidromel esperavam nos barris para encher as jarras de prata. Um verdadeiro banquete estava disposto: truta fresca assada e arenque salgado, porcos cozidos, enfeitados com uma miríade de frutas, além de aves e pães condimentados com especiarias. Os trovadores enchiam o ar com o doce som da harpa e do alaúde, enquanto os cavalheiros escoltavam às damas a suas cadeiras, junto aos numerosos servos e vassalos de Avarloch.
Brynna observou atentamente o salão luxuosamente decorado e não deixava de maravilhar-se, enquanto caminhavam para a mesa.
— De onde saiu toda esta comida? A dispensa está quase vazia devido à geada que se adiantou este ano.
— Dante e eu passamos quase todo o dia ontem caçando para ter comida fresca, e depois viajamos até a aldeia para fazer algumas trocas — Brand jogou um brincalhão olhar de soslaio —. Não sentiu saudades? Estive fora todo o dia.
— Foi você mesmo? — perguntou surpresa, enquanto avaliava a enorme quantidade de comida sobre as mesas — Por que não enviou os cozinheiros para fazer a troca?
Brand encolheu seus musculosos ombros.
— Só queria me assegurar de que tudo fosse de seu agrado.
Brynna finalmente deu a volta e levantou a vista para olhá—lo.
— Fez tudo isto por mim?
Brand se deteve e encontrou seu olhar maravilhado.
— Oui — disse simplesmente, como se fosse lógico que ela esperasse tal coisa.
— Obrigado — foi um sussurro. Não conseguiu dizer nada mais ante tanta consideração da parte de um homem que nem sequer a amava. Por todos os Santos, não podia nem imaginar o que teria feito se a amasse.
Lorde Richard foi o primeiro a oferecer sua bênção ao casal. Prodigalizou a sua filha com um grande abraço e, quando lançou seus braços ao redor de Brand, o sombrio guerreiro olhou por sobre o ombro para sua esposa, com os olhos muito abertos e incrédulos. Um momento mais tarde, William rodeou Brand e tomou Brynna pelos ombros.
— Posso beijar a noiva? — implorou o duque.
— Naturalmente — Brand tomou a mão de Brynna e a colocou frente ao rosto desiludido do duque. William observou o oferecimento como se estivesse chateado, e olhou Brand indignado.
— Isto não é o que tinha em mente.
— Mas é tudo o que vai obter — respondeu Brand, com um doce sorriso.
Com um olhar áspero, o duque beijou levemente a mão, balbuciando ainda antes de levantar a cabeça, que seu mais querido amigo nem sequer lhe tinha confiança com sua esposa.
Brynna observou o poderoso duque afastar-se, decepcionado, e finalmente ofereceu ao tosco guerreiro um sorriso que ele não viu.
— É um gatinho com enormes e mortais presas — concluiu em voz alta, e deslizou seu verde olhar para seu marido — Igual a você.
Voltando-se para ela com um sorriso de seda, Brand lhe roçou o lábio inferior com o polegar.
— Às vezes ser mordido pode ser intensamente agradável, esposa —adicionou a última palavra com um brilho feroz e sensual nos olhos.
Brynna lambeu o lábio onde o dedo de Brand havia tocado, enquanto seu sangue empreendia um selvagem caminho para seu sexo.
— Talvez eu possa morder a ti..., marido — replicou ela.
A expressão no rosto de Brand era tanto de surpresa como de encanto. Fez uma leve reverência, olhando-a fixo nos olhos com uma intensidade predadora sob suas escuras pestanas.
— Um rival feroz torna mais interessante a batalha. Uma que poderia durar toda a noite... Até a manhã — rebateu com um sorriso devastador e seus olhos brilharam com tanto ardor que Brynna sentiu que sua boca se tornava seca. Foi incapaz de sufocar um suspiro, ao sentir um estranho fogo lhe percorrendo o corpo. Juntou coragem e se aproximou, enquanto ele se endireitava e dirigia sua mão para a sedutora curva de suas nádegas. Ela pôde sentir a plenitude dele, ao levar seus lábios até seu pescoço.
— Quanto mais prolongada a batalha, mais doce a vitória, guerreiro —ronronou contra sua pele, então se afastou, olhando-o nos olhos com um sorriso triunfal. Mas Brand a puxou de novo para ele, pousando a mão obstinadamente em suas nádegas. Apertou, levantando seus quadris até seu membro ereto, o que fez com que os olhos da moça se arregalassem.
— Ou uma derrota mais desumana — Sua voz era um grunhido baixo e rouco. Estava surpreso pela selvagem urgência que tomava conta dele, que o fazia sentir-se a ponto de explodir, se não a possuísse em seguida. Nunca tinha desejado tanto uma mulher. Não podia pensar em outra coisa que não fosse a corrente fluindo, envolvendo-o, aceitando sua plenitude. Saborear seus seios ávidos que tinha querido devorar a noite anterior.
Ao vê-lo queimando com o calor de seu corpo, com um apetite instintivo em seus olhos, Brynna de repente se deu conta de que este homem era exatamente isso... Um guerreiro. Se escolhesse jogar este perigoso jogo de sedução com ele, teria que estar preparada para suportar a força de seu abraço, o ataque do fogo que o impulsionava e a resistência que sempre lhe concedia a vitória. Olhando-o nos olhos, apertada contra seu corpo firme e elástico, Brynna soube que tinha que tentar. Estava se apaixonando por ele e estava decidida a conseguir que ele também a amasse.
— Já lutou contra um Dumont na batalha e ganhou. Desafia a sua filha agora, e embora nos encontremos em outro campo de batalha, asseguro que desta vez a derrota será sua — Seus olhos dançaram com o desafio, ao mesmo tempo que um sorriso provocante se desenhava em seus lábios. Com um cuidadoso puxão se libertou de seus braços e se afastou, olhando por cima do ombro para deleitar-se pelo estado no qual tinha deixado seu marido.
Brand a observou com olhos duros como diamantes que lhe roçavam o corpo dos pés a cabeça. Esfregou a ponta dos dedos, recordando o contato da fina seda entre eles. Sua esposa estava jogando outro jogo com ele, e desta vez perderia. Sua expressão se enrijeceu, ante a idéia de derrotá-la. Aproximou-se dela. Num instante Brynna foi carregada em seus braços.
— O que está fazendo?! — gritou assustada ante a força e o apetite animal de seu olhar.
— A batalha — disse, enquanto se dirigia para as escadas — começou.


Capítulo 13

— Ponha-me no chão! Todo mundo está olhando! — Brynna percorreu com o olhar o salão e ruborizou intensamente ante as expressões surpresas dos convidados — Brand... — olhou-o, rogando que não a humilhasse dessa maneira, mas sua expressão era severa, exigente e voraz.
— Participa de jogos perigosos, senhora, e acendeu minha curiosidade — as comissuras de seus lábios se elevaram em uma careta selvagem.
— Espero sinceramente que possa sobreviver ao seu desafio.
O coração de Brynna pulsou com fúria em seu peito. Sobreviver? Por que diria tal coisa? Tinha ido muito longe? Tinha-o desejado tantas vezes, logo depois de vê-lo no lago luzindo somente um sorriso que parecia o de um anjo em um êxtase pecaminoso. Mas estava com uma mulher que ele amava, nesse dia. Isto era diferente, porque embora agora fosse sua esposa, Brynna sabia que ele não sentia nada por ela, além de uma ardente paixão. Quanto ardente? Perguntou-se e lhe encheram os olhos de pânico. Castigaria-a por tomar parte de um jogo do qual ela não sabia nada? Mordeu o lábio furiosamente, preocupada com o dilema que ela mesma tinha criado.
— Está assustada? — sussurrou Brand. Seus olhos ardiam com um poder puramente masculino... E uma faísca de diversão.
— Teria que estar?
Ele assentiu. O pulso de Brynna pulsou grosseiramente em seu pescoço e ele o acariciou muito suave. Com a língua enquanto a levava pelas escadas. O sabor de sua pele o fez desejá-la mais. Afundou o rosto nesse pescoço.
— Eu nunca... — Brynna começou a dizer.
— Sei — sussurrou ele contra sua pele.
Abrindo a porta com um pontapé, Brand entrou em seu quarto e se deteve frente à enorme cama.
— O campo de batalha? Ou algum lugar mais neutro? — ofereceu, assinalando um tapete espesso de pele de urso no chão frente ao fogo que rugia na lareira.
Brynna quase engasgou. Ambos os lugares pareciam igualmente aterradores. Em realidade, tinha ido muito longe com este homem, lhe prometendo um prazer que não sabia dar. Ele se zangaria, impacientaria-se, a tomaria sem ternura. Tinha imaginado este momento com ele tantas vezes que se sentiu segura de saber o que fazer, como agradá-lo. Mas agora, com o fogo da lareira esquentando o tapete de pele, a enorme cama esperando o começo da apaixonada batalha, e suas mãos obstinadas com força ao redor dela, uma nova onda de pânico invadiu os nervos de Brynna. Levantou a vista esperando encontrar consolo na beleza daquele olhar azul esverdeado. Só viu um cru apetite.
— Onde, Brynna?
— Eu... eu... — gaguejou.
Seus olhos se suavizaram um momento.
— Neutro, então — decidiu, dando três passos até o tapete. Baixou-a como se fosse um bebê recém-nascido. Os sapatos de Brynna desapareceram no espesso tapete. Ele esboçou um meio sorriso; deu a volta e se encaminhou ao pequeno baú do outro lado do quarto, lançando ao passar sua capa descuidadamente sobre a cama. Ficou de joelhos, procurando algo no baú. Brynna o observou surpresa ao notar, até em seu estado de pânico, os firmes músculos de suas coxas quando se agachou.
Sitiada por imagens de seu corpo nu, inundando-se na água, ergueu os olhos, sentindo o fogo que queimava como o da lareira, ardente em seu corpo. Amar esse homem assustava até mais que a paixão de seu marido. E se chegasse a amá-la? A idéia fez com que Brynna quisesse sair correndo do quarto. Não, pensou desafiante, ficaria. Deixaria que seu marido a enchesse, gentilmente, lentamente, do mesmo modo que enchia em seus sonhos.
Desatou as cintas que mantinham sua capa fechada. O cetim caiu aos seus pés como se fossem plumas. Ao encontrar o que estava procurando, Brand ficou de pé, mas quando deu a volta para enfrentar Brynna de novo, deteve-se, aturdido com a visão de sua figura. A luz da lareira brilhava atrás dela, delineando a silhueta de seu corpo sob a fina seda. As curvas voluptuosas o chamavam, acendiam um ardente fogo em seu corpo. Suspirou extasiado, mas a Brynna soou mais como um grunhido e tentou desesperadamente acalmar o bater de seu coração.
— É formosa — disse em uma voz baixa, poderosa, enquanto se aproximava. Inalando profundamente, deslizou os dedos por seu cabelo e fechou os olhos, quando suas deliciosas mechas enroscaram-se em seus dedos como se estivessem vivas, respondendo ao chamado de seu desejo. Acariciou sua cabeça, e girou a jovem até colocá-la de costas.
Brynna continha o fôlego, esperando que lhe arrancasse o vestido. Surpreendeu-se quando seus dedos deslizaram pela parte de trás de seu pescoço tão brandamente como um suspiro. Afastou-lhe o cabelo da nuca, e beijou-a com doçura, tão devagar que a fez estremecer, enquanto outro fio de fogo lhe lambia as costas.
Sentiu algo frio roçar a pele e levou a mão instintivamente ao pescoço, quando Brand terminava de fechar a gargantilha de esmeraldas.
— O que é isto? — perguntou surpresa.
— Um presente de bodas — seus lábios revoaram no lóbulo, antes de dar a volta para olhá-la novamente. Deu um passo para trás para admirar seu presente — E mesmo assim seus olhos são mais verdes.
De pé frente a ele, Brynna ficou sem fôlego. Era um guerreiro alto e rude, mas a intensidade de seus olhos a fizeram duvidar de que pudesse conquistar esse frio alguma vez. Aproximou-se dele, estendendo a mão para tocar o cacho negro que caía sobre seus olhos.
— Não tenho nada para te dar.
— Mas é claro que tem — a corrigiu com uma voz profunda, deslizando uma mão ao redor de sua cintura.
— Brand — suspirou Brynna, seus olhos cheios de paixão —, quero...
— O que? — aproximou sua boca da dela, tomando seu rosto entre as mãos — O que quer?
— Quero te agradar. — Não era mentira, mas não era o que queria dizer. Não podia confessar que queria seu coração, seu amor. Teria que ganhá-lo, do mesmo modo como ele tinha ganhado Avarloch.
— Vai me agradar, Brynna. Só olhar para você me agrada. — Sua boca voraz encontrou a dela. Sua língua procurou acariciar a de Brynna como uma chama ardente. Apertou-a com mais força entre seus braços, enquanto sua língua trabalhava gentilmente, penetrava mais fundo em sua boca e retrocedia.
Brynna sentiu-se consumida pela força de seu corpo, e com cada estocada de sua língua se tornava mais fraca. Reclamava-a com sua boca, mordendo-a com um cuidado delicioso, lambendo, bebendo-a de um modo que ela nunca acreditou possível.
— Amo você — sussurrou a moça, enquanto ele lambia seu pescoço. Brand ficou rígido, e Brynna se amaldiçoou por expressar bruscamente em sua paixão o que seu coração tentava que ocultar.
Ele deu um passo para trás. As mãos caíram.
— Brynna...
— Shh — ela se aproximou e levou um dedo aos lábios dele — sinto muito. — Passou a ponta do dedo pela leve covinha de seu queixo, por seus ombros, onde começou a desabotoar as travas metálicas do colete. O metal de prata caiu, com um forte som no piso e Brynna o chutou. Sem tirar os dedos do peito de seu marido. Com terno cuidado, desatou os laços da túnica enquanto seu coração pulsava loucamente.
Brand fechou os olhos quando ela beijou seu peito. Absorveu o delicioso aroma de seu cabelo. Passou a túnica por cima do peito, saboreando a força de seus braços que se elevavam sobre sua cabeça, apreciou sua verdadeira altura quando se deu conta de que não podia tirar o objeto. Ele o fez por ela, lançando a túnica no chão.
Ardendo com um desejo para o qual nem sequer os sonhos a tinham preparado, percorrendo, com os dedos os tensos, lisos músculos de seus braços, acariciando seu firme abdômen. Brand grunhiu incapaz de dominar o efeito palpitante e maravilhoso que sua esposa lhe causava. E finalmente, quando sentiu seus dentes sobre a pele, arrancou os botões do vestido e rasgou o fino tecido que cobria seu corpo como se fosse de papel. Ele caiu de joelhos e começou a lhe beijar o ventre plano. Passou a ponta dos dedos pelas costas e as curvas voluptuosas das nádegas, enquanto ela tremia em seus braços. Ficou rígido quando com a língua e os dentes percorreu um ofegante caminho para o monte sedoso sob seu umbigo.
Brynna fechou os olhos e sentiu o corpo dele estremecer, como se lhe tivesse causada dor. De repente, ficou de pé e a carregou em seus braços. Beijou-lhe os seios, levantando a cabeça brevemente para admirá-los com olhos selvagens antes de voltar a percorrer com a língua seus mamilos que se tornaram até mais rígidos com seu contato. Brincou com seus lábios enquanto o prazer lhe açoitava o corpo, que endurecia ante o mais leve gemido que arrancava da garganta de sua esposa. Voltou a olhá-la. A imagem de sua cabeça arremessada para trás, em um lânguido êxtase, o fez temer não poder ser gentil ao tomá-la. Apertou os dentes, à medida que a paixão o inflamava, impulsionava-o a recostá-la sobre a pele para poder livrar-se do confinamento das calças.
Brynna ficou em silêncio olhando o guerreiro completamente erguido que estava suspenso sobre ela. As sombras dançavam sobre seu enervado membro enquanto o fogo brilhava, sedutoramente, sobre a carne ardente e brilhante.
— Brand, tenho medo.
Ajoelhou-se diante dela e lhe acariciou o cabelo.
— Non, não te farei mal.
— Mas como vai entrar em meu corpo? — lamentou-se ela.
Ele sorriu ante sua doce inocência.
— Entrará — sussurrou ele, beijando-a — Irei devagar e com suavidade, Brynna.
— Mas disse...
Inclinou-se sobre ela. O calor de seu corpo a abrasou. Seus olhos mantinham cativos os dela com uma estranha força que era tão poderosa como os músculos que dançavam em seus braços.
— Pensei te possuir sem cuidado, na verdade. Mas é tão delicada como uma flor, mais formosa que mil amanheceres — levou o polegar a seu mamilo e acariciou o contorno do seio. Seu contato era mais suave que um suspiro e Brynna mordeu o lábio enquanto o fogo ardia entre suas pernas — Sua beleza me entorpece — deslizou a língua por seu lábio inferior —, seus olhos são mais radiantes que a mais estranha das gemas. Estão cheios de uma paixão ainda por descobrir. Quero me afundar na calidez de seu cabelo e me perder no aroma que me chama. E estes seios... — afundou o rosto no vale entre eles — tão firmes e formosos — sua boca encontrou os tensos mamilos cor de rosa e sua língua deslizou sobre eles, enquanto tomava-os com as mãos —. Ah, queria ser brutal. Fazer que nunca esquecesse, mas não posso. Quero saborear cada carícia. Quero tomar lentamente, sentir cada abraço, te fazer gritar com um deleite e um prazer tão intenso que seu corpo me anseie mais a cada momento que não estou dentro de ti.
Brynna escutou suas fogosas promessas como um eco em sua mente. Queria lhe dizer que ela já o ansiava, mas seu corpo se movia tão febrilmente sobre o seu que não podia emitir nenhuma palavra, exceto os gemidos de paixão que brotavam do mais profundo de sua garganta.
Desceu, deslizando por seu corpo, lhe abrindo as pernas com as mãos. Brynna gemeu e suspirou quando seus gentis dedos repartiram as suaves dobras de seu sexo. Agarrou-se à pele de urso debaixo de seu corpo, com os dedos apertados, enquanto um calor úmido começou a pulsar e bombear em seu sangue.
— Um tenro casulo que logo florescerá em uma encantadora flor — escutou que lhe dizia antes que seu rosto desaparecesse entre suas coxas.
Estava sendo banhada em calor, consumida por um fogo tão descontrolado que desejava que a tragasse para que a consumisse inteira. Ele a levou em uma dança ondulante, entre uma miríade de ondas que a balançavam para frente e para trás, enquanto uma luz explodia e a banhava com um delicioso calor. Sua respiração se tornou pesada, à medida que os rosados mamilos que coroavam seus seios se erguiam. Seus lábios, sua língua, seus dentes trabalhavam para impulsioná-la para um esquecimento encantador. Gritou quando mais chamas a alcançaram. Sem qualquer vergonha, abriu mais as pernas e se esticou, para agarrar os cachos negros que roçavam suas coxas.
As chamas se estendiam e chispavam na lareira, mas a boca de Brand era mais ardente. Suas mãos agarravam seus quadris com uma força que até o assustava. Seu firme controle se desvanecia com cada ardoroso movimento do corpo de Brynna, com cada suave gemido que lhe arrancava. Ansiava tomá-la com força, com o ardor primitivo de uma besta selvagem. Mas se agarrou ao último fio de controle que possuía. Lentamente, colocou-se sobre ela. Estava preparada, e a ânsia de seu sexo era suficiente para fazê-lo esquecer suas promessas sussurradas e afundar-se na profundidade de seu corpo.
O sabor de sua doce paixão ficou nos lábios de Brand ao passar por sua boca.
— Acho que morrerei se não te possuir — gemeu. Brynna tremeu ao escutar sua voz selvagem. Olhou fixamente seus olhos azuis, enquanto sua virilidade palpitante deslizava sobre a úmida entrada de seu corpo. Penetrou bem lentamente, como tinha prometido, embora ela pudesse ler na tensa linha de seus lábios que lhe custava um imenso autocontrole fazê-lo dessa maneira gentil. Olhou-a nos olhos com uma ternura que a surpreendeu, e, entretanto, a paixão em seu olhar ameaçava transbordá-la.
Como Brand tinha previsto, o corpo dela o aceitou, apertando fortemente. Gemeu profundamente, levantando a cabeça como uma besta a ponto de uivar. Encheu-a mais do que Brynna tivesse acreditado se possível. Um mormaço a percorreu, a dor começava a abrir caminho até fazê-la gritar. Mas o som se perdeu na suavidade de seus beijos. Sussurrava-lhe ao ouvido, dizia-lhe como se sentia dentro dela, cálida e tensa e tão docemente sedosa. E então começou a mover-se.
Brynna pensou que não conseguiria sobreviver a suas investidas. Mas a dor cedeu e o prazer tomou seu lugar, enquanto o aveludado ritmo dessas lentas invasões movia seu corpo contra a pele de urso debaixo de seu corpo. Tremores pulsantes se acumularam em seu interior até tornarem-se insuportáveis e ergueu as pernas para rodeá-lo, respondendo ao chamado de seu impulso luxurioso. Ela gritou, gemeu, umedeceu os lábios com a língua e Brand empurrou mais forte, mais profundamente. Um êxtase tão completo a empurrou que afundou as unhas em seus músculos.
— Sua força me consome. É tão firme, tão rígido.
A voz de Brynna foi como um látego nas costas de Brand. Seu corpo se esticou, desejando explodir dentro dela. Sentiu que não podia enchê-la o suficiente. O corpo dele queria mais e mais. Retrocedeu lenta, tortuosamente, quase saindo dela, então voltou a penetrá-la tão devagar que Brynna se queixou com um ardoroso gemido, longo e lânguido. Retirou-se uma vez mais e sorriu quase pecaminosamente. Deslizou dentro dela outra vez, desfrutando de cada apertado espasmo com o que o agarrava.
O chão sob Brynna balançava, enquanto o suave deslizar do corpo de Brand a tomava uma e outra vez. Arqueou as costas. Ele fechou os olhos, afundando mais profundamente, enlouquecido pelos sensuais movimentos do corpo debaixo do dele, aceitando-o completamente. Pegou suas mãos, as sustentando sobre sua cabeça. Ela o olhou e viu que estava sorrindo, não era o encanto exuberante que tinha visto uma vez, mas o incandescente fogo em seus olhos lhe disse que seu prazer estava a ponto de ser liberado.
Ele franziu os lábios apenas.
— Minha derrota chega rápido, Brynna — respirou com esforço, depois jogou para trás a cabeça. Feixes de músculos esticaram seu pescoço quando um rouco gemido penetrou o ar. Brynna sentiu seu líquido precipitar-se em seu interior como uma maré.
Ele provocou espasmos que convulsionaram seu corpo. Abandonou-se, cravou-lhe as unhas nas mãos e gritou, uma e outra vez, à medida que as ondas de prazer a devoravam, tornando-a fraca debaixo dele.
Todo o peso de Brand caiu sobre ela, rodeando-a com um calor delicioso e dominante, enquanto lhe beijava o pescoço e chegava a seus lábios.
— Surpreendeu-me, esposa — levantou a cabeça e a olhou nos olhos com a paixão que ainda persistia.
— Isso significa que ganhei meu senhor? — Brynna repousava lânguida e relaxada debaixo dele.
— Oui, ganhou — a paixão obscureceu seus olhos — Mas foi só o primeiro assalto. Minha espada ainda está faminta pela batalha — suas mãos se moveram sobre seus seios.
Os olhos de Brynna se arregalaram.
— Não pode querer dizer... outra vez? — mas enquanto perguntava sentiu que a espada em seu interior começava seu segundo ataque.
Desta vez Brand a assolou, e desatou sua paixão por completo. As estocadas de seu corpo eram como trovões, enquanto suas mãos vagavam indomáveis por seus seios, ao longo de suas coxas, erguendo até mais seus quadris. Tomou as nádegas entre as mãos, apertando-as com os dedos, puxando-a para que se aproximasse mais, para que seus assaltos lentos e devoradores chegassem mais profundamente. Acariciou-lhe o pescoço, lambeu-lhe os lábios e os mordeu brandamente, e todo o tempo a olhava como se apenas vê-la o impulsionasse e não os sedosos espasmos que o tomavam.
— Entrou bem, não é assim, senhora?
— Sim, guerreiro, entra perfeitamente.
Brand a tomou como tomava todas as coisas, com a urgência instintiva que lhe tinha dado a fama de "o Apaixonado". Saboreou-a como se fosse à última vez que a possuía, desfrutando seu corpo do mesmo modo que desfrutava na vida, do modo que lutava no campo de batalha. E no final saiu vitorioso, embora a derrota de Brynna chegasse docemente, enquanto ele a provava, saboreando o sal de sua pele e sussurrando promessas de um prazer tão completo que não só se renderia, mas também morreria para que acontecesse uma e outra vez. E assim foi oferecendo sua vida ao guerreiro que a tomou até a manhã seguinte.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Capítulo 14

O sol se ergueu sobre o horizonte, como pressentindo a batalha que se formava dentro da mente de Brand enquanto acordava ao lado de sua esposa. Observou-a enquanto dormia. Parte dele queria tomá-la em seus braços, percorrer com a ponta do dedo seus cílios, traçar a linha cheia de seus lábios. Queria conhecê-la, descobrir as coisas que acendiam esse fogoso temperamento. O que a fazia sorrir? O que enchia de lágrimas esses formosos olhos? Seu olhar percorreu um cacho de cobre caído sobre a bochecha. Queria tocar esse cacho e beijar a bochecha de alabastro, mas uma tensão tomou seu peito ante a idéia. Ela era sua esposa. Tinha-lhe feito o amor toda a noite, entretanto, achava difícil tocá-la agora. Era como se fazê-lo, de algum modo, fosse arrancar seu coração e deixá-lo nu diante dela. Embora quisesse permitir que Brynna tocasse essa crua e danificada parte de si mesmo, não podia. A sombra da traição ainda o ferroava com seus espinhos. Colette lhe tinha tirado muito. Mas Brynna era o tipo de mulher pela qual se travavam batalhas. Apaixonada, briosa, gloriosa, bela, apaixonadamente sensual, compassiva e amável. Irradiava calor e perfeição, e Brand levou a mão ao seu cabelo, desejando-a, desejando perder-se na calidez que a envolvia. Gemeu, e afastou o olhar de seu rosto sereno. Passando as mãos pelo cabelo, ficou de pé, vestiu-se rapidamente e saiu do quarto.
William o deteve nas escadas, um amplo sorriso iluminando seu rude rosto.
— Perdeu um festim espetacular, amigo — anunciou e prodigalizou Brand com um sorriso malicioso. Tinha visto Brand levar sua esposa na noite anterior e o luxurioso brilho nos olhos de ambos —. Mas estou certo de que teve um particular, né? — bateu nas costas do jovem cavalheiro — Agrada-me ver que não perdeu o fogo que queimava entre suas pernas antes que essa rameira Marson entrasse em sua vida.
— Não serve de nada, William — respondeu Brand em voz baixa, levantando a vista para olhar William antes de partir —, perdi algo muito mais valioso. Não quero amá-la.
William ficou olhando o brilho dos cachos negros quando Brand desceu rapidamente a escada. De repente, a compreensão se desenhou no rosto do duque e uma grande pena encheu seu olhar cinzento. Foi ele quem tinha ensinado a Brand que tudo o que tinha valor podia ser obtido com uma boa briga. William olhou para a porta do quarto de Brand. Uma faísca de determinação brilhou em seus olhos, enquanto se dirigia a ela. Agora era hora de ensinar essa lição a sua esposa.
Os pertences de Brynna não tinham sido trazidos ainda para o quarto de Brand, por isso teve que procurar algo de seu marido para colocar, quando escutou batidas na porta. Colocou meias negras que ficavam bastante bem, exceto pelo fato de que sobravam nos tornozelos. Ajustado o objeto, recordou como ficavam belamente apertadas em seu marido. A túnica de cor ocre que tirou de seu armário era outra coisa. Ficava grande nos ombros e lhe chegava até os joelhos, até que a amarrou na cintura com o cordão prateado de seu rasgado vestido de noiva.
Quando por fim abriu a porta, surpreendeu-se ao ver William em toda sua estatura.
— Temos que falar — disse, entrando no quarto.
— Que aconteceu? Onde está Brand? — Brynna se sobressaltou ao ouvir a seriedade na voz do duque. O coração batia em seu peito quando se deu conta de que o sol mal tinha saído e seu marido já não estava.
— Acaba de sair. Disso é do que temos que falar.
Brynna estudou o homem selvagem que sentou em uma cadeira, junto a lareira.
— Aconteceu algo errado, milorde? — perguntou, levando uma mão ao peito.
Seus olhos se encontraram com os dela, e por um momento algo passou entre os dois; houve uma calidez que ultrapassou a raiva de Brynna e as brincadeiras toscas de William, uma calidez e um carinho que ambos compartilhavam pelo mesmo homem.
— Seu marido está perdido e depende de ti para encontrar o caminho.
Brynna assentiu. Se havia algum modo de romper as grossas defesas de Brand, queria saber. A força nos olhos do duque William lhe fez sentir que podia fazê-lo. Sentou-se a seus pés e levantou a vista.
— Diga-me o que devo fazer. Como faço para que Brand se esqueça de lady Marson e da dor que lhe causou?
— Ah, então já sabe dessa perdida.
— Dante me contou — disse Brynna. Não viu razão para contar ao duque que ela tinha visto Brand com sua amante.
— É uma sedutora de olhos andarilhos e fogosos — disse William —, uma malcriada cujo pai mesmo estava tão aliviado para livrar-se dela, que aceitou que vivesse com Brand, embora não estivessem casados. Fui ver o pai da moça, Lorde Fredric de Marson, só para me inteirar de que Colette tinha fugido uma semana depois que Brand a enviou de volta para sua casa. Meus homens e eu a encontramos vários dias mais tarde, vivendo a umas poucas léguas de distância, com outro homem. Lady Colette é a imagem da beleza, e sabe como atrair os homens para suas garras. Arrastei-a novamente à casa de seu pai, e a rameira me rogou todo o caminho que a devolvesse à casa de Brand, até se ofereceu como recompensa. Estive tentado a tomá-la, porque é mais perfeita que a terra mais cobiçada, mas sua beleza é enganosa.
— Parece uma malvada.
— Realmente é. Embora não acredito que tenha mostrado esse aspecto de si mesma a Brand até o final. Necessitava-o muito, para poder escapar do rígido domínio de seu pai.
— Como posso lutar contra ela? — perguntou Brynna. O duque sorriu com um sorriso suave e gentil que surpreendeu Brynna.
— Não estou seguro de que seja contra Colette que deve lutar, mas contra o que fez a Brand. Você o quer — disse William com sábia certeza —. Se vê claramente em seus olhos, Ma cher.
— Sim, é certo.
— Então seja paciente e pormenorizada. Não o pressione muito cedo. Já conquistou muito, ele estava tão decidido a não casar-se que o rei teve que me arrastar até aqui desde a Normandia, para convencê-lo. Mas foi você que o fez mudar de idéia, não eu. Ele só obedece as ordens que quer. — William se pôs de pé e tomou mãos da jovem entre as suas, levantando-a do chão. — Lute por ele, Brynna. Leva sangue de guerreiro nas veias. Luta por ele. Certa vez, ele viveu sua vida com paixão. Ajude-o a viver deste modo outra vez, e seu amor será digno de sua luta.

Brand cavalgava a toda velocidade, embora não soubesse para aonde se dirigia. Cavalgava como alguém açoitado por demônios, com a respiração pesada e difícil. A terra tremia sob os cascos de seu negro corcel. Cavalgou sobre erva espessa e logo entre nogueiras e carvalhos. No bosque podia esconder-se da raiva e da dor que o perseguiam. Arbustos e árvores frondosas podiam ocultá-lo dos demônios que o infestavam, da incerteza por ter desfrutado de sua esposa, por querer estar com ela, por desejar sentir seu aroma. E o bosque, com seus retorcidos ramos esticando-se para o sol para obter a calidez vital que lhe seria negada durante o inverno vindouro, podia entender o frio vazio que sentia porque não queria amá-la.
Finalmente deteve o cavalo quando chegou a um lago que começava a congelar. Até ali não estava a salvo.
Desmontou e deixou cair descuidadamente as rédeas para observar a superfície do lago.
Pensava que havia se preparado bem para casar-se com Brynna, para resguardar-se dela e evitar que chegasse a ele. Já não estava seguro de ter tido êxito. Por que seria tão tolo de deixar que outra mulher entrasse em seu coração? Acaso não tinha aprendido a lição? Alexander estava morto porque Brand se deixou cegar pelo que nem sequer tinha sido algo real. E o que era real? Já não sabia, e isso era o que estava destruindo-o. Fechou os olhos contra a luz do sol e viu o rosto de Brynna. Parecia tão real. Seus olhos eram tão fáceis de ler. Suas expressões tão abertas. Amava seu pai, e seu amor e lealdade por Avarloch eram perfeitamente claros quando se ofereceu para lutar com ele pelo castelo. Até mesmo quando se casou com um descarado frio e distante, para evitar uma batalha que nem sequer teria estado ali para ver. Mas até isso não era suficiente para ele. Como podia confiar em seu bom julgamento quando se equivocou tanto anteriormente? Inclusive assim... e diabos, isso era o pior... ela tocou seu coração quando lhe deu essa maldita rosa. Saberia o efeito que teve nele ao cuidar que sua carne não fosse ferida por um espinho? Protegeria seu coração com tanto cuidado?
Seus pensamentos voltaram-se para noite anterior e uma cálida coluna de fogo lhe lambeu as costas. Como tinha conseguido acender um desejo tão cru nele? Tinha querido que Brynna o desejasse. Queria que desejasse sua paixão a tal ponto que nunca pudesse ser satisfeita por ninguém mais. Mas era ele quem a desejava. E o assustava mais que o próprio demônio. Sabia que nenhuma mulher o satisfaria como fazia Brynna. Em sua mente, podia ver o vívido verde de seus olhos, fogosos e provocadores, dançando quando ela ria e ardia como seu temperamento quando se zangava.
Brand não tinha idéia de quanto tempo tinha passado ali sentado, olhando o lago. Tampouco sentiu o frio que tocava seus músculos, tornando-os rígidos. E quase nem escutou a voz que o chamava. Ao dar a volta, viu Brynna saindo das árvores. Caminhava com a capa amassada ao redor de corpo, guiando o cavalo de seu pai pelas rédeas, sobre as raízes e as rochas.
Quando seus olhos se encontraram, o cauteloso olhar lhe tirou o fôlego. Ela não disse nada, simplesmente se sentou ao seu lado na grama. Seu longo cabelo lhe cobria os ombros e Brand ansiava tocá-lo para encontrar sua própria calidez dentro das mechas de bronze.
— Que está fazendo aqui? — perguntou, afastando seu olhar turquesa.
— Não quero que fique sozinho.
— Quero estar sozinho — respondeu com menos convicção do que tinha sentido no último ano. Olhou fixamente a superfície iluminada da água e permaneceu em silêncio.
— Sei sobre ela, Brand — admitiu Brynna, rompendo o silêncio que se estendia em seus olhos cheios de fantasmas —. Sei de Colette. Dante e William me contaram.
Seus ombros ficaram tensos e inclinou-se, quando sacudiu a cabeça.
— Não deveriam ter dito nada. Ela não significa nada para mim.
— Não significa nada? — perguntou Brynna com incredulidade —. Ainda está apaixonado por ela. Como pode não significar nada?
Ele piscava, observando a fria, cristalina superfície da água que fazia jogo com seus olhos.
— Deve esquecer o que lhe contaram.
Os olhos de Brynna se entrecerraram.
— Como posso esquecer que meu marido ama outra?
— Isto não tem a ver com o amor, Brynna. Você e eu não nos casamos por amor — respondeu inexpressivamente.
Os olhos de Brynna se encheram de lágrimas, mas não deixou que caíssem.
— Mas eu te amo, Brand — sussurrou.
— Non, não é certo — suspirou ele —, ama como te fiz sentir ontem à noite. Não confunda as duas coisas.
A dor lhe apertou o coração. Ele certamente não confundia as duas coisas, disso estava certa. Bem, não lhe importava o que pensasse. Já era hora de que soubesse a verdade.
— Não, eu te amo, marido. Você reclamou meu coração na primeira vez que te vi.
Brand por fim a olhou, e afirmou com um leve sorriso de dúvida:
— Queria me ver morto quando cheguei a Avarloch.
— Não, meu amado — o corrigiu, procurando em seus olhos o homem do qual sentia saudades —, vi em Porthleven, nadando em uma lagoa muito parecida com esta — se voltou para o lago congelado e seu olhar parou ali, enquanto recordava esse belo dia —. Estava sozinho no começo e te observei. Logo ela chegou. Eu a vi, Brand — Brynna voltou seu olhar para ele —, vi você com ela... — sua voz se perdeu e baixou os olhos ante seu penetrante olhar.
— Viu-nos? — foi tudo o que pôde dizer muito surpreso pela confissão para dizer algo mais. Brynna assentiu. A confusão enredou sua mente. Queria estar zangado com ela porque não lhe havia dito que sabia sobre Colette desde o começo. Procurou sua raiva em sua alma, mas não pôde achá-la. Que estranho, pensou, esse sentimento sempre espreitava perto de seu coração, quando pensava em Colette. Fez um esforço para produzir um bom gesto de recriminação e lhe fazer saber que não aprovava seu costume de espiar e escutar atrás das paredes.
—O que estava fazendo em Porthleven? — no mesmo instante em que perguntou, notou que ela estava vestida com sua roupa e lutou para não sorrir.
— Estava visitando meu tio. Minha companhia passou por Porthleven de volta para casa e eu fui caminhar sozinha, quando nossa carruagem se deteve devido a uma árvore caída — Deus querido, sentia-se tão aliviada ao falar disso com ele —. Te vi, tão formoso e apaixonado pela vida, e nunca esqueci, Brand .
Suas palavras finalmente começaram a fazer sentido para ele, que somente a olhava. Brynna se esforçou para sustentar seu olhar. Mas ele piscou e seus olhos se suavizaram, com uma ternura acolhedora.
— Mas tomei seu lar — recordou em voz baixa —, seu pai vai partir de Avarloch por minha culpa.
— Sei — ela quase não respirava.
— Meu povo matou a sua mãe, Brynna.
— Sim.
—E depois de tudo, acha que me ama?
— Sei que te amo.
Brand a estudou. Inclinou a cabeça tentando discernir se estava dizendo a verdade.
— Soube de Colette todo o tempo — disse, compreendendo agora tudo o que ela tinha visto. Recordava o dia que ela tinha mencionado.
— Sabia que havia alguém em sua vida a quem amava. Perdoe-me por não lhe dizer isso.— respondeu, observando-o enquanto voltava a cabeça para dirigir à água seu pensativo olhar. Ela acreditou ver os cantos de sua boca elevarem-se em um leve sorriso.
— O que é que viu... exatamente?
Brynna suspirou ao recordá—lo.
— Tudo. Estava nu deixando que a água te banhasse com um alegre abandono. E logo ela chegou e não pude partir. Estava presa ali, atrás desses malditos arbustos morta de medo de ser descoberta.
O rosto de seu marido se abriu em um sorriso mais amplo, e enquanto ele voltava esse maravilhoso sorriso para ela, as sombras que povoavam seus olhos se desvaneceram.
Era um sorriso que Brynna tinha visto antes... divertido, feliz, inesperado e totalmente radiante.
— O que acha tão engraçado? — perguntou ela, que já estava ruborizada e sem fôlego.
— Agrada-me saber que a visão de meu corpo te encantou dessa maneira — seus olhos dançaram com humor e afeto, e o coração de Brynna deu um salto. O sorriso dele era real e não calculado, inocente e malicioso ao mesmo tempo.
— Asseguro senhor, que era seu rosto... quero dizer a felicidade em seu rosto o que me cativou, não seu corpo.
— Foi meu corpo — insistiu ele, aproximando-se mais. Inclinou a cabeça até que seus lábios pousaram sobre os dela —, arrebatou-te minha imagem — riu em um murmúrio, quando Brynna revirou os olhos e lhe deu um empurrão —. Admita — persistiu ele, aspirando o aroma do cabelo de Brynna.
— Não admito nada. — Indignada, ela cruzou os braços sobre o peito e tentou afastar o olhar, mas ele tomou seu queixo entre as mãos e levantou o rosto para olhá-la.
— Obrigado por ontem à noite — adicionou, com um sorriso libidinoso: — e por esta manhã.
À luz do sol, seus olhos eram como a água brilhante, maravilhas marinhas, e enquanto Brynna os olhava, acreditou ver algo em sua vastidão, algo cheio de sentido. Acariciou-lhe a áspera bochecha.
— Não tem necessidade de agradecer a sua esposa por cumprir com seu dever, senhor.
— Foi mais que um simples dever — sussurrou, e lhe roçou a boca com os lábios —. Não é assim, Brynna?
— Sim — respondeu ela ofegando, antes que a beijasse. Ah, era mais que isso, pensou, enquanto ele a recostava no chão e desamarrava sua capa.

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Ao retornar ao castelo, encontraram William no parapeito da entrada observando atentamente enquanto Dante lutava com um dos cavalheiros do duque. As espadas chocavam-se e cintilavam. Brynna conteve o fôlego, mas quando viu que Alysia aplaudia freneticamente e pulava de alegria, olhou perplexa para seu marido.
— Isso é uma prática?
Brand sorriu levemente sacudindo a cabeça ante o duque normando, que agora bramava ao seu homem porque tinha perdido.
— Alguns podem chamar assim — disse com um suspiro exasperado.
—William é muito competitivo. Não gosta de perder em nada, por isso até as práticas se convertem em uma batalha. E neste momento, parece que está perdendo. — Brand lançou um largo olhar de soslaio, cheio de malícia, antes de afrouxar as rédeas e galopar para ele.
— Vamos — gritou para Brynna.
William mal olhou em sua direção quando Brand chamou-o, e continuou repreendendo seu cavalheiro vencido.
— Praticando um pouco de batalha amistosa, William? — sorriu Brand soltando as rédeas.
Dante sorriu e trocou um rápido olhar de assentimento com seu irmão.
— Quantos de seus homens venceu até agora? — interrogou Brand, sabendo que o número devia ser elevado, para que William o estivesse tomando com tanta seriedade.
Dante jogou a longa espada sobre seu ombro e deslizou o olhar para o duque; sua expressão divertida se transformou em um sorriso vitorioso.
— Sete.
Brynna observou o musculoso guerreiro de seu cavalo, arqueando uma sobrancelha em sinal de admiração. Dante tinha derrotado sete homens e não estava nem cansado. Uma de suas donzelas gritava algo sobre Hércules e Dionísio, enquanto ele sorria, com satisfação. Brynna teve que admitir que Lorde Dante Risande era um homem extremamente atraente. Isso, somado ao modo como os raios sol brilhavam sobre seu colete de malha, faziam-no parecer como se acabasse de descer do monte Olimpo.
— Isto não terminou ainda — anunciou William a todos os presentes.
De seu cavalo, Brand levantou uma sobrancelha, cético.
— Não sei, me parece que terminou, Will.
Então o duque sorriu como um lobo a ponto de saltar.
— Seu irmão tem que brigar com um homem mais, antes de ser declarado campeão.
Brand desmontou, passando as rédeas a Peter. Dirigiu-se para Brynna e a ajudou a descer do cavalo, piscando um olho antes de voltar-se para o duque.
— E quem é esse homem? Você, William?
O duque devolveu o sorriso zombador e escuro do Brand e sacudiu a cabeça.
— Non, ele — assinalou Lorde Richard, que acabava de sair da torre de entrada, calçando uma grossa luva de couro na mão. Os vassalos de Avarloch o aclamaram e Brynna se uniu à aclamação, lançando um beijo a seu pai quando piscou um olho.
— Muito bem! — gritou Brand enquanto William caminhava para o campo de batalha —; mas se Dante ganhar terá que se inclinar diante de todos nós e me beijar o traseiro.
— Oui — concordou William —. E se sir Richard ganhar, você se inclinará ante sua esposa e me beijará o... — olhou para Brynna e piscou um olho.
Brand deu a volta e dirigiu-se para sua esposa. Seus ombros sacudiram levemente ao rir, sabendo que isso enlouqueceria William.
E o fez.
William ladrou ordens para que todos se afastassem e abrissem caminho a seu cavalheiro campeão, enquanto Richard caminhava em direção a Dante, com sua enorme espada reluzindo ao sol.
Com os braços cruzados sobre o peito, Brand observou, com expressão divertida.
— Pensa que meu pai perderá? — perguntou Brynna e lhe beliscou o braço.
— Não sei formosa. Dante é um guerreiro poderoso, mas sei por experiência, que seu pai é muito habilidoso. Qualquer que seja o resultado, Dante conseguirá inquietar William e isso o deixará louco... e quero estar aqui para ver. Diga-me, quem é Nathan?
Perguntou tão despreocupadamente, que pegou Brynna de surpresa.
— O que? Como sabe de Sir Nathan?
Seu marido riu de William, quando o duque gritou para que todos fizessem silêncio, e se voltou para ela.
— Disse que lhe tinha partido a vassoura de sua tia Gertrude na cabeça quando ele acreditou que não podia lutar com ele. Era alguém a quem seu pai tinha lhe prometido?
— Ai, Deus santo, não — Brynna riu e estremeceu ante a idéia —. Sir Nathan é um dos guardas de meu tio. Um tolo mal-humorado, que ameaçou me açoitar.
Brand não se alterou, e voltou seu olhar tranqüilo para a luta.
— Feriu-o quando quebrou a vassoura em sua cabeça?
— Sim. Recebeu uma feia ferida em cima do olho direito.
— Bem feito — disse seu marido em voz baixa. Brynna pôde ver a satisfação em seu perfil e sorriu. Por que de repente lhe perguntava sobre um homem que ela tinha mencionado mais de uma semana antes? Sorriu porque não lhe tinha perguntado sobre Nathan antes. Nunca o trairia como tinha feito Colette, mas era bom saber que seu marido estava começando a sentir ciúmes.
Dante e Richard ficaram frente a frente, levantando as enormes espadas sobre a cabeça. Lutaram durante muito tempo, mais do que Brand tinha previsto. E para deleite de Brand, William caminhava nervoso, de um lado para o outro, levantando seus olhos cinzentos para olhá-lo a cada dois segundos.
Os movimentos do jovem guerreiro eram precisos, selvagens e carregados de um poder devastador. Devolvia os golpes com astúcia e evitava as contundentes investidas sobre sua cabeça, mas a experiência de Richard finalmente ganhou o título de campeão.
William aclamou exaltado ante o triunfo de seu homem. Deu a volta para procurar Brand, mas seu amigo não estava em nenhum lugar. Descarado, pensou William triunfalmente, e estava a ponto de abrir caminho para Richard quando sentiu o frio e duro aço entre as pernas. Ficou rígido, e um sorriso cruzou seu rosto.
— Cancele o trato — ouviu o grunhido a suas costas, perto de seu ouvido
—, não te beijaria a mão, muito menos essa diminuta amostra de virilidade que minha espada está ameaçando, neste mesmo instante.
— Que pena — respondeu o duque, fingindo estar aflito —, tinha a esperança de que sua esposa se encarregasse de pagar sua aposta.
Brand moveu a espada uns milímetros e William se sacudiu.
— Toma a espada, William, porque estou bastante seguro de que ela lhe teria arrancado isso com uma dentada, quando chegasse o momento. E tire esse sorriso zombador de seu rosto, não ganhou.
William começou a protestar imediatamente, mas Brand o sossegou com um leve movimento de sua espada.
—Se esta fosse uma batalha real, estaria morto. E um exército sem seu líder é vencido rapidamente. Eu, meu amigo, venci. —Tirou sua espada e deu um passo atrás. William girou lentamente, lançando um olhar perigoso ao homem a quem tinha ensinado a ser tão diabólico.
Em resposta, Brand lhe ofereceu seu mais radiante sorriso e se inclinou, confiando que o duque não lhe cortaria a cabeça.
— É desumano — disse o duque normando em tom de brincadeira.
Brand levou a mão ao coração.
— Obrigado. — Seus olhos procuraram Brynna como o faziam sempre quando ela não estava ao seu lado, um fato que sua mente não podia compreender. Encontrou-a perdida sob o peso do abraço de seu pai. Seu sorriso se ampliou, quando chegou junto a eles.
— William os treinou bem, a ti e a seu irmão — admitiu Richard logo depois que Brand o felicitou por sua vitória —, não lutei contra homens tão habilidosos desde que enfrentei os bizantinos em batalha.
— Devemos muito ao duque — Brand focou seu olhar em Brynna e o modo como seu cabelo brilhava, como o fogo sob o sol.
Richard lançou um rápido olhar de soslaio a sua filha.
— Brynna está muito formosa um dia depois de suas bodas, não é?
Seu genro assentiu.
— Oui, assim é.
— Tudo foi bem na noite de bodas, então? —perguntou o velho cavalheiro com um tom malicioso.
Os olhos de Brand se tornaram maiores, o sorriso congelou em seu rosto.
— Bem, obrigado por perguntar — tropeçou com as palavras, a incredulidade ante a pergunta de seu sogro nublou seus olhos.
Richard não notou a inquietação de Brand. Sorriu amplamente e lhe deu uma palmada nas costas, como teria feito William.
— É um bom começo — disse sabiamente, deixando os recém casados olhando-o fixamente, enquanto se dirigia para onde estava William.
— Os guerreiros carecem de tato. Lamento. — Brynna passou seu braço pelo de seu marido.
— É seu pai! Por que queria saber algo assim?
Ela encolheu os ombros.
— Estava preocupado pensando que me tomaria a golpes.
Voltando-se para ela com um repentino ar sensual, Brand levou a mão de sua esposa até sua boca.
— Fiz assim.
A jovem abriu a boca para protestar, mas Brand a beijou, apaixonada e espontaneamente, deixando-a sem fôlego, antes que pudesse dizer uma palavra; ele também se afastou, caminhando.
— Aonde vai? — perguntou ela a suas costas.
— À cama — deu a volta, caminhando de costas para ela... e logo sorriu a seu pai, _ depois de ontem à noite, quase não posso permanecer em pé.
Brynna o olhou afastar-se e tremeu ante a crua masculinidade que possuía. Logo riu para si e se encaminhou para o estábulo. Para ver sua égua.

 

 

 

 

 

Capítulo 15

Brand subiu as sinuosas escadas com um coração que parecia mais leve que de costume. Sorriu recordando quando viu Brynna parada no parapeito vestida com sua roupa. Até luzindo uma túnica duas vezes maior que seu corpo, sua esposa o deleitava e encantava sua alma. Tirou a imagem da cabeça. Estava muito cansado para excitar-se novamente, o qual sorriu ao perceber, sempre parecia acontecer quando pensava nela.
Quase tinha chegado ao final das escadas, quando cruzou com Rebecca, a donzela de Brynna, que descia. Seu pálido cabelo loiro solto sobre os ombros era como uma névoa de seda que ricocheteava, quando caminhava.
Brand ficou rígido.
Por um instante, retornou ao castelo de Graycliff e observou Colette, e se viu esperando que se aproximasse, para tomá-la em seus braços, logo depois de voltar de uma batalha.
— Bom dia, milorde — o saudou a pálida beleza. Deteve-se ao passar por seu lado, notando que o novo senhor a olhava fixamente —. O que houve, milorde. Aconteceu algo?
Voltando para o presente com uma piscada, Brand sorriu.
— Non — começou a subir, mas voltou a deter-se e voltou-se para ela— por favor, procure o escudeiro Kennet e diga que traga a água para meu banho.
— Em seguida, milorde — Rebecca suspirou em silencio ao vê-lo afastar-se. Por Deus, o homem era tão belo, pensou enquanto saía em busca do Kennet.
Quando Brand entrou em seu quarto, a primeira coisa que viu foi o vestido de noiva de Brynna sobre o tapete de pele de urso. Foi para ele e o levantou, levando o delicado tecido a sua bochecha, para aspirar seu perfume.
O som da risada forte de William, proveniente do parapeito, na planta baixa levou Brand à janela ainda com o vestido apertado contra o nariz. O duque tinha o braço nas costas de Richard e havia um brilho endiabrado nos olhos de William, que Brand podia ver de sua janela. Riu, adivinhando que seu amigo estava planejando algum tipo de represália contra ele.
Ao observar o duque patife, o coração de Brand se abrandou. William sempre o fazia rir, até depois de Colette. E Brand tinha uma grande afeição por ele. Tinham compartilhado a vida do mesmo modo. Com apetite, saboreando-a com uma paixão que os impulsionava na batalha, o amor, e as simples brincadeiras cotidianas. Eram homens que preferiam morrer antes que não sentir mais a gloriosa calidez do sol no rosto ou o vento lhes tocando a pele ao partir, como o trovão, para a batalha. Mas Brand tinha mudado, tinha visto o mundo girar horrivelmente insípido e descolorido... até que encontrou a cor da primavera nos olhos de Brynna.
Inalava, procurando seu aroma no vestido, quando chegou a água quente para o banho. Observou da janela enquanto quatro jovens escudeiros arrumavam o biombo e vertiam água na tina de banho.
Rebecca aguardava na porta até que terminassem, e olhou a Brand que ainda agarrava o vestido de sua esposa entre as mãos.
— Quer que o atenda, senhor? — perguntou logo depois de despedir os escudeiros.
— Onde està Kennet?
— Não pude encontrá-lo.
Brand olhou pela janela. Preferia que Brynna o atendesse, mas não a via em nenhuma parte. Além disso, precisava dormir e sabia que se as mãos de sua esposa lhe tocassem o corpo, permaneceria acordado ao menos outra hora.
— Está bem — disse —, estou cansado e temo que talvez durma e me afogue — sorriu à donzela, sem perceber o efeito que produzia nela. Lançou o vestido de Brynna sobre a cama e começou a despir-se.
Rebecca o olhou, encantada enquanto preparava o sabão e as toalhas.
— Alcance-me uma dessas, por favor — pediu Brand, e ela estendeu uma toalha limpa para cobrir-se. Para seu deleite, entretanto, ele não se cobriu quando tirou as calças. Dava-lhe as costas e a donzela sentiu uma comichão, enquanto observava suas nádegas esculpidas e suas fortes coxas.
Brand se meteu na água, dando um grunhido tão denso como o vapor que se elevava ao seu redor. Antes de sentar-se, lançou a toalha no chão, como resto de sua roupa. Rebecca de repente, lembrou-se de respirar. Na realidade, exalou tão explosivamente que Brand se voltou para vê-la.
— Está doente?
— N-não, milorde. — Foi até a tina, ajoelhou-se e tomou uma pequena toalha para banhá-lo.
— Só as costas e os braços — disse—, eu me encarrego do resto. E lave o cabelo também. — deslizou-se dentro da tina, afundando a cabeça na água para molhar o cabelo. Rebecca se colocou atrás dele, quando voltou a emergir e começou a lhe ensaboar as grossas mechas negras. Esfregou e massageou o couro cabeludo com os dedos. Ele gemeu e a donzela fechou os olhos a suas costas. Logo depois de uns minutos, afundou de novo para enxaguar-se. Quando voltou a sair, sacudiu a cabeça com força, salpicando à donzela com água morna.
— Aaaaah! — chiou ela, se cobrindo com as mãos para proteger-se da água que a molhava.
— Diabos, perdoe-me — disse Brand abruptamente, voltando-se para vê-la. Suas pálidas mechas eram agora um tom mais escuro e pendiam ao lado do rosto, enquanto gotejava água de cada fio. Ele sorriu, levemente a princípio, e depois jogou a cabeça para trás e começou a gargalhar.
Brand surpreendeu-se com sua própria risada, mas se sentia excelentemente bem e deixou que a alegria o alcançasse.
Brynna estava a ponto de entrar no quarto, quando escutou o maravilhoso som. A profunda, robusta música da risada de seu marido encheu os corredores e ecoou em seu coração, fazendo-a sorrir. Abriu a porta esperando encontrar Brand e seu irmão compartilhando um brinde. Seu sorriso se desvaneceu rapidamente quando viu Rebecca. O coração de Brynna gritou em seu peito, mas ficou quieta, sem ser vista, enquanto os dois riam juntos agora.
— Você é muito diferente de Lorde Richard — a beleza de cabelo loiro o adulou. Enquanto deslizava a toalha molhada e ensaboada pelos braços de Brand, tão lentamente que pôs Brynna furiosa —, nunca foi divertido banhá-lo.
— Que agradável sensação. —Brand suspirava.
— Está tão tenso. O que precisa é uma boa massagem com azeites medicinais.
— Umh... — gemeu Brand —, isso soa maravilhoso.
Já era suficiente! Brynna não suportava escutar outra palavra. Marchou para a tina com as mãos formando punhos.
— Se quiser azeites — sua voz atravessou o ar com uma mescla de mel e estricnina —, irei procurar em seguida.
Rebecca se surpreendeu tanto pelo som e a presença de sua ama que caiu para trás, como se alguém a tivesse empurrado com força.
— Ai! — Brynna se dirigiu para ela —. Te assustei, minha querida moça? Lamento tanto — tomou o braço de Rebecca e com um puxão a levantou e a olhou com fúria. Depois olhou para Brand e à toalha que jazia no piso ao lado da tina —, Deixou cair isso — se agachou rapidamente, tomou a toalha molhada e a lançou em seu marido.
— Brynna! — a voz de Brand era como gelo, mas ela o ignorou e olhou indignada a sua assustada donzela.
— Agora pode terminar de banhar meu marido, e quando terminar, pode ir ajudar Peter a limpar o esterco dos estábulos.
Os olhos de Rebecca estavam cheios de lágrimas, quando saiu correndo do quarto. Quando a moça se retirou, Brynna voltou seu indignado olhar esmeralda para Brand. Estava de pé agora, jorrando água de cada parte de seu corpo, e todo traço de humor se desvaneceu de seus olhos.
— Que pena, agora terá que se banhar sozinho — alfinetou Brynna com veneno.
— Cuida dessa boca, esposa — Brand advertiu ameaçador.
— Está zangado porque te interrompi, você... você, fétido pedaço de esterco de inseto?
Abriu muito os olhos, escurecidos pela fúria que se apoderava dele.
— Não seja tola, Brynna.
— Mas sou uma tola, saliva de rato! Uma tola por te amar e por pensar que havia uma possibilidade...
— Nunca houve — Suas palavras a atravessaram, enquanto um fogo azul emanava dos olhos de Brand.
Por um instante Brynna quase cambaleou, com a dor que lhe provocou a fria afirmação, mas se conteve, jurando não lhe deixar ver a ferida que acabava de causar. Seus olhos se entrecerraram, lançando adagas verdes.
— Na verdade é uma besta fria e desalmada. Não te importa de quem é a flor que floresce em suas mãos, se a minha ou a de uma donzela, as duas significam o mesmo para ti.
Brand assentiu.
— Assim é — confirmou com um sorriso gelado. Mas não o sentia. Nunca ninguém o tinha excitado como tinha feito Brynna, como o fazia até agora enquanto cuspia seu ódio por ele. Seu fogo o fazia sentir-se vivo, enquanto os aguilhões da paixão se cravavam em seu sexo, uma paixão que lutava por controlar antes que crescesse ante os olhos dela.
_ A um selvagem não importa quem grita debaixo dele, sempre e quando gritarem pedindo clemência. Mas não a terá.
As palavras de Brand a assustaram, mas também a enfureceram, e sua raiva, como a de sua mãe, sempre dominava seu temor. Brynna endireitou os ombros e desafiou o olhar de seu marido.
— Não escutará nunca mais um grito de meus lábios, nem de paixão, nem de medo. Juro isso, você, sujo caipira. — Voltou-se para partir, mas a mão dele se estendeu e se fechou ao redor de sua cintura. Saiu da banheira e a atraiu para seus braços. Não havia nada gentil em suas ações, nem em seus olhos, só fúria e paixão rugindo desatadas.
— Esta é a segunda vez que me acusa falsamente. Nunca volte a fazê-lo, a não ser que me veja fazendo amor com uma de suas donzelas. Quanto a gritar, juro isso, esposa, não só te farei gritar debaixo de mim, mas também me rogará que não me detenha. Rogará penosamente até que te encha uma e outra vez, e nunca será suficiente — sua respiração era quente contra seu rosto, seu corpo rígido e preparado para tomá-la.
— Nunca! — disse Brynna, tentando furiosamente escapar de seu abraço, mas ele se precipitou sobre ela e a levantou do chão.
Com três passos gigantescos Brand a levou para a cama, ignorando os insultos. Deixou-a cair sobre o colchão, com descuidada desconsideração. Ela ricocheteou como uma mola.
— Vou deste quarto, Brand.
— Non, não o fará. Não até que termine contigo — Tire a roupa antes que lhe arranque isso.
— Não o farei! — afirmou Brynna, balançando as pernas para o beira da cama.
Ele saltou sobre ela, como um felino. Eram as roupas dele que usava, mas as arrancou da mesma forma. Brynna queria gritar, mas tinha jurado que não o faria.
— Nunca voltarei a me render diante de ti, escória normanda! — gritou com os dentes apertados, enquanto seu marido lançava a roupa ao chão e a recostava, com um empurrão.
— Então a batalha vai recomeçar. — Sua voz lhe ferroou os ouvidos com tanta força como a mãos que a seguravam à cama.
— Que seja bem-vinda — Brynna levantou a cabeça do travesseiro para lhe gritar no rosto, mas ele só a olhou, admirado.
— Pensei que era minha imaginação — ofereceu um sorriso enfurecedor —, mas, na verdade, é até mais bela quando está zangada, Brynna. Se soubesse o que está me fazendo neste momento, estou certo de que te submeteria rapidamente.
— Nunca, mentiroso! — ela lutou com fúria debaixo dele, mas sua pressão era muito forte, seu corpo a cobria como o aço. Podia sentir a carne excitada contra sua coxa e se surpreendeu de que a ele ainda sentisse um pouco de desejo. Não importava. Ignorou o ávido palpitar, a feroz luxúria em seus olhos.
— Isto te faz sentir como um homem? — zombou.
Um canto de sua boca carnuda se levantou, formando um meio sorriso lascivo.
— Por que não me diz isso você? — Agarrou, com força, a mão e levou a palma para baixo, ao longo de seu corpo, balançando seu peso sobre ela. Ela mordeu o lábio quando ele deslizou seus dedos além de seu abdômen de aço, até sua ofegante vara de ferro. Sua voz se tornou rouca com o esforço para controlar-se, quando fechou os dedos ao redor de sua rigidez —. Como o sente você?
Brynna conteve o fôlego ante a vida que pulsava entre seus dedos. Um calor inflamado fluía dele e parecia enchê-la, mesmo contra sua vontade. Brand gemeu. Tomou o mamilo com os dentes, banhando-o dentro de sua boca com a língua. O bico rosado se ergueu até enquanto lutava contra ele. Sua língua umedeceu a crescente dureza, e depois lambeu ferozmente. A dor, e um sobressalto de prazer, levou a mão de Brynna até mais embaixo. Queria gritar, mas não podia... tinha jurado não fazê-lo. Soltou-lhe a mão, mas ela não a tirou de sua rígida carne. Deslizou os dedos pelo interior da coxa, seu contato a provocava, acariciando-a, lhe fazendo apertar a dureza entre seus dedos.
— Está pronta para mim, esposa? — sussurrou com uma voz rouca.
— É um selvagem — respondeu Brynna sem fôlego.
De repente, seu dedo mergulhou profundamente dentro dela, Rolando, acariciando delicadamente e levando-a a um êxtase inimaginável. Ofegou, arqueando as costas. Brand lhe mordeu o pescoço, esforçando-se para não parti-la em duas com a endurecida lança que estava a ponto de explodir em sua mão. Acariciou o botão de seu desejo com o polegar e Brynna se sentiu assaltada por ondas de êxtase sexual. Era tão intenso que queria gritar, clamar, rogar que a penetrasse e a enchesse com sua poderosa carne.
— Nunca — disse sufocada, respondendo a si mesma em voz alta. Brand sorriu em cima dela.
— Oui, agora — a corrigiu, tomando sua mão uma vez mais para que ela o guiasse —. Agora, Brynna — sussurrou, e ela o levou dentro de seu corpo, e logo o soltou e ele avançou ferozmente, grunhindo.
Brynna tremia enquanto os espasmos de prazer percorriam seu corpo. Toda idéia de negar que quisesse a paixão deste homem sem seu amor se pulverizou como folhas caídas no vento outonal. Queria tudo o que estava lhe dando. Queria que a enchesse, como estava fazendo agora. Deu-se conta que amava o peso de seu corpo sobre o dela, a aspereza de sua mandíbula ao roçar sua bochecha delicada. O modo como seu corpo se movia em perfeito ritmo com o dela, a impulsionou a elevar os quadris, até que os fogos que lambiam sua carne e suas costas e vinham de dentro da úmida caverna, onde ardia seu prazer, se fizeram quase insuportáveis.
A paixão de Brand era tão tumultuosa como o mar durante uma tormenta. Cavalgou sobre Brynna com um passo febril, já não lhe importava a ternura, só o prazer, quente e doce e selvagem em sua avidez. Queria consumi-la, ser consumido por ela. O apertado túnel de desejo de Brynna acariciavam sua virilidade e Brand sentia cada um dos músculos voltando a reclamá-lo, quando retrocedia, enquanto suas dobras aveludadas o acariciavam como lábios úmidos.
O êxtase chegou ao topo envolvendo Brynna. Mordeu-lhe o ombro, afundando as unhas em suas costas. Agarrou-se a ele desenfreadamente, movendo-se com ele, como lhe ordenava. Todo controle se desvaneceu e ela encontrou no ardor de sua boca uma urgência igual à sua. E logo ele emitiu um som que não era como nenhum que tivesse escutado. Era o som do prazer que se tornava audível, tangível. Era sensual e erótico, masculino e cru. Não um grunhido, mas uma série de sussurros roucos e primitivos. Brynna não sabia se não tinha sido esse mero som que a fez gritar. Quando o êxtase a transbordou.
Abriu os olhos para ver o rosto que tinha desejado, e ali estava. Um regozijo estranhamente angelical em seu feroz e exuberante êxtase, formava em seus lábios um amplo sorriso. Seus olhos se fecharam quando a encheu, movendo-se dentro das águas de seu corpo. Inalou, como se o ar fosse uma delícia para seus pulmões, depois apertou os lábios, impulsionando-se mais profundamente dentro dela. Sua paixão era tangível, manifestava-se em seu sorriso ardente e selvagem.
Brynna afundou as unhas em sua carne, enquanto as cores explodiam dentro dela em infinitas convulsões, que pensou que nunca acabariam. Gemendo, contendo gritos de êxtase que ameaçavam sair, ela foi se aquietando.
E sua sensual fantasia permanecia ali, jogando a cabeça para trás como uma formosa e primitiva fantasia feita realidade. Ele franziu os lábios e um áspero grito gutural saiu de sua garganta. Logo paralisou-se em seus braços, esgotado, completamente exausto. Queria dizer algo, mas não pôde. Rolou para o lado e a atraiu para seus braços, e em segundos estava dormido.
Brynna descansou ao seu lado, aconchegada em seu peito e fechando com força os olhos, para deter as lágrimas que ameaçavam afogá-la. O homem da lagoa ainda existia. Estava ali, com ela agora. Tinha empurrado Brand para a borda do que se acreditava que era a paixão, do modo como o tinha feito a mulher na água, quando o viu pela primeira vez. Só que era uma paixão diferente, mas não menos intensa.
Suas paixões... as coisas que experimenta... consomem-no. Seja felicidade, ódio, luxúria, ou amor, igualmente o consomem, disse-se Brynna, recostada junto ao seu homem. E soube, nesse momento, que não importava o quanto maravilhoso fosse seu desejo por ela, precisava ver a paixão de seu amor dessa mesma maneira. Precisava senti-la, tocá-la, vivê-la.
Seus pensamentos voltaram-se para aquele dia em que o duque da Normandia tinha ido ao quarto de Brand para falar com ela. Tinha pedido que fosse paciente. Fez-lhe prometer que tentaria, jurando que seu marido era um bom homem pelo qual valia à pena lutar.
— Digno da batalha.
Brynna escutou em sua mente as palavras do duque William, enquanto estava deitada na cama com Brand, olhando as negras e densas pestanas que repousavam sobre seus olhos. Sabia que não tinha opção além de lutar. Por sorte, era algo que sabia fazer bem. De algum modo, tinha que ganhar o amor deste guerreiro. Tinha que encontrar um modo de derreter seu gelado coração.
— Digno da batalha.
— Sim, certamente é — sussurrou Brynna e acariciou seus cachos negro —, e, meu amado esposo guerreiro, vencerei.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Capítulo 16

O som de um grito carregado de dor despertou Brynna na metade da noite. O fogo intenso da lareira se reduziu a umas poucas brasas acesas, mas havia suficiente luz para ver seu marido dormindo, quando se sentou na cama.
— Colette!
Brynna sussurrou o nome de seu marido na escuridão. Seu coração se quebrou em pedaços que cravaram em seu peito.
— Brand, acorde — o chamou meigamente. Com cautela, como se tocar sua pele pudesse feri-la, pousou a ponta dos dedos em seu ombro —, acorde, por favor, meu amor.
Seus olhos se abriram, com a leve consciência de estar despertando para a realidade. Voltou a cabeça para Brynna e ela retrocedeu, ante o horrível vazio que reinava em seu olhar.
— Brynna — As mãos fortes e seguras agora tremiam, enquanto tomavam o rosto. Turbulentos oceanos azuis procuraram seus olhos por um momento. Logo, como se não encontrassem o que necessitavam, separaram-se dela.
Brand tirou a colcha de cima e abandonou a cama. Seu corpo nu movendo-se na tênue luz do fogo da lareira, parecia quase luminoso apesar da palidez que o cobria. Brynna o observou afastar-se e levou a colcha até o pescoço.
— Brand, não vá, por favor.
Mas parecia não escutá-la.
Ao achar sua capa carmesim, a jogou sobre os ombros nus e se aproximou do fogo. Ela o observou, em silêncio, enquanto ele esticava as mãos para frente para esquentá-las. Inclinou-se para alimentar as faíscas moribundas com lenha. As chamas se alastraram, e depois saltaram, com renovada força dando mais luz ao quarto e mais calor. Brand se ergueu, como se estivesse brotando do ávido fogo, e esticou as mãos para esquentá-las, uma vez mais. Seus ombros, tão largos e poderosos, afrouxaram-se à medida que o fogo o aliviava de um modo em que Brynna não podia fazê-lo.
Ante a cena, a jovem esposa chorou. Desejava aproximar-se dele. Mas o que lhe diria? Ela não era Colette de Marson... e Colette era a mulher que Brand queria.
— A odeia, Brand — Brynna mal sussurrou—, a odeia, mas entendo que ainda a ame.
— Non — sua voz soou tão profunda como as sombras —, já não a amo. O amor transforma os homens em idiotas — disse, sem voltar-se para Brynna—. Sempre deixei que me governasse o coração, Brynna — fez uma pausa recordando a angústia de sua traição refletida no olhar aterrorizado de Alexander, antes de morrer—, fiz escolhas com as quais devo viver o resto de minha vida. Nunca voltarei a cometer o mesmo engano.
O que poderia penetrar o gelo que envolvia Brand e encerrava seu apaixonado coração? Brynna queria ir para ele, sustentá-lo em seus braços e lhe prometer coisas nas quais pudesse confiar e acreditar. Mas eram suas próprias emoções que o tinham traído. Saiu da cama, precisava chegar até ele.
— Deixe-me te ensinar a confiar no que seu coração sabe que é bom — disse brandamente, aproximando-se um passo mais — Deixe-me te curar, marido — lhe tremiam os joelhos enquanto avançava, esperando, rezando que não a rechaçasse. Parou em frente a ele. A silhueta de Brand era como uma obra de arte esculpida, rígida, cheia de incerteza. Levantou a mão até seus braços e traçou seus músculos.
Ele inclinou a cabeça e lhe roçou a têmpora com os lábios, comovendo-a. Seus braços tomaram, lentamente a princípio, resistindo sua oferta. Logo a aproximou de seu corpo e capturou sua boca em um beijo que era tão quente quanto o fogo da lareira.
Brand já havia partido quando o sol da manhã refletiu sua luz no rosto de Brynna. Vestiu-se devagar, pensando na noite que tinha compartilhado com ele. As imagens de seu rosto, uma formosa máscara de puro, arrebatado êxtase, voltavam para sua mente. Traçou o contorno de seus seios com a mão, recordando como tinha sido o contato de sua boca ali. Era ardente, apaixonado e puramente masculino, tão feroz que somente a recordação a devorava. Mas também estava ferido, assustado por um amor cheio de engano e de sangue.
Sabia que a batalha seria difícil, mas por suas veias corria o sangue Dumond. Lutaria para salvar Brand o Apaixonado. Sabia, enquanto se apressava para fora do quarto e procurava, ansiosamente, entre seus vestidos, que não era Brand contra o que tinha que lutar, mas contra o que amar Colette de Marson tinha feito a ele.
Sorriu vitoriosa ao encontrar o vestido que combinava perfeitamente com seus olhos. Era encantador. O veludo verde esmeralda mais suave que a pétala de uma rosa, caiu como líquido a seus pés. Pequenas pérolas adornavam o corpete, que empurrava seus seios para cima, em um decote exagerado. A saia era amplia e fluída, com aberturas em ambos os lados das pernas até os joelhos. Debaixo, duas capas de gaze agitavam-se sobre sua carne, insinuando suas pernas bem feitas.
Com a esperança brilhando em seus olhos, colocou no pescoço a gargantilha de esmeraldas que Brand tinha dado. Penteou o cabelo de maneira tal que seu rosto ficasse descoberto, colocando uma mecha para trás com um grande broche de esmeraldas, enquanto que o resto caía sobre as costas. A batalha continuava e seu homem era digno de cada golpe que ela tivesse que desferir. Colocou seus delicados pés em sandálias douradas e saiu do quarto com um suave balanço no andar.
William foi o primeiro a ver Brynna quando entrou no grande salão. Ou ao menos, pensou Brand, seu audaz amigo era o único com a coragem de ofegar ao vê-la.
— Por Deus, como te invejo, homem! — comentou o duque. - Se não te quisesse tanto, mataria por ela.
Sentado junto a William, Dante lançou uma gargalhada.
— É muito vaidoso para lhe dar um sorriso, sem adular primeiro a si mesmo.
Aceitando o desafio, William deslizou seu olhar para o irmão de Brand.
— Olhe e aprenda cachorrinho.
Brand sorriu, mas não afastou os olhos de sua esposa enquanto ela caminhava através do salão. Estava formosa. Transbordava de vida e era tão fresca como uma manhã primaveril. Cada movimento de seu corpo fazia balançar o suave veludo que a cobria tão deliciosamente, e expor mais as fortes e formosas pernas que o tinham rodeado na noite anterior. A observou, com olhos lascivos, entrecerrados, e quando sorriu, seu corpo se esticou com uma pressa que o fez sentir-se poderosamente estimulado. Ela era misteriosamente sensual, e alagava de desejo cada um de seus sentidos.
— Este é um jogo que joga comigo — disse Brand, mais para si que para o duque.
William bebeu seu hidromel antes de responder.
— É o único jogo com o qual se pode chegar a ti.
— Ganharei, William — grunhiu Brand, ainda observando-a.
O tosco duque fixou seu olhar no guerreiro.
— Que preço terá essa vitória, amigo?
— A morte — respondeu Brand — Minha morte, se perder.
— Talvez, mas o que acontecerá se sua derrota te trouxer de volta para a vida?
Brand bebeu de um sorvo, ignorando as perguntas de William e a silenciosa preocupação delineada no rosto de seu amigo. Seus olhos seguiram Brynna com uma intensidade selvagem, à medida que ela se aproximava da mesa. Quando por fim chegou, foi William que lhe sorriu.
Brynna escolheu o assento localizado frente a seu marido. Logo depois de devolver a piscada afetuosa de William e o encantador sorriso de Dante, entrecerrou seus verdes olhos em direção a Brand e formou com os lábios um sorriso sensual e ardente, que fez com que seu marido se retorcesse, incomodamente na cadeira.
— Perdeu a fala esta manhã, marido? — Sua voz era uma chama que açoitou as costas de Brand.
O sorriso de William se fez mais amplo.
— Minha senhora — disse o duque, inclinando-se para frente—, posso lhe dizer o maravilhosamente encantada que está nesta manhã?
— Pode, meu senhor — respondeu Brynna, voltando o rosto para vê-lo.
_ Você faz regozijar a alma — cortejou William —, seu cabelo é como o bronze fundido, fogoso contra a mais tenra pele com a qual Deus, tão generosamente, a vestiu.
Os olhos de Brynna brilharam quando sorriu.
— Palavras tão bonitas na boca de um selvagem tão sedento de sangue.
— Oui — assentiu William e lançou um olhar confidente a Dante —. E seus olhos... minha senhora, não há esmeralda na terra que seja mais brilhante, nenhuma mais esculpida com tão reverdecido fogo.
Ela ruborizou e estava a ponto de responder, quando Brand se jogou para trás na cadeira e cruzou os braços contra o peito, os olhos entrecerrados e a mandíbula apertada a desafiavam a continuar. Brynna quase retrocedeu ante o aço frio do olhar de seu marido. Estava com ciúmes, outra vez? Com o coração batendo, ela esperava que assim fosse e deu a William seu mais deslumbrante sorriso.
— E você, meu senhor, está cheio de poder e força, que brotam de cada poro de seu corpo endurecido pelas batalhas. Você atemoriza e debilita com apenas um de seus olhares de aço. Entretanto, é quente como uma manta de lã em uma fria noite de inverno.
O sorriso de William era tão amplo que Brynna riu, como uma menina cobrindo a boca com a mão. De repente, ele plantou as enormes palmas de suas mãos sobre a mesa, com um golpe, e ficou de pé.
— Deixe este normando degenerado e foge comigo!
Todos no grande salão se sobressaltaram até quase caírem de suas cadeiras, ao escutar o ensurdecedor grito de William, mas o brilho azul no olhar de Brand nunca abandonou o rosto de Brynna.
— Mas, senhor, você também é um normando — recordou, ignorando o olhar de seu marido.
— Oui — suspirou o duque, pesaroso, e voltou a iluminar-se — Renunciarei ao trono e me proclamarei saxão!
A moça conteve o fôlego, fingindo sentir-se escandalizada.
— Tamanha traição!
E finalmente, William explodiu em uma gargalhada, jogando a cabeça para trás e sustentando o estômago.
— Ah, é uma mulher especial... Verdadeiramente especial — proclamou, enquanto voltava a sentar. –Vê o que tem aqui, Brand, ou realmente te roubarei isso.
O lento sorriso de Brand lhe chegou à alma.
— Uma mulher que pode aniquilar homens poderosos só com a língua.
O coração de Brynna golpeava com força em seu peito. A batalha estava de pé e ela se colocou ali, de maneira intencional. Agora tinha que ser cuidadosa... Mas não muito.
Fazendo um esforço para manter seu sorriso, olhou diretamente a seu marido e lambeu os lábios, deixando ver toda sua sensualidade.
— Uma língua, quando usada corretamente, meu senhor, pode ser uma arma letal.
William cuspiu sua bebida, quase se afogando, e deu uma palmada nas costas de Brand, levantando da cadeira.
— Desejo-te boa sorte — disse, quase com lástima—, vai precisar. — riu novamente com uma gargalhada vigorosa, própria de um homem de muitas paixões, como era o duque da Normandia. Passou seu enorme braço debaixo do braço de Dante e pôs de pé o jovem cavalheiro — Venha — disse, querendo permitir a Brand e Brynna ficar um momento a sós —, precisamos conversar sobre o castelo de Graycliff.
— Por quê?
— Porque é ali que viverá.
Brynna observou o duque arrastar consigo Dante; logo voltou seu olhar para Brand e estava a ponto de dizer algo, mas conteve a respiração ao ver o modo como a estava olhando.
O sorriso de Brand era sombrio, sensual, e a percorria com uma intensidade crua e masculina, quando o oferecia a sua esposa. A visão de sua língua foi tão excitante para ele como se tivesse acariciado seu corpo, mas controlou suas emoções, assim como seu crescente desejo por ela.
— Já te adverti antes sobre como joga de uma forma perigosa, esposa. Seduzir outros homens ante meus próprios olhos — sua voz era tranqüila, enquanto roçava levemente a beirada de sua taça com a ponta dos dedos. Seu olhar poderoso a abandonou um segundo, para admirar a fina taça dourada. Logo, voltou a levantar a vista e olhou fixamente Brynna —. Por sorte, a sensação de algo tão fino sob meus dedos me faz esquecer a raiva.
Brynna olhou sua mão. Longos, calosos dedos, rastreavam, saboreavam o frio metal. Tremeu ao imaginar que era seu seio que ele desfrutava sob seu terno contato. Mencionou a sedução, mas era cru o desejo em seus olhos, a careta de sua boca sensual, seu sorriso apaixonado o que conseguia seduzi-la. Cuidado, Brynna, advertiu-se a si mesma, pegando um pedaço de pão para levar aos lábios, com dedos trêmulos.
—Então é realmente uma sorte que meu marido se deleite acariciando sua taça, de outro modo sua raiva me atemorizarìa tanto que sairia correndo para nosso quarto, para esconder-me em nossa cama e esperar meu castigo.
Brand a estudou um momento, seus olhos eram lacunas azuis de uma calma cristalina, e lhe deu um sorriso que a estremeceu. Era uma expressão real e aberta, e cada vez que a agraciava com esse tipo de sorriso, se sentia mais perto dele, como se estivesse tocando o gelo e derretendo-o. Ela o divertia, o fazia rir, e isso a deleitava. Devolveu-lhe o sorriso, sentindo que, estava segura, era um afeto real estendendo-se para ela do outro lado da mesa.
Compartilharam o precioso momento em silêncio, e Brand ficou de pé e lhe estendeu o braço.
— Venha cavalgar comigo.
— Mas meu jardim, deveria...
— Já enviei Alysia e Lily para essa tarefa. Venha — a chamou, sua voz era o sussurro de um feiticeiro, atraindo-a para ele — Sua terra é desconhecida para mim. Se for proteger Avarloch, devo aprender onde está cada monte, ver cada caminho e saber aonde leva.
Brynna não podia negar-se, e não queria fazê-lo. Levantou-se da cadeira e tomou a mão. Ele não a voltou a soltou, mesmo quando caminhavam juntos para os estábulos. Quando tentou montar um de seus cavalos, ele a deteve e a montou sobre seu próprio corcel.
— O tempo está frio — disse, saltando sobre a montaria —, vamos nos aquecer, cavalgando juntos. — O fôlego de Brand atrás do ouvido de Brynna foi suficiente para esgotar suas terminações nervosas. Quando deslizou os braços ao redor de sua cintura e tomou as rédeas, ela se aconchegou, comodamente, sobre os planos firmes de seu peito.
O mordaz ar outonal intumesceu as bochechas de Brynna, enquanto Brand cavalgava passando o parapeito exterior e o jardim de sua mãe. A deslumbrante paisagem logo desapareceu sob uma cúpula de folhas pintadas de ouro e verde profundo. Brand seguiu as indicações de sua esposa, que os guiaram entre labirintos de árvores e barrancos de pedra. Observou cada sinuoso atalho que lhe assinalava, embora se sentisse tão cativado pelas doces ondulações de sua voz que, por duas vezes, se perdeu no que lhe mostrava. Cada monte coberto o maravilhava com sua beleza. Cada borbulhante arroio que cruzavam era celebrado com um grito de deleite, enquanto a água gelada lhe salpicava as pernas.
— Ah, há um lugar que quero te mostrar, que vai deixá-lo sem fôlego! —disse Brynna e seu marido sorriu ante a emoção que se mesclava em suas palavras —, meu pai estava acostumado a me levar ali. É obvio nunca nos atrevemos a contar a minha mãe. Ela teria esfolado vivo meu pobre pai.
— E por que razão?
Voltando a cabeça, Brynna o agraciou com um sorriso travesso que ele teve o impulso de tirar com um beijo.
— Já verá. Vá até aquela ladeira e suba.
Brand guiou seu cavalo sobre o que começava a pensar que era a ladeira de uma montanha. Duas vezes seu corcel quase perde pé no monte rochoso, mas Brynna só fez uma pausa em seu despreocupado bate-papo por um instante, para lhe dizer que já estavam chegando.
— Devia ter me deixado trazer meu cavalo, Brand. Seu corcel se cansa facilmente.
Estava a ponto de responder a esse comentário com a risada que merecia quando a besta voltou a escorregar. Um instante antes de alcançar o topo, Brynna se voltou tão rapidamente que teriam despencado, se Brand não tivesse tido firme controle sobre seu cavalo.
— Feche os olhos! — ordenou ela.
— Que? Mulher é tão tola como...
— Por favor, Brand. Feche os olhos ou arruinará a surpresa.
Não queria fechar os olhos. Queria amaldiçoar e talvez até estrangular a sua esposa por ser tão pouco cautelosa. Pousou um severo olhar nela, preparado para negar-se a cumprir sua tola solicitude, mas maldita seja, suas bochechas estavam tão rosadas, e seus olhos tão abertos e suplicantes que Brand franziu o cenho, apertou os dentes e fechou os olhos.
— Agora, desça do cavalo. Não, não abra os olhos! Faz o que digo e deixa de parecer tão assustado.
— A única coisa que me assusta são estas vontades que tenho de te jogar pela ladeira deste gigantesco monte. — Escutou-a rir e franziu o cenho.
— Tome minha mão — disse ela, logo depois de desmontar —, deve confiar em mim.
Brand se deteve. Manteve os olhos fechados, mas não deu outro passo. Brynna pegou sua mão. Sua risada lhe enchia os ouvidos.
— Venha, marido. Prometo não te deixar cair.
— Brynna — de repente, se sentiu assaltado pelas imagens de seus sonhos, caindo da beira de um precipício. Abriu os olhos, mas Brynna voltou a cobri-los novamente e apertou seu corpo contra o dele.
— Só me siga.
— Não — Ela não tinha idéia do que lhe estava pedindo.
— Por favor — seus lábios sussurraram contra os dele —, sério, Brand, está tirando toda a graça da aventura.
Pegou sua mão novamente e desta vez, ele se moveu. Deixou que o guiasse alguns passos, enquanto o coração lhe pulsava freneticamente.
— Agora sente-se. Assim está melhor, verdade? — acalmou-o — Meu pai me fez fazer isto, quando tinha nove anos, e te asseguro que foi o dia mais mágico de minha vida.
— Posso abrir os olhos agora?
— Ainda não. — O sibilante vento fustigou sua bochecha com uma mecha do cabelo de Brynna, quando ela se sentou ao seu lado. _ Deve te recostar sobre o estômago — voltou a rir como uma menina —, Vá, certamente tem alguma idéia má sobre o que fazer comigo. — O puxou pela manga, até que ficou recostado totalmente contra a fria rocha debaixo de seu corpo — Pode abrir os olhos agora.
Brand abriu os olhos, e o que viu quase parou o coração.
— Deus meu — quase não podia respirar, olhando diretamente para baixo às espumosas ondas que batiam contra a ladeira do escarpado, a menos de sessenta metros abaixo.
— Não é magnífico? — sorriu Brynna — Com a cabeça pendurada desta maneira, não parece que está voando? — Ele não respondeu, mas Brynna não estava esperando que fizesse. — Escute como soam as ondas quando se mesclam com o vento? Ainda me arrepiam a pele.
"Arrepiar a pele" não era a expressão que teria escolhido Brand para descrever o que estava sentindo, enquanto se pendurava na beira do mundo. Uma excitação que fazia com que o sangue fluísse por suas veias como o fogo, isso era mais preciso. Um arroubo que lhe detinha o coração e que lhe arrebataria qualquer palavra, se tivesse tido a audácia de pronunciar alguma. Graycliff estava construído sobre os altos escarpados de Dover, mas nunca havia se sentido suspenso no ar, desse modo. Brynna voltou à cabeça para olhá-lo e viu o assombro em seu sorriso. Sorriu com ele.
— Agora vê por que minha mãe se zangou?
Ele riu, brandamente, fechou os dedos ao redor da parte de trás de seu pescoço e a beijou. Quando retrocedeu, Brynna se comoveu ao olhá-lo nos olhos.
— Cada dia que passa eu te conheço melhor, e agradeço a Deus não ter tomado a vida de seu pai.
Brynna piscou. Também ela estava grata, mas nunca tinham falado disso. Não entendia por que mencionava agora.
— Por que não o fez?
— Porque é valente. É um grande guerreiro e o respeitava mesmo quando sua espada caía sobre a minha. — Ela assentiu com a cabeça e o observou voltar-se outra vez para as ondas.
— Por que me conhecer te faz agradecer a Deus por havê-lo deixado viver?
— Se o tivesse matado, teria me odiado.
Brynna mordeu o lábio inferior para afogar as perguntas que essa resposta sugeriu, mas já o tinha pressionado suficiente por um dia.
— Não teria odiado durante muito tempo, entretanto — quando ele levantou uma sobrancelha e a olhou, ela enviesou os lábios em uma careta aflita —: teria te atravessado com uma flecha, muito antes que tivesse a oportunidade de sentir pena de mim.
A risada de Brand foi rápida, rica e profunda. Transportou-se com o vento e se mesclou com o poderoso rugido do mar. Brynna estava segura de que nada soaria mais doce a seus ouvidos, até momentos mais tarde, quando ele lhe disse que queria levá-la para casa e fazer o amor em uma cama quente.

Enquanto descia tranqüilamente as escadas, mordendo uma maçã, Dante foi o primeiro a saudá-los quando entraram em Avarloch. Sorriu, mostrando sua famosa covinha ao passar ao seu lado, a caminho do grande salão
— William quer sua cabeça.
— Por quê?! —gritou Brand a suas costas.
— Seus galgos chegaram de Graycliff — respondeu Dante, por cima do ombro e seguiu caminhando, — aterrorizaram seus homens durante quase uma hora, até que ele entrou como um redemoinho no salão e com sua voz de trovão e os fez calar.
— Merde. Onde estão agora? — perguntou Brand seguindo-o.
Dante não respondeu, mas assinalou as duas grossas portas em frente a eles. Instantes depois, abriu uma das folhas com um empurrão, apoiou as costas contra o marco de madeira e fez um gesto com a mão para que passasse.
— Depois de ti.
Brand encontrou seus cães logo que entrou no salão; dois deles caminhavam ao redor dos bancos e roubavam comida do prato dos comensais. A boca de Brand desenhou um meio sorriso e deu a volta para seu irmão e Brynna, que estavam ao seu lado.
— Os homens de William parecem estar a ponto de molhar as calças.
— Parecem bastante selvagens — Brynna deu um passo atrás de Dante e apareceu do lado de seu braço, para olhar aos enormes cães.
— Podem chegar a sê-lo — respondeu Brand, juntando os lábios e emitindo um breve assobio, que fez com que os cães levantassem a cabeça e soltassem a comida roubada.
Ao ver Brand, uma enorme besta prateada saiu correndo para ele, para grande alívio do cavalheiro, que tinha permanecido rígido como uma estátua enquanto a criatura lhe limpava o prato. Brand se inclinou para frente, para carregar o enorme animal em seus braços, mas este se esticou em suas patas traseiras, quase derrubando Brand no chão.
— Sentiu saudades então, Sussurro? — perguntou Brand, agarrando a boca aberta do animal, — eu também, bela dama — inclinou a maciça cabeça da cadela e plantou um firme beijo em sua brilhante pelagem prateada.
— Sussurro, é?
Brand levantou a vista e viu que William caminhava lentamente para ele, com uma grande jarra de cerveja entre as mãos.
— Seu incessante latido não te dizia nada, quando lhe pôs o nome? — ao aproximar-se de Brand, a cadela grunhiu e mostrou as presas.
— Quoi?! — grunhiu William à cadela —. O que é que diz? Teria que estar choramingando a meus pés, por não ter te esfolado para fazer uma manta nova para o inverno. — Lançou seu ameaçador olhar a Brand —. Se seus cães pulguentos incapacitarem algum de meus homens, o custo sairá de suas arcas.
Quando Dante mordeu a maçã, para deter o sorriso que lhe cruzava o rosto, William balbuciou entre dentes e voltou para sua cadeira.
— Brynna — disse Brand, voltando—se para ela — acaricie minha cadela.
— Não, obrigado.
— Tem que se fazer amiga dela. Ofereça um pouco de comida desse prato ao seu lado, ou não gostará de você e te arrancará a garganta quando se aproximar para mim.
Brynna o olhou fixamente, enquanto sua incredulidade se transformava em raiva. A idéia de aproximar a mão da boca da besta a aterrorizava, mas a expressão divertida que dançava nos olhos de seu marido lhe disse que isso era exatamente o que ele pretendia. Não estava disposta a ser derrotada por uma cadela. A jovem lhe ofereceu um pedaço de carneiro. Olhou Brand desafiante, queria amaldiçoá-lo com veemência, mas mudou de opinião quando olhos tão escuros como um pesadelo se voltaram para ela.
—Tranqüila Sussurro — a acalmou Brand. Estava zombando de Brynna, sabendo que Sussurro era tão dócil como um gatinho, mas sua esposa não sabia. Se não acendesse sua raiva, viveria constantemente atemorizada por seus enormes galgos. Sorriu quando Brynna aceitou o desafio, como ele sabia que faria, e levou os dedos à boca da besta. As enormes presas brancas tomaram delicadamente a carne dos dedos de Brynna.
— E os outros dois? — desafiou Brynna, logo depois de engolir o medo.
Brand encolheu os ombros e continuou acariciando a cabeça de Sussurro.
— São uns descarados e tomarão o que querem, sem pedir.
— Mmm, exatamente como seu amo — disse Brynna. Observando os dois cães, não tinha dúvidas de que Brand dizia a verdade —. Como se chamam?
Ele sorriu.
— Caos e Triturador. Mas não é necessário que os toque. São caçadores por natureza, não mascotes.
Um tremor percorreu suas costas, mas estava decidida a ganhar a batalha que seu marido havia começado com seus galgos. Fechou os olhos, disse uma silenciosa prece, e tomou uns pedaços mais de carneiro e os segurou na frente das bestas, que agora babavam ao lado de Dante.
— Tranqüilos — ordenou, ofegando enquanto se aproximavam dela. Em seguida, percebeu a mudança na posição de Brand. Parecia preparado para segurar os cães, se qualquer dos dois tentasse atacá-la. Brynna sorriu. Seu marido não estava disposto a permitir que lhe fizessem mal, como tinha sugerido com sua atitude cruel. O calor e a saliva tocaram sua pele. Logo, fechou os olhos de novo, conteve o fôlego e levantou a mão lentamente para acariciar Caos na cabeça. O escuro galgo lambeu seus dedos e Brynna se permitiu exalar.
Com um olhar cheio de assombro, Brand libertou Sussurro e deu a volta para olhar para Dante.
— Deveríamos levar a nossa senhora à batalha conosco. Tem uma língua e um tato que acalma às bestas mais selvagens.
— Não, meu senhor — Brynna lançou um sedutor olhar decidida a prosseguir a batalha —, você é a besta mais selvagem de todas, e ainda não te acalmei.
— É verdade — respondeu Brand, com voz rouca. Inclinou o rosto para o dela e passou o polegar pelo lábio inferior —, faz-me sentir mais selvagem do que jamais me senti.
Brynna ruborizou e se voltou para Dante, mas ele já havia saído. Juntou os lábios e passou ao lado de seu marido, roçando seus sólidos músculos com as delicadas curvas de seu corpo. Ele inalou seu aroma. Deixou que o veludo de seu vestido o acariciasse, que a suave elasticidade de sua carne debaixo do tecido o excitasse, antes de dar a sua esposa um sorriso que a fez estremecer antes de voltar-se para partir. Ele a observou. Não podia tirar os olhos de cima do suave balanço de seus quadris. Seu corpo o chamava, convidava-o a segui-la. Saboreou suas deliciosas curvas com olhos luxuriosos. Tremendo de desejo, saiu correndo a procurá-la, tomou-a em seus braços e a beijou, ardentemente.
— Desculpe-me, milorde.
Brand levantou o olhar, um pouco perturbado pela interrupção do jovem escudeiro.
— O que aconteceu, não vê que estou beijando minha esposa?
As bochechas do escudeiro se tornaram de um pálido doentio.
— Lamento, milord — retorceu sua túnica, nervosamente—, o guarda da torre me enviou para lhe informar que se aproximam uns cavaleiros.
Brand afastou seu ardente sorriso de Brynna, por um momento.
— Levam insígnias?
— Não, milorde.
— Está bem — suspirou Brand oferecendo a Brynna um gesto contrariado e de desculpa —, alerte à guarnição. Estarei lá, em seguida.
— Envie Dante — sugeriu ela, com um ronronar—. Te necessito aqui, agora.
Fechou os olhos contra a sedução aveludada de sua voz e a promessa ardente que a acompanhava. Ela pôde sentir como se esticava seu corpo e sorriu, ante o poder que tinha sobre ele.
— Dante! — rugiu Brand. Seu irmão o olhou da cadeira onde estava sentado e lançou o resto da maçã a Caos —, aproximam-se uns cavaleiros, Veja o que querem e me faça saber quem são. Vou retirar-me com minha esposa. — deu a volta para partir, com uma mão na cintura dela.
Em sua pressa para levar Brynna para a cama, quase não notou dois de seus cães correndo ao seu lado, em direção às portas de entrada do castelo. Só quando Sussurro começou a choramingar, o senhor de Avarloch levantou a vista.
O rosto de Brand se tornou mais pálido que a lua em uma fria noite de inverno. Só havia uma pessoa que provocava tal ansiedade em sua cadela; uma só pessoa que fazia com que esse animal se escondesse a seus pés como se uma calamidade estivesse a ponto de acontecer, uma calamidade que só Sussurro, com seu agudo nariz e afiado ouvido podia perceber. Com um rápido e profundo suspiro, Brand se afastou de Brynna e alcançou Dante em dois grandes passos, antes que seu irmão abrisse as portas de entrada.
— Espere! — gritou. Dante se deteve e deu a volta. Brand parecia estar reunindo toda a força que restava em uma última, lenta inalação. Depois, assentiu com a cabeça. Os cães se sentaram, rapidamente, a seus pés. Estavam em silêncio, exceto pelos choramingos de Sussurro.
William saiu do salão para ver o porquê de tanta comoção, no momento em que Dante abria as portas. O duque lançou a Brynna um olhar interrogativo, mas ela encolheu os ombros e voltou seu olhar novamente para Brand. Quem quer que estivesse ali fora, fazia retroceder seu marido, como se temesse ver o que, de alguma maneira, já sabia que o esperava.
O coração da moça, repentinamente, começou a bater num ritmo acelerado em seu peito.
— Brand? — foi até ele e colocou uma mão delicadamente no braço, mas ele não a olhou. Seus olhos já estavam fixos na escura figura que se aproximava, cavalgando para Avarloch.
— Que Deus nos ajude — a voz de William atrás de Brynna lhe arrepiou a pele e fez com que seu coração desse um pulo. Estava a ponto de dar a volta para olhá-lo, quando um gemido de seu marido a deteve. Olhou-o, temerosa de olhar para qualquer outro lado, temerosa de ver o que seu coração lhe dizia. Os olhos de seu marido agora estavam fechados, como negando-se a ver quem via. Por fim, Brynna deu a volta para ver por si mesma.
Uma figura se aproximou do portal do muro exterior, montando a cavalo, coberta com uma capa tão negra como a esperança de Brynna, quando se deu conta de quem era. Rodeada por uma patrulha de menos de quinze homens, os delicados traços do cavaleiro se tornaram mais nítidos, sob a sombra do capuz de sua capa. O tenso silêncio dos homens de Brand, incluindo William, disse-lhe o que sua mente se negava a aceitar.
— O que devo fazer? — a profunda voz de Dante quebrou o silêncio.
Olhando fixamente ao cavaleiro, como se seu ofegante coração estivesse a ponto de explodir no peito, Brand quase não respirava, não piscava.
— Encontre-a no portal e veja o que quer.
Dante titubeou, e se afastou para cumprir o pedido de seu irmão.
— Brand, só feche a maldita porta na cara dela, com um golpe!
Brand levantou a mão para silenciar William. Brynna se voltou para o duque, cravando a vista em seus enfurecidos olhos. Mas ele afastou o olhar, cheio de desesperança. Ela queria chorar, gritar. Desejava correr para as portas e fechá-las com um golpe, como tinha ordenado William, mas não fez nada. Quase não podia mover-se, enquanto observava Dante subir de um salto em sua montaria, para fora das portas.
— Não seja idiota, Brand — foi a tensa advertência do duque da Normandia. Mas ele não escutou. Seus olhos nunca abandonaram à sombria mulher lá fora. A cor não retornou a seu rosto, nem parecia respirar. Só observava como se, em seu silêncio, pudesse capturar alguma palavra pronunciada no vento.
Brynna também tinha deixado de respirar, e o notou, quando começou a dar voltas sua cabeça. Inalou profundamente, e se deteve de novo, quando Dante retornou ao castelo. Seus olhos se dirigiram a ela, antes de falar com seu irmão.
— Quer refugiar-se de seu pai aqui.
— Por quê? — perguntou Brand em voz baixa.
— Não quis dizer isso, só disse que queria falar contigo.
Avarloch permaneceu em silêncio durante o que pareceu uma eternidade. Ninguém falou. Ninguém respirou. O único som provinha de Sussurro, que continuava com sua choramingação, aos pés de seu amo. O mundo pareceu mudar, envelhecer, no espaço desse silêncio que levou Brand para tomar uma decisão. Sua mente lutava, como se negasse algum cataclismo que sabia estava a ponto de ocorrer, e Brynna estava segura de que todos no salão o haviam sentido.
O olhar de Brand não tinha abandonado, nem por um momento, a figura que aguardava lá fora. Por fim, pronunciou as palavras que ecoaram no coração de Brynna como um trovão, arrastando-a a inacabáveis ondas de dor e tortura.
— Deixe-a passar — disse claramente, com um mandato em sua voz que ninguém se atreveu a questionar.
Ninguém, exceto Brynna.
Voltou-se para olhá-lo de frente e apertou seu braço. Cravou-lhe os olhos, exigindo que a olhasse.
— Não tenho necessidade de perguntar se a mulher ali fora é Lady Colette de Marson. Já que claramente, pelo forte batimento de seu coração, é ela quem se aproxima de minha casa. Mas te pergunto, marido: por que lhe permite a entrada? Por que ignora meus sentimentos com tanta desconsideração? — Apertando os dentes, Brynna respondeu sua própria pergunta: — A ama. A ama ainda, e exibirá esse amor frente a mim como...
— Silêncio! — interrompeu-a Brand, bruscamente. Seu rosto estava esculpido em mármore; seus olhos, duros como o aço. Piscou lentamente e pareceu recompor-se, defendendo-se uma vez mais atrás de intermináveis capas de pedra sólida —. Fará silêncio, ou farei que lhe retirem.
Brynna o olhou, indignada, lutando contra as ondas de lágrimas e fúria que a transbordavam.
— Muito bem. Silêncio é o que terá — prometeu em uma voz carregada de tranqüila determinação.
Pela primeira vez desde que as portas tinham se aberto, os olhos azul céu abandonaram à mulher que agora esperava a entrada em Avarloch. Brand deu a volta para seguir Brynna, quando ela o rodeou e parou junto a William e a seu pai.
—Tudo estará bem entre nós, Brynna — foi quase um sussurro, como se temesse dizê-lo, como se temesse prometer algo. Seus olhos procuraram os dela, mas Brynna os afastou, silenciosa.
Lady Colette de Marson entrou em Avarloch com uma lufada de ar frio, sua capa negra voava atrás dela com o vento. Quando chegou até onde estava Brand, deteve-se e lentamente e tirou o capuz.
— Imbecil! — William já não pôde conter seu desgosto e saiu violentamente do castelo, chocando um maciço ombro contra um dos homens de Colette, e quase o derrubou no chão.
Colette não se alterou ante a fúria do duque da Normandia; de fato, sua compostura e graça, sem mencionar o impacto da angelical beleza de seu rosto, assombrou Brynna, que a olhava com olhos cautelosos e em chamas.
— Milorde — a voz de Colette de Marson era o som de um suspiro pronunciado no vento. Beliscou as grossas dobras de seu vestido de veludo e fez uma breve reverência frente a Brand. Quando se ergueu, revelou olhos grandes e negros, inundados em lágrimas. Levantou uma delicada mão para sua bochecha, mas ele a tirou com a velocidade de uma serpente e a deteve.
— Por que está aqui? — perguntou secamente.
Olhos negros, penetrantes como carvões ardentes percorreram o salão e pousaram em Brynna.
— Queria falar em particular, milorde — lentamente, voltou o olhar para Brand e esperou.
Ele a olhou durante um longo momento, e Brynna quase podia escutar as perguntas que desejava fazer e a dor misturada em cada uma.
— Muito bem — respondeu, por fim.
Colette sorriu e esperou que Brand devolvesse o gesto. Não o fez. Morta de raiva, Brynna não pôde reconhecer a rigidez que percorria os traços de seu marido, enquanto olhava fixamente Colette.
Desatando os laços de sua capa, Colette deu a volta e convidou as mãos de Brand para que a retirasse de seus ombros. Quando ele o fez, uma cabeleira tão loira que parecia iluminar toda a Avarloch se derramou em seus dedos. E se Brynna não tivesse fugido do salão nesse instante, talvez houvesse visto seu marido se voltar para procurá-la.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Capítulo 17

William passou às pressas pela torre de entrada, partindo o ar com sua presença, amaldiçoando. Suas pernas grossas o levaram pelos campos que rodeavam Avarloch. Encaminhava-se para o bosque. Sua terrível fúria desafiava o frio que tentava penetrar sua carne. Não sentia nada, não podia pensar em nada mais que em partir o pequeno pescoço da cadela francesa, como um ramo seco. Pensou que nunca voltaria a ver Lady Colette de Marson, mas ali estava! Já era frustrante ter que ver como um dos mais poderosos guerreiros que tinha conhecido se debilitava e caía sob o feitiço de uma bruxa sedutora, mas agora Lady Brynna também seria destruída.
Pensou na filha de Lorde Richard Dumont, enquanto espancava o joio e a erva sob suas pesadas botas de couro. Via seu rosto nas flores que desafiavam o frio. Não havia uma mulher como ela em toda a Inglaterra, estava certo disso. Tanta vida, tanto fogo e paixão oferecidos a um homem que os pisotearia como se não fossem nada... Oferecidos a um homem que ele amava como ao seu próprio filho, esse condenado idiota! Deu—se conta de que ainda tinha a taça de vinho na mão, e a fez em migalhas contra uma árvore.
— Maldita seja, Colette de Marson. Não deixarei que os destrua — a escura promessa ressoou através do bosque e os pássaros que se aninhavam nos altos ramos, chiaram de medo e saíram voando. O duque da Normandia quase não notou, seus furiosos olhos cinzentos olhavam mais à frente do bosque. Non, nunca.

**************
Brynna entrou em seu quarto e arrancou o vestido. Correu para o armário e procurou entre sua roupa, até que encontrou um vestido marrom de cavalgar e uma quente túnica de lã.
— Brynna! — a voz de seu pai ressoou do outro lado da porta.
— Um momento, por favor — disse, vestindo-se. Secou as lágrimas com o dorso da mão e se dirigiu à porta.
Quando Richard viu sua filha, seu coração se partiu.
— Brynna...
Ela se afastou de seus braços abertos e deu a volta para procurar as botas. Movia-se rapidamente, sem pensar... Tinha que fazer dessa maneira, porque se se permitisse pensar...
— Onde estão minhas botas?! — gritou, suas palavras entrecortadas traíam sua dor.
— Brynnafar...
— Posso lutar contra um fantasma, pai — antes que pudesse detê-las, as palavras saíram de seus lábios —, mas não com uma mulher de carne e osso, que viverá em minha própria casa. Uma mulher a quem ele ama com todo o coração.
Sem saber como tinha chegado ali, a jovem estava nos braços de seu pai, consumida por um amor que quase tinha esquecido que existia.
— Filha — sussurrou ele, e ela deixou que suas lágrimas fluíssem sobre o largo ombro do único homem que a amava.
— Levarei você para a Normandia comigo. Não tem por que ficar aqui.
— Não, não — disse ela, secando os olhos com uma determinação que seu pai conhecia e admirava. Amo-o, pai. Devo ficar.
Lorde Richard sorriu gentilmente, afastando a sua filha, para olhá-la nos olhos.
— Então lutará por ele?
Os lábios de Brynna desenharam uma careta irônica.
— Já passou muito tempo com o duque William — Brynna suspirou, deixando que seu pai se contagiasse com o sorriso — Tentarei. — Em realidade, não tinha outra alternativa. Se abandonasse Brand se transformaria no mesmo em que se transformou sua fantasia... Embora se ficasse, talvez seria, de todos os modos, como ele.
— É verdadeiramente a digna filha de sua mãe, Brynnafar Grenalyn.
Sorrindo ao escutar o nome completo que sua mãe lhe tinha dado, Brynna beijou a áspera bochecha de seu pai e se separou de seu abraço.
— Agora, preciso cavalgar estar longe daqui para ordenar meus insensatos pensamentos. — ajustou um cinturão de couro ao redor da cintura e trançou seu espesso cabelo acobreado.
— Leve Dante contigo, filha, ou algum de meus homens.
Franziu o cenho delicadamente e olhou seu pai.
— Desde quando necessito escolta para cavalgar por minha própria terra?
— Não necessita, mas leva-a igual, só para me agradar. — A preocupação de seu pai a comoveu. Deu um passo adiante e lhe rodeou o pescoço com os braços.
— Está bem, procurarei alguém. Prometo.
Lorde Richard assentiu. Antes de que pudesse dizer outra palavra, viu sua filha sair do quarto. Suspirou profundamente e decidiu encaminhar-se para a cozinha, para comer algo. Seu coração lhe disse que fosse procurar lorde Risande, mas sua mente refutou a idéia sabendo que, pelo próprio bem do cavalheiro normando, ir procurar algo para encher o estômago era o melhor para todos os envolvidos.
Brynna saiu às escondidas do castelo de Avarloch, mas manteve a promessa que tinha feito a seu pai, não foi sozinha: junto com ela, caminhava Caos.

Com olhos de falcão, Brand observava Colette caminhar de um lado para outro do aposento. Não perdia nenhum só de seus movimentos, incluindo os dos dedos que agarravam e soltavam as dobras de seu vestido de veludo. Notou a tensa contração nervosa de seus lábios e as pálidas mechas de cabelo que voavam, quando ela dava voltas, em sua contínua e frenética marcha.
— E bem? — perguntou Brand em voz baixa.
Colette fez uma pausa durante um instante, antes de levar as mãos ao rosto e chorar.
— Meu pai prometeu-me a uma besta, Brand.
— E? — respondeu ele apenas. Acaso Brynna não tinha sido forçada a casar-se com uma besta também? E não tinha enfrentado seu destino sem lágrimas? —, muitas mulheres se vêem forçadas a casar-se com homens que não amam.
O rosto de Colette apareceu por cima de suas trêmulas mãos.
— Não posso. Não posso! Ele é um selvagem!
Brand encontrou uma cadeira de encosto alto e desabou nela. Por um instante, pensou em ir para Colette e acalmá-la. Mas logo se deu conta de que era a familiaridade que sentia em seu presença o que o tinha feito considerar consolá-la. Não sentia nenhum desejo de senti-la outra vez em seus braços. Tinha pensado que, se alguma vez voltasse a vê-la, se sentiria tentado a perdoá-la. Quando permitiu sua entrada em Avarloch, pensou que lhe faria bem lhe fazer as perguntas que o atormentavam. Mas ali estava Colette e a única coisa em que ele podia pensar era em Brynna. Sua esposa o fazia sentir-se vivo outra vez. Com um leve sorriso, recordou como se sentiu ao beijá-la com o vento gelado lhes açoitando o rosto e ameaçando jogá-los para as nuvens. Fechou os olhos para saborear a lembrança de seus lábios carnudos, quando lhe cuspiam seu veneno. Tinha um mau gênio terrível, mas não discutiu, nem lhe lançou suas palavras mais raivosas quando lhe gritou que fizesse silêncio. Só o olhou como se acabasse de lhe arrancar o coração do peito e estivesse sustentando a confusão frente a seu rosto. Por Deus, tinha-a ferido! Exalou um longo fôlego. Por que as mulheres tinham que ter sentimentos tão delicados? Os homens seguiam melhor sem eles, concluiu. Oui, então não teria que preocupar-se em tomar decisões apressadas das quais se arrependeria mais tarde.
— Deve retornar a seu pai — disse a Colette. Não pode ficar aqui. Cometi um e...
— Não, não, por favor, milorde! — ela saltou para ele e caiu a seus pés —, deixe-me ficar até a primavera, rogo isso. Então meu pai terá esquecido a idéia de me casar com essa besta e você pode voltar comigo e falar com ele.
— E dizer o que?! — gritou Brand. Seus olhos a escrutinaram como um relâmpago atravessando uma árvore —, o que supõe que direi a seu pai? Devo lhe pedir que perdoe uma desonra a mais com a que sua própria filha segue manchando seu nome? Devo lhe dizer que esqueça que seu coração não pertence a ninguém? Que deve apagar de sua mente a realidade de que sua filha abre as pernas a qualquer homem que a deseja?
Curiosamente, suas palavras não feriram a mulher a seus pés, que nem sequer notou, nem se importou que o que estava escutando eram as acusações sentidas do próprio Brand. E se ele tivesse estado menos consumido pela profunda raiva que o queimava por dentro, uma raiva que precisava sentir para poder curar-se, talvez tivesse notado que para Colette não parecia importar o que pensava dela.
A mulher ficou de pé e cravou os olhos diretamente nos dele.
— Já me abandonou uma vez. Rogo, não o faça de novo. Porque desta vez me matarei antes de chegar à porta.
— Não tirará a vida. Ama muito a si mesma para fazer isso.
Ao olhá-lo, Lady Marson se maravilhou. Via-o tão arrebatador como o céu antes de uma tormenta. Mas tinha conhecido um Brand Risande diferente. Tinha conhecido a Lorde Brand o Apaixonado, um homem a quem consumia seu ardor pela vida, que o fazia tão vivo que ela sempre havia sentido que tinha que correr para alcançá-lo. Recordava o amor em seu olhar, que estava acostumado a banhá-la tão meigamente, a suave carícia de seus braços fortes, e o mel de sua boca quando a beijava. Oui, ela tinha poder sobre ele. Só tinha que recordar-lhe
— Brand — sua voz foi um suave ronronar. Com olhos feiticeiros percorreu o rosto dele. Viu a raiva ali quando lhe devolveu o olhar, mas a ignorou. Levantou a mão e lhe tocou a bochecha.
— Se alguma vez me amou me ajude agora.
— Não me fale de amor. Não te devo nada. Casei-me com outra e desejo me libertar de ti — no momento em que pronunciou essas palavras, Brand soube que era verdade. Já não queria voltar a estar com ela. Ela estava ali, e ele não a desejava.
— Sei que está casado, Brand — levou a ponta do dedo aos lábios para silenciá-lo, ignorando seus desejos —, o rumor de sua batalha com Sir Richard Dumont se difundiu rapidamente por todo o país. Sei que o forçaram a casar-se com sua filha saxã para poder ficar com sua terra...
— Quis me casar com ela — a interrompeu, lutando por ordenar seus pensamentos, à medida que o aroma conhecido de Colette lhe assaltava os sentidos.
—A ama?
Silêncio.
— É adorável. — O corpo de Colette se elevou como uma nuvem até que sua cintura se acomodou entre as fortes coxas de Brand. Ele fechou os olhos, ante o rosto tão perto do dele, ante os lábios que estava acostumado a morder — Colette — pronunciou seu nome e pareceu soar estranho em seus ouvido.
— Amo você, Brand.
Ele inclinou a cabeça para os suaves dedos que acariciavam sua bochecha. Abriu os olhos. Por um momento, esperou ver uma cabeleira cor de bronze enroscada ao redor de seus dedos. Quase se surpreendeu de ver Colette. Afastou violentamente as mãos.
— Posso ficar milorde? Por favor? — a doce brisa de seu fôlego o acariciou, alagando-o de indesejadas lembranças do tempo em que viveram juntos.
— Non, Colette — ficou de pé, afastando-a com um empurrão—, partirá ao amanhecer.
— Não posso! — Soluçando, ela se lançou a seus pés—. Por favor, não me obrigue a partir! Está gelado e morrerei antes de chegar a Canterbury — fez silêncio um momento, esperando uma resposta. Quando não chegou, seguiu adiante —. Oh, por favor, Brand, meu prometido já me bateu uma vez. Tenho medo de voltar para minha casa.
Brand olhou seu cabelo loiro pálido. Teve o impulso de tocá—lo. Maldita seja, e maldita seja Brynna também. Ele não era um bastardo desalmado.
— Muito bem. Pode ficar até que decida o que fazer contigo. Mas, Colette, enquanto estiver aqui, não te aproxime de mim, e nem de minha esposa. Não quero ferir seus sentimentos mais do que já os fere sua presença aqui.
Colette secou os olhos e o olhou fixamente, com uma repentina faísca de raiva no olhar.
— Se não te conhecesse bem, diria que está apaixonado pela saxã.
Brand a deixou, sem dar uma resposta. Não a merecia, mas essa não foi a razão de seu silêncio. O coração pulsava muito ferozmente no peito para falar. Ver Colette em carne e osso tinha provado que ainda havia lugar em seu coração para amar uma mulher. E sentiu um suor frio, enquanto se afastava dela. Amor! Por Deus, seria mais fácil lançar-se sobre sua própria espada nesse momento e acabar com tudo... Quer dizer, se apaixonar-se por sua bela esposa não o matasse primeiro.

Brynna cavalgou a toda velocidade. O vento frio penetrou em seus pulmões e lhe açoitou o cabelo, a trança lhe golpeava as costas como um látego urgindo-a a cavalgar mais rápido. Caos manteve o frenético passo junto ao cavalo. Entrou no bosque sem diminuir a marcha, as lágrimas ardiam em seus
bochechas momentos antes de serem arrancadas pelo vento . Os cascos de seu cavalo retumbavam sobre o bosque, advertindo às criaturas menores que deviam fugir antes de serem pisoteadas. O focinho da besta exsudava uma espuma que desaparecia no ar congelado. E mesmo assim, Brynna seguiu forçando o cavalo, evitando árvores e ramos baixos, ansiosa para escapar da dor que sempre parecia estar espreitando em suas costas desde que Lorde Brand Risande tinha chegado a Avarloch.
De repente, o corcel se levantou sobre suas patas, espantado por algo no caminho. Brynna tentou segurar-se, mas o animal estava correndo muito rápido, e freou repentinamente. Cavalo e cavaleiro caíram no chão frio e atapetado de vegetação, com um golpe que sacudiu a terra.
Brynna despertou horas depois, sentindo o calor de uma fogueira que ardia a centímetros de onde estava recostada. Uma enorme figura estava inclinada sobre ela. Esteve a ponto de gritar, mas logo uma aguda dor explodiu em cores brilhantes dentro de sua cabeça.
— Tranqüila, bela dama, sou eu — William sussurrou perto de seu rosto. Ofereceu-lhe seu sorriso mais cálido — caiu com muita força do cavalo.
A moça levou uma mão à cabeça e se queixou.
— Isso é o que aconteceu? Sonhei que me lançavam do paraíso.
William riu brandamente.
— Non, isso não aconteceria nunca. — Retornou à fogueira e pôs toda sua atenção em uma fatia de carne que estava assando em uma churrasqueira improvisada. Arrancou um pedaço com os dedos e ofereceu.
— Toma, come.
— O que é?
— Coelho.
Observou a oferenda durante um momento, logo tentou sentar-se. Mas um fogo ardeu ante seus olhos e caiu de costas contra a capa que William tinha enrolado, para lhe fazer um travesseiro.
— Tem que se recostar e ficar quieta até que chegue ajuda Brynna — ordenou William gentilmente.
— Você o matou?
— O que? —olhou-a por cima da fogueira, com olhos que brilhavam como prata polida.
— Com o que matou o coelho?
O sorriso selvagem do duque normando apareceu, enquanto segurava a carne frente a seus olhos, para examiná-la.
— Por que me pergunta isso? — antes que ela tivesse tempo de responder, ele encolheu os ombros—. Para ser um verdadeiro guerreiro, deve-se usar todos os recursos que Deus deu.
Brynna olhou ao redor da pequena fogueira, mas tal como suspeitava não viu nem adaga, nem espada, nem arco. Recordou que o duque tinha saído furioso do castelo de Avarloch, sem nada mais que uma taça nas mãos.
— Foi Caos que matou o coelho? — perguntou, com um respeito reverencial crescente pelo homem ao que tinha chamado de monstro.
Ao escutar seu nome, o enorme galgo negro levantou a cabeça de seu tranqüilo sono e a olhou.
— Non — William lambeu os dedos e continuou mastigando—, se te disser que matei o animal com minhas próprias mãos, pensaria mal de mim?
— Não — respondeu Brynna, olhando-o fixamente —, talvez só precise saber quão perigoso pode chegar a ser meu novo amigo.
William riu e o lançou um pedaço de carne para Caos. A jovem observou o duque e imaginou-o correndo entre os grandes arbustos como uma besta indomável, perseguindo a sua presa.
— Posso ser bastante perigoso, bela dama, mas nunca para ti.
Brynna sorriu. Acreditava. Ele parecia uma besta contra a vegetação silvestre dos arbustos e os grossos troncos. As sombras refletidas pelo fogo que dançavam sobre seu rosto lhe davam uma aparência selvagem, mas sua voz era gentil, seus enormes dedos quase delicados, quando arrancavam a carne assada da carcaça do coelho.
— O que está fazendo aqui no bosque? — perguntou.
— Posso te fazer a mesma pergunta.
O olhar de Brynna se elevou para o céu, que estava escurecendo. Suspirou lentamente, seus pensamentos retornavam a Brand. Perguntava-se o que estaria fazendo nesse momento. Estaria com Colette?
— Tinha que sair por um momento.
— Também eu — William compreendia a dor que via nos olhos dela.
Brynna tentou sentar-se de novo, mas William a deteve, com uma enorme mão em seu ombro.
— Fique quieta.
— Não, tenho que retornar — disse, lutando para libertar-se da mão que lhe impedia de mover-se.
— Retornará, Brynna, mas não neste momento. Não temos cavalo e estamos muito longe para voltar caminhando.
Ela se deteve.
— Não há cavalo? Mas... — olhou ao redor da pequena clareira — onde está meu corcel?
O duque permaneceu em silêncio um minuto, olhando—a fixamente nos olhos; .
— Seu cavalo quebrou o pescoço ao cair.
Tal como tinha previsto, Brynna fechou os olhos para deter o pranto que procurava fluir.
— Não devi forçá-lo tanto — soluçou incapaz de conter a pena que a atormentava.
William olhava o fogo, respeitando suas lágrimas em silêncio, sabia que não se derramavam somente pelo cavalo. E enquanto a mulher que admirava mais do que qualquer outra amaldiçoava sua própria imprudência, sua raiva contra Brand e Colette se acendeu uma vez mais.
— Brynna — começou a dizer lenta, cautelosamente, deixando que seus prateados olhos a encontrassem na penumbra —, quando voltar a Avarloch, deve reunir toda a força que sei que tem. Use todos os recursos femininos com os quais Deus te benzeu. E me acredite, mulher... — William suspirou, olhando-a —, benzeu-te com muito. Prepare-se para a batalha agora.
— Mas...
— Non — a deteve —, te prepare agora mesmo, Brynna, ou não te incomode em retornar. Sei quanto Brand deu a Colette de Marson. Não sei quanto dele segue com ela, mas é melhor se preparar para uma batalha sem trégua — uma careta de lobo se apoderou de seus lábios—, poderia te dar por vencida, te render. Mas não o fará.
A moça secou as lágrimas e olhou ao tosco guerreiro. Assentiu com uma nova determinação ardendo em seus olhos e William assentiu em resposta. Ofereceu-lhe uma fatia de coelho e desta vez ela aceitou.
—Tem uma reputação monstruosa, milorde William — disse ela, de repente.
Ele jogou a cabeça para trás e se riu.
— Fiz por merecer.
Brynna o estudou. Os músculos dançavam em sua mandíbula e sua garganta enquanto mastigava, destroçando a suculenta carne. Agora estava sentado com uma perna dobrada contra o peito, seu braço pendurando sobre o joelho, e notou quão imponente era o homem sob todo esse cabelo e essas maneiras rústicas. Ele a apanhou avaliando-o e levantou a comissura de sua boca barbada em um sorriso.
— Conte-me de suas batalhas, William.
O duque lançou mais carne a Caos. Fez uma breve pausa, como se algo estivesse dando voltas em sua mente; Levantou seu sombrio olhar e deixou que sua ferocidade a inundasse, até fazê-la tremer pelo que via.
— Jure-me lealdade, Brynna Risande, e te contarei uma história que seus filhos contarão a seus filhos.
— Lealdade — riu ela, mas o luxurioso brilho nos olhos de William lhe disse que não estava brincando — Mas não sou um cavalheiro — recordou incrédula.
— Certo, mas é uma guerreira. Corre por suas veias. Vi-o. É leal ao seu pai e ao seu lar. Sei que será leal a Brand. Agora, estou pedindo que me seja leal e compartilharei algo contigo que ninguém mais sabe. Nem sequer seu marido.
— Mas sou saxã — recordou Brynna com uma nova faísca nos olhos.
William sorriu gentilmente e outra vez ela se surpreendeu pela natureza terna desse homem, com reputação de selvagem.
— Logo, não importará. Presta-me juramento, bela dama?
Apanhada no fogo de seus olhos e o suave resplendor do fogo que o banhava em uma luz misteriosa e majestosa, Brynna ficou séria.
— Sim, farei o juramento.
O duque normando se ajoelhou frente a ela. Acomodou-a lentamente até sentá-la e perguntou se estava cômoda. Assegurou-lhe que sim, excitada e um pouco nervosa pelo que estava pedindo que fizesse.
— Já está — disse quando ela reuniu a força suficiente para permanecer sentada sem sua ajuda. Brynna teve que recordar que não eram dois meninos fazendo um juramento secreto de sangue de ser amigos para sempre. O duque a olhou direto nos olhos e ela teve a sensação de que tudo era um sonho. Ali estava, a ponto de jurar lealdade a um normando! A um homem que, frente à luz da fogueira, parecia tão ameaçador e dominante como assegurava sua reputação. Mas ele era muito mais que isso, disse a si mesma, vagamente consciente de que Caos se levantou de seu lugar de descanso, para sentar-se junto ao escuro guerreiro. O duque William da Normandia era um homem governado por sua habilidade e sabedoria em primeiro lugar, e depois por sua força física e poder.
— Repita depois de mim — disse o guerreiro contra o chiado do fogo —: Eu, Lady Brynna Risande, esposa de Lorde Brand Risande de Avarloch, juro lealdade ao duque William da Normandia. Prometo lealdade e honra em minha vida, ante os olhos de Deus.
Brynna repetiu o juramento e quando terminou, William tomou suas mãos e as beijou.
Brynna suspirou.
— Sinto-me um pouco tola.
— Não — sussurrou ele. Uma paixão sobrevoava seu ávido olhar, que ela jamais tinha visto em outro homem. Quando ele voltou a falar, sua voz era profunda e baixa, e Brynna estava convencida de que podia escutar o coração do guerreiro golpeando dentro de seu peito.
— Brynna — confiou maliciosamente —, ouviu falar de uma pequena aldeia no sul chamada Hastings?

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Capítulo 18

Brand percorreu os salões do castelo apressado. As tochas que ardiam de ambos os lados ondulavam em seu caminho. Procurou lorde Richard esperando, pelo bem do velho cavalheiro, que tivesse tido uma boa razão para permitir que sua filha saísse para cavalgar com apenas um cão ao seu lado. Brynna tinha saído há muito tempo, e com o passar dos minutos Brand ficava mais furioso com seu pai. Sabia que tinha sido muito rude com sua esposa, quando lhe disse que a faria retirar-se do salão. Mas, diabos, tinha necessitado tempo para pensar com clareza e não podia fazê-lo com ela ali lhe dizendo o quanto ele amava Colette. Por Deus, os olhos de sua esposa eram duas esmeraldas consumidas pelo fogo, e tinha querido perder-se neles para sempre. Tinha visto a dor em seu olhar, assim como o desafio, e se amaldiçoou. Não compreendia por que custava tanto confiar nele. Acaso pensava que só porque tinha permitido a entrada de Colette em Avarloch fugiria com ela? Recordou sua ira quando encontrou à donzela banhando-o. Tinha-o acusado de desejar também Alysia. Maldita seja por não acreditar nunca nele. Pela natureza desconfiada de sua esposa, qualquer um pensaria que tinha sido ela a traída, em lugar dele. Teria que conversar com ela a respeito. Ela o amava. Ele precisava reafirmar que nunca trairia esse amor.
Sua pele começou a arder, como se uma língua de fogo o tivesse percorrido ao pensar no amor de Brynna por ele. Pensou que era formosa, quando a viu pela primeira vez, mas a irresistível combinação de ternura e paixão que oferecia fazia com que lhe afrouxassem todos os músculos. Seu coração pulsou mais forte quando pensou em seu olhar sensual, em sua formosa risada que o fazia esquecer o passado e não pensar em ninguém mais que nela. Suspirou profundamente, recordando os gemidos, lânguidos que lhe tinha arrancado. Enquanto descia as escadas, viu lorde Richard entrando no castelo.
— Onde esteve? — perguntou Brand bruscamente, detendo-se a meio caminho em sua descida.
— Nas cavalariças — Lorde Richard levantou o olhar impassível, antes de seguir caminhando para o grande salão.
— Onde está minha esposa? — continuou sua lenta descida, não dando importância ao fato de que Richard só se deteve brevemente para olhá-lo —. Peter me disse que saiu daqui sozinha, com apenas um de meus cães.
Ver Brand era um pouco perturbador para Lorde Richard Dumont. Viver no castelo com ele, compartilhando vinho e risadas, quase tinha feito com que o pai de Brynna esquecesse o ardiloso, desumano guerreiro que tinha enfrentado no campo de batalha. Mas não podia esquecê-lo, em especial agora, quando seus olhos eram tão mortíferos como sua espada. Vê-lo era como ver a calma antes da tormenta... uma tormenta que podia destruir tudo em seu caminho.
— Aonde foi? — perguntou de novo. Seu olhar severo imobilizou Richard em seu lugar, até que Brand finalmente o alcançou.
— Saiu para cavalgar — Richard enfrentou seu genro diretamente. Com seus sentidos alertas, estava muito consciente de cada movimento que fazia o jovem cavalheiro. Observou as mãos pendentes ao lado do corpo, perto de sua espada.
— Cavalgar — repetiu suas palavras, e Richard soube que o sério cavalheiro não acreditava.
— Minha filha precisava livrar-se da desonra a qual você a submeteu hoje, Lorde Risande — disse Richard, entre dentes, sem lhe importar as conseqüências.
Por um momento, o guerreiro desapareceu, e a compressão seguida do remorso tomaram conta de Brand. Mas lutou contra suas emoções tão grosseiramente como se fossem um inimigo que enfrentava na batalha. Podia estar apaixonando-se por sua esposa, mas nunca deixaria que esse sentimento voltasse a governá-lo. No espaço de um momento, a batalha que Brand lutou consigo mesmo se evidenciou em seu rosto. Tinha que deter o que sentia por Brynna, antes que fosse muito tarde. Oui, tinha que detê-lo porque estava certo de que se o permitia, poderia amá-la até com maior intensidade, com maior paixão do que tinha amado Colette.
Lorde Richard se maravilhou ao observar o marido de sua filha desarmar-se e logo recompor-se, ante seus próprios olhos. Observou como um autocontrole nascido só para conquistar, era por sua vez conquistado. Mas durou só um instante, antes que o guerreiro vitorioso retornasse. E agora o guerreiro não fazia nada para ocultar sua raiva.
— Aonde foi e por que não retornou ainda? — exigiu Brand.
— Por quê? Por que, pergunta? — Richard estava furioso, com os olhos entrecerrados em uma expressão mortífera — A você não interessa se ela retornar ou não. — odiou-se nesse momento por ter se rendido ante esse homem e por ter tido que dar sua filha a um patife tão desalmado. Havia esperado que o normando chegasse a amar sua filha, que Brynna, de algum modo, pudesse ultrapassar suas defesas, mas ao olhar dentro das vastas profundidades dos olhos de Brand, suas esperanças se desvaneceram —. Não é isso o que queria no princípio, Lorde Risande? Não ter que casar-se com minha filha?
— Não serei humilhado por uma esposa que me abandona, porque está ferida em seus sentimentos — replicou furioso.
Richard o olhou, indignado. Queria odiar este bastardo normando, correr para ele com sua espada, mas seu coração sabia muito bem quanto tinha falhado com sua filha, e não fez nada além de olhar para os olhos gelados de Brand.
— Se ela for tão forte como lhe ensinei, nunca retornará para você — alfinetou —. Cavalgará e seguirá cavalgando e nunca voltará.
Richard estava agora muito zangado para reconhecer o pânico nos olhos de Brand, ante suas palavras.
— Rogue — advertiu Brand em uma voz completamente aterradora — que ela volte para mim ou você nunca chegará a ver a Normandia.
— Está me ameaçando, Brand?
Brand assentiu, e olhou Richard com uma intensidade imperturbável.
— Oui. E desta vez, talvez não tenha piedade de você.
Duas horas mais tarde, as ordens de Brand podiam ser ouvidas trovejando pelos corredores de Avarloch. Queria que Dante se preparasse para cavalgar e que seus outros dois cães estivessem preparados imediatamente. Lamentava ter ferido os sentimentos de sua esposa, mas não estava disposto a permitir que o abandonasse por isso. Encontraria-a e logo depois de estrangulá-la, por havê-lo obrigado a percorrer as almenas todo o dia, beijaria-a até deixá-la sem sentidos, maldita seja.
Colette saiu do castelo quando os homens se preparavam para abandonar o parapeito. Acomodou a capa ao redor dos ombros, para se proteger do intenso frio, enquanto observava Brand saltando sobre um corcel tão negro como os cachos que caíam soltos sobre a fronte de seu cavaleiro. A capa carmesim que usava se levantou de seus ombros, quando o vento uivou no parapeito. Ela acomodou o capuz sobre a cabeça e correu para ele, mas o vento esparramou a cabeleira como um halo ao redor da cabeça.
Sobre o cavalo, Brand a observou com olhos escuros, enquanto o frio lhe mordia a carne. Pensou naquele dia em que estava saindo de Graycliff para lutar contra os homens do barão Hawthorn, em uma época em que ter que deixar Colette partia sua alma. Ela tinha saído correndo de Graycliff para lhe dar um último adeus, quase como agora. Ele tinha saltado da sela de seu cavalo de guerra, tinha-a tomado em seus braços para desfrutar de seu aroma, para deleitar-se com o contato de seu corpo apertado contra o seu, e para lhe sussurrar seu amor ao ouvido. Agora, apertava os dentes, furioso pela demora.
— Brand! — chamou-o, apressando-se para alcançá-lo antes que abandonasse Avarloch. Quando chegou até ele, colocou uma pequena mão enluvada em sua coxa e olhou para cima, com seus olhos grandes e feiticeiros — Sentirei saudades, amado meu.
Brand riu, mas não havia rastros de alegria no som zombador.
— Por que corre atrás dessa mulher? Deixe-a ir, Brand, e fica comigo.
—Volte para dentro, Colette.
— Não respondeste minha pergunta. Por que corre atrás dela? — repetiu, tentando sustentar o mel em sua voz.
Um fino sorriso se desenhou em seus lábios, quando baixou a vista para olhá-la de seu cavalo.
— Porque, Colette, seu aroma me embriaga.
O leve bater das asas de seu nariz disse a Brand que suas palavras tinham tido o efeito que esperava, mas ofereceu um encantador sorriso.
— William também se foi, milorde. Não notou? Talvez estejam juntos.
O corcel de Brand se encabritou e protestou, pela repentina pressão das coxas de seu cavaleiro.
— Isso não importa — a desafiou —, nem todas as mulheres acham tão difícil manter as pernas fechadas — agarrou, com força, as rédeas para partir —. E, Colette — adicionou rude, voltando-se para olhar seu rosto—, a próxima vez que me chamar de "amado meu" farei com que cortem sua língua.
Imperturbável e ignorando sua ameaça, Colette de Marson dirigiu seu sorriso feiticeiro para o forte e belo irmão de Brand. Em resposta, Dante a olhou, com uma expressão de desprezo que desenhou uma covinha em sua bochecha. Uma brisa fria levou uma mecha negra de cabelo sobre o rosto e cobriu o brilho trêmulo de seus olhos, ocultando por um instante a repugnância que sentia.

O bosque se abria diante de Brand como mil portas que emitiam ecos, chamando... Atraindo-o. Sacudiu a cabeça para clarear seus pensamentos, mas a imagem de compridos, sinuosos corredores se transformava no rosto de Colette. O rosto de um anjo enviado para destrui-lo, pensou Brand zangado. Não havia mais lágrimas para derramar por ela, embora certa vez tinham caído como a chuva, inundando seu coração, sua alma. Já não existia o impulso de gritar como um norueguês frenético, enlouquecido por ter que engolir sua raiva. A dor que o havia consumido por completo já não existia. Não restava nada mais que uma insensibilidade letal sobre seu coração, que tentava protegê-lo do amor, transformado em seu inimigo.
Dante cavalgava ao seu lado em silêncio, conhecia aquelas sombras nos olhos de seu irmão. Não concordaria com ninguém que lhe dissesse que Brand já não sentia paixão. Na verdade, só olhar para os turbulentos olhos de seu irmão para ver o fogo que tinha ardido com tanto ímpeto. Dante sabia muito bem por que Brand era chamado "o Apaixonado": Como uma espada, atravessava a vida deixando que sua energia enchesse suas veias até que sua risada soava contundente e real, fazendo com que os que estavam ao seu lado se unissem a sua alegria. Mas sua escuridão era tão mortal como sua luz. Quando Brand cavalgava para a batalha, sua paixão não emergia. Mas sim se acendia, e qualquer que lutasse junto a ele, como seu irmão, podia sentir a vida que ele amava pulsando em seu corpo. O guerreiro ainda vivia, Dante sabia, recordando a destreza e a fúria com que seu irmão tinha empregado para conquistar o exército de Lorde Richard. As emoções ainda se acendiam dentro dele. Brand só tinha substituído sua risada pela dor, mas ainda podia sentir. Ainda vivia. Em algum lugar, o fogo ainda ardia. E porque ele o conhecia tão bem, era o único que reconhecia as chamas que brilhavam novamente quando Brand fixava seu olhar em sua esposa.
— Preocupa-me que talvez tenha acontecido alguma coisa — aventurou Dante, mantendo seu cavalo em um rápido galope curto junto ao de Brand.
Brand manteve o olhar fixo espessura das árvores, diretamente em frente deles.
— Seu pai me assegurou que ela conhece estes bosques como se fossem parte de sua própria casa.
— Oui, mas mesmo assim, me preocupa.
Silêncio:
— A mim também, Dante.

A forte gargalhada soou no silêncio do crepúsculo, reverberando contra os escuros ramos e fazendo-se soar nos ouvidos dos homens que percorriam o chão úmido e coberto de folhas. Brand deteve seu cavalo para escutar.
William.
— Por aqui — ordenou. Puxando as rédeas e guiando seu cavalo para o som conhecido.
Talvez estejam juntos. A voz de Colette zombava dele.
Sussurro e Triturador uivaram e ladraram, em seu frenesi pela descoberta, enquanto Caos respondia a seus chamados detrás de uma pequena elevação, na distância.
— Encontraram-nos — William sentou-se ao lado do fogo e olhou a elegante mulher sentada junto a ele. Sorriu, embora Brynna notasse um tom de desilusão em sua voz —. Recorde, minha mais bela e leal guerreira —sussurrou, enquanto o trovejar dos cavalos se fazia mais forte —, uma batalha te espera, e eu espero sua vitória.
— Sim, milorde — Brynna apertou a enorme mão e rapidamente plantou um beijo em sua bochecha —, e eu também espero a sua.
William levou um dedo aos lábios dela e o manteve ali. Por um momento, Brynna pensou que pretendia silenciá-la, mas os olhos tão selvagens descansavam como pétalas sobre seu rosto, como se a estivesse vendo pela última vez.
— Brynna, deve saber que sempre será importante para mim, e se alguma vez não se sentir amada, recorda que seu futuro rei te ama de verdade.
As lágrimas alagaram os olhos da moça e o duque suspirou profundamente, antes de ficar de pé em toda sua enorme estatura.
— Seque as lágrimas, senhora, seu marido se aproxima — sua voz tinha mudado no espaço de um segundo. O amigo de Brynna se foi e em seu lugar estava um homem de majestosa autoridade, que estudava a penumbra do bosque esperando a acusação que sabia estava a ponto de descer sobre ele.
A jovem tentou ficar de pé quando viu Brand, mas a dor da ferida em sua cabeça a fez cambalear. Fechou os olhos à escuridão que ameaçava tragá-la. Escutou a voz de seu marido como uma lufada de ar gelado contra sua pele.
— Isto te parece acolhedor, William? — disse Brand ao entrar na pequena clareira, iluminada pela fogueira. Seu olhar descansou sobre Brynna que estava sentada frente às chamas, parecendo aturdida.
— Oui, parece — sorriu William, mas sua voz era tão afiada e decidida como o ar invernal —, mas infelizmente, não para sua esposa. Caiu do cavalo e está ferida.
Brand desceu de sua montaria e, em um instante, estava ajoelhado junto a Brynna .
— Machucou-se muito?
A terna preocupação em seus olhos fez com que quisesse assegurar que a ferida não era séria.
— É só minha cabeça — disse brandamente.
Levou os dedos ao couro cabeludo e procurou, atentamente, nas espessas mechas de cobre que enroscavam em sua mão.
— Não há uma ferida aberta, só um calombo do tamanho de meu punho.
O quente fôlego de sua boca caiu sobre a bochecha de Brynna e ansiou voltar a cabeça para lhe dar um beijo, mas seu marido já estava de pé. Enfrentou William com tal severidade que Dante descendeu de seu cavalo e se aproximou, com cautela, de seu irmão.
— Por que não a levou de volta a Avarloch, William? — perguntou Brand, sua voz era um grunhido ameaçador.
Os dois guerreiros se olharam um momento, antes que o duque respondesse.
— Saí a pé, e o cavalo da senhora morreu na queda.
— Quanto tempo faz que está aqui com ela?
William lançou a seu amigo um sorriso benigno, e o fogo em seus profundos olhos cinzentos devia manter acesa sua amizade. A cena era familiar para Brand, e William sabia o que seu amigo estava pensando. Tinha que pôr fim a esses pensamentos rapidamente, não tentando convencer Brand da verdade, mas lhe permitindo chegar as suas próprias conclusões.
— O tempo suficiente para fazer o que você mais teme.
Brynna emitiu um som de protesto, mas o mortal assobio da espada de Brand ao sair de sua bainha a paralisou; o aço apontava para o duque normando.
— Brand, guarde a espada! — Dante deu um passo para seu irmão, incapaz de acreditar no que estava vendo. Mas William deu um passo atrás, seus olhos fixos em Brand.
Brand sentia-se selvagem, uma fúria imensa apossando-se de seus pensamentos, suas mãos tremiam fazendo com que a espada oscilasse em frente dele. Brynna não, por favor. O coração pulsava tão furiosamente no peito que pensou que vomitaria.
— Fez algo, William? Diga.
— Non, amigo — respondeu William suave e serenamente —, você me diz.
O silêncio caiu, como um manto, enquanto Brand olhava fixamente por cima de sua espada à pessoa em que tinha acreditado. Enfrentou os demônios da traição, cambaleando a beira do precipício uma vez mais. Mas este era William. Seu mais querido amigo o trairia? Brand soube, imediatamente, a resposta. Baixou a espada.
— Rogo que me perdoe William.
Dando um passo a frente, o duque se aproximou e bateu em seu rosto, afetuosamente.
— Já perdoei ami. — deu a volta, tocou o braço de Dante, tranqüilo e se dirigiu aos cavalos — Mas não volte a me provocar, ou te estriparei na frente dos formosos olhos de sua esposa — disse, por cima do ombro.
Brand embainhou a espada e olhou para Brynna. Escutou os passos de seu irmão que abandonavam a clareira. Seu coração se retorcia, em uma desesperada tentativa de negar. Que Deus o ajudasse, estava perdendo. Passou a mão pela boca e fechou os olhos. Era tão perigoso permitir-se amá-la? Retrocedeu, compreendendo que a profundidade do amor que podia sentir por Brynna era muito mais intensa que qualquer coisa que tivesse sentido por Colette. Mas Brynna não era Colette. Não era uma egoísta. Tinha provado sua lealdade para com seu lar e o povo que estava sob o amparo de seu pai. Tinha bárbaro, como ela o chamava. Diabos, já o tinha levado a beira do mundo, e ele a havia seguido. Cegamente, por certo! Mas em vez de cair, mostrou-lhe como era voar.
Ajoelhou-se junto a ela e tomou a mão para levar aos lábios.
— E você? Também me perdoa Brynna?
— Sim — sussurrou ela, em seguida, quase sem fôlego ante seu terno olhar. Queria lhe dizer que só de vê-lo, derretia-se como o mel aquecido pelo sol — Brand, eu... — quando ia continuar, os dedos acariciaram seus lábios.
— Ssh. Vamos para casa, Brynna. Terá que descansar, durante alguns dias — Deslizou os braços embaixo dela, erguendo-a do chão frio, como se não pesasse nada. Roçou a bochecha contra a sua cabeça, e deixou que seus lábios se atrasassem ali em um longo, doce beijo. Teria que estar estrangulando-a por ter causado tanta preocupação, mas estava aliviado de tê-la de novo em seus braços.
Aconchegada e segura contra seu peito, Brynna fechou os olhos e deixou que o aroma masculino a invadisse, despertando todos seus sentidos como pequenos fogos que ardiam e a derretiam. Respirou profundamente, descansando a cabeça no vão de seu ombro. Voltou o rosto levemente para cima para banhar-se no calor de seu pescoço.
Brand podia sentir os lábios de sua esposa sobre a pele. Enviavam línguas de fogo por suas costas. Gemeu brandamente, levou-a até seu cavalo, queria afastar-se de William e de seu irmão, para poder tomá-la ali mesmo onde estava de pé. Examinando a firmeza flexível de suas coxas com uma mão, apertou-as e as acariciou. Um fogo ardeu de seu umbigo até seus joelhos.
— Brynna — sussurrou, diminuindo o passo. A palavra soou como se tivesse sido arrancada contra sua vontade. Queria dizer como estava feliz por tê-la encontrado, e como a idéia de que ela pudesse abandoná-lo o tinha enlouquecido.
Brynna esperou que continuasse, mas ele não disse nada mais. Só a apertou mais forte, pressionando a bochecha contra sua cabeça. Sua voz estava carregada com a tensão do desejo que ardia, lutando para ser liberado. Desejo, não amor, disse a si mesma.
— Colette continua em Avarloch? — perguntou, sem erguer o olhar.
— Sim — respondeu Brand. Sentiu que sua esposa ficava rígida em seus braços e suspirou —, e não permitirei que minha esposa saia sozinha por aí cada vez que falo com essa rameira. Você e eu devemos ter uma conversa sobre sua falta de confiança, Brynna.
A fúria se desatou como um relâmpago esmeralda, quando levantou a cabeça e o olhou indignada.
— Minha falta de... — estava tão zangada que não pôde terminar. Recuperou a voz, entretanto —. Que razões me deu para confiar em ti? Não só tenta ocultar que ainda ama Colette, mas tomou posse de minha casa, e me fez sua esposa só para satisfazer a luxúria de seu membro normando, e agora zomba de mim, trazendo sua amante para minha casa para que também zombe de mim.
Brand se deteve e a olhou, indignado. Esteve tentado a soltá-la.
— Disse que não a amo. Parece ter dificuldade para acreditar em mim... Essa é outra conversa que devemos ter logo — voltou a caminhar —, perdoarei você por me acusar de zombar de ti, ou de permitir que alguém mais o faça, porque compreendo que esse galo na cabeça deve ter te deixado tonta.
Brand alcançou seu cavalo e colocou Brynna na sela. Foi bastante gentil, mas o rápido movimento fez doer a cabeça, tanto que pensou que perderia os sentidos, pelos enjôos. Tentou afastar-se dele, quando a acomodou entre suas fortes coxas, mas ele rodeou sua cintura com seu braço e a arrastou novamente para si.
— Ordenarei a Alysia que cuide de você, logo que chegarmos — sua voz era fria e seca — E pare de rebolar em meu colo. Daria-me pena ter que fazer amor e te ferir ainda mais.
Brynna queria gritar.
Outro cavalo trotou junto ao de Brand, lentamente. Ela levantou a vista. Uns olhos cinzentos se encontraram com os seu, em silêncio, mas a mensagem de William era clara e retumbou na cabeça dolorida de Brynna. Recorda, minha mais bela e leal guerreira, uma batalha te espera, e eu espero sua vitória.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Capítulo 19

Brynna estava de mau humor na cama, enquanto Alysia suspirava ao ver a comida de sua ama intocada.
— Deve comer para recuperar suas forças, minha senhora. — A donzela voltou a suspirar, quando a bandeja que empurrou para Brynna foi devolvida.
— Já tenho forças — disse furiosa — Força suficiente para descer, cravar as unhas e arrancar os olhos dessa bruxa da Colette.
Os grandes olhos de Alysia se abriram ainda mais, mas um sorriso se desenhou em seus lábios carnudos.
— Acredito que todas as mulheres em Avarloch dariam sua benção por vê-la fazer isso.
Brynna voltou a cabeça no espesso travesseiro em que estava reclinada e olhou sua donzela.
— Seu comportamento é tão detestável?
— Sim — Alysia assentiu e sentou na beira da cama — Quando está com Dante, arde como o ferro forjado nas chamas. O único homem ao qual não presta atenção é o duque William.
Brynna não sabia se amaldiçoava à perdida ou soluçava pela dor que seu comportamento estava causando em seu marido. Não choraria, decidiu rapidamente. Brand escolheu permitir que Colette ficasse em Avarloch, sem importar a tortura que causasse. Desde que pudesse extasiar-se com sua acetinada cabeleira loira, seus brilhantes e escuros olhos marrons... Brynna lutou para controlar a fúria que crescia em seu interior. Podia lutar contra Colette de Marson? Brand a amava, sempre amaria. Estava tão ocupado adoecendo por sua apaixonada, que não tinha tido tempo sequer para visitar sua esposa, desde que a trouxe de volta para casa.
Brynna se indignou ao recordar que tinha sido carregada como um bebê indefeso, frente ao sorriso divertido daquela bruxa. Brand havia lhe trazido diretamente para a cama, colocando-a ali sem dizer uma palavra. Agora ela apertava os punhos, obstinados, nos lençóis da cama, apertava os dentes para impedir que fluíssem as lágrimas que ameaçavam alagá-la. Que passe seus dias com essa sedutora, lamentou. Que Colette acabe com o que restar de seu coração. Ele merecia.
— Não quero saber o que está fazendo com ela, Alysia, entendeu?
— Mas, minha senhora, ele nem sequer...
— Entendeu? — a voz de Brynna soou tão afiada como uma adaga.
— Sim.
— Bem. Pode ir. E leve esta bandeja contigo.
Alysia assentiu e recolheu a bandeja da cama. Podia ver a dor de Brynna refletida no brilho de seus olhos e os tensos lábios que tremiam, tentando conter sua dor.
— Há alguém que queira ver? Seu pai, talvez?
— Não— respondeu. Estava cansada de permitir que seu pai visse sua dor constantemente. Já era bastante difícil para ele saber que Brand estava ali por sua culpa. Não desejava torturá-lo mais. Pensou em uns olhos da cor do aço e suaves como o veludo.
— Peça ao duque William que venha. Queria falar com ele.
— Partiu minha senhora.
— Partiu? — Brynna sentou-se na cama. Seus olhos arregalaram-se, quando piscou. Agarrou os lençóis tão fortemente, que seus dedos ficaram dormentes. — Quando?
— Esta manhã. Falou com Lorde Risande durante uns minutos, reuniu seus homens e partiu.
Alysia queria largar a bandeja e correr para sua ama. Nunca uma donzela tinha visto tanto vazio em uns olhos, como nos de Brynna nesse momento. Mas como apareceu, sumiu.
— Obrigado, Alysia — disse a jovem com toda a força que pôde reunir. Dispensou a moça com um breve movimento da cabeça.
Mal a donzela saiu, Brynna afundou a cabeça no travesseiro. Então o tosco normando tinha abandonado Avarloch, sem sequer dizer adeus. Como pôde fazer isso? Tentou deter as lágrimas, mas já não podia. Disse para si mesma que William da Normandia não era mais que um selvagem. Tinha estado certa disso, a princípio. Era frio, como seu marido. Bom, ela também podia ser como eles e não se importar ninguém. Mas seu coração ardia ante estes pensamentos, e não importava o quanto tentasse impedir, suas lágrimas caíram sem cessar, até que a escuridão que a consumia venceu e acabou adormecendo.

Brand estava sentado em uma cadeira acolchoada que ostentava o exuberante emblema verde e amarelo de Lorde Dumont. Apesar do crepitante fogo que ardia na lareira, o grande salão de Avarloch estava frio. Brand percorreu com um dedo o belo trabalho esculpido em uma taça de prata que
repousava ociosa sobre a mesa frente a ele. Estava sozinho com Sussurro, que dormia recostada aos seus pés. Brand se fixou vagamente no trabalho artesanal da taça. A prata estava finamente trabalhada, representando a figura de uma mulher com a cabeça jogada para trás, enquanto o corpo de seu amante se inclinava sobre ela, beijando-lhe o pescoço. As flores se abriam com cores invisíveis ao redor do casal, enquanto os ramos caiam em cima deles, como o abraço do amante. Estavam fazendo amor no bosque, pensou Brand, tal como ele quis fazer com Brynna, antes de trazê-la a casa. Tal como Colette fez com Alexander, antes que Brand o matasse. As sombras dançaram em seus olhos, enquanto sua mente o levou de volta ao lugar onde perdeu sua alegria.
Colette.
Traição.
— Cadela — Brand esticou a mão com violência, até alcançar a taça e a jogou contra a parede atrás dele. Sussurro se levantou com um salto e gemeu preguiçosa, antes de dar voltas em círculos e tornar a recostar-se.
— Brand?
A voz era de seda pura, como o suspiro de um anjo. Brand conhecia o som, tinha escutado muitas vezes e tinha sonhado com ele, depois. Olhou por cima das mãos com as quais tinha coberto o rosto.
— Deixe-me sozinho, Colette.
— Não, meu senhor — a música de sua voz emitiu um eco ao redor do salão, com uma doce inocência e uma feminilidade sedosa que drenou sua alma e o deixou esgotado.
— Não me visitou desde que cheguei meu senhor, nem me chamou ao seu quarto — Colette se movia para ele como se deslizasse — Rogo que me diga por que.
Brand a observou, com olhos nublados e cansados. O ar ao redor dela parecia dançar como se estivesse impregnado de calor.
— Por que nega algo que é tão evidente para todos, até para sua esposa? — perguntou Colette, gentilmente, à medida que se aproximava, dando voltas ao redor da mesa para chegar perto dele, roçando a superfície da mesa com a ponta do dedo.
— Não nego nada — disse Brand, mas ela deslizou para mais perto... Mais perto... Era como um sonho tornando-se realidade, enquanto a luz da lareira resplandecia sobre seu cabelo.
— Colette — o som de sua voz arrancou outro gemido da cadela a seus pés —, por que me traiu?
— Eu não traí nosso amor, Brand. Nunca deixei de te amar. — Como uma aparição, chegou até ele e ficou de joelhos frente a sua cadeira. — Não pensei em ninguém mais além de você, desde que me forçou a abandonar Graycliff. Trair você? Não, meu amor, é você quem me traiu quando se casou com outra — acariciava sua coxa enquanto falava, olhando para cima e sorrindo.
Brand fechou os olhos. Não havia fogo ardendo em seu interior que o impulsionasse a tomá-la... Não havia nada. Até sua raiva tinha desaparecido.
Brynna.

Sua mente deu voltas, sentiu-se embriagado com o vinho doce que esteve tomando toda a noite.
— Não posso dar meu coração por sua culpa, Colette.
— Porque seu coração me pertence, Brand — corrigiu ela.
Ele abriu os olhos e a observou deslizar entre suas pernas, subindo por seu corpo até que seu rosto esteve muito perto dele, até que pôde olhar diretamente em seus olhos, com os quais tinha sonhado tantas noites. Lentamente, levantou a mão para seu rosto e roçou a bochecha com o dedo. Colette respondeu ao contato com um leve suspiro. Estava a ponto de aproximar-se para beijá-lo, quando o horroroso vazio que tomava conta de sua alma se fez visível no brilho de seus olhos turquesa. Colette deteve-se, sobressaltada pela inexprimível dor de Brand. Que gritava mais forte que um trovão.
— Levou tanto de mim, Colette...
— Me ame de novo, Brand, e afastarei toda a dor que te causei. Faça com que sua esposa se vá. Livre-se dela. Não me importa. Encha-me de novo com seu amor, e te prometo...
Mas enquanto ela falava, Brand sacudia a cabeça. Colocou um dedo nos lábios para calá-la.
— Non, Colette. Isso é o que estou tentando dizer. Nego-me a amar alguém. Até a você. — Afastou a mão que ela tinha em sua coxa e se levantou da cadeira.
— Brand! — Colette ficou de pé, rapidamente, quando ele quis sair do salão —, se não poder me amar, então faça amor comigo. Recorda? — rogou, puxando seu braço para que ele a olhasse —, recorda como me sentia embaixo de ti?
Brand procurou em seus olhos e riu, mas o som arrancou outro gemido de Sussurro. Falou lenta e tranqüilamente, descobrindo, nesse momento, uma grande verdade, tão simples que sentiu-se um tolo por não tê-la compreendido antes.
— Minha esposa nunca ficará satisfeita apenas com meu desejo carnal, porque deseja também meu amor, enquanto que o amor nunca foi suficiente para ti, Colette. Você é feliz apenas tendo a espada de alguém em suas coxas. A espada de qualquer um — se afastou dela — Me temo que me tornei como você, meu doce anjo, só que ainda não estou tão desesperado. Para te desejar. — Esse aniquilador poder dava a Brand uma beleza tão devastadora que Colette ficou sem fôlego, apesar dele estar expressando seu desprezo por ela.
— Encontrarei outro para esquentar meu leito — afirmou —, e isso te partirá o coração esta noite.
Ele sacudiu a cabeça, sorrindo.
— Não tenho coração, Colette. Divirta-se.
Como se houvesse pronunciado uma ordem, Sussurro seguiu seu amo para fora do grande salão e subiu com ele as largas e sinuosas escadas, até a porta do quarto de Brynna.
Tal como na noite anterior, Brand entrou no quarto de sua esposa quando ela já estava dormindo. Observou-a dormindo profundamente em sua própria cama. Restavam só faíscas do fogo da lareira, mas ainda podia vê-la. A luz da lua se infiltrava através das janelas, lançando seus prateados raios sobre a fina camisola que se aderia a suas curvas sensuais. O espesso cabelo acobreado lhe acariciava o rosto. Brand se aproximou para tocá-lo, para sentir o fogo que a envolvia. Mas deixou a mão cair. Temia que nunca pudesse dar a Brynna o que desejava... O que merecia. Ela desejava o sussurro de doces promessas enquanto era tomada, e ele não podia pronunciá-las. Ela queria amor e ele estava muito assustado para dar. Entretanto, seu corpo tremia de só vê-la. Seu coração pulsava com força, sempre que o olhava do outro lado de um aposento. Seu rosto o perseguia em cada momento de sua vigília.
Brand fechou os olhos e inalou profundamente. Havia dito a si mesmo que não tomaria novamente Brynna, nem nessa noite, nem em nenhuma outra noite. Não permitiria que ela perdesse seu coração por um homem que nunca poderia dar o que necessitava. Mas vendo-a agora, sabia que não poderia resistir. Já a desejava. Com um esforço, afastou-se da cama e se dirigiu para a lareira. Colocou, com cuidado, mais lenha sobre as faíscas moribundas e observou as chamas lamberem vorazmente os pedaços de madeira. Enquanto o quarto se aquecia, Brand tomou seu lugar habitual em uma cadeira, frente a cama de Brynna para observá-la, enquanto sonhava. Não queria pensar por que sentia a necessidade de estar ali com ela, nem o questionava. Simplesmente queria observá-la. Com seus olhos azuis bebia todo o seu corpo, recordando o suave aroma de jasmim que banhava seus sentidos, quando ela estava perto e o brilho de seus olhos tão cheios de paixão, a sinceridade, e o amor à vida que ele tinha perdido. Escutou a canção de sua respiração profunda e rítmica e adormeceu na cadeira.
Brand abria caminho entre corredores escuros e sinuosos. Suas botas golpeavam o chão, levantando redemoinhos de pó e um aroma acre que aderia a sua pele, junto aos aromas de rosas e gardênias.
Ela estava ali, em alguma parte.
Colette.
A porta no final do corredor estava aberta, como a enorme boca de um dragão esperando tragar sua confiança e seu amor, enquanto as portas dos flancos o chamavam com vozes fantasmagóricas, incitando-o a entrar. Com os olhos fixos, Brand caminhou diretamente para a última porta. Desta vez, ao alcançá-la, não caiu de joelhos ante a visão de sua angelical amante, deitada sobre a relva.
Levou tudo de mim.
Alguém se moveu e Brand ergueu o olhar, exaltado ao ver Alexander.
— Acorde, Brand — era Brynna. Ele sorriu ao vê-la —, acorde e farei com que viva de novo — oferecia-lhe uma rosa perfeita. Com as mãos, o protegia dos espinhos. Algo se agitou dentro de sua alma ante o contato, ante as palavras ditas com tanto sentimento.
— Acorde e me permita te amar. Acorde.
Brand abriu os olhos. Era de manhã, inacabáveis campos verde esmeralda o olhavam. Suspirou, perdendo-se no amor que encontrou nos olhos de Brynna. Sua cabeleira caía como labaredas sobre os dedos de Brand, que estavam agarrados ao braço da cadeira. Sorriu ao vê-la inclinada sobre ele.
— Seu sonho está cheio de fantasmas — disse ela, com certeza.
— Oui.
Brynna o estudou durante um momento, com terna preocupação; o brilho esmeralda escureceu até um tom oliva, enquanto as sombras a alagavam, então se voltou, num redemoinho de gaze. Foi até sua cama e se sentou, olhando para a janela. De costas para ele, pegou um pente e
Passou-o pelo cabelo.
— O que está fazendo aqui?
Brand a observou. Observou o cabelo aderido a seus seios e quis brincar com suas mechas de fogo, acariciá-la tão sedutoramente como ela acariciava seu cabelo.
— Sou seu marido. Onde mais passaria a noite?
— Em minha cama talvez? — replicou ela bruscamente antes de olhá-lo —, ou com Colette.
— Brynna — Brand pronunciou seu nome com tanta ternura que ela quis chorar ao ouvir o doce som —, não desejo Colette. Se fosse assim, seria sincero com você desde o principio. Mentir leva a desconfiança e eu valorizo muito a confiança. Como pode não saber disso, a esta altura? — ela levantou os olhos para olhá-lo, enquanto ele falava —. Estou aqui contigo. É onde quero estar.
— Mas sonha com ela. O que significa isso, Brand? — a sincera e aflita curiosidade em sua voz apertou o coração de Brand —. Diga-me, por que permite que sua deusa persiga-me também?
Brand sacudiu a cabeça.
— Você é a deusa, bela Brynna — procurou em seus olhos, um pouco perdido e ansioso. A respiração dela vacilou. Seu apetite a convocava, mas não se moveu da cama —. Seu cabelo é como uma labareda que queima quando toca minha pele — disse com voz rouca enquanto ficava de pé. Brynna sentiu que sua determinação se dissolvia quando ele parou frente a ela, olhando-a com seus formosos olhos —. Seu sorriso me renova a alma.
O contato de seu olhar era quase físico, enquanto a percorria. Custava-lhe respirar, fechou os olhos para defender-se da paixão a impulsionava para ele. Ajoelhou-se diante dela e levou sua mão aos lábios. Roçou com um beijo a parte interna de seu pulso.
— É tão formosa.
— Não.
— Oui. — Sua voz cobriu a dela, sedutora, crua e totalmente masculina. Com a ponta dos dedos percorreu sua bochecha até a suave curva de sua boca —, quero saborear o néctar destes lábios. Quero me empapar da paixão pela vida que pulsa dentro de ti. Ajuda-me? — aproximou-se mais dela até que os lábios de ambos se roçaram e sua língua começou a saboreá-la, como disse que o faria.
Brynna estava perdida em um beijo que era como seu marido... íntimo, intenso, feroz e terno.
— Brand... — Brynna ofegava, enquanto ele a bebia mais profundamente e traçava um atalho ardente ao longo de seu pescoço —, deve saber que se a tomar e te perder, meu coração se romperá em pedaços, como o teu.
Bebendo seus lamentos, Brand deixou cair seu corpo poderoso sobre o dela, tremendo com um apetite sensual que era tão forte como seu controle. Deixou de beijá-la por um instante para falar, seus lábios percorreram a fronte, o nariz, as bochechas, e outra vez os lábios.
— Não sei quanto poderia te machucar — sussurrou, beijando os cílios de Brynna, capturando as lágrimas cristalinas que ela tentava negar —, por isso me mantenho afastado. Só peço sua ajuda.
Ele se afastou para olhá-la. O escuro olhar que a jovem descobriu era tão real como seu desejo por ela. Por Deus, amava este homem.
— Diga-me como te ajudar, Brand, e farei o que me pedir. Quero tanto você, marido.
O sorriso dele era tão belo como o despertar do amanhecer.
— Sei que me ama — seu sorriso se desvaneceu levemente —. Mas não sei como recuperar o que me tirou a traição.
— Está bem — sussurrou Brynna —, agradeço por ter me dito a verdade, desde o início — deixou que um sorriso agraciasse seu rosto, e ruborizou quando Brand inalou fortemente —. Estou renovando sua alma, marido?
Uma risada leve e a excitação sensual enredaram a garganta de Brand.
— Assim é. — ficou de pé com um autocontrole que surpreendeu a si mesmo e tomou as mãos de Brynna.
— Sente-se suficientemente bem para tomar o café da manhã comigo esta manhã? — perguntou-lhe. Seus olhos caíram sobre ela, tocando-a como uma profunda carícia. Brynna assentiu com a cabeça, enquanto afastava uma mecha de cobre que tinha caído sobre a bochecha —. Esperarei lá fora enquanto se veste.
— Não tem por que sair — protestou ela —, é meu marido.
Brand se afastou dela.
— Oui, mas só a lembrança de seus seios me enlouquece, temo que não seria capaz de me controlar se os visse de novo e não pudesse saboreá-los.
— Um fogo próprio assaltou Brynna ao ouvir essas palavras e a paixão em sua voz. Ofereceu-lhe um sorriso luxurioso. — Esperarei lá fora. — Sem esperar sua resposta, Brand saiu do quarto.
O coração de Brynna pulsava freneticamente. Brand tinha se afastado para protegê-la dele mesmo. A idéia fez com que o amasse ainda mais. E era seu amor por ele que fazia arder sua paixão, como um incêndio descontrolado, queimando-a, fazendo com que cada nervo de seu corpo ardesse. Ansiava que a tomasse, queria senti-lo penetrando-a com seu primitivo poder. Desejava escutá-lo pronunciar seu nome, enquanto a embalava, como o oceano contra um escarpado rochoso. A esperança se agitou uma vez mais dentro de Brynna. Algo lhe dizia que as altas paredes das muralhas que Brand tinha construído ao redor de seu coração estavam começando a cair. Por Deus, essas paredes eram fortes. Mas ela entendia porque quando o olhava nos olhos. Brand dava tudo de si em tudo o que fazia, e isso incluía o amor a Colette. Brynna se deu conta com uma clareza reveladora que provavelmente não se teria apaixonado por ele, se não fosse testemunha de sua entrega total naquele dia no lago. Não o teria amado, se ele tivesse sido capaz de renunciar a Colette tão facilmente. Queria ser amada com esse tipo de compromisso total, com confiança e lealdade, e ela retribuiria. Ah, ele era digno de sua luta, digno de sua paciência. Era um coração que se ela pudesse conquistar, pertenceria-lhe para sempre. Sairia vitoriosa. Mas as grandes vitórias levavam tempo. Todos os bons e leais guerreiros sabiam.
Saltou da cama e colocou um vestido de suave veludo carmesim. Arrumou o cabelo em uma espessa trança, que deixou cair sobre as costas e completou o penteado com um fino aro de rubis diminutos que caíam sobre sua fronte. Quando terminou de vestir-se, refugiou-se na determinação que necessitaria para travar essa batalha até o final, e saiu tranqüila do quarto.
Brand estava sentado em um pequeno banco contra a parede com suas longas pernas esticadas. Quando abriu a porta, recebeu-a com um sorriso cálido e ficou de pé, preparado para escoltar sua esposa à mesa do café da manhã, pela primeira vez desde que estavam casados.
Ao erguer o olhar, Brynna encontrou um olhar azul marinho que a observava, intensamente. Os olhos de Brand percorreram seu rosto e estudaram seus suaves contornos.
— É tão bela que me tira o fôlego — disse levando sua mão aos lábios.
— E você o meu, marido.
Ergueu o olhar de sua mão e Brynna estremeceu de desejo diante do sensual olhar que lhe deu.
— Então é melhor não nos olharmos, ou não vamos descer as escadas.
Ela riu ante a imagem que ele evocava, e deteve-se quando seu marido começou a rir com ela. Seu rosto tinha mudado, irradiava uma alegria que acelerou o coração de Brynna. Perguntou-se se poderia sobreviver ante tanta felicidade quando verdadeiramente a encontrasse de novo.
— Deus santo, senhor, é tão belo — sussurrou apenas ela.
Brand levantou uma sobrancelha negra, divertido e surpreso. Dando um passo para trás, fez uma reverência, com um sorriso verdadeiro e modesto desenhado nos lábios.
— Obrigado... acredito. — Aproximou-a dele, moldando sua firme calidez contra seu corpo. Deslizou os braços ao redor de sua cintura até que ela pôde sentir o batimento de seu coração contra o peito. Seus olhos eram vastos oceanos, lagos sem fundo. Mas já não estavam vazios. De fato, a emoção que expressavam era tão poderosa que, por um momento, Brynna pensou que morreria em seus braços, e se acontecesse, morreria feliz.
Ele estremeceu ao falar, com medo de que o que sentia, nesse momento, escapasse antes que pudesse dizer.
— Prometa que nunca me deixará sem seu sorriso, Brynna. Olhe-me sempre como neste momento, me banhando na luz do sol da primavera. Juro, esposa, posso sentir seu amor me chamando. E prometo sempre ser fiel a esse amor.
Brynna roçou os lábios com a ponta dos dedos e o observou, enquanto ele os beijava. Sabia que tinha falado com a verdade. Sempre seria fiel. Sim, estava derrubando essas muralhas. Desafiante, ela se atreveu a manter viva a esperança. E nesse momento não importava, soube nesse momento que nunca mais iria separar-se dele, nem por um instante. Não importava se a amava ou não, somente vê-lo, sentir seu aroma, dava-lhe vida.
— E eu serei fiel ao meu amor por ti, meu formoso guerreiro. Prometo, com todo meu coração.
Brand a beijou, e finalmente as vozes que o perseguiam silenciaram.

Capítulo 20

O grande salão estava cheio de gente. Os sons das risadas se mesclavam com o alaúde e a harpa, enquanto os cavalheiros e as damas comiam e os vassalos e os servos batiam as taças, em inúmeros brindes. O aroma do faisão recém assado impregnava o ar.
Brynna percorreu o enorme recinto com o olhar e ergueu os olhos para o homem de que a levava pelo braço. As títulos e posições significavam pouco para Lorde Brand Risande, um fato que ele tinha deixado muito em claro até frente ao rei. Brand não outorgava seu respeito facilmente, mas sim tinham que ganhá-lo, dava todas as oportunidades para isso, ao tratar a todos em Avarloch com justiça. Brynna sorriu para seu marido enquanto a guiava através do salão. Este era seu lar, e embora seu pai fosse um homem justo e amável, nunca tinha visto Avarloch tão cheio de vida.
Brand procurou com o olhar Lorde Richard entre a multidão. Quando o encontrou, tomou Brynna pela mão e a guiou para seu pai. Lorde Richard Dumont observou o casal que se aproximava entrecerrando os olhos e se perguntou se o sorriso de sua filha era genuíno. Duvidava, logo depois de tê-la visto tão triste em seu quarto, na manhã anterior. Mas, pensou Richard desconcertado, não havia nada oculto, nada calculado no cálido sorriso que Lorde Brand lhe oferecia. O homem realmente irradiava tanta felicidade que Richard Dumont se perguntou o que tinha acontecido entre sua filha e seu marido, nas últimas vinte e quatro horas.
— Lorde Richard — Brand o saudou serenamente, quando chegaram junto a ele.
— Senhor — respondeu o pai de Brynna com uma leve inclinação da cabeça e voltou sua atenção para sua filha —. Brynnafar — aproximou-se para beijá-la no rosto —, como se sente?
— Estou bem, pai — seus olhos passaram de um ao outro homem. Franziu o cenho ao perceber a raiva de seu pai — O que aconteceu? — perguntou, cautelosamente.
Brand lhe respondeu, dando um passo para frente para colocar-se frente a frente com seu pai.
—Temo que fui mais que desrespeitoso com seu pai no outro dia. Lorde Richard, peço que aceite minhas desculpas pelo modo como falei. Não há desculpas para meu comportamento.
Richard o olhou durante o que, para Brynna pareceu uma eternidade. Quase podia ver seu pai procurando a sinceridade dentro de Brand.
— Se pensasse que você estava preocupado por minha filha nesse momento, teria...
— Estava — o interrompeu —, muito mais do que estava disposto a admitir. — deu a volta e fixou em sua esposa um olhar significativo — muito.
Richard olhou para sua filha, mas ela não tinha idéia a que se referiam e portanto não pôde dar nenhuma resposta. Surpreso pela desculpa de Brand e por admitir que sentia algo por sua filha, Lorde Richard ficou sem palavras.
— Muito bem, então. Aceito sua desculpa.
Brand deu um sorriso tão radiante que Brynna estremeceu. Sussurrou-lhe ao ouvido que precisava falar com Dante e a deixou a sós com seu pai.
— O que aconteceu entre vocês dois? — perguntou —. Juro olhava para você como se fosse um escudeiro doente de amor.
O coração de Brynna saltou ao escutar as palavras de seu pai, enquanto seus olhos seguiam obstinados a Brand, que agora estava tomando assento junto a seu irmão.
— Acredito que meu marido está se transformando no homem fantasia — deu a volta para olhar seu pai e as cálidas lágrimas em seu rosto o emocionaram, embora não tivesse idéia do que estava falando. — Amo-o, pai — explicou —, e acredito que ele está começando a corresponder.
Seu pai sorriu com ternura e rodeou seus ombros com o braço.
— Isso não é nada difícil, Brynnafar.
— Não — disse Brynna. Finalmente acreditava que Brand já não amava Colette de Marson. Seu coração não era cativo do amor, mas do temor de voltar a amar —, a traição dela o deixa prisioneiro.
Richard deu a volta para seguir o olhar de sua filha. Colette de Marson entrou no salão de braço com Sir Jeffrey Hamlin, um dos homens que a tinha escoltado a Avarloch. Seu cabelo era da cor do trigo banhado pelo sol, e o tinha preso ao redor da cabeça, como uma coroa. Seus olhos continham o encanto e a inocência de uma menina. Enquanto observava sua pequena figura entrar em salão, Brynna pôde entender por que Brand a tinha amado tanto. Os olhares das duas mulheres se encontraram, por um breve instante, e Colette sorriu antes de baixar o olhar. O sangue de Brynna fervia.
— Ela não me engana com sua beleza angelical. William me disse como... — de repente, seus olhos se arregalaram ao olhar seu pai—. Não partiu com ele!
— Com quem?
— Com o duque... imaginava que iria para a Normandia com ele. Partiu sem ela!
Seu pai se inclinou mais.
— Minha querida — sussurrou enquanto Colette passava ao seu lado—, William não voltou para a Normandia. Seu mais leal servente, o duque, partiu para lutar por você.
Brynna olhou estupefata a seu pai. Suas sobrancelhas se arquearam, expressando sua confusão. Mas antes que pudesse interrogá-lo, o som de uma risada doce assaltou seus ouvidos. Voltou-se bem a tempo de ver Colette jogar a cabeça para trás, convidando sua escolta a enterrar o rosto mais profundamente em seu pescoço. Com os olhos entrecerrados, Colette gemeu suficientemente forte para que todos no grande salão se voltassem para olhar para ela. Todos, inclusive Brand.
— Não vale morder, Jeffrey! — Colette riu como uma menina e afastou o homem com um empurrão, _ Guarde isso para o quarto — voltou a cabeça em direção a Brand.
Brynna ficou paralisada em seu lugar observando a reação de seu marido, que foi muito diferente do que tinha previsto. Brand mal levantou a vista com um vago interesse para o apaixonado casal e continuou sua conversa com Dante. Brynna queria arrancar os olhos da mulher.
— Tenta zombar de meu marido frente a seus homens — observou furiosa, mais para si que para seu pai. Mas Lorde Richard respondeu de qualquer forma.
— Então vá e o faça sentir como o homem que é, Brynnafar. Mostre-lhe que se casou com uma mulher e não com uma menina malcriada.
A batalha. A guerra. Os olhos de Brynna se acenderam e endireitou os ombros com determinação. Amava Brand. Amou-o no primeiro instante em que o viu, vivo e exuberante. Sabia o que ele queria, sabia como fazer com que seu marido se sentisse feroz e vivo. A única coisa que não tinha perdido com a traição de Colette era o desejo. E então, com um sorriso sensual formando-se em seus lábios, tirou os broches do cabelo e cruzou o salão com a graça digna de uma rainha.
A energia infundiu o ar com uma sensualidade indomável que fez com que todas as cabeças se voltassem para olhá-la passar, coroada por sua magnífica cabeleira que caía sobre os ombros e o peito ao andar. Brand viu sua esposa aproximar-se e a expressão em seus lábios e o olhar de desejo disse a Brynna que todos outros no salão já não existiam, inclusive Colette. A paixão de Brynna chamava a seu marido, como um falcão guiado pelo assobio de seu amo.
Os olhos de Brand escureceram e a observou com um sorriso ostensivamente masculino. Ficou de pé para recebê-la. Quando ela se aproximou, aspirou seu conhecido aroma de jasmim. Passou a mão ao redor de sua cintura e ofereceu uma cadeira junto à sua. Seus olhos nunca abandonaram os dela, enquanto o apetite levitava como uma espessa névoa ao redor de ambos.
— Tem muitos assuntos para tratar aqui esta manhã, marido? — os lábios de Brynna roçaram seu ouvido, enquanto se sentava.
A expressão de Brand mudou em seguida. Surpreendeu-se ao descobrir as claras intenções de sua jovem esposa; sorriu, respondendo:
— Nada que não possa esperar, querida. Mas acreditei que havíamos concordado que...
— Maravilhoso. Apresse-se com Dante, por favor — interrompeu Brynna.
A insinuação erótica em sua voz enviou uma labareda de fogo através do corpo de Brand. O que estava fazendo?, Perguntou-se. Por que seus olhos rogavam que a arrastasse para seu quarto? Ele não queria usar seu corpo sem dar o que ela necessitava, e sabia que ela tampouco queria isso. Observou-a recolher uma bolacha e levar à boca. O mel gotejou sobre seu lábio inferior e ela recolheu com a língua. Brand inalou com todo seu ser, sabia que devia possuí-la.
Como se lesse os pensamentos de seu marido, a moça entrecerrou os olhos e captou o modo como a avaliava.
— O que aconteceu, Brynna?
— O que aconteceu com o que, marido?
Ele sorriu. Mas além de um anseio selvagem, ela podia ver a confusão em seus olhos.
— Por que me tenta desta maneira?
Quando ele falou, escutou-se a risada de Colette outra vez, enquanto seu amante lhe apertava os seios, à vista de todos. De repente, Brand compreendeu tudo, e seu sorriso se desvaneceu.
— Faz isto só para que não preste atenção nela — acusou-a, em voz baixa.
— Ora! — riu Brynna e voltou a mastigar sua bolacha —. Sou eu que tenho toda sua atenção, meu senhor — baixou a voz para que ninguém além de seu marido pudesse escutá-la —, é meu corpo que se deleitará com seu ardente desejo. Minha carne que te sentirá pulsando dentro de mim, em nossa cama. Recorda — acrescentou, com uma faísca nos olhos—, jurou fidelidade.
Brand estudou sua esposa com suspeita, enquanto lutava para controlar a ofegante dureza que crescia sob a mesa. A certeza em sua voz lhe assegurou que ela acreditava no que havia dito.
— Faz isto porque sente pena de mim — concluiu ele, golpeando a mesa com a palma de sua mão —. Não tenha pena de mim, Brynna.
Ela se voltou em sua cadeira, para ficar frente a frente com seu marido. Seus olhos eram faíscas ardentes enquanto se inclinava mais perto de seu rosto. Brand quase podia sentir o calor que emanava dela, o anseio que fazia tremer sua voz, e a ardente necessidade que fazia com que seus seios se elevassem inchados. Sobre seu vestido quando respirava.
— Não tenho pena de você, meu amor. Quero te agradar. Quero olhar dentro de seus olhos e que você olhe dentro dos meus, enquanto nossos corações batem um contra o outro e nossos corpos gozam. Quero sentir seu cabelo enroscado em meus dedos, enquanto usa a língua para acelerar o pulsar em minha garganta — sua voz era um murmúrio sensual que o provocava, atormentava e colocava Brand tão tenso como um látego. Um sorriso malvado apareceu no rosto dela, ao vê-lo retorcer-se em sua cadeira e continuou torturando-o ainda mais — Quero acariciar sua dureza com a palma de minha mão, esfregar sua carne sedosa e... Quero te saborear — concluiu ela, desfrutando do efeito que tinha em seu marido. Inclinou-se ainda mais perto e beijou o sorriso que ficou em seus lábios.
Voltando-se em sua cadeira, Brand apoiou o cotovelo sobre a mesa e levou um punho embaixo do queixo. Permaneceu sentado desse modo, enquanto os segundos tornavam-se minutos e Brynna se perguntou se não tinha ido muito longe.
— Está zangado comigo, Brand?
Deslizou seus olhos brilhantes para ela.
— Non — disse simplesmente —, mas necessito uns minutos, para... relaxar antes de te carregar pelas escadas e te tomar como merece — Ficou em silencio durante algum tempo e depois ficou de pé.
Um canto da boca de Brynna ergueu-se, desenhando um sorriso encantador quando viu que o corpo dele não havia ‘relaxado’ completamente.
Brand correu a cadeira dela para trás, com um movimento rápido e levantou sua esposa em seus braços.
— Vamos nos retirar — disse em voz alta, diante dos rostos surpresos sem que seu selvagem olhar abandonasse os olhos de sua esposa —. Desfrutem do resto do dia, senhoras e senhores.
Brynna riu e jogou os braços ao redor do pescoço de seu marido, enquanto era carregada para fora do grande salão.

Brand fechou a porta com um pontapé e levou Brynna para a enorme cama com dossel. Ela olhava-o extasiada, enquanto ele a recostava gentilmente sobre o colchão de plumas. Seu corpo poderoso se inclinou para beijá-la apaixonadamente.
— Dói só te olhar — sussurrou ela, quando ele se afastou lentamente.
— Onde? — levantou a saia carmesim e roçou com os dedos o aveludado monte, que excitou-se ainda mais sob seu contato sedoso —, dói aqui?
Ela assentiu excitada. Moveu os quadris acrescentando pressão aos dedos dele. O gemido profundo que Brand arrancou de seus lábios fez com que seu corpo se esticasse pela urgência feroz de estar dentro dela.
— Falou de me dar agradar, mas me deixe-me te agradar primeiro, Brynna — sua voz ofegante era quase irreconhecível por seu desejo incontrolável. Os dedos de Brand trabalharam com uma lenta delicadeza enquanto desatava um a um os laços de seu vestido. Deslizou suas mãos sob o tecido, roçando com as palmas o cetim de seus seios e os sensíveis mamilos que endureciam com seu contato. O vestido caiu de seus ombros até a cintura, acariciando seus joelhos. Brand levantou as mãos e simplesmente observou a beleza que tinha exposto.
— É terrivelmente selvagem, marido — gemeu ela, observando seu poder masculino.
— Sinto-me terrivelmente selvagem — o sorriso que deu era tão indomável quanto a carícia de seus dentes contra sua carne —. Deleita minha língua com o mel mais doce — lambeu o vale entre seus seios. A ponta de sua língua traçou um círculo ao redor de seu mamilo e lentamente o envolveu com os lábios. A carícia de sua boca se transformou em intensa lascívia. O calor fluía como correntes através dela... E arrancava lânguidos gemidos de sua garganta.
— Agrado-te? — perguntou Brand, observando a reação de sua esposa enquanto enviava fogo para o pescoço com as doces pinceladas de sua língua —, estou acendendo sua paixão?
Brynna não podia responder. Quase não podia respirar enquanto seus dedos continuavam traçando um ardente caminho para o monte acobreado entre suas pernas. Os dedos ásperos tornaram-se suaves ao sondar as delicadas dobras que se amoldavam a ele. Passou as pontas dos dedos lentamente sobre seu sexo, fazendo-a tremer enquanto um trovão explodia dentro dela. Mesmo assim, ele seguia sondando, além das delicadas pétalas que pulsavam de desejo.
— Floresce para mim tão rapidamente.
— Sim — ofegava ela, tão ardente quanto o líquido que empapava os dedos dele.
Brand inspirou profundamente, entre seus dentes apertados. Seu prazer estava se convertendo em agonia, enquanto sua carne dura lutava para libertar-se das calças. Ficou de pé; parecia um caçador que tinha encontrado sua presa. Brynna o observou com olhos arregalados, enquanto ele se despia. Estava completamente excitado, tão tenso que parecia a ponto de explodir. Ela sorriu cativa do êxtase diante de seu corpo poderoso e resplandecente de desejo por ela.
— É formoso... magnífico.
— Non — Brand sacudiu a cabeça —, você é formosa. Não posso descrever o que é para mim, Brynna.
— Então mostre-me isso, meu belo cavalheiro — convocou-o e ele obedeceu.
O leve roçar de seus dedos enviou fogo pela poderosa coxa do Brand enquanto empurrava para abrir suas pernas e se ajoelhava entre elas. Sua virilidade pulsava contra a carne de Brynna, quente e viva, ansiando. Ela a percorreu com os dedos, fechou a mão acariciando delicadamente o aveludado aço.
—Toma o que quiser — sussurrou sensualmente —, já não posso esperar para sentir esta força dentro de mim.
Brand fechou os olhos e emitiu um som abafado, como se a paixão estivesse sendo arrancada brutalmente de seu corpo. Ergueu-se sobre os joelhos até levantar-se em toda sua estatura acima dela. Um sorriso transformou o rosto selvagem. Deslizou a mão dela para baixo e para cima, uma e outra vez, até que Brynna pensou que gozaria em sua mão. Abriu os olhos e sorriu tão maliciosamente que ela se assustaria se não estivesse sentindo o mesmo.
— Abra-se para mim — ordenou.
Ela obedeceu, rodeando-o com as pernas enquanto ele descia sobre seu corpo. Seus olhos a imobilizaram quando a penetrou. Lenta, provocativamente, enviando onda atrás de onda de ardentes convulsões por seu interior; os assaltos do corpo de Brand tornaram-se mais urgentes, deliciosamente primitivos. Balançou-a, enroscando os dedos em seu cabelo, procurando sua boca com a língua enquanto todo seu corpo a reclamava, vorazmente. Ela agarrou-se a ele com as pernas, as unhas, arqueando cada vez mais as costas. Quanto mais fortemente se agarrava, mais intenso se tornava o desejo dele, até que o prazer explodiu dentro de Brynna, fazendo-a tremer enquanto gritava seu nome.
Saboreando cada fragmento de seu calor, Brand se retirou lentamente, depois deslizou dentro dela outra vez, provocando-a até gozar. Seu corpo tenso acariciava cada centímetro dele. Deleitava-se com cada espasmo que pulsava, que apertava e soltava, seus olhos a penetravam tão profundamente como seu corpo. Permanecia em silêncio enquanto a tomava, como uma besta selvagem, enquanto seu corpo a possuía.
E foi em seu silêncio que Brynna escutou o coração dele. Tinha ansiado olhar dentro desse sorriso pecaminoso e sensualmente sombrio. Ver o êxtase que uma vez a sobressaltou enquanto ele nadava, e novamente quando a tomou tão grosseiramente. Brynna tinha pensado que seu triunfo chegaria com esse sorriso. Mas estava ali, no sutil arco de sua sobrancelha, no silencioso desejo de seus olhos enquanto beijava seu rosto, e Brynna entendeu que tomá-la já não era suficiente. Ele queria dar. No silêncio de sua paixão, ela pôde escutar seu coração batendo em doce rendição.
Mais tarde, ficou deitada, enroscada em seus braços, com uma de suas poderosas pernas em cima das dela. Ele não tinha pronunciado uma palavra, mesmo depois de cair esgotado e trêmulo sobre ela. Aconchegou-a em seus braços, beijando a fronte, as bochechas, os lábios, tudo com um delicioso cuidado. Brynna fechou os olhos, presa na força de seu peito e se perguntou se o que tinha visto em seus olhos era real ou só sua obcecada esperança agitando-se uma vez mais. Queria perguntar, mas não se atreveu, temia estar equivocada.
— Tenho fome — sussurrou ela, acariciando as linhas de seu peito com os dedos.
Brand se moveu na cama aproximando-a dele.
— Eu também — respondeu com voz rouca.
Levantando a cabeça para vê-lo, Brynna sorriu enquanto o gentil brilho de seus olhos transformava-se em uma labareda voluptuosa.
— O guerreiro volta a despertar.
— Oui.
Sob as colchas, delicados dedos tocaram-no, medindo sua carne excitada.
— Deixe-me te agradar, como prometi — ela acariciou seu rígido órgão e sorriu, sentindo o tenso tremor percorrendo seu marido.
— Onde aprendeu a agradar a um homem assim? — ofegou Brand fechando os olhos sob o amado contato de sua mão.
— Alysia me contou muitas coisas. É turca, como sabe. Vivia no harém de um sultão antes de meu pai trazê-la para cá.
— Isso explica por que Dante sempre está sorrindo.
— Como estará você amanhã, meu guerreiro — Brynna pressionou os lábios contra o quente e musculoso pilar de seu pescoço. Sua língua traçou um fogoso atalho até seu peito. O sabor de seu salgado aroma masculino a embriagou como se estivesse bebendo vinho. Recordou como ele tinha sugado docemente seus mamilos, atraindo-a com insaciáveis embora delicados beijos. Sua língua revoou sobre os mamilos dele, chupou e sorriu secretamente, diante do tenso gemido que arrancou.
O corpo de Brand se esticou com a selvagem paixão que o percorria com cada carícia da mão de sua esposa.
— Como pode um instrumento aveludado tão esplêndido crescer tão rígido entre meus dedos?
— Cresce diante de sua presença, mulher — Brand disse ofegante, observando sua acobreada juba deslizar para baixo por seu corpo.
— Realmente? — perguntou Brynna, acendendo fogo ao passar para o interior de sua coxa —. Penso que deve doer... — fez uma pausa levantando o olhar de sua carne e provocando um sorriso—, mesmo se for beijado.
O fogo rugiu indomável, sacudindo o corpo de Brand enquanto os lábios dela o acariciavam e o calor pulsava de suas sedosas carícias. A língua percorreu todo o comprimento de seu membro, antes de abraçar sua paixão no calor de sua boca. Brand gemeu, enquanto o êxtase convulsionava seu corpo, tencionando seus músculos até uma dolorosa agonia. Tomou sua cabeça entre as mãos, e a guiou, dirigindo-a lentamente.
Brynna nunca tinha imaginado que dar prazer pudesse ser tão maravilhoso quanto receber, mas ao sentir os grossos músculos das coxas convulsionarem-se debaixo dela, ao escutar os profundos, ásperos lamentos arrancados da garganta de seu marido, sua paixão voltou a crescer.
Quando Brand pensou que já não podia suportar um segundo mais dessa deliciosa agonia, levantou a cabeça.
— Venha aqui.
— Aonde?
Levantou-a sem esforço. Deslizou as mãos sob seus braços.
— Aqui... — gentilmente baixou a sua esposa para sua palpitante carne — Possua-me como eu te possui.
— Oui — sussurrou enquanto deslizava para baixo, afundando sua espada até o punho.
Seu nome foi arrancado da garganta de Brynna com uma rudeza que coincidia com os assaltos dele. Seu cabelo se derramava sobre o peito de Brand como fogo incandescente. Empurrou-a para baixo, queria-a mais perto, necessitava dela ainda mais perto. E atrás da cortina de cabelo acobreado, sua boca desejosa encontrou a dela.
O tempo deixou de existir, enquanto seus corpos se moviam em um ritmo perfeito. Uma umidade quente e suave os cobria, provocando ondas de calor até transformar-se em pequenas explosões, enquanto o puro prazer os percorria. Brynna jogou a cabeça para trás, assaltada por espasmos tão tentadoramente pecaminosos que pensou que morreria empalada em cima dele. Brand empurrou ao seu encontro, encontrando seus mamilos eretos, mordendo-os meigamente.
— Deixa que seu perfume me inunde, Brynna — sussurrou.
Ela gritou seu nome novamente, cravando as unhas nos musculosos ombros enquanto as explosões se tornavam incontroláveis, sacudindo-a, convulsionando-a em um febril arrebatamento em cima dele. E Brand saboreou cada duro e completo assalto. Desfrutava da força com a qual ela o reclamava, apertando-se contra ele, mais tensa que sua própria carne, até que finalmente gritou, alagando-a com tudo o que tinha para dar.
Dormiram, enquanto a noite cobria Avarloch como uma névoa. Pela primeira vez, Brand não sonhou.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Capítulo 21

— Acorde, Brand!
O guerreiro se levantou na cama tão rapidamente que Brynna quase cai da beira onde estava sentada. Seu marido a segurou com suas mãos rápidas e fortes. Brynna sorriu ironicamente e sacudiu a cabeça.
— Sempre desperta assim?
— Assim como? — por força do hábito Brand olhou para a lareira. As chamas consumiam vorazmente pequenos pedaços madeira. Não era uma cena incomum, quando despertava de um sonho. O incomum era que não sentia frio. Olhou para a janela. O sol iluminava o céu como um gigantesco girassol recebendo o dia. A noite tinha passado e se feito dia, enquanto ele dormia serenamente.
— Como se alguém tivesse se escondido em seu quarto durante a noite e estivesse esperando que despertasse para te assassinar.
— Quanto faz que o sol saiu? — ignorou sua pergunta e esfregou os olhos. Fazia tanto tempo que não dormia até tão tarde, que estava surpreso, e olhou novamente pela janela.
— É tarde, marido. Temo que dormiu quase toda a manhã.
— Sério? — Brand a olhou fixamente e deu um sorriso —, essa é uma boa notícia.
— Não! — o rosto de Brynna abriu-se em um enorme sorriso que fez Brand sorrir também. Como se o sol não estivesse o suficientemente brilhante, sua alegria o inundou de calor. Amava seu sorriso — William retornou enquanto nós dormimos quase todo o dia.
— E? — perguntou, tocando os lábios com os dedos e marcando seu sorriso —, por que está tão contente com isso?
— Porque senti saudades, tolo — disse ela alegremente — Vamos, vista-se.
Brand olhou-a, como se estivesse sonhando. Tinha que estar sonhando.
— Sentiu saudades de William? O mais selvagem dos selvagens?
Brynna desdenhou suas palavras com um gesto de mão.
— William é tão inofensivo como os gatinhos de Gritã no estábulo.
— Non, beleza — Brand riu facilmente e se recostou sobre o cotovelo —, é mais perigoso que uma toca de leões famintos.
— Não comigo. — A moça saltou da beira da cama e procurou por todos os lados o broche de rubis que tinha tirado na noite anterior. Encontrou-o perto da janela e se agachou para pegá-lo. Colocou na cabeça para recolher a massa de cabelos avermelhados que caía ao redor de seus ombros, e quando voltou-se para Brand, viu que estava observando-a.
Ele olhava para ela... toda ela... da ponta da cabeça passando pelo vestido carmesim até os pés. A exuberante luz solar da janela derramava-se sobre ela, banhando-a em luz. Mas não necessitava da luz do sol para resplandecer, pensou Brand. Para ele, Brynna era a mulher mais bela que tinha visto em sua vida, e ninguém podia negar isso. Mas ele também via um tipo de beleza diferente em sua esposa. Ela era fresca, cheia de vida como a primavera despertando à terra de seu sonho invernal.
A primavera que chamava as sementes a surgir do chão em diminutos brotos e elevar-se para a promessa da esperança e do calor vital do sol.
Brynna sorriu diante do modo como a olhava.
— Está levantando?
— Ah, oui, claro que sim.
Ela levantou uma sobrancelha.
— Fará William esperar?
— O que aconteceu, na realidade, entre vocês dois durante as horas que passaram sozinhos no bosque? — a leve ruga em suas negras sobrancelhas o tornava perigoso, mas Brynna reconhecia o sorriso desenhado na comissura de seus lábios.
— Ah, nada — disse ela alegremente —, falamos de batalhas e realezas e outras coisas aborrecidas. Não tem por que preocupar-se, meu amor — se dirigiu para ele e caiu nos braços que a esperavam —, William é muito peludo para meu gosto — riu como uma menina e Brand absorveu sua felicidade, gravando em sua mente o perfeito arco de sua sobrancelha, seu pequeno nariz reto e a vida nova na chama verde de seus olhos.
— Alegro-me. Por um momento temi que teria que deixar crescer o cabelo até os cotovelos para te agradar.
— Faria isso? — Brynna suspirou muito perto de sua boca.
Ele assentiu e seu olhar a imobilizou. Ela se surpreendeu de não ter notado antes como eram penetrantes seus olhos. Tinham mudado? Recordava sombras fantasmagóricas, lagos sem fundo de emoções ocultas ou perdidas. Tinha visto ondas tempestuosas, carregadas de raiva e agonia; uma calculada inocência que era tão formosa como o céu antes de uma tormenta, mas nunca tinha visto seus olhos querendo chegar até ela, falando como o faziam agora.
— É meu amado — Brynna sussurrou perto de seu rosto. Algo... algo diferente o emocionava, diziam seus olhos, mas não estava certa do que era. Algo vital, disse a si mesma, uma reação ao seu amor.
— Ande, mulher — Brand roçou o sorriso com a ponta do dedo —, vá saudar seu guerreiro preferido antes que eu o obrigue a esperar outras duas horas.
Brynna esperou outro momento, mas o que quer que tenha visto em seu olhar tinha desaparecido. Levantou-se sem vontade do calor de seu peito nu, beijando o queixo enquanto se afastava. Alisou o veludo da saia e se inquietou pelo amassado, depois de passar a noite enrugado e feito uma bola no chão.
— Por que as donzelas ainda não trouxeram minha roupa para seu quarto? Não posso continuar me vestindo com sua roupa ou com o mesmo vestido dois dias seguidos.
— Certamente, estão todas muito assustadas para pôr o pé aqui dentro. Seu temperamento é temível — zombou Brand, recordando a pobre Rebecca.
Brynna estalou a língua e desprezou suas palavras com um gesto.
—Tolo — disse. Nada podia alterar seu ânimo neste dia. Seu rei tinha retornado e ela estava ansiosa para lhe contar suas vitórias, não importava o quanto fossem pequenas.
— Oferecerei a William suas desculpas e direi que a paixão de sua esposa te deixou muito esgotado para descer e recebê-lo apropriadamente.
Brand riu ao captar o olhar triunfal que ela lançava, por cima do ombro.
— Nesse caso, meu amor, diga que necessito dez horas mais de sono, pelo menos — concordou ele e caiu sobre o travesseiro, enquanto a porta se fechava atrás de sua esposa.
A jovem parou do outro lado da porta. Acabava de chamá-la de amor? Era a primeira vez que usava essa palavra com ela. Levou a mão ao peito e suspirou profundamente.
—Deus meu — seu rosto desenhou um amplo sorriso e desceu correndo as sinuosas escadas para o grande salão, como uma menina que quer ver os presentes que seu pai tivesse trazido, depois de uma longa viagem. Suas bochechas estavam avermelhadas e sua respiração acelerada quando se deteve ante a enorme porta.
William encontrava-se a alguns metros de distância, falando em voz baixa com Dante, enquanto dezenas de pessoas se moviam ao seu redor. Usava o cabelo escuro cheios de mechas cinzentas preso, expondo os agudos ângulos que em geral ficavam ocultos atrás de sua juba selvagem. Voltou-se como se houvesse sentido os olhos de Brynna sobre ele. Olhou-a com um sorriso tão terno que pareceu um abraço.
— A primavera retornou à terra! — exclamou William admirado, suficientemente forte como para que ela o escutasse —, como uma brisa que agita as folhas caídas, ela renova meu espírito cansado. — O braço maciço que segurava o ombro de Dante se ergueu, convidando Brynna para ser consumida por sua pelagem quente e seus músculos.
Dirigiu-se para ele, surpreendendo-se ao notar quanto tinha sentido saudades do tosco patife que zombou dela de maneira tão desumana, quando chegou a Avarloch na primeira vez.
— Meu rei — sussurrou ela, perto de seu ouvido enquanto ele a rodeava com seus braços como troncos de árvores.
Soou uma grande gargalhada do grande duque e suspirou, deixando que o aroma de Brynna o impregnasse.
— Como está minha mais bela guerreira? — olhou-a longamente, estudando-a; sorriu com astúcia ao ver o brilho em seus olhos — Assim tão bem? — perguntou, com admiração —. Minha querida, devo te levar para minha próxima batalha. A Inglaterra seria nossa ao cantar do galo.
Brynna riu e levou um dedo delicado aos lábios para lhe advertir que fizesse silêncio. Dante estava muito perto para escutá-los, mas se o fez não prestou atenção diante da declaração de traição expressa por William. William piscou um olho, olhando por cima de seu ombro.
— Onde está ele?
— Na cama — as bochechas de Brynna ruborizaram, mas o malicioso brilho em seus olhos a delatou.
— Onde o deixou — sentenciou o duque orgulhoso —, ah, bom trabalho — bateu em seu ombro brandamente e bebeu um gole da cerveja.
— Brand está dormindo? Neste momento? — Dante falou finalmente, olhando Brynna com tal admiração que ela baixou o olhar, envergonhada pelo que ele devia estar pensando.
— Lady Brynna, desculpe-me — disse o atraente cavalheiro, arrependido ao ver seu desconforto —, é só que ele não dorme bem há tanto tempo...
William bateu nas costas de Dante.
— Ela está lhe fazendo bem, non?
— Oui — concordou Dante com um sorriso terno nos lábios.
— Bem — William estendeu suas duas grandes mãos e Triturador e Caos correram para ele —, o que tenho que dizer pode esperar umas horas mais. Prefiro passar o tempo com sua esposa.
Brynna lhe lançou um olhar severo.
— Esteve tudo muito tranqüilo aqui em sua ausência, milorde. E você partiu sem uma despedida sequer.
O duque franziu os lábios sob a barba.
— O perdão é uma virtude bendita, doçura, e eu tinha um assunto urgente para atender.
— Lutar por mim. — Não era uma pergunta, e Brynna respondeu ao olhar enganoso de William. - Meu pai me disse.
— Cortarei sua cabeça.
— Não, não o fará! — golpeou-o no braço musculoso, mas lhe apanhou a mão, obrigando-a a aproximar-se.
— Só por ti, perdoarei sua vida.
— Agradeço.
— Ah, a primavera — William suspirou diante do formoso sorriso que Brynna lhe deu, e a conduziu à mesa onde os aromas do café da manhã o chamavam como uma amante longamente desejada.

Brand demorou para vestir-se, sabendo que quaisquer que fossem as notícias que William havia trazido, podiam esperar. O duque normando tinha ido a Canterbury para ver o pai de Colette e averiguar a verdade sobre seu compromisso. Mas a Brand não importava seu compromisso, nem se tinha mentido como suspeitava William. Não se importava se nunca voltava-se a vê-la. Brand parou, antes de colocar a túnica negra e sorriu, feliz por ter se libertado de Colette. Brynna o tinha acusado de amá-la ainda. Mas ele sabia que já não era assim. Nem sequer tinha considerado isso. Pensou que não poderia amar a ninguém mais, depois do que Colette tinha feito. Mas estava enganado. Alegrava-lhe que Colette tivesse vindo a Avarloch. Vê-la fora de seus sonhos tinha permitido dar-se conta de que o quer que tivesse sentido por ela, tinha desaparecido.
Fechou a porta de seu quarto, sentindo-se como um homem recém libertado da masmorra. Dirigiu-se para as escadas, atraído pelo delicioso aroma de pão fresco e pelo pensamento de pousar seus olhos sobre a mulher que tinha sacudido sua alma e a tinha trazido de volta à vida.
— Meu senhor?
Brand se deteve antes de chegar às escadas. Voltou-se no momento em que Colette entrava no corredor, saindo de seu quarto. Sorriu-lhe angelicalmente e afastou uma mecha do loiro cabelo sobre o ombro. Os olhos de Brand percorreram seu corpo, enquanto ela se aproximava e se detiveram em seus brancos seios mal escondidos sob uma seda turquesa.
— Certa vez, não faz muito tempo — disse zombeteira —, ver-me neste vestido fazia com que seu sangue se convertesse em fogo. — Quando o alcançou, ele levantou a vista, olhou-a nos olhos e mal sorriu. — Vejo que ainda te produz o mesmo efeito — caminhou em círculos ao redor dele como uma gata — Sempre soube que me perdoaria, Brand. Que a lembrança de meu corpo em seus braços voltaria a trazer você para mim — completou o círculo e se deteve em frente dele, colocando um dedo delicado sobre seus lábios —. Compreendo o quanto te feri.
Brand sacudiu a cabeça enquanto seu aroma enchia seus pulmões, sufocando-o.
— Você não compreende nada, Colette. Fui um tolo ao permitir que ficasse aqui.
Um sorriso provocador se desenhou nos lábios de Colette. Deu um passo mais perto, até que ele pôde sentir o calor de suas palavras sobre o rosto. Era hipnótica em seus movimentos, no piscar de seus olhos, no modo como seus dedos brincavam com os laços de sua túnica. Ela encantava, enfeitiçava, tomava sutilmente o controle dos sentidos, até deixar os homens rendidos a seus pés. Tudo em Colette de Marson era muito perturbador para que um homem pudesse resistir, mas Brand viu algo em seus olhos que nunca tinha notado antes, embora estivesse certo de que sempre tinha estado ali. Ela era egoísta, sentia paixão somente por seu próprio bem-estar. Alguma vez o tinha amado de verdade? Ou havia dito todas as coisas que ele queria escutar, só para manter-se longe da férrea disciplina de seu pai? Surpreendeu-se ao dar-se conta disso. O quanto tinha sido cego. Tinha estado disposto a lhe dar o que ela quisesse. E o tinha feito. Tinha dado seu mundo.
E agora o queria de volta.
— Permite que eu fique porque ainda me deseja milorde — deslizou as mãos por seu peito, por seus ombros, medindo sua força e sua musculatura.
—, quer provar o doce sabor de meus lábios. Seu coração me deseja tanto como seu corpo — de repente, ela franziu os lábios levantando a vista para olhá-lo com enormes olhos tristes — Estava tão zangada contigo por ter me obrigado a partir, meu amor, mas agora sabe que foi um engano, não é?
— Non.
— Mentiroso — sussurrou Colette perto de seu ouvido — Por que outra razão levaria a filha de Dumont para a cama, além de satisfazer a selvagem luxúria que sente por mim?
Brand sorriu levemente, quando os lábios de Colette percorreram sua bochecha tão delicadamente como pétalas de rosa. Mas não era um sorriso de prazer, mas de triunfo ao notar outra singela verdade que, como um tolo, tinha-se negado a ver.
— O que insinua não é verdade, Colette — disse bruscamente. Levou os dedos brandamente sobre a carne acima de seus seios. As pontas de seus dedos se moveram, com deliberada lentidão, fazendo-a derreter-se como manteiga, enquanto seu inquietante olhar a imobilizava.
— Formosa Colette — disse com um suspiro —, embriaga o coração dos homens com sua falsa inocência. Seu cabelo cai como asas sobre seus ombros de alabastro criados para serem acariciados. — Colette tremia ante seu contato. Os lábios de Brand se elevavam ameaçadores, enquanto movia a mão sobre a curva de seu pescoço. Por um instante, os olhos de Colette se abriram com temor, ao sentir sua mão lhe apertando o pescoço. Brand podia quebrá-lo em um instante, podia tirar a vida antes que tivesse tempo sequer de gritar — Seus lábios unem-se para beijar, ávidos e gentis, enquanto vertem mentiras.
— Brand...
— Mas invocar uma luxúria selvagem em mim? — sua voz cobriu a dela e a escura paixão em seus olhos se desvaneceu em nada mais que uma expressão de diversão — Nunca me provocaste isso. É encantadora, minha senhora, mas luxúria selvagem é algo que nunca me fez sentir. Está, e sempre estará tão morta por dentro como me fez sentir. Reúna seus homens, Colette, e vá para casa.
Brand deixou Colette sozinha com sua humilhação, inclinou-se em uma leve reverência e continuou sua marcha para o grande salão.
A risada invadiu seus pensamentos, antes de chegar às portas do recinto. Ao reconhecer o exuberante, profundo som da alegria de William, Brand não pôde evitar de sorrir. Era o som da vida... a vida da qual ele sentia saudades, a vida que queria de volta. Sabia na verdade que já não amava Colette. Nem sequer estava zangado com ela. Havia lhe trazido a morte. Oui tinha amado uma vez, e ao vê-la, ao inalar seu aroma, até a morte parecia tentadora. Mas a vida o chamava como a lua chama o mar, convocando-o a recordar o calor do sol ao banhá-lo em sua gloriosa luz. Tentando-o como nem sequer Colette tinha conseguido, sentir a paixão de voltar a sorrir. De saborear o vento no rosto enquanto seu cavalo galopava como um trovão pelos campos cheios de cores tão brilhantes como... Os olhos de Brynna. Brand sorriu, pensando em sua esposa. Seu coração desejava viver novamente. E agora sabia por onde começar.
No instante em que Brand entrou no concorrido salão, seus olhos a encontraram. O sorriso que agraciava o rosto de sua esposa era real, aberto, e mais esplêndido para ele que as assombrosas costas da Normandia. Deteve-se simplesmente para observá-la sentada à mesa com William e Dante. Estudou a elegância de seus dedos quando ela levou a taça aos seus lábios, o modo como as chamas que saltavam na lareira corriam como raios de sol por seu cabelo solto. Atraído por ela, Brand deu um passo em direção à mesa.
— Nosso guerreiro finalmente despertou de seu sono! — gritou alegremente William, sem perceber quanta verdade havia em suas palavras.
Brynna levantou seu olhar brincalhão para seu marido e sorriu, como se resplandecesse por dentro.
— Não dormiu muito, meu senhor — disse, quando ele se aproximou.
— Sonhei com fogo e campos tão verdes que queria deleitar-me em sua beleza para sempre — enquanto Brand falava, seus olhos pousaram sobre o rosto de sua esposa — Desci com um apetite voraz — adicionou com voz rouca.
— E agradecemos por nos agraciar com sua presença, poderoso senhor de Avarloch — interrompeu William antes que Brynna tivesse a oportunidade de ruborizar. Uma careta zombeteira ampliou o sorriso do duque. Brand sacudiu a cabeça, preso no humor cáustico, momentos antes de seu amigo levantar-se. Rodeou Brand em um abraço tão estreito que por um momento o deixou sem fôlego.
— Solte.me, degenerado. Não conhece sua própria força.
William deu um passo para trás e o segurou pelos ombros, com os braços, sorrindo de forma maliciosa.
— Oui, mas a conheço. Ela nunca poderá me amar enquanto você estiver vivo.
— Ela nunca poderá te amar, de qualquer modo, é muito peludo. — Brand piscou um olho para sua esposa, empurrou para o lado o tosco duque e tomou a mão de Brynna.
— Senti saudades — o roçar dos lábios de seu marido na palma da mão fez com que a jovem se movesse em sua cadeira.
Sem soltá-la, Brand se sentou na cadeira que Dante tinha ocupado. Seu irmão estava muito feliz de poder agradá-lo, ao notar uma faísca de felicidade nos olhos de Brand que tinha pensado que nunca mais veria.
— Então não voltará comigo para Graycliff? — preguntou a seu irmão com um sorriso ladino.
— Non. Meus filhos viverão em Avarloch.
— Filhos? — repetiu Brynna, levantando contrariada uma sobrancelha, Depois, suas bochechas tomaram um forte tom carmesim quando Brand a olhou e ela viu seu sorriso tomado pela a emoção.
— Muitos filhos — disse ele, com voz rouca —, tantos quantos tivermos forças para fazer.
Do outro lado, William grunhiu exasperado.
— Normandos!
— Sim — disse Alysia, sentada ao lado de Dante. Levantou sua taça para todos.
— A mais refinada horda de selvagens que já puseram os pé em Avarloch!
O salão tomou vida com as risadas e gritos dos homens de William e Brand.
Mais tarde, quando tudo o que restava do festim matinal eram miolos e taças vazias, o duque se levantou de sua cadeira, esticando-se tanto que parecia chegar até o teto, antes de bater nas costas de Brand.
— Estou esgotado pela viagem. Desfrute do resto do dia... e de sua esposa. Falaremos mais tarde.
Brand não queria que nada mudasse seu bom humor nesse dia, assim ignorou a névoa que cobria os olhos de William. Quase nem se importava com o que seu amigo tinha descoberto, em sua busca por saber a verdade sobre Colette. Queria.a fora de Avarloch antes que caísse a noite.
— Sabe por que William cavalgou até Canterbury, marido?
Seus dedos fortes se fecharam ao redor das mãos delicadas.
— Oui, sei — disse Brand — Mas não precisa preocupar-se, Brynna — olhou-a profundamente — O que sentia por Colette é uma lembrança que se desvanece a cada dia que passa.
— De verdade? — perguntou Brynna, temendo respirar.
Traçou o contorno de seus lábios com a ponta do dedo, e Brand observou a imagem de sua esposa. Era um raio de sol contra seu coração, um raio de esperança.
— De verdade — respondeu e a beijou, de um modo que não deixou lugar para dúvidas.

Capítulo 22

O vento nórdico uivava sobre os campos que agora pertenciam a Lorde Brand Risande, anunciando a promessa de um inverno brutal. Para prová-lo, a primeira geada aderia ao telhado do estábulo onde Brynna, Brand e Peter estavam ajoelhados no espesso feno esperando, como que desafiando essa promessa, a vida que emergia da égua prenhe.
— Deitou-se ao pôr do sol — disse Peter sem fôlego, afofando o feno com os dedos, para preparar um local suave para o potro.
— Tranqüila, não se esforce tanto — a voz de Brand era baixa, tranqüilizadora, enquanto se ajoelhava junto à cabeça da égua e a acariciava brandamente.
— Parece mais agitada que as outras, quando deram a luz — informou Brynna a seu marido, com a preocupação marcada no semblante.
— Non — sussurrou Brand com segurança, sacudindo a cabeça—, ela é forte. Ficará bem — sua mão nunca abandonou à égua, nem se alterou o tom com o qual falava —, prometeu-me que me deixaria montá-la quando chegasse a primavera, e nenhuma promessa se romperá jamais em Avarloch. Sorriu e ergueu o olhar para sua jovem esposa por um momento, antes de retornar à égua castanha que acariciava tão delicadamente.
Brynna observou seu marido na luz dourada das velas. Estava sereno, tranqüilo, magnífico, e o efeito que tinha em sua égua era assombroso. Os movimentos ascendentes e descendentes do ventre inchado da égua pareciam seguir o ritmo gentil de sua voz, quando a adulava.
— É uma boa égua — sussurrou—, a melhor que vi em minha vida. Suas patas são poderosas e rápidas e sua vontade de ferro não pode ser derrotada pelo frio ou o calor intenso, ou pela tortura da vida que vai chegar.
Brynna o escutava, sentada ao seu lado, tranqüilizada por sua calma, enfeitiçada pelos cachos negros que caíam sobre as sobrancelhas...
— Brynna?
Pelo suave sorriso no rosto de seu marido, percebeu que ele a tinha chamado mais de uma vez.
— Já fez isto antes, não é?
— Sim, muitas vezes.
— Bem, então deve colocar-se atrás dela. Acredito que necessitará de ajuda. Mas não muito perto de suas patas. Peter, fique por aqui.
De repente, a égua levantou a cabeça. Tentou ficar de pé com as patas dianteiras.
— Está vindo, Brand! — gritou Brynna.
— Deixe que seu potro chegue bela dama — sussurrou o guerreiro perto da orelha da égua —, não pode deter a vida quando decide vir. Não importa quanto lute, virá. Confie em mim — acrescentou com um suave murmúrio —, sei o que digo.
A égua chutou e tentou ficar de pé novamente. Uma poderosa pata traseira quase golpeou Brynna.
Brand amaldiçoou em voz alta, seu rosto se tornou de um doentio tom de branco.
— Afaste-se de suas patas, Brynna! — gritou, entre mais maldições, acalmando o maciço corpo da égua com suavidade. Vendo que sua esposa não tinha se machucado, voltou a falar com a égua com amabilidade.
A moça viu a mancha branca na cabeça do potro, que saía por entre as patas da égua.
— Brand, vem vindo!
A égua tragou, fazendo dançar os músculos de seu pescoço grosso enquanto sua língua saía em busca de água.
— Tem sede, Brynna.
— Um momento.
Brand levantou gentilmente a cabeça da égua e a colocou sobre seu colo. Falou em voz tão baixa que Brynna não podia ouvir o que dizia. O animal se acalmou de novo e o potro deslizou até quase chegar à Brynna.
A égua ficou de pé, esquecendo o homem que a tinha tranqüilizado com tanta ternura e cuidado.
Aproximando-se de Brand, Brynna tomou o rosto de seu marido entre as mãos e o beijou, apaixonadamente.
— Quando nascer nosso bebê quero você ali, comigo.
— Estarei — prometeu ele. Seus olhos percorreram cada centímetro de seu rosto e suspirou profundamente, enquanto o coração saltava dentro do peito.
Satisfeitos de que a égua e seu potro estivessem bem, Peter saiu em silêncio do estábulo.
Brynna acariciou a boca de Brand com os dedos.
— O que aconteceu, meu amor?
Ele queria lhe dizer... dizer o que? Que alguma vez queria ficar sem ela? Que só de ver seu rosto, seu sorriso, era suficiente para querer dar a vida por ela? Já tinha feito isso e tinha sido pior que sofrer uma morte lenta no campo de batalha. Não podia dizer que tinha medo de tal morte, mais medo que da morte em sí, assim afastou o olhar e sorriu ao potro. A diminuta criatura tentou equilibrar-se sobre suas trêmulas patas, enquanto sua mãe o limpava, até deixá-lo de um tom castanho.
— É belo — anunciou Brand ofegando.
— É magnífico — concordou a jovem, em voz baixa. Tinha escutado a voz maravilhada de seu marido e olhou seu perfil forte, delineado contra a luz das velas.
— Um pequeno e débil potro pode assombrar tanto a um guerreiro?
Por um momento Brand não respondeu, marés de emoção assolavam seu coração. Atraiu sua esposa para ele e a abraçou.
— É a vida, Brynna. É a vida que estranho. Estava acostumado a desfrutá-la, saborear cada momento como o mais refinado bocado — ela assentiu comprensivamente; ele suspirou, como se a lembrança fosse muito difícil de suportar —, e deixei que tudo escapasse. Deixei que ela me tirasse a vida e não sabia como recuperá-la. — acariciou o cabelo com suavidade — Nem sequer sabia se queria recuperar a vida, Brynna... até que vi a luz em seus olhos. Até que te segurei em meus braços.
As lágrimas esperavam nos cílios da jovem, e quando piscou, correram por suas bochechas e caíram sobre os dedos dele.
— Ajudarei você a confiar de novo, Brand — prometeu —, e recuperarei seu coração e te amarei, até que já não possa mais suportar.
Ele simplesmente a olhou durante um momento, desfrutando que ela o amasse tanto, a aproximou e lambeu, brandamente, sua boca.

— A vida também te torna amoroso? — sorriu sua esposa.
Sua única resposta foi um sorriso mais ardente que o fogo, antes de recostá-la sobre o feno fresco.

O castelo estava em silêncio, quando retornaram caminhando do estábulo, meio congelados. Um leve resplendor que se infiltrava pela parte inferior das portas do local atraiu a atenção de Brand.
— Brynna — tomou-a em seus braços —, prepare um banho para dois. Vou te lavar com muito esmero — prometeu com um sorriso luxurioso antes de beijá-la.
— Não vem comigo?
— Estarei lá em um momento.
Brynna não queria partir sem ele. Perguntava-se se não era Colette que queria ver, antes de deitar-se.
— Está bem — concedeu, confiando em sua promessa de fidelidade... embora não de amor —, por favor, venha logo.
Ele assentiu e observou sua lenta subida pelas sinuosas escadas. Esperou até que desapareceu, antes de dirigir-se ao local onde sabia que William o esperava.
— Como está a égua? — perguntou o duque, quando Brand entrou no aposento, tenuamente iluminado.
— Está bem, como seu potro. — desabotoou a capa e a lançou sobre uma cadeira próxima. Seus olhos azuis brilhavam contra a luz da lareira.
— Ficou acordado para me esperar, William?
O duque falou em voz baixa.
— Oui.
— Ela me enganou outra vez, então?
— Oui, mon ami.
— Não tem importância — assegurou Brand tranqüilamente ao seu melhor amigo. Podia ver a preocupação no rosto de William e a dor que causava ao duque normando contar o que tinha descoberto. Sentou-se em uma cadeira forrada de veludo com encosto alto — Diga-me. Terminemos com isto, assim posso libertar Avarloch dela e voltar para minha esposa.
— Um gole, primeiro? — ofereceu, levantando sua taça.
Brand sacudiu a cabeça. Em seguida, porque já não podia esperar, disse:
— Mentiu para mim — foi uma certeza.
O duque aspirou profundamente antes de começar.
— Oui, mentiu. Não há tal prometido, nem selvagem nem de nenhum outro tipo. — Sua maciça figura delineava-se contra as faiscantes chamas enquanto inclinava-se na cadeira — Não há modo de dizer o que vou dizer de uma maneira simples, nem ninguém que queira te poupar de mais dor que eu — suspirou e olhou dentro de sua taça.
— Temo que desta vez te traiu de uma forma muito pior que antes.
Brand permaneceu em silêncio, seus dedos golpeando contra o braço da cadeira.
— Encontrei-me com Lorde de Marson em Canterbury — continuou William —, Estava aterrorizado de verdade, Brand. Tremia, para falar a verdade.
Os olhos de Brand ardiam como o fogo incandescente, enquanto considerava o que William lhe contava.
— Por que teria medo de você, William? Conhece você o suficiente para saber que não lhe faria mal, a não ser que...
O sorriso do duque era inexpressivo.
— Isso foi o que perguntei, mas sua única resposta foi que o rei Eduardo tinha informado que eu tinha retornado a Normandia — os olhos do velho guerreiro se entrecerraram até que só se viam duas finas linhas —. De todos os modos, somente surpreendeu-me e atiçou minha curiosidade, já que todo mundo na Inglaterra, incluindo lorde de Marson, sabiam que vinha para cá. Mas ninguém sabia que não tinha partido quando o rei se foi. E dado que Eduardo não estava aqui para me ver partir, deve ter informado a De Marson que tinha retornado a Normandia — Brand, imóvel, não disse nenhuma palavra, e William continuou, intranqüilo —. Perguntei-me por que o rei consideraria tão importante contatar de Marson sobre meu paradeiro, non? — Não esperou a resposta de Brand. — Mas ele tinha medo, Brand, tinha um medo terrível quando me viu, então o pressionei ainda mais. E como suspeitava, era por sua culpa que ele me temia. Aparentemente Lady Colette estava residindo no palácio do rei devido a um... incidente com um cavalheiro local em Canterbury, que era casado.
A voz do duque se perdeu, quando Brand sorriu, mas os olhos de Brand disseram a William que não estava aborrecido com a mulher que certa vez tinha sido sua prometida.
— Há mais, ami — disse lamentando-se —, Colette foi enviada a Winchester para servir à rainha, com a esperança de melhorar sua vida. Mas quando Eduardo retornou, encontrou um melhor uso para a moça. Você não é nenhum favorito do rei, Brand — acrescentou aflito, com um brilho prateado nos olhos mais afiados do que qualquer espada —, quero que saiba que já me encarreguei deste assunto...
— Conte-me, William.
William levou a taça aos lábios, bebeu de um gole a cerveja e levantou-se, não suportando mais ficar confinado em sua cadeira.
— Há uma conspiração contra você, Brand. Do mesmo modo que houve contra Richard, liderada por Eduardo e Harold e levada a cabo por Colette, com a bênção de seu pai.
Seus olhos tão ardentes como o enxofre, olhavam fixamente o fogo da lareira, enquanto Brand digeria as palavras de William.
— Prometeram-lhe terras e casamento com um dos cavalheiros mais ricos de Eduardo. Sua tarefa era vir aqui e afastá-lo de Brynna.
— Por quê?
— Pensa, homem! — aproximou-se de Brand e se inclinou sobre sua cadeira. Colocou uma mão no ombro de seu amigo — Eduardo sabia que a rameira loira era sua debilidade. Esperava que, uma vez que Colette chegasse aqui, você abandonasse Brynna. E já que você tinha deixado claro que talvez fizesse isso, de qualquer forma... — deixou que a idéia deslizasse para Brand e com um gesto de sua enorme mão, afirmou: — Sua traição se estende muito além do que fez a Richard. Para Eduardo não importam as alianças, como acredita o Conselho dos witan. Os saxões nunca aceitariam que trouxesse uma normanda para Avarloch. Ameaçaram recuperar Avarloch pela força, se não casasse com Brynna, mas abandoná-la por uma normanda...? A guerra seria inevitável, Brand. E não haveria ninguém aqui para te ajudar. Por isso, Marson ficou tão apavorado, ao ver que eu continuava na Inglaterra — William se afastou da cadeira de Brand com um sorriso orgulhoso — Com você morto, Eduardo reclamaria Avarloch. Harold de Wessex assegurou ao rei sua ajuda, se eu me erguesse contra ele. Assim como vê, o plano era quase infalível.
Brand permaneceu paralisado em sua cadeira, digerindo tudo o que William havia dito. Uma conspiração para livrar—se dele... e Colette, disposta a vê-lo morrer.
William exalou um forte suspiro e retornou à mesa para procurar mais cerveja.
— Enviei um mensageiro a Eduardo, informando que sei de tudo e que se um fio de seu cabelo for sequer tocado, cortarei a cabeça de seu precioso Harold.
O único som no grande salão vinha de fora. O vento uivava e gemia golpeando contra as janelas, como se um frio ártico exigisse entrar em Avarloch. Brand não piscou, nem olhou para William enquanto falava. E quando o fez, o duque imaginou se não seria seu cavalheiro preferido que estava provocando a tormenta invernal. E logo... logo a tormenta desabaria.
— Traga-me Colette.

Brynna olhava fixamente o vapor que se elevava da tina em frente da sua cama. Cruzou os braços contra o peito, esperando Brand. Finalmente, levantou-se e saiu do quarto.
Do alto das escadas viu William sair de seus aposentos. Parecia mais atormentado que Brand quando chegou em Avarloch. O duque subiu os degraus lentamente olhando para Brynna todo o tempo. Sorriu, mas ela podia ver, até na penumbra, a consternação em seus olhos.
— O que aconteceu, William? — perguntou, brandamente, sem desejar, realmente, saber a resposta.
O tosco duque levou uma de suas mãos ao rosto de Brynna.
— Vá para a cama, bela Brynna. Ele estará contigo em um momento.
A jovem assentiu, mas não se moveu de seu lugar, enquanto o duque percorria o longo corredor em direção ao quarto de Colette. Em silêncio, desceu as escadas, caminhando nas pontas dos pés até as portas onde Brand esperava. Um frio gelado lambeu suas costas ao abrir levemente as portas e um pressentimento arrepiou-lhe. Brand estava sentado em frente ao fogo, observando as chamas que se refletiam em seus olhos.
— Brand?
Não respondeu. Não se movia, exceto pelos dedos que agarravam e soltavam os braços de sua cadeira. No silêncio, Brynna observou seu marido com uma preocupação que misturava-se em seu interior, como o amargo fel. Algo estava terrivelmente errado. Que novidades havia trazido William que tinham transformado os olhos de Brand em espadas em chamas, sua boca em uma fina linha de ódio e de fúria?
— Meu amor? — sussurrou ela. Aproximou-se de onde ele estava sentado.
A voz de William atrás dela a sobressaltou e quase a faz cambalear.
— Volte para a cama, Brynna.
Voltou-se para olhar para ele. Segurava Colette por um cotovelo, enquanto ela se retorcia.
— O que está acontecendo? — exigiu.
— Por favor, Brynna — ordenou William gentilmente —, volte para seu quarto.
— Ela fica, Will — o som da voz de Brand fez com que Brynna se voltasse para ele. Apesar de sua ira quase tangível, seu tom era suave —. Feche a porta, William, por favor.
No momento em que o duque libertou Colette, ela correu para Brand e caiu aos seus pés.
— O que quer que tenha dito sobre mim, não é verdade, meu senhor! — disse em um lamento lacerante —, sabe que sempre me odiou.
— Oui — disse Brand, tranqüilo —, é um homem de grande sabedoria e nunca foi tão imbecil quanto eu.
A visão da cabeleira de Colette enroscada ao redor dos pés de seu marido, enfureceu Brynna. Deu outro passo para frente, mas Brand a deteve com o olhar.
— Ainda acha que sou um selvagem sem coração, esposa?
— Não, meu amor — Brynna derreteu-se diante do modo como a olhou. Sua fúria se desvaneceu, quando seus olhos se encontraram.
— Não sou um desalmado, Brynna — disse, como se tentasse convencê-la. Baixou o olhar para a mulher caída a seus pés —, mas Colette de Marson conspirou contra minha vida. Não teria que cortar essa língua mentirosa? Farei o que você disser. — Brynna não respondeu, mas conteve o fôlego, enquanto os soluços de Colette se tornavam mais fortes. — Ela é o demônio que tem me atormentado — seu marido continuava olhando para Colette —. Deveria matá-la e terminar com tudo?
— Não — Brynna engoliu as lágrimas ao ver a emoção que rugia dentro do homem que amava... a emoção que ardia como um fogo selvagem dentro dele. Ali estava sua fantasia, retornando da morte —, amou-a certa vez. Recorde isso como uma honra que concedeu a um coração ingrato e nada mais, Brand. Porque protegerei você com minha vida. Vi como ama. Todas as riquezas do mundo não podem comparar-se. É um tesouro precioso pelo qual eu luto. E se alguma vez o possuir, morrerei antes de deixá-lo partir.
Brand fixou os olhos em sua esposa. A luz da lareira que dançava em seu olhar refletia algo tão terno, tão aberto que até William viu e sufocou um tenso soluço, como se fossem suas próprias emoções que estivessem sendo arrancadas.
— Não sabe o que pode fazer de sua vida entregar o coração, Brynna — disse Brand, brandamente.
Ela deu um passo para frente.
— Confio que tratará meu coração com ternura, marido,
Como se fosse impulsionado pela incomensurável força do amor de Brynna, Brand ficou de pé e caminhou ao redor de Colette, que continuava ajoelhada no chão. Aproximou-se de sua esposa com dois grandes passos, tomou o rosto entre as mãos e o aproximou do seu.
— Tentei lutar contra a que estava sentindo por você, mas você lutou com mais força que eu. Pede meu amor? — seus olhos a devoraram, seu fôlego estava entrecortado de emoção —. Em realidade, já é teu. Na verdade, amo você, Brynna; oui, com todo meu coração, amo você — inclinou-se para ela e capturou sua boca.
Atrás deles William deu um forte suspiro de alívio.
— A vitória enfim — esperou, enquanto seu cavalheiro preferido beijava a sua amada, antes de limpar a garganta. Quando Brand se afastou levemente de sua esposa, o duque fez um gesto para Colette com o queixo — O que se deve fazer com ela?
Ainda segurando Brynna em seus braços, Brand voltou-se para olhar Colette.
— Minha esposa salvou sua vida, mas quero que saia de Avarloch esta noite. Reúna seus homens e seus cavalos e que Deus decida seu destino
Colette levantou-se do chão e o olhou fixamente, aturdida e incrédula.
— Mas está gelado lá fora...
Brand assentiu.
— Como disse, que Deus decida. — Sem outra palavra nem olhar em sua direção, guiou Brynna para a porta do aposento.
— Venha rameira — ordenou William. Dando três passos gigantescos para a mulher que o olhava indignada, com um negro desprezo em seus olhos, puxou-a pelo cotovelo, com um puxão.
— Meu pai vai matar você — alfinetou Colette, venenosa.
— Duvido — respondeu, com sarcasmo, o duque normando enquanto a arrastava para fora da sala — quando o deixei, estava apresentando-se ao Criador — baixou os olhos agudos para ela — Verá, minha querida, eu não sou tão misericordioso quanto Lorde Brand de Avarloch. Ou como sua esposa.

 

 

 

 

 


Capítulo 23

Brand não podia dormir. Com Brynna aconchegada contra a curva de seu corpo, levantou os dedos e traçou o suave contorno de seu ombro, desceu por seu braço e pela redondez de suas nádegas. O contato lhe arrancou um leve gemido enquanto dormia que fez com que quisesse despertá-la e voltar a fazer o amor. Ele suspirou, pensando como facilmente tinha derrubado suas defesas. Tinha jurado nunca mais transformar-se em um tolo por amor, mas só um tolo poderia resistir a esta mulher incrível. Aproximou-a mais e sentiu seu corpo esticar-se, quando ela se acomodou em seu abraço.
— Brand? — sussurrou meio adormecida.
Mas ele a silenciou com seus beijos.
— Durma, meu amor. — E Brynna voltou a respirar calmamente, num sono tranqüilo.
Brand ficou acordado até a saída do sol, abraçando-a, acariciando seu cabelo, e beijando-a delicadamente para não voltar a despertá-la. Por Deus, como a amava! Não havia temor nele, só felicidade. Abraçou-a mais forte e finalmente adormeceu.
Brynna despertou pouco depois de Brand adormecer. Embora sentisse frio açoitando Avarloch, a luz do sol que se derramava dentro do quarto a impulsionou a começar o dia. Dando-lhe um beijo nos lábios entreabertos, deixou o calor dos braços de seu marido. Vestiu-se em silêncio, para não perturbar seu sono sereno. Sorriu ao observá-lo, enquanto se escovava o cabelo, recordando a paixão em seus olhos quando fazia o amor, na noite anterior. Era uma paixão mais intensa que qualquer outra que tinha conhecido. Tinha entregue seu coração tão completamente como seu corpo, e Brynna se entregou à luxúria dessa lembrança.
Brand moveu-se na cama, procurando-a.
— Descanse marido — dirigiu-se para ele e fechou seus olhos com beijos.
— Aonde vai? — perguntou sonolento.
— Ao estábulo para ver o potro.
Por mais que se esforçasse, Brand não podia manter os olhos abertos.
— Não demore.
Brynna sorriu ante a negra cortina de cílios que se curvavam levemente, passou por cima de Sussurro e saiu do quarto.
Estava amarrando os laços da capa, quando ergueu o olhar bem a tempo para evitar se chocar contra o peito de Dante.
— Bonjour, belle. Aonde vai com tanta pressa?
— Ver meu potro. Nasceu ontem à noite — explicou ela, com uma alegria exuberante que fez Dante sorrir.
— Ainda não o vi. Espere que procure minha capa e irei contigo.
Desapareceu pelo corredor e Brynna o observou, pensando como Alysia ficaria triste quando ele partisse de Avarloch. Ela também sentiria saudades, percebeu, momentos depois, quando ele voltou com uma capa cor de anil presa ao redor de seus largos ombros e um sorriso divertido desenhado em seu belo semblante. Sua natureza tranqüila e seus despreocupados sorrisos faziam com que até os dias mais sombrios parecessem mais luminosos.
— E o que existe no castelo de Graycliff que te leva a nos abandonar? —preguntou bruscamente, antes de poder deter suas palavras.
— Minha irmã — o sorriso de Dante manteve-se intacto, apesar da pergunta inesperada de Brynna.
Ela piscou ao olhá—lo, e tomou o braço, quando ele o ofereceu.
— Nem sequer sabia que tinha uma irmã.
— Katherine tem treze anos. Trouxe-a para a Inglaterra comigo faz quatro anos.
— E seus pais? — Brynna perguntou, enquanto desciam as escadas.
— Minha mãe deixou esta terra ao dar a luz à Katherine. Foi uma gravidez tardia e muito difícil. Meu pai morreu a serviço do rei Felipe.
— Oh, lamento — bateu suavemente em seu braço e mordeu o lábio inferior, notando o pouco que sabia da vida de seu marido — Você e Brand devem sentir muita saudade de seus pais.
— Non — Dante sacudiu a cabeça e exibiu sua covinha para Rebecca quando ela o saudou, do grande salão, com a mão —, Brand foi enviado para servir William como seu pajem, quando tinha sete anos. Enviaram-me três anos depois. Quase nunca víamos nossos pais.
Abriu as pesadas portas e uma rajada de vento soprou o cabelo de Brynna afastando-o de seu rosto. Caminharam até o estábulo, enquanto o rangente gelo golpeava a capa de Dante, levantando-a como asas cor anil. Disse algo sobre um corpo quente, mas suas palavras se perderam no vento. Brynna adivinhou que falava de Alysia, mas lembrou-se do sorriso sensual nos lábios de Dante quando viu Rebecca.
Abriu a porta do estábulo, com esforço contra o vento que lutava contra ela. Estremeceu pelo frio intenso.
— Duvido que esteja mais quente aqui dentro — disse ao entrar.
— Certamente não tão quente como Alysia... ou o corpo de quem se referia antes —Brynna riu atrás dele.
Dante voltou—se para dar um sorriso zombador, mas o cabelo negro que soprou em seu rosto o fez parecer mais como um perigoso guerreiro, do que com o patife encantador que era.
— Você... — suas palavras se perderam no uivo de uma feroz rajada. E o brilho de uma adaga que se afundava em suas costas. Olhos cinzentos, manchados de verde encontraram o olhar esmeralda de Brynna, antes que o corpo de Dante caísse no chão.
No instante seguinte, Brynna foi arrastada, como se estivesse rodeada por redemoinhos de vento. Estava ali, tão surpresa que não podia nem gritar. E depois, já não estava mais.

Momentos mais tarde, um grito que atravessou sua própria alma, despertou Brand. O som correu por suas veias e alcançou sua garganta, onde um lamento intenso explodiu em seus lábios. Sem amarrar as calças saiu correndo de seu quarto e entrou no caos que tinha descido sobre Avarloch. William já estava à caminho do quarto de Brand, quando os dois se encontraram no corredor lotado de homens de ambas as guarnições, que corriam pelas escadas.
— É Dante —William chegou até seu amigo em dois grandes passos.
A mente de Brand girava, enquanto as imagens de seu irmão enchiam seu pensamento.
— Dante? — perguntou, lutando para clarear sua mente.
O duque levou as maciças mãos ao rosto, num gesto de dor e quando olhou para Brand, havia fúria em seus olhos.
— Encontraram-no no estábulo, Brand; tinha uma adaga nas costas. Vive, mon ami — apressou-se a dizer, ao ver o horror e a incredulidade no rosto de Brand — O fio penetrou entre as omoplatas, mas está inconsciente e quase congelado.
O estábulo! Um novo horror iluminou os olhos de Brand.
— Onde está Brynna? — agarrou a túnica de William, enquanto o pânico se apoderava dele e apertava seu coração, com dedos frios e mortais —. Onde está, William?
— Brynna? — durante um instante, não compreendeu o temor e o pânico de Brand. Olhou por cima do ombro de Brand para a porta do quarto.
— Não está contigo?
A cor abandonou o rosto de Brand, para dar lugar à dor que pareceu invadi-lo por completo, quando jogou a cabeça para trás querendo gritar. O terror percorreu o poderoso duque da Normandia. Apertou seu coração de um modo que fez com que sua mente se rebelasse, já que o terror lhe era completamente desconhecido. Ao redor deles, o povo corria de um lado para outro. Os cavalheiros davam ordens aos servos para que procurassem suas espadas; um de seus irmãos tinha sido atacado por um inimigo. Mas William não escutava nada, só ouvia o brutal batimento de seu coração. Não via ninguém além do homem que tinha em sua frente.
Uma fúria negra mesclada com um temor inexprimível rodeava Brand. E a pálida máscara de temor que cobria seu rosto era suficiente para convencer William de que o terror que ele mesmo sentia era real.
— Por que Brynna não está contigo? — a voz de William trovejou pelos corredores de Avarloch — Onde está, Brand? — quando Brand pronunciou suas próximas palavras, o som que as seguiu foi um grunhido mais profundo e mais letal do que o suportável.
— Ela foi ao estábulo.

Brynna era guiada através do bosque, com os olhos vendados e quase congelada. As mesmas mãos selvagens que tinham atacado Dante arrancaram sua capa. O rosto e os braços sangravam pelos arranhões dos ramos, à medida que a empurravam mais e mais profundamente dentro do bosque. Não falou, nem gritou. Só disse a seus captores que seus destinos seriam piores que a morte mais desumana. Eles riram, caminhando atrás dela, empurrando-a para frente, enquanto os outros cavalgavam.
Horas mais tarde, quando já não conseguia mais suportar continuar andando sobre suas pernas exaustas, caiu sobre o chão frio.
— Levante se! — exigiu a voz de um homem.
— Não — disse alguém mais—, este é um lugar tão bom quanto qualquer outro, para emboscá-lo quando vier procurá-la. Vamos parar aqui.
— Colette — sob a escuridão da venda, Brynna reconheceu a voz da mulher. Sua doçura já não estava ali. Ou só por não poder ver seu rosto angelical, o sorriso inocente que mascarava a verdadeira maldade de seu coração, o verdadeiro caráter de Colette se tornava tão transparente?
— Não parece surpresa — Colette desceu de seu cavalo e fez um sinal a dois de seus homens.
Mãos ásperas se fecharam ao redor das mãos de Brynna.
— Como pode me surpreender algo que faça Colette? — replicou Brynna, venenosamente, enquanto era arrastada pelo chão frio. A dor era insuportável, quando, por fim, conseguiram colocá-la de pé, e tiraram sua venda.
— Surpreendi Brand — Colette riu, tirando a venda dos olhos de Brynna —, não tinha idéia de meus planos até que o bastardo de William me delatou.
Os olhos de Brynna se acostumaram à luz que se infiltrava por entre as árvores e olhou indignada para a mulher, envolta em uma capa negra. A angelical beleza tinha desaparecido dos olhos escuros e cheios de ódio de Colette, seu doce sorriso tinha sido apagado pelo vento.
— Matou Dante — disse, enquanto amarravam suas mãos com grossas cordas em uma árvore a suas costas.
— Não, Clyde só o feriu. Precisaria mais que uma adaga para matá-lo, e não tínhamos tempo.
Brynna estudou sua fria expressão, procurando algo, algum rastro de emoção humana. Não havia.
— Sabe, Colette, é quase feia à luz do dia.
A mão se moveu como um látego, golpeando a bochecha machucada de Brynna. Enquanto lutava com fúria contra as cordas que a imobilizavam, Brynna prometeu arrancar os olhos de Colette, assim que estivesse livre. Mas sua captora só riu e deu meia volta, afastando-se dela.
— Diga-se de passagem, minha senhora — disse Colette por cima do ombro —, obrigada por me salvar a vida, frente a essa besta que chama de marido.
— Cuidado, Colette — advertiu Brynna —, já abusou o suficiente da misericórdia que tinha para te dar.
— Não se atreva a me ameaçar, querida, ou me verei forçada a te matar antes que chegue Brand. — Colette se moveu entre o círculo dos homens que a haviam escoltado até Avarloch.
— Necessitamos uma fogueira — disse.
— Não — respondeu um dos homens —, delataria nossa posição.
— Mas vamos congelar.
— Eu te manterei quente — a mão do homem se esticou para tocar uma mecha do cabelo loiro pálido que tinha caído do capuz negro. Brynna o reconheceu: era Sir Jeffrey. Colette afastou sua mão, repreendendo-o em voz baixa.
— Ela usou você para chegar a ele, idiota — explicou Brynna, com lástima, mas o ódio em seus olhos era tão ardente como o aço incandescente —. Usou você, e agora que Brand não está aqui para ver, desdenha-te.
Colette voltou-se para Brynna, seus olhos muito abertos destilavam fúria, e com um sorriso tenso sentenciou:
— Brand vai morrer. Como você. — de repente, seu rosto suavizou—se, enquanto um novo pensamento cruzava seu olhar — É uma lástima, na verdade, tenho afeto por ele. Ah, o que vamos fazer com ele...— disse divertida encolhendo os pequenos ombros.
Sir Jeffrey não tinha tirado os olhos de cima de Brynna desde que tinha falado com ele. Aproximou-se e a olhou de cima abaixo, atrás de longas e espessas pestanas. Por um instante, a jovem não pôde ler sua expressão. Ele levantou a mão para acariciar seu rosto.
— É bela — murmurou —, você gostaria de me usar?
— Toque nela e arrancarei seu coração, Jeffrey — ameaçou Colette, ferozmente, levantando-se da pedra sobre a qual estava sentada.
Brynna sorriu diante dos olhos marrons e ávidos de Jeffrey.
— Ela não brinca, eu mesma a vi fazer isso. – assegurou — Mas coloque uma mão em cima de mim e o que eu arrancarei será muito mais doloroso.
Ele riu, divertia-lhe o temperamento de Brynna.
— Vamos desamarrá-la, Colette — disse, sem voltar-se — Vejamos se seu fogo pode ser amordaçado.
A expressão de Colette era tão angelical quando Jeffrey finalmente olhou para ela, que ele pareceu derreter-se frente aos olhos de Brynna.
— Põe a prova minha paciência, senhor cavalheiro — ronronou Colette —, mas perdoarei você, se vier aqui e mostrar a ela a quem deseja, na realidade.
Jeffrey, virtualmente, saltou sobre um ramo caído para chegar ao seu lado. Colette abriu os braços para recebê-lo e jogou a cabeça para trás, enquanto ele se inclinava para morder seu pescoço.
A adaga apareceu só por um instante, mas Brynna a viu. Tentou gritar, mas já era tarde. Colette empunhou a adaga e cortou a bochecha de Jeffrey. Provocou-lhe só uma ferida superficial, mas o sangue que gotejava do rosto de seu amante fez com que seus olhos ardessem, com mais lascívia.
— Mais tarde, Jeffrey — disse, quando ele tentou beijá-la de novo.
— Cuidado onde crava a adaga, rameira — Um homem com a pele marcada de varíola e uma larga cicatriz cruzando um olho, ficou de pé e olhou Colette, com indignação —, ou levarei sua cabeça ao rei Eduardo.
— A única cabeça que levará ao rei será a de Brand, Clyde — a expressão vazia de Colette não tinha mudado, exceto para revelar um tom de brincadeira oculto atrás de sua frustração —. O plano só mudou um pouco. Tudo o que o rei queria era a morte de Brand, e a terá.
— E a cabeça do duque William? — perguntou Clyde, entre os dentes apertados —. Se graças a alguma intervenção milagrosa, conseguirmos matá-lo também, desabará a guerra sobre a Inglaterra. Não pensou nisso?
Colette fechou os olhos, a frustração refletida em seu rosto.
— Nós..., nós podemos ferir o duque para que não possa lutar, nem nos perseguir. — Alguém riu e Colette percorreu, com seu irado olhar, todos os rostos —. Todos vocês podem retornar, se desejarem. Farei isto eu mesma e a recompensa será só minha. Para Eduardo não importa quem assassine Brand, só importa que sua cabeça role.
O sangue de Brynna congelou ao escutá-la. Colette era uma demente capaz de tudo. E Eduardo... ai, rogava que William o matasse quando invadisse a Inglaterra.
— O que aconteceu em sua vida que fez com que sua alma se tornasse tão negra? — perguntou Brynna, quase sentindo pena da jovem mulher.
— Cale-se! — gritou, apontando sua adaga para ela —, Não abra a boca. Já está morta.
Os olhos de Brynna ardiam. Seu sangue fervia.
— Não traiu Brand, não é mesmo, Colette? — perguntou, serenamente, compreendendo agora aquela mulher —, não pode trair um amor, quando nem sequer sabe o que é o amor.
— Ah, mas eu sei — zombou Colette, sua ira aparentemente esquecida surgindo uma vez mais, enquanto se aproximava de Brynna — Amo o poder. O poder que minha beleza exerce sobre os homens — segurou a ponta da adaga na garganta de Brynna e a deslizou sobre sua carne. Ela fechou os olhos e Colette se inclinou, para beijá-la —, amo o poder que me dá o fato de não me importar com ninguém — sussurrou, observando a folha enquanto traçava os contornos do pescoço de Brynna.
A jovem sabia que tinha que se calar, mas a fúria se apoderou dela, e se tivesse que moderar sua língua um instante mais, a cortaria com uma dentada.
— Odeia Brand porque não teve o poder para convencê-lo a retornar contigo — abriu os olhos e lançou um severo olhar esmeralda sobre Colette. A mulher piscou e os lábios de Brynna desenharam um fino sorriso —. É assim, não é? Ele foi o único homem que te derrotou.
— Não de todo — Colette se recompôs rapidamente, mas a mão que segurava a adaga caiu ao seu lado —, vou vê-lo morrer.
Tendo escutado mais do que podia suportar, Brynna apertou os dentes com força.
— Como pôde ter amado você algum dia?
A única réplica da normanda foi um sorriso radiante.
— Não o matará — a voz de Brynna era um grunhido baixo —, é você que morrerá esta noite — a ameaça foi pronunciada com tão terrível convicção que Colette quase acreditou.
— Silêncio! — voltou-se para o homem mais próximo—, se ela sequer sussurrar, mate-a.
Capítulo 24

Quatro cavalheiros seguiram o trovejar dos cavalos de Brand, William e Lorde Richard pelo bosque. Cavalgavam como guerreiros prontos para a batalha, seus rostos refletiam uma impetuosa determinação, severos e poderosos, preparados para aniquilar seus inimigos com um só movimento de suas potentes espadas. Só a presença de Caos e a ausência dos elmos e armaduras revelava que cavalgavam para uma caçada e não para uma batalha.
A decisão de esperar o cair da noite e levar somente um dos cães tinha sido idéia de William. Sua mente bem treinada e tática raciocinou que Brynna tinha sido capturada por uma simples razão: fazer com que Brand a seguisse. O rosto de Brand se manteve frio e indecifrável, quando o duque explicou que acreditava que tinham sido Colette de Marson e seus homens que tinham ferido Dante e seqüestrado Brynna.
— Planejam te assassinar, inventar uma história qualquer para Eduardo sobre sua traição, que ele estaria mais que feliz em acreditar, se esta idéia tivesse sequer uma remota possibilidade de realizar-se.
— Vou matá-los um por um — tinha prometido Brand, com mortífera segurança.
— Oui — assentiu William, estava de acordo com o plano. Prosseguiu —levamos um cão para que nos ajude a encontrá-los, depois o manteremos calado, enquanto nos aproximamos.
Brand estava de acordo.
— Resgatamos Brynna, e massacramos o resto.
A noite desceu mais cedo no bosque sobre os troncos pálidos que elevavam seus incontáveis ramos ao céu. A geada caía das folhas murchas, mas Brand não sentia o frio sob sua capa negra. Impulsionou seu cavalo com força e rapidez; a fúria tinha acendido um fogo dentro dele que não seria extinto, até que todos os raptores de Brynna estivessem mortos. Não duvidava que a resgataria viva. Não podia duvidar, porque se o fizesse, só restaria afundar sua própria espada no coração, depois de matar Colette.
Não levaram muito tempo para encontrar o acampamento de Colette. Da distância se podia ver a fumaça elevando-se sobre a copa das árvores.
— Idiotas — sorriu William, grosseiramente.
— Pode ser um truque — advertiu Lorde Richard.
— Non — o duque normando sacudiu a cabeça, voltando-se para o pai de Brynna — Tiveram que acender uma fogueira. Está gelado. Se não tivessem feito, estariam congelados.
— Estão ali — concordou Brand — Caos nos guiará — assinalou o galgo que tinha saído correndo na direção da fumaça, mas se deteve para olhar, impaciente, os cavaleiros.
Sem esperar seus companheiros, Brand agitou as rédeas e cavalgou com William e os outros, que o seguiam de perto.

Colette caminhava de um lado para outro ao redor do fogo, como uma besta enjaulada, retorcia as mãos sob a grossa lã de sua capa. Cada som de um animal correndo pelo bosque, desviava sua atenção de Brynna.
— Ele já teria que estar aqui. Escutei dizer que te amava. Por que não veio?
Os olhos de Brynna procuraram entre as árvores, tentando vislumbrar qualquer sinal de movimento.
— Escutei o bastardo dizer que não ama ninguém — disse Clyde, com voz rouca ajustando a espada — Talvez não se importe se ela vive ou morre. O fogo o trará diretamente até nós, se chegar a vir, de qualquer forma.
— Deixe aceso — Colette olhou-o com raiva —, quanto antes morrer, mais rápido poderemos retornar para Eduardo.
Brynna fechou os olhos, tentando evitar que vissem suas lágrimas. Talvez tivessem razão. Talvez não importasse para Brand. Ele tinha assegurado que nunca importaria. Mas não podia evitar a lembrança de seus olhos, quando a olhava, o brilho de seu sorriso genuíno, o modo como sua mão se fechava sobre a dela, e as palavras que havia dito na noite anterior. Viria procurá-la. Viria com seu pai e com William. E cairiam diretamente na armadilha de Colette. De repente, passou uma idéia por sua cabeça, afastando o pânico que tomava conta de sua mente... uma maneira de salvar a todos os homens que amava.
— Brand não virá me buscar, Colette. Você o destruiu. Ele não me ama. Não pode me amar.
Colette deteve-se em seu ir e vir e olhou para Brynna com os olhos entrecerrados.
— Disse que te amava, eu mesma escutei.
Brynna sacudiu a cabeça.
— Sabe por que William veio para cá? Para comunicar a Brand a ordem de que me tomasse como esposa — respondeu — Brand preferia começar outra batalha antes de casar-se comigo. Disse a William e a meu pai que nunca me amaria. — As falsas lágrimas de Brynna arderam em sua pele e brilharam como a geada em suas bochechas. — Fiz tudo o que pude, mas não consegui que me amasse. Não virá, assim é melhor que me mate agora mesmo e vá embora.
A alguns metros de distância, escondido atrás de densos arbustos de amoras e groselhas, Brand escutava o testemunho de Brynna e um tremor atravessou sua alma. Jurou passar o resto de sua vida convencendo sua esposa de que a amava.
Na escuridão Brand voltou-se para William e assentiu com a cabeça. O duque colocou o capuz de sua capa negra sobre a cabeça e saiu dos arbustos, arrastando-se em silêncio, confundindo-se com as sombras e os homens da patrulha de Colette. Passou despercebido, quando se sentou em um grande tronco e começou a esculpir um ramo seco com a adaga. Logo, outra figura tão escura como a primeira ingressou na pequena clareira como um fantasma, com a capa e o capuz firmemente ajustado contra o corpo, para proteger-se do frio.
— Esperaremos até o amanhecer, a mataremos e retornaremos ao rei Eduardo — disse Colette mal-humorada, sabendo que Brynna provavelmente tivesse razão. Nada tinha saído como o tinha planejado de qualquer forma, e Clyde certamente tinha razão a respeito de William. Os normandos atacariam a Inglaterra, se algo acontecesse ao duque bastardo. Talvez o rei a recompensaria de qualquer modo. Diria que Brand tinha assassinado sua esposa, e uma vez que a notícia chegasse aos nobres saxões, o resultado seria o mesmo. Brand seria assassinado e o rei teria suas terras e ela, as suas.
Com um grunhido digno de um animal selvagem, Colette chutou a terra no fogo. As chamas dançaram, refletindo sombras ao longo dos grossos troncos, e sobre os homens.
Clyde ficou de pé ajustando a capa ao redor dos ombros.
— Tenho frio e necessito o calor de uma mulher — seus olhos se dirigiram para Brynna, com uma pálpebra caindo sobre sua pupila escura. Sorriu —, tomarei a ela, Colette, e se me interromper tomarei também a ti... antes de te matar.
— Pode ser que ainda apareça, Clyde — Colette o olhou, com raiva — Por que não espera e o obriga a observar?
— Não, tenho frio agora — disse o cavalheiro de pele marcada, agarrando Brynna.
— Tenho o pressentimento de que entrarei dentro de ti muito comodamente — o olhar luxurioso de Clyde, com uma explícita intenção fez Brynna tremer tanto que caiu de joelhos, mas ele deu um passo atrás, com uma careta zombadora —Talvez só faça você em pedaços.
Atrás dele ergueu-se uma sombra. William jogou a capa sobre os ombros. Em segundos, o duque da Normandia puxou sua espada. Resplandeceu à luz da lua por um instante e desapareceu nas costas de Clyde.
— E talvez não faça — disse William secamente, enquanto observava o homem cair.
O tempo pareceu parar, enquanto o duque levantava seu olhar para Brynna; então, voltou-se tão rapidamente que sua capa se elevou e estalou contra suas pernas.
— Colette! Ma cher! — exclamou, com ironia, enquanto o bosque cobrava vida a seu redor —, que prazer ver você de novo.
De repente, os capuzes foram jogados para trás revelando rostos que Colette tinha visto no castelo, incluindo o de Lorde Richard. Passou um momento, até que a surpresa que imobilizou seus homens desapareceu de seus rostos, e na luz da fogueira, Brynna observou os olhos de William que brilhavam com a excitação da batalha, enquanto chocava o aço das espadas.
A arma do duque afundava com destreza e sem esforço no ventre dos atacantes que se aproximavam. Antes que sua vítima caísse no chão, William retirava a espada, limpava o sangue na capa do homem e voltava a embainhá-la com a mesma rapidez com que a tinha tirado. Estudou a pequena batalha com um sorriso satisfeito, e voltou-se para a jovem.
— Está bem? — tirou uma adaga de sua bota esquerda e começou a cortar as cordas para libertá-la.
— Sim — ela respirou profundamente. No momento em que suas mãos estiveram livres, jogou os braços ao redor de seu pescoço e se pendurou dele.
— Oui, a mais bela de todas as mulheres — o tosco guerreiro normando fechou os olhos contra o cabelo acobreado de Brynna. Havia uma ternura paternal no seu abraço, e tanto alívio na profunda exalação que escapou de sua garganta que pareceu mais um grunhido do que um suspiro — Graças a Deus, está bem.
— Dante está vivo?
— Oui, está. Quando o deixamos, três de suas donzelas estavam atendendo-o, como órfãs carentes de amor.
— Onde está Brand? — perguntou Brynna quando a soltou.
O duque desatou os laços do pescoço e com um movimento da mão, pôs sua capa ao redor da jovem. Assinalou para uma sombra que se movia, como um borrão pela velocidade com que lutava.
— Está ali. É o que empunha a espada que derrama mais sangre. Merde, mas é um bastardo desumano, não? — William parecia escandalizado, mas seu sorriso contava uma história muito diferente sobre o que pensava de seu amigo preferido.
Brynna olhava seu marido lutar. A espada de Brand brilhava grosseiramente ao descer, cortando o ar e derramando sangue em todas as direções. Se sua fúria não tivesse sido tão aterradora, teria sido belo de observar. Era tão seguro, tão rápido, tão letal enquanto girava, balançando sua pesada espada com ambas as mãos. Seus olhos resplandeciam na escuridão, desumanos em sua destruição, como uma indomável paixão libertada. E embora diante de um inimigo ele fosse um pesadelo feito realidade, para Brynna era admirável e magnífico.
— Eu o treinei — disse William, com orgulho.
Atrás de sua enorme figura, sentia-se totalmente protegida da luta que tinha lugar ao seu redor e lançou ao duque um rápido e sardônico olhar de zombaria.
— Você não teria que estar brigando junto com ele?
— Mas se já não fica virtualmente ninguém contra quem brigar! — argüiu William mostrando, com um gesto, o pequeno campo de batalha.
Brynna assinalou Colette, que estava a ponto de montar em seu cavalo e fugir. William sorriu com malícia e saiu atrás dela.
Só dois dos homens de Colette seguiam vivos e Lorde Richard os estava despachando rapidamente, quando Brand desceu a espada e voltou seus olhos selvagens para sua esposa. Instantaneamente, seu olhar suavizou-se. Seus olhos a chamavam do outro lado da fogueira. Seus ombros tensos relaxaram como se somente vê-la o tornasse humano outra vez.
"Fiz tudo o que pude, mas não consegui que me amasse”.
Mas eu te amo, Brynna. Seu coração gritava.
Abriu caminho até ela, sobre os corpos e ramos, ansiando tomá-la em seus braços e dizer que significava mais para ele do que a própria vida.
Estava a centímetros de distância, quando uma figura saltou das árvores atrás de Brynna. O terror consumiu completamente Brand ao ver o braço que rodeou o pescoço de sua esposa. A adaga brilhou sobre sua garganta. A espada de Brand se ergueu como um trovão. Ambas as mãos sustentavam o punho da arma.
— Solte-a e não te cortarei em pedaços — prometeu Brand ao seu captor. Sua voz era baixa e mais letal que qualquer arma forjada a fogo. A ponta de sua espada permanecia tão quieta que parecia ser uma ilusão.
O atacante de Brynna sacudiu a cabeça, enquanto Lorde Richard e outros se aproximavam, lentamente, por trás de Brand.
— E um cavalo e tempo para fugir ou a matarei em seguida — replicou seu atacante.
Silêncio. Brand estava imóvel. Seus olhos ardiam como terríveis labaredas. Não houve um sorriso quando falou, só uma ira tão negra que cortava o ar, mesmo ao passar por seus dentes apertados.
— Solte-a agora.
Um temor selvagem cruzou o rosto de seu atacante. Franziu o cenho, preparado para matá-la.
— Que assim seja — pressionou mais forte a adaga sobre o delicado pescoço.
Brand só grunhiu. Com a velocidade de um raio que sobressaltou até Lorde Richard, sua espada voou como uma flecha lançada diretamente do arco. Cortou o ar, assobiando a milímetros de distância do rosto de sua esposa e atravessou a garganta do atacante, com tal força que o cravou na árvores as suas costas.
Cada fibra do corpo de Brynna enfraqueceu, ao voltar-se lentamente para ver quão perto o fio tinha passado ao seu lado. Olhou para seu marido e desmaiou.

A primeira coisa que Brynna sentiu quando despertou foi o calor do corpo de Brand. Estava recostada em seu colo. Brand acariciava seu cabelo, como se fosse mais preciosa para ele do que o ar que respirava. Ela abriu os olhos e ele baixou a cabeça e sorriu, franzindo o cenho.
— Desculpe-me por assustar você. O fio de minha espada jamais teria sequer te roçado — sussurrou.
Elevando os dedos para sua áspera mandíbula, Brynna deixou que seu olhar percorresse o rosto de seu marido. Seus olhos falavam, inundando-a com a paixão que ela tanto ansiava. Com seu perfeito olhar, revelava seu temor de perdê-la e sua transbordante felicidade por tê-la. Falava de uma necessidade masculina de protegê-la, não porque lhe pertencesse, mas sim porque já não podia viver sem ela. E, na serenidade do momento que passou docemente entre eles, os olhos de Brand disseram o quanto a amava.
— Sei que nunca teria deixado que me fizessem mal, Brand — disse, brandamente.
O remorso cruzou seus olhos.
— Mas tenho feito mal, Brynna. Nunca foi minha intenção.
— Brand...
— Non — silenciou-a, inclinando seu rosto até o dela —, só me beije e deixe que te dê meu coração — traçou o contorno de seu sorriso com os lábios — Amo você, Brynna — seus lábios eram a luz do sol e a escuridão, ao mesmo tempo, uma terna carícia e um anseio primitivo ao atraí-la para ele, até que ela sentiu o batimento de seu coração.

 

 

 

 


Capítulo 25

William caminhava de um lado para outro da clareira, arrastando Colette com ele, enquanto esperava que Brynna terminasse de abraçar seu pai.
— Merde, estou congelando! — gritou o duque normando, com impaciência, lançando a Brand um olhar selvagem — Não tocaram em um só fio de cabelo dela. Podemos ir agora?
Brand riu e enquanto se aproximava de William falou o suficientemente alto para que seu amigo pudesse escutá-lo.
— Como diabos fará para sobreviver neste país se alguma vez o conquistar, menino queixoso?
William estava a ponto de responder, quando Colette formulou um suave rogo.
— O que vão fazer comigo?
Brynna reuniu-se com seu marido. Seu braço a rodeou, meigamente.
— Meu senhor — disse a William, enquanto seus olhos verdes cristalinos encontravam os de Colette —, sabia que a única coisa que esta criatura ama é o poder que exerce sua beleza sobre os homens? — sem esperar a resposta de William, Brynna dirigiu um sorriso ameaçador a Colette — Que tipo de poder pensa que ela pode exercer sobre você"William o Conquistador"?
William olhou-a, com malícia. Dirigiu-lhe um sorriso selvagem e intensamente masculino ao considerar Colette de Marson de uma maneira totalmente nova.
— Pode levar um longo tempo para descobrir, mas o jogo certamente será muito interessante.
O olhar de Brynna percorreu o alto e largo corpo musculoso de William e seus severos olhos de aço.
— Colette? — disse com um tremor—, agora sim tenho pena de você.
Oferecendo a William uma delicada reverência, Brynna retirou-se da clareira com Brand, que não fez nada para ocultar a admiração que sentia por sua esposa.
— Esperem! — William deu um gigantesco passo para detê-los. Depois de um rápido gesto para um dos homens de Brand, Colette foi conduzida e lançada sobre o cavalo do duque, gritando e chutando, cegamente. Os olhos de William falavam de um amor terno e profundo, quando tomou a mão de Brynna — Está certa de que não foi... danificada por nenhum destes bastardos?
Brynna sorriu e beijou sua bochecha.
— Estou certa.
— Bem — respirou aliviado, com um sorriso novo e um orgulhoso movimento de seus ombros maciços disse — sabe, eu gosto de como me chamou antes, "William, o Conquistador". Parece muito apropriado, não é?
Os olhos da jovem brilharam com alegria.
— É obvio, por isso disse.
A gargalhada do duque lançou um eco pelo bosque sombrio e rodeou o pescoço de Brynna com um braço que quase a derruba no chão.
— Senhora, o mundo é muito mais luminoso para mim, desde que você está nele.
— Obrigado — disse sinceramente, sabendo que este homem seria seu amigo para sempre —, meu rei — adicionou, com uma piscada travessa.
— Rei? – zombou Brand, com um sorriso — Acaso minha esposa sabe algo que o resto da Inglaterra ignora?
— Non — disse o duque tão inocente como um menino — sempre disse à você que governarei a Inglaterra algum dia, não é?
Brand assentiu, desprezando o segredo que compartilhavam seu melhor amigo e sua esposa. Queria levá-la para casa em Avarloch e começar uma vida juntos. Deixar que os nobres batalhassem pela terra, ele tinha deveres muito mais importantes para atender.
— Vamos para casa fazer alguns herdeiros — sussurrou no ouvido de Brynna. Saltou sobre seu cavalo. Seus braços a rodearam, enquanto tomava as rédeas.
— Duvidou que viesse te buscar, meu amor? — perguntou, perto de seu ouvido, enquanto saíam da clareira.
Suspirando diante da calidez de seu fôlego e o tremor que percorreu as costas, Brynna se apertou ainda mais contra seus braços.
— Nem sequer por um momento. — Podia sentir seu sorriso contra o pescoço e seu peito alargar-se atrás dela, enquanto aspirava seu aroma.
No alto, a lua descia no céu aveludado, refletindo sua luz prateada sobre a fina geada que cobria os ramos. À direita, o lago brilhava como o cristal sob a luz e Brynna olhou-o enquanto recordava a fantasia pela qual se apaixonou.
— Brand? — Brand gemeu, desfrutando de seu aroma e do som de seu nome em seus lábios — Há algo que quero fazer, quando chegar o verão.
— O que é? — perguntou, beijando-lhe o pescoço.
Brynna fechou os olhos e deixou que seus lábios afastassem o frio.
— Quero aprender a nadar.

 

 

 

 

 

 

 


Epílogo

Bahia de Pevensey, Inglaterra – Outono de 1066
O vento era favorável e arrastava a tormenta para oeste. O sol se elevava sobre o horizonte, enquanto o som da trompeta de batalha anunciava o novo dia e uma numerosa cavalaria reunia-se na praia, preparada para a guerra.
A cavalo, William estudava os montes distantes, por onde guiaria seu exército para a vitória. O elmo esmagava a espessa cabeleira, enquanto uma parte mais fina de metal protegia seu nariz. Seus olhos cinzentos percorreram o canal de onde seus navios já tinham zarpado de Hastings e onde seus normandos encontrariam-se com Dante e os quatrocentos soldados, agora sob seu comando.
— Parece um dia tão bom como qualquer outro.
— Oui — ressoou a poderosa afirmação de seu cavalheiro mas leal, que esperava ao seu lado.
— Alegra-me que esteja aqui — disse William, olhando diretamente para a terra que se desdobrava frente a ele, como os braços ávidos de uma amante.
— Não poderia estar em nenhum outro lugar, além de aqui, contigo — Brand voltou-se e sorriu, seus olhos turquesa sob o prateado de seu elmo normando.
— Seu bebê está a ponto de chegar, por estes dias — recordou William.
— Então teremos que acabar rapidamente com o exército de Harold — um sorriso tão sinistro quanto os cuidadosos planos de William para tomar a Inglaterra, iluminou o rosto de Brand.
William riu, e finalmente voltou-se para olhá-lo.
— Assim faremos, meu amigo. Assim faremos.
Ao pensar em sua guerreira de cabelos de fogo, o duque ficou sério.
— Como está ela, Brand? Como está minha querida Brynna?
Seu severo olhar suavizou-se e um gentil sorriso substituiu a careta de Brand. Para William pareceu como se seguisse para ela, podia ver na expressão de Brand como sentia seu aroma até ali, entre milhares de cavalos enlameados e suados.
— Ela é mais assombrosa que o mar — disse Brand com voz rouca, como se Brynna pudesse escutar sua adulação — É perfeitamente formosa. Meu coração se detém cada vez que olho para ela.
William levantou uma sobrancelha sardonicamente.
— Então, o que tenta dizer é que a ama — brincou, mas o viu tão apaixonado que lhe enfraqueceu o coração e já não conseguiu zombar.
— A amo além de toda razão, William.
William suspirou feliz.
— É bom que o coração ame tão profundamente — disse o poderoso duque com toda seriedade, voltando seu olhar ofegante para os campos e montes em frente a eles.
— Vamos, Brand?
— Oui, meu senhor — respondeu o jovem guerreiro, fixando seu ávido olhar na direção de Hastings.
William levantou a mão em um silencioso sinal que ordenava a seus homens para seguir. E um momento antes de levar seu cavalo a um galope rápido, olhou uma vez mais ao homem que queria como um filho. A paixão pela batalha corria tão feroz pelas veias de Brand que William quase podia senti-la e seu próprio olhar escuro refletiu o dele, quando seus olhos se encontraram.
O duque estalou as rédeas com um poderoso movimento das mãos e o trovão lançou um eco, sob os cascos de seu cavalo.
— Por Brynna! — gritou, por cima do ombro, levantando sua feroz espada normanda para o céu — Que esteve esperando minha vitória tão ansiosamente como eu esperei a sua!
O vento fustigou o cabelo de William e golpeou contra seu rosto. Ele levantou o semblante para o sol para desfrutá-lo enquanto cavalgava. Sorriu, ao escutar a profunda risada de seu mais querido amigo atrás dele. A vitória, sem dúvida, seria deles.
— Falou com ela de Hastings antes de me dizer? É um bastardo, William o Conquistador!

 

NOTA: WILLIAM OU GUILHERME DA NORMANDIA
Rei inglês (1066-1087), nascido em Falaise, Normandia, ficou também conhecido como William o Bastardo ou William da Normandia, e em francês como Guillaume Le Conquérant ou Le Bâtard, ou Guillaume De Normandie, que se tornou duque da Normandia (1035) e respeitado como um os maiores soldados da Idade Média. Filho ilegítimo do Duque Roberto I da Normandia e de Herleve ou Arlette, filha de um curtidor de peles de Falaise, com a morte do pai (1035), foi reconhecido pela família dele como o herdeiro, tendo um tio como regente do ducado durante sua menor idade William. Aos 15, o Rei o Henry I da França, o sagrou cavaleiro. Liderou com sucesso uma rebelião dentro da própria Normandia (1047) liderada pelos nobreza favorável a submissão ao rei francês. O exército de Henry I da França, seu antigo aliado, foi derrotado na Batalha de Mortemer (1054). Seus sucessos e sua reputação o ajudaram a negociar o matrimônio dele a Mathilda, filha do Conde Baldwin V de Flanders. Na época da invasão dele de Inglaterra, era um chefe militar muito experimentado e temido, dentro e fora da Normandia unificada. A sua reivindicação do trono inglês baseava-se na sua afirmação de que o casto Eduardo o Confessor, de quem era um primo distante, tinha lhe prometido o trono (1051) e que, assim, Haroldo II era então um usurpador. Além disso, teve o apoio de Imperador Henry IV e a aprovação papal. Pensando assim, com a morte de Eduardo e a coroação de Haroldo, preparou uma grande força de invasão, com cerca de 600 navios, 7000 homens, incluindo 3000 de cavalaria e atravessou o Canal da Mancha e aportou em Pevensey e, partiu para Londres e encontrou as tropas de Haroldo II em Senlac, Hastings. O confronto final foi uma das batalhas mais famosas da história inglesa: a Batalha de Hastings (1066), Sussex, onde após derrotar as tropas de seu rival Haroldo II. A sangrenta batalha só terminou com o Rei Haroldo e seus irmãos mortos e um saldo de 1500 a 2000 guerreiros mortos do lado normando e outros tantos ou mais, do lado inglês. O Bastardo havia conquistado em poucos dias uma vitória que romanos, saxões e dinamarqueses haviam lutado longa e duramente para alcançar. Ele havia conquistado um país de um milhão e meio de habitantes e provavelmente o mais rico da Europa, na época. Ganhou ao reino inglês e foi coroado no dia de Natal na Abadia de Westminster, e por esse feito ficou conhecido na história como The Conqueror.

 

 

                                                   Paula Quinn         

 

 

 

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